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Crimes virtuais puros e impuros

Alexandre Atheniense

Ninguém questiona que a Internet passou a ser meio para a prática de crimes e contravenções já previstos pela nossa legislação. No mês passado inclusive, tivemos ampla divulgação pela mídia que segundo pesquisa feita por um Instituto de Segurança da Internet na Alemanha, chegou-se a conclusão que o maior número de ataques a sites na Internet no mundo foram originados no Brasil.

Na discussão desta temática encontramos três vertentes distintas sobre a aplicação das leis sobre os crimes virtuais.

Alguns dizem que tais crimes não estariam tipificados, pois haveria necessidade de uma nova lei, mais específica. Outros alegam que bastaria aplicar o Código Penal, nos casos em que não há distinção quanto ao meio pelo qual o ilícito é praticado, já que a Internet é apenas um cenário eletrônico e não implica qualquer diferença. Outros ainda argumentam que como a Internet é global, faltaria um tratado internacional. Qual seria a solução diante destas discussões?

Inicialmente, cumpre distinguir que alguns crimes já são tipificados pela lei penal não distinguindo qual seria o meio utilizado para a sua consumação. Por exemplo: difamar alguém. Preceitua o art. 139 do Código Penal. “Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à reputação – Detenção, de três meses a 1 (um) ano e multa”.

Como se vê, embora o nosso Código tenha sido elaborado em uma época muito distante da Internet, o legislador não criou óbices para tipificação de uma prática realizada pelo mundo virtual. Estes são os chamados crimes virtuais impuros. Nestes casos, bastaria aplicar a legislação penal atual.

Quais seriam os limites de aplicação do Código Penal? Devemos refletir que a grande maioria das nossas leis foram escritas para lidar com bens corpóreos, portanto, muitos ilícitos que são praticados pela Internet estão relacionados com bens incorpóreos (dados, informação), como acesso não autorizado a banco de dados, alterações de informações em banco de dados, invasões de sites e a disseminação de vírus. Estes são chamados os crimes virtuais puros.

Embora alguns entendam que seja possível tipificar os crimes virtuais puros na figura de outros considerados impuros, como a violação de correspondência, usurpação de propriedade intellectual e o crime de dano, é de se considerar que estes tipos necessariamente foram criados originariamente para se relacionarem com bens tangíveis. Daí, existe uma certa dificuldade para aplicá-los aos ilícitos virtuais. Urge a aprovação dos projetos de lei onde estão previstos estes novos tipos penais de modo a minimizar os problemas relacionados com as transações on line.

Os maiores problemas verificados atualmente são: as ameaças e vulnerabilidades que colocam em risco a confidencialidade e a privacidade (proteção contra acessos indevidos e vazamentos de dados); integridade (proteção contra alterações indevidas e fraudes); disponibilidade (garantia de acesso) e autenticidade (identificação do perfil do agente que praticou algum acesso eletrônico).

Embora alguns juristas sustentem ser necessário um tratado internacional para a completa harmonização dos crimes virtuais em vários países, é de se lembrar que o Brasil adota o princípio da ubiqüidade (art. 5o. do CP), segundo a qual se aplica a lei brasileira sempre que alguma parte de um ilícito penal haja sido cometida no território brasileiro, sendo desnecessário que o crime ou contravenção tenham sido integralmente praticados no Brasil.

Fica afastado, portanto, o antigo conceito de que a Internet é uma zona sem lei e o desconhecimento das normas aplicável não irá absolver ninguém.

* Alexandre Rodrigues Atheniense, 35 anos, é advogado sócio da Aristoteles Atheniense Advogados em Belo Horizonte, onde atua nas áreas de Direito Comercial, Direito da Informática e Cível perante a 1ªInstância e Tribunais. É diretor de Informática, membro da Comissão de Direito à Informação e conselheiro Estadual da OAB/MG. Foi professor de Direito Comercial na PUC-MG e na UNA, em Belo Horizonte. Participa como conferencista de diversos eventos no Brasil e exterior, com especialidade em Direito da Informática e Informática Jurídica, sendo autor de trabalhos premiados nessa área e já publicados em várias revistas especializadas.
E-mail: colunistas@mundolegal.com.br