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PUBLICAR OU PERECER





O dito publicar ou perecer é típico da vida acadêmica norte-americana, e alienado por excelência. Num tempo em que será preciso recorrer ao 'livro usado' (eventualmente é reeditado algo clássico) para resgatar objetos que lembrem, em algo mais além da capa, o que era um livro, publicar pode ser mais alienado ainda, porque não está provado que todos os ítens publicados, hoje, tenham trazido à cultura jurídica maior tirocínio, ajuda e aprimoramento do regime democrático, ou o contrário, se a quantidade não é ela mesma sintoma de que o dito na verdade encobre o seu contrário, quando haverá muitos objetos do tipo do livro (isto é, capa e determinado número de páginas impressas) que já nascem perecidos, porque o que nunca chegou a ter vida não é sequer apto a morrer, não é mortal. Não sendo mortal, não pode ser imortal. É um item a mais no "cemitério de coisas da modernidade". Produto tipicamente norte-americano, o dito também é importado para adequar-se à ideologia do "Primeiro Mundo". Não se veja aqui qualquer ufanismo populista que seria parte de uma certa tradição latino-americana, mas é preciso enfatizar que uma cultura, e a cultura jurídica mais que todas, está ligada a determinadas tradições e é sempre idiossincrática, com seus prós e contras. Mudar de tradição, como panacéia, da noite para o dia, como quem muda de roupa, ainda pode fazer com que importemos o pior de cada tradição. Não há instituições universalmente democráticas, que funcionariam do mesmo jeito em todos os lugares. Os Estados Unidos, nesse particular, escreve Heller, conseguem exportar objetos funcionais "como carros, geladeiras, aparelhos de televisão, da Irlanda ao Mali", mas "não conseguiram implantar sua 'marca' de instituições democráticas em um único outro país".

A instituição do publicar ou perecer já está entre nós. Se não fosse o que vem junto com ela, seria tolerável, porque se diria que publicar por diletantismo ou qualquer outra preocupação, por mais alienada que seja, ainda será uma questão personalíssima que a ninguém incomoda, até porque o livro também é um objeto de mercado e cada um compra o que quer. O problema é quando a introdução de um certo academicismo no espaço público traz, de quebra, outros aspectos não-democráticos, como a sub-reptícia introdução da consigna totalitária do "politicamente correto", que é a imposição, pela força (pela violência ou pelo cansaço) de uma opinião sobre todas as outras, eliminando a pluralidade de opiniões não manipuladas, único substrato possível do conceito "opinião pública". Como escreveram Ágnes Heller e Ferenc Fehér, em pequeno livro em que criticam (com certeza à margem da 'academia' norte-americana) o potencial totalitário das "biopolíticas", sói ocorrer que as políticas de gêneros, raças e outras "substâncias" venham acompanhadas da parafernália radicalista e totalitária do "amigo-inimigo", da autoclausura e do gueto, de hipocrisia ou histeria, assim como também virão com "epistemologias" especiais, místicas do graal de "iniciados" no vocabulário do grupo, e outros elementos da nova-linguagem do "politicamente correto":



"para os europeus orientais, que se livraram há muito pouco, e ainda não em grau suficiente, do despotismo da opinião 'politicamente correta', a mania atual de manietar coletivamente o indivíduo para que aceite uma posição pré-fabricada e obrigatória, que inunda o meio acadêmico e os meios de difusão estadunidenses, é um espetáculo quase incrível. E isso é muito natural, porque os europeus orientais e os habitantes da antiga União Soviética tiveram tempo de sobra para descobrir que lá onde há uma única opinião 'politicamente correta', não há nenhuma opinião em absoluto, apenas submissão, covardia, silêncio e uma nova linguagem".



O dito alienado do publicar ou perecer anda junto com o politicamente correto. Ambos quebram a tradição, instauram a regra quantitativa para o conceito de autoridade. Junto a eles, costuma vir o "culto ao novo". Do meio acadêmico, onde o 'novo' responde a uma necessidade existencial de 'dar conta' de algo antes de se precisar compreender, ainda que de passagem, dois ou três milênios de tradição, a americanização adentra no mundo jurídico e judicial. Quer-se o constitucionalista mais novo, o precedente mais novo, o que ainda não foi publicado, o que ainda não foi traduzido, e por aí vai. Que ambos simulem a existência da cultura (que é, como se disse, produto da pluralidade de opiniões e não da que foi decretada como politicamente correta) parece lógico. Porque a tradição não se interessa pela quantidade de títulos que apareceram no mercado ou por quantas dezenas de milhares da 'obra' já foram vendidas. A tradição tampouco precisa do conceito de 'duração' para afirmar-se. Não é a 'duração' o único termômetro da tradição. Alguém pode adentrar no mundo da cultura hoje e pretender fazê-lo para preservar a tradição. E provavelmente será esse alguém quem no futuro será ainda objeto de interesse, assim como (agora já no plano estritamente jurídico) nós ainda nos interessamos (e cada vez mais) pelos autores dos "manuais" antigos, que não eram coletâneas feitas sobre a ferramenta do "recortar e colar", mas obras de autor. Não se trata de uma nova onda de romantismo, pois não adotamos qualquer argumento do tipo que afirme com nostalgia a grandeza dos antigos em comparação com uma suposta decadência inexorável. Trata-se apenas de resgatar o conceito de tradição, que é difícil de definir, mas que se conhece também pelo lado negativo, pelo que não é. Porque aqui também vale a referência bíblica de que "a árvore se conhece pelos frutos". E só por isso há algo de "sacro" no que teve um dia vida, no que colheu da vida concreta a motivação real para dizer a outros aquilo que aprendeu, por "ter o que dizer sobre um assunto", por ter reunido experiência, e somado a ela a reflexão conceitual, e depois concisamente selecionado autoridades, por ser enfim 'juiz' das opiniões de outros (pois quem não tiver como dizer o certo e errado que não pretenda fazer 'doutrina'), responder pelo que subscreve de outros, sem por isso precisar da 'marca' equívoca da originalidade ou do gênio. Doutrina é obra de autor, e autor tem que dizer isso entra, aquilo, não, e se uma opinião é intrinsecamente convincente, e analisar as opiniões todas em seu mérito, preferencialmente iniciando pelas opiniões cotidianas, pré-reflexivas, que farão com que nos abriguemos contra a tentação da ficção e a perda do bom senso, etc. A chamada doutrina, com a quebra da tradição, deixou de ter autoridade, porque não pode ter autoridade a coleta de duas opiniões sem análise, sem que se diga esta tem tais méritos, esta outra tem aquele outro, no cômputo geral das coisas, esta idéia é mais democrática, aquela é menos, etc. (alguém poderia somar aos itens da análise outros tantos, mas que por favor digam alguma coisa que não se limite às ferramentas de "recortar e colar").



CONSENSO FORÇADO E QUEBRA DA CULTURA JURÍDICA



O consenso forçado já está entre nós, tanto pela violência quanto pelo cansaço.

Para citar alguns exemplos, fiquemos com a questão do "sigilo bancário" e da "execução de multa penal pela Fazenda Nacional".

Sobre o primeiro, havia, até pouco tempo atrás, uma salutar pluralidade de vozes no Supremo Tribunal Federal, e dessa pluralidade extraía-se a opinião, muito bem sustentada, do então Ministro Rezek, de que o sigilo bancário não era uma garantia posta na Constituição (todos nós a conhecemos, ainda que não tenha sido 'publicada'). Daí que seja interessante também publicá-la, agora com motivação desalienada, para que idéias jurídicas não pereçam pela manipulação do consenso e pela nova unanimidade, pela "elegância" da última "conquista" final da liberdade sobre o arbítrio que pode, ao fim e ao cabo, redundar no seu contrário. Sem pretender 'rebater' a tese de que o sigilo bancário esteja incluído no direito à intimidade, procuramos apenas tentar compreender por que o discurso jurídico é de uma hora para outra tomado pela unanimidade (por que 'dez anos' após a Constituição foram afinal descobrir o valor da "intimidade", quando ela é a primeira a ser pisoteada na prática diária, com a vista grossa de todos. São denúncias de escuta ilegal, são suspeitas de que a "inteligência" dos governos não é só 'coordenação' de informações às altas autoridades, mas verdadeira polícia secreta, e por aí vai).

Há uma súbita urgência em considerar 'atrasado' o ponto de vista segundo o qual o direito ao sigilo bancário não é uma garantia constitucional. Por isso, precisamos publicar, para não perecer, a idéia contida na voz dissonante, para que ela tenha direito a existir. Então, poderemos ler e argumentar (e contra-argumentar sobre a base da dedução, da lógica, do que se quiser, menos do "consenso" ou unanimidade dos juristas apresentados pelos meios de (de)formação de opinião, que se tornaram entre nós os representantes da grande imprensa).

"Meu voto - dizia o Ministro Rezek - é no sentido de indeferir o mandado de segurança impetrado pelo Banco do Brasil, entendendo, como entendo, perfeitamente legítima - segundo a ordem jurídica a que o Tribunal deve garantir vigência - a requisição de informações endereçada ao banco pelo Procurador-Geral da República.

"Parece-me, antes de qualquer outra coisa que a questão jurídica trazida à corte neste mandado de segurança não tem estatura constitucional. Tudo quanto se estampa na própria Carta de 1988 são normas que abrem espaço ao tratamento de determinados temas pela legislação complementar. É neste terreno, e não naquele da Constituição da República, que se consagra o instituto do sigilo bancário - do qual já se repetiu ad nauseam, neste país e noutros, que não tem caráter absoluto. (etc.)".

(Ministro Francisco Rezek, Mandado de Segurança nº 21.729-4 Distrito Federal).



O dito publicar ou perecer pode ter também vertentes de autenticidade.

Nós já nos engajamos, inclusive em petições, para que o Poder Judiciário publique alguns acórdãos antigos, porque não queremos que as idéias que eles continham pereçam, atropeladas pela súbita unanimidade.

Não faz muito tempo, a Seção Tendências/Debates da Folha de São Paulo patrocinou uma discussão sobre o tema, e apresentou (a referência é de memória) a opinião de um médico, e parlamentar, dizendo que o sigilo bancário jamais foi cogitado como garantia constitucional e que não estava no art. 5º, nem no inciso X e muito menos na palavra "dados" do inciso XII. Logo abaixo, apresentava a opinião de alguém que se apresentava como jurista, a dizer que era "óbvio" que o sigilo bancário era decorrência do direito constitucional de "intimidade" do art. 5º, X, da Constituição. De uns anos para cá, surgiu uma "urgência" e relevância em uniformizar a interpretação (que a muitos parece extrapolar a própria Constituição) sobre o foro constitucional da garantia do sigilo bancário. E não foi à toa que a "tendência" do Ministro Rezek foi estampada no tablóide por quem é "leigo" em matéria jurídica, porque um "médico" obviamente não compreende a erudita técnica que interpreta o "espírito" da Constituição, mesmo que apresente em lógica e bom senso tudo o que parece faltar às eruditas peças dos juristas.

Para não deixar dúvidas, não demorará que alguém promova uma "pesquisa" de opinião pública entre os juristas (como, aliás, já vem sendo promovido e divulgado pela imprensa a propósito de congressos de tributaristas, constitucionalistas, etc.). E não demorará que se divulgue o resultado com o percentual que votou constitucional ou inconstitucional, como um grande júri. Só que há questões que podem estar sendo impostas na pergunta, como sói ocorrer entre os que se valem do 'marketing' para forjar consensos. E aí bem poderá a pergunta ser formulada do seguinte modo (em hipótese):



"Qual a opinião de V. Exa. sobre o sigilo bancário, tal como previsto no art. 5º, inciso X, da CF?"



E isso pode ser feito para uma finalidade meramente acadêmica, e depende de quem irá formular a pergunta a qualidade da resposta, como num grande espetáculo de audiência do tipo "Você Decide". Nós precisamos publicar, sim. E ter meios de divulgação de opiniões que circulem entre nós mesmos e os outros (se quiserem ler, pois há tanta coisa publicada que cada um seleciona o que quer ler) para que saibamos nós mesmos (e os outros que quiserem saber) que nossas opiniões existem e não vão perecer. Porque do contrário, não será muito relevante que a interpretação jurídica (que muitos entendem superior), vamos dizer, de uma lei nova que se limitou a dizer que na execução penal a lei aplicável será a mesma de que se vale a União para executar sua dívida ativa, que ela nem por isso tornou essencial a formação de um 'título' extrajudicial (como é uma certidão de dívida ativa) para a cobrança de multa penal e custas do processo, e que o titular da ação continua sendo o mesmo titular da execução. Porque a unanimidade veio a ser decretada ontem, e não se precisa mais discutir já que, a partir da interpretação nova, de que é atribuição da Fazenda Nacional, vem a interpretação 'autêntica', quando os tribunais federais, para evitar "tumulto" processual, legislarão sobre a matéria em provimento. E aí tanto faz que recurso extraordinário, interposto pelo Ministério Público ao Supremo Tribunal Federal, seja conhecido e provido, porque já haverá uma 'praxe' simplificadora de tudo que será um forte argumento no julgamento.

É preciso publicar para manifestar contrariedade à quebra da tradição, quando, por motivos de utilidade, conveniência ou outros de igual índole, entra no mundo um deus novo contra o qual não é possível manifestar contrariedade, porque ainda vão dizer que os recursos são tumultuários, e vão perguntar se "queremos fazer execução fiscal?" ou "quem quer julgar questiúnculas de fauna silvestre?". E depois, já que passamos a pena corporal, por "conveniência" administrativa, para a Justiça dos Estados, por que não fazer o mesmo com a multa, que passaremos à Fazenda Nacional.

Haverá, de ora em diante, tanta coisa que não cabe em recursos, que é preciso publicar para não perecer. De uma hora para outra, com a quebra da tradição, entrará um "novo deus" na doutrina e jurisprudência, e então vistamos a roupa nova para não ficarmos fora de moda. Fala-se em igualdade das partes no processo penal? Alguns vão mais além e a aplicam ao inquérito. Então haverá despachos, dos quais não cabe recurso (não por razões jurídicas, mas por razões práticas, quem recorreria, intimando a parte contrária para razões, da negativa de busca e apreensão?), do tipo "justifique o Ministério Público a necessidade de adentrar na vida privada do indiciado", ainda que preso em flagrante delito de crime grave. Dizer o quê?

Publicar o que se "recorta" da boa doutrina será então aqui nosso "recurso" (e já que se trata, em alguns despachos judiciais do "apele quem puder", também diremos, leia quem quiser, mas quem quiser ler algo diferente do que entrou no "ar" como o 'novo', verá que podemos ter fundadas razões de contrariedade).

Afirmar contrariedade fora do processo (preferencialmente em artigos de doutrina) se tornará necessário à medida que a quebra de autoridade da doutrina é acompanhada também de quebra de autoridade judicial. Deve haver algo de sério e grave numa unanimidade que não consegue sustentar-se diretamente com recurso à argumentação jurídica, precisando de métodos laterais de legitimação. Deve haver algo sério acontecendo quando o Judiciário e o Ministério Público, ambos com lugar na Constituição, tenham "unanimidades" divergentes sobre a aplicação das leis, quando deveriam ambos estar em busca do mesmo objetivo: de resguardo da ordem jurídica.

O pensamento jurídico do Ministério Público deve afirmar-se como uma voz dissonante, que cultivará a pluralidade de vozes na discussão jurídica, a busca da tradição. Publicar não precisa do elemento "novo", nem da originalíssima e idiossincrática opinião do gênio. Temos que publicar a própria "tradição". Afirmar, contra idéias novas que se disseminam com velocidade inédita, doutrina diversa, que teremos de ter o trabalho de procurar, ou simplesmente repetir o óbvio. A quem disser com estranha naturalidade que precisamos de "provas" para investigar ou denunciar, afirmaremos que jamais foi isso que se pediu ao Ministério Público, que tem na dúvida a legitimidade de pesquisar, na defesa da vítima, até o último vestígio.



CULTURA E CATARSE



Mas é preciso publicar para não perecer também de outras causas, tais como a perplexidade. Até porque a "cultura" (e a vocação cultural do Ministério Público é-lhe parte essencial, para que se assegure a pluralidade de vozes na produção do conhecimento e da prática judicial) também serve para canalizar emoções que, nos dias de hoje, tenderiam a perturbar a tranqüilidade da vida e da rotina de trabalho das instituições, como o sentimento de impotência ou de desalento que se expressa em frases do tipo, "não, isso de novo, não", ou "nisso eu não acredito...", sob formas mais saudáveis e urbanas do que a eventual retorsão. Inclusive porque não é aconselhável a retorsão, que sempre fortalece quem não era vítima, porque a verdade e a justiça da retorsão jamais poderão entrar em discussão pública, pelo menos não diretamente e não com seus nomes "próprios".

A pluralidade que se diz fazer parte essencial da cultura jurídica é a pluralidade de opiniões jurídicas, que se sustentam e fundamentam em métodos razoáveis de discussão e argumentação, mas todos tendo o mesmo objetivo (óbvio): o de realizar a justiça, o bem comum, resguardar o regime democrático. Exemplo clássico dessa divergência frontal e pluralidade que chega ao antagonismo, em que ambas as opiniões são respeitáveis em si mesmas, está na discussão célebre travada no Supremo Tribunal Federal por ocasião da discussão dos efeitos, para a subsistência do estelionato, da fraude bilateral (nesse caso a respeitabilidade da discussão transparece na "letra" do acórdão, que vale a pena recordar, apenas para "inspiração", STF, RHC 65:186, RTJ, 124:195).

Agora, quando a divergência não tem outro sentido senão o de disfarçar a injustiça e entronizar valores pré-modernos (como está-se tornando comum na discussão criminal, que retorna à pré-modernidade, quando primeiramente se valorava a "pessoa" para depois, conforme o seu estrato político, valorar-se o fato criminoso, de modo que não era para um 'nobre' que se usaria o mesmo 'direito' que era aplicável a um vassalo), na verdade não há discussão alguma, porque contra a sofística não há argumentação, mas mera sucumbência perplexa. É preciso haver um modo respeitável de negar respeitabilidade ao que não a possui. Para isso haveremos de "cultivar" também a tradição.



QUANDO O HOMEM É LOBISOMEM DO HOMEM



Tempos como o nosso são tempos que dão guarida aos lobisomens (que são, segundo a lenda, aqueles lobos que assustam nas sextas-feiras, até serem feridos, quebrando-se o encanto), porque entronizam a 'lei da selva' em que o homem é lobo do homem. Se fôssemos adotar a nova-linguagem do politicamente correto até o dito ficaria "os homens e as mulheres são lobos e lobas dos homens e das mulheres". A troca do gênero masculino pelo duplo gênero é, na verdade, mais "inclusiva" e constitui o lado mais simpático e inofensivo da nova-linguagem. Mas do lobisomem, que é, gramaticalmente, substantivo masculino, teríamos de dizer mais: que ele, em essência, de certo modo, não tem gênero. E não desencanta fácil, pois que é vitalício.

Na década de 70, fez sucesso, pelo menos no Rio Grande do Sul, o romance Por Que Acredito em Lobisomem, de Serafim Machado, advogado que contava um caso escabroso do Judiciário, nas instâncias estaduais e no Supremo Tribunal. Cuidava-se da argüição de nulidade do testamento de Auristela Alves Pereira, oligofrênica de nascimento, que - segundo a perícia, séria, que fora produzida no processo, contraditório, de interdição - jamais havia passado dos oito anos de idade mental e que, não obstante, após um processo administrativo de "revisão" da interdição, "apenas para poder testar", recebido por petição do curador que, em três linhas, apontava "grave erro dos peritos" e pedia novo exame, na certeza de que suas conclusões lhe haveriam de ser favoráveis, viu passar para os filhos do seu curador toda sua fortuna, que parece que não era pouca.

E daí em diante o processo segue em diversos juízos, relatado e votado por diversos desembargadores e ministros (e muitos, porque houve, no Tribunal de Justiça e no STF decisões não unânimes posteriormente discutidas em Embargos de Divergência). Uns, desembargadores e ministros, minoritários, apontam que havia não apenas graves nulidades, mas também uma verdadeira "fraude" urdida para benefício do curador da testadora, fraude que jamais poderia convalescer na casa da Justiça. Entre os vencedores, afora os expedientes de 'excesso de prazo' (cinco anos para entrar em pauta o processo em grau de embargos no Tribunal de Justiça, e mais um ano para lavrar o acórdão), vai narrando o autor todos os "titubeios e tergiversações" de relatórios que conseguiam contradizer em poucas e frívolas palavras os juízes vencidos, pairando, ao fim de cada julgamento:

"a impressão de que tudo viera abaixo no monumento judiciário, coerência, tradição, jurisprudência e outros valores que formam a majestade da justiça. (...) [é o] momento em que parecia ruir o último reduto dos desafortunados; pois, quando tais figuras de gabarito aprovam e sancionam tal disparate, tamanha afronta à lei e às normas seculares, o que mais resta esperar?".



O inusitado acórdão, relata Serafim Machado, era composto de "citações de fatos irrelevantes, acórdãos sem muita pertinência ao assunto em debate, mas que servem para ir ocupando espaço", como sói ocorrer nesses casos, para que por fim, numa linha distraída, se traduza e resuma a essência "jurídica", que no caso do voto do desembargador relator vinha na conclusão de grande profundidade de que "mesmo o normalmente perfeito 'é relativo'". E sustentava então, o excelso vencedor, o 'fundamento' de seu voto - desprezando a prova (um incômodo, nesses casos), unicamente no "depoimento do advogado da interdita".

No Supremo Tribunal, a essa altura já formado por ministros nomeados após a chamada "redentora", mais um acórdão majoritário seria desafiado por embargos de divergência, sendo ambos relatados com "malabarismos e frases ambíguas, contornando fatos e situações tão claras, sem lugar para dúbias interpretações".

"Foi quando passei a acreditar em lobisomem", conclui Serafim Machado, para quem o sentimento que traz um caso como esses não tem propriamente nome, mas é algo como:



"um estado de enojamento por tudo, de descalabro total, desmantelo irremediável, como quem perde o entusiasmo e a crença por todos os valores humanos".



Conjecturou-se, na época, que o caso Auristela tinha por objeto não tanto o testamento de uma oligofrênica, cujos sucessores talvez já nem mais esperassem justiça, mas era o verdadeiro julgamento da Justiça, e nisso teria semelhança com o famoso precedente do julgamento de Dreyfus, em que o advogado, Émile Zola, já relutara em aceitar a defesa, "porque, cético e descrente, achava 'ridícula a luta da boa fé contra a fraude'".



A REAÇÃO À MODERNIDADE



Aqui faz sentido o paradoxo: o verdadeiro incrédulo é aquele que ... acredita no lobisomem. Os mais céticos não nos desencantamos tão tragicamente, como Serafim Machado, que - pelo espírito de seu livro, parece que tinha mais fé do que devia na tradição jurídica e nos propósitos de moralização da "Redentora". Talvez porque sejamos céticos, acreditando no bicho mesmo antes das provas e "de tudo o mais que dos autos consta", é que procuramos compreender que espécie de Estado concede mais "espaço" para os lobos. Será importante não conceber, de modo ingênuo e sempre conveniente aos detentores do poder, que o bicho existe como uma "marca indelével da condição humana". Não, os "lobisomens" de Serafim não são recorrências eternas da burocracia judicial, que seriam parte da natureza ou da ordem das coisas. Eles têm e ganham espaço em regimes que precisam deles, que são regimes que vão suprimindo as liberdades públicas, os valores democráticos, e entronizando sofismas e conveniências como "opiniões politicamente corretas".

Já se produziu, em dez anos de medidas de emergência, suficiente quebra do conceito de "ordem jurídica", quebra adequada para que o próximo passo seja a perda de qualquer padrão razoável de discussão e argumentação judicial, de qualquer expectativa razoável de que diante de determinada conduta seja decorrência legal determinada sanção. Onde nada se espera, nada surpreenderá. Tudo é movimento e dinamismo. O que ontem foi perdoado amanhã será punido, e "exemplarmente" - como sói acontecer em estados de exceção.

Farão falta - em tempos como o nosso - aqueles que afirmem com saudável senso comum, e mesmo na frente do bicho, que "lobisomem não existe", e que traduzirão, nesse gesto, a prova de que a fraude, o sofisma e a conveniência política podem levar ao poder, mas não asseguram a honra ou a glória.

O politicamente correto entroniza "linguagens" novas, e normalmente tais linguagens serão um pouco míticas: falarão numa coisa, mas o que se produzirá é o contrário. Os maiores retrocessos - até mesmo em Direito e Processo - virão como marcas da insofismável afirmação da modernidade e da liberdade possível. As maiores conquistas modernas passam por mágica a serem "ab-rogadas" pelo "novo" espírito do Mundo (um espírito que seria meio americano, fala-se em mudar nosso processo penal, na imprensa, para que fique um pouquinho como os filmes de júri, e muitos até se entusiasmam em coletar, para o novo mosaico pós-moderno, pedaços de tradições diversas, fazendo por fim uma grande salada que pode bem ficar com o pior de cada tradição, como se a solução fosse o recurso já velho de "mudar de nome", que é na verdade a estratégia de mudar tudo para que fique tudo igual). Ouviremos - com a mais absoluta naturalidade, até em juízo e em acórdãos, verdades feudais como o testis unus testis nullus, a prova tarifada, etc. contra as quais a modernidade se construiu, e não com tanta facilidade (valeria a pena lembrar a luta de Mittermaier, traduzida, aliás, com clareza, na Exposição de Motivos do Código de Processo Penal de 1941, ao fundamentar o "livre convencimento leal" do juiz na avaliação da prova, e mais, a participação ativa do juiz no processo, quando só pronunciará a dúvida favorável ao réu depois que esgotar a última fonte de convicção possível). Ouviremos, com a maior naturalidade, no processo judicial o triunfo do pensamento cotidiano estampado nos jornais, e incentivado por quem na verdade não aprecia demasiado o que é 'moderno', para chegar a um "objetivo" final, não claramente expressado, mas que pode ser "deduzido" de pistas e sinais. O retorno a critérios medievais de avaliação da prova é recomendável a uma burocracia judicial que tem por tarefa não só aplicar o direito, mas também avocar os processos de determinadas pessoas, construindo, de modo disfarçado, novos privilégios de foro.

E isso se fará com a mais "liberal" das justificativas, que é de preservar as honras dos acusados contra a sanha persecutória de uma nova "inquisição". Isto é, divulga-se à imprensa que o Ministério Público (defensor da sociedade) seria quem retornaria à Idade Média, quando a verdade é todo o contrário.

E com que naturalidade aparecerá a confusão, mesmo em processos, entre prova e indício, entre o princípio acusatório e a dúvida em favor do réu, e com que naturalidade se dirá que - se não podia pedir condenação com as provas do inquérito não podia o acusador processar, e por isso, se o fez, que indenize a pseudovítima, e por aí vai.

A "onda" de litigância contra o Ministério Público Federal insere-se nessa "histeria" anti-moderna, fomentada pela imprensa, que é, no fundo, uma grande e bem armada reação contra a Constituição democrática de 1988.

Será preciso publicar para não perecer, à míngua, tendo nossos bens seqüestrados e penhorados nas novas "espécies processuais". Vem-se disseminando uma "cultura" segundo a qual o nosso "quinto poder" é algo terrível, que precisa pagar pela vitimização dos acusados. Estimula-se na imprensa uma espécie de histeria, e então o Judiciário aparece como protetor da dignidade do acusado contra a nossa suposta vilania. Somado a isso, vem o "interesse" a que a histeria é subserviente: as "perdas e danos" vêm de uma "instância" social que não admite que contra ela se levantem suspeitas, porque na melhor linha da ética absolutista, nem o Rei, nem os que lhe são próximos, cometem crimes, quando muito "enganos", cuja retratação será sinal de "ética" e valentia. Daí ser importante propalar, para o público leigo (até mesmo profissional) o "espírito" de uma legislação como a Medida Provisória 2088-35, de 27/12/00, que poderá até não vigorar, mas já cumpriu seu papel, que é o de sedimentar a idéia anti-democrática de que "todo acusado absolvido deve processar o acusador", ou seu lado mais bárbaro, que a denúncia que não se prova é "calúnia".

Será bom e nos trará algum conforto encontrar lucidez na tradição, por exemplo, do bom Maquiavel, que compreendeu muita coisa da política e não se furtou a dizer o certo e o errado, que tal coisa acontece mas é fraude, que a fraude pode levar ao poder mas não à glória, etc. Então, contra a barbárie, afirmaremos a boa tradição. Segundo o pensador renascentista, a boa república estabelecerá o princípio de que:



"todo cidadão poderá ser acusado, sem qualquer temor ou perigo; uma vez estabelecido e bem observado este direito, os caluniadores devem ser punidos rigorosamente". Afirma um pouco antes: "as calúnias devem ser detestadas nas cidades que vivem sob o império da liberdade" ... "para isto, o melhor meio é abrir caminho às denúncias" ... "Acusa-se os cidadãos perante magistrados, perante o povo, ou os tribunais; calunia-se nas praças públicas, em reuniões particulares. A calúnia é mais empregada sobretudo nos Estados onde a acusação é menos habitual, e cujas instituições não se harmonizam com este sistema".

Daí se compreende como e por que se fala em "calúnia" para que determinadas pessoas não "sofram" o que lhes é de direito: a acusação pública perante os tribunais. Sofram, então, as vítimas, porque o Judiciário não está interessado na persecução penal, apenas na proteção do réu (por inacreditável que seja, é o que se lê num artigo sobre o direito penal "moderno" de autoria de juiz federal, e que teria por fundamento certa doutrina "garantista", etc.).

Então começamos a conectar os pedaços do novo mosaico. O "Remédio Abortivo da Ação Penal", evocado em texto publicado no Boletim da Associação Nacional dos Procuradores da República, não tem só aquele propósito "nobre" de antecipar a absolvição do acusado para evitar a 'martirização' pelo processo (conceito que já é equívoco, como também a idéia que já circula que o processo penal é "a favor do réu", quando o processo, qualquer um, é a favor das liberdades em plural, para conhecer, com seriedade, os fatos, e afirmar a 'liberdade de todos'), que ali se delineou (até porque o texto não examinava a questão de um ponto de vista mais generalista, como fazemos agora).

O hábeas-corpus falso é também parte essencial de um projeto maior de reação contra a modernidade. O abuso do hábeas-corpus simboliza um retorno ao processo pré-moderno, já que se abusa da forma jurídica e da tradição para julgar pessoas relevantes, e não fatos criminosos, perpetuando a desigualdade formal de todos perante a lei que é a base de nossa tradição colonial. Andará junto, o "abortamento" da ação penal ou de improbidade, com a confusão geral e inconstitucional das funções do Estado.

As indenizatórias, contra atos praticados pelo Ministério Público Federal, no mais das vezes abusarão da forma processual no que tange à competência. Todos sabem que agimos no exercício da função, mas pode ser mais "conveniente" eleger o foro estadual. E aí o raciocínio supostamente jurídico para dizer que a competência é estadual é o mesmo que fundamenta a existência do art. 22 da Lei 9028/95 (segundo o qual a Advocacia-Geral da União poderá representar judicialmente, quando quiser, alguns altos funcionários de Governo ou agentes do Poder Judiciário).

O raciocínio, juridicamente perverso, é mais ou menos o seguinte: quando o funcionário (de um bom escalão) é acusado, ele obviamente agiu como diz o art. 22 "no exercício de suas atribuições constitucionais, legais ou regulamentares, no interesse público". Agora, ao contrário, se o Judiciário rejeita as ações do Ministério Público Federal, tais ações não são ações da "instituição democrática do Estado", mas daquelas pessoas enquanto entes "particulares", que se apossariam da máquina estatal (entrariam no cargo) para dele abusar e contrariar o interesse público, e perseguir o interesse privado, daí porque a ação indenizatória civil jamais seria proposta pela pseudo-vítima para fazer que a União pague algo (porque seria, veja-se, a União também vítima da ação de vilania desse seu Agente), mas sim contra o próprio agente enquanto particular, e uma ação cível entre dois particulares se resolve no foro estadual, dado o "óbvio" desinteresse da União. Que seja esse o argumento "jurídico" em discussão, é mais uma das conseqüências do nosso tempo de vigência - paralela à Constituição - da ilegalidade. Ou no dizer de Celso Antônio Bandeira de Mello, é conseqüência da:



"singularidade do momento em que vivemos, no qual mesmo as noções jurídicas mais óbvias, mais primárias, são ignoradas ou simplesmente desaplicadas, dando margem, então, a que o curial apareça como problematizável, o evidente como duvidoso, o elementar como exotérico, o lógico como ilógico, o singelo como complexo e o básico como tema de alta indagação".



Em termos mais abstratos, mas não menos certeiros, aqui também se tem prova inequívoca desse nosso "salto" sobre o Estado moderno, para trás, quando voltam a unir-se, na mesma pessoa, a Coroa e o Rei (e acreditem ou não, talvez a Judiciário retorne rapidamente a ser manifestação da soberania do príncipe e não da lei). A modernidade construiu lentamente - como no representativo relato filosófico da jurisprudência medieval européia, de Ernst Kantorowicz, se demonstra - a tese da dualidade entre o corpo político do rei e o corpo político da Coroa (corpo místico, de inspiração teológica) que é, na realidade, predecessora do Estado moderno, da idéia de que os Estados são eternos enquanto seus governantes passam, da idéia de que podem os governantes pecar (cometer delitos) contra o Estado, podem usurpar poderes, etc.



0800-DISQUE-JURISTAS



E mais grave é que tempos de anormalidade constitucional são tempos também que verão, juntamente à quebra da tradição, o desaparecimento de autoridades sociais (com o aparecimento de novas autoridades, normalmente autoproclamadas, ou proclamadas por alguém que detenha poder de conferir uma espécie de grau ou 'carteirinha' de intérprete correto do 'espírito da Constituição', sendo os demais ignorantes, atrasados e chicaneiros), uma quebra generalizada e crescente de decoro, e um aumento também generalizado de soberba, porque desaparecem as noções objetivas em que temos de nos fiar para agir no plano ético-jurídico. Para a grande convulsão de valores, é essencial que passem a valer "novos deuses", e daí é normal que a tradição judiciária seja tomada de um certo "academicismo", onde o que mais importa é o último título publicado. A soberba, que torna a vida das instituições judiciais passionalizada a ponto de quase esquecer-se de aplicar o direito às partes (aplicando-o para premiar ou castigar os próprios agentes que as representam) atinge indiscriminadamente todas as instâncias. Não é uma "radicalização" que resolve atacar as instâncias inferiores como rebeldia contra a autoridade, ela é a própria quebra do conceito de autoridade de que são culpáveis as instâncias superiores. Nestas, a soberba manifesta-se como violência (que age de modo violento ou sofístico, pela manipulação, como no caso dos 'lobisomens' que dirão que a decisão é x, embora o fundamento seja até o "normalmente perfeito é relativo", ou ainda, que o réu "n" confessou, mas o depoimento deste co-denunciado "w" está muito bom e autoriza o trancamento da ação, e "apele quem puder"). Nas instâncias inferiores a soberba manifesta-se como "retorsão", e com o tempo (é o consenso pelo cansaço) até esta se esvai, e adentramos no campo da desistência.

E ainda pagaremos indenização, provavelmente em foro incompetente e por ritos sumaríssimos, aos acusados culpáveis e "pra lá de responsáveis", em processos abortados pelo 'deus ex-machina' do palco judicial, que ora parece trágico, ora comédia, e que, entre nós, desde o livrinho de Serafim Machado, atende pelo nome de 'lobisomem'?

Melhor não responder, ainda. Mas na necessidade de "publicar" o pensamento jurídico do Ministério Público, para que não pereça a democracia, também se afirma a vocação do Ministério Público, que é "política" em sentido amplo, por não aceitar a ditadura do "politicamente correto" que se ensaia entre nós, sem qualquer sinal de resistência. Por isso, e também como "o último recurso", nos fará bem a cultura, não só como formadora de opinião pública verdadeira (plural) e combatente do 'politicamente correto', mas também como "catarse". Hannah Arendt já citava Isak Dinesen para traduzir o elemento catártico da cultura e sua função (positiva) na vida política, para eliminar o ressentiment: "todas as desgraças podem ser suportadas se você as colocar em uma estória ou narrar uma estória a respeito delas".

Nem tudo precisa ser alienado. Engajemo-nos no autêntico "publicar", mesmo que seja de peças jurídicas que achamos simples e pouco originais, mesmo que seja de "colagens" de opiniões de outros, porque até o "selecionar" de boas opiniões de outros está fazendo falta. Publiquemos independentemente de autoridade acadêmica, até porque ela é relativa, e por vezes absolutamente independente da autoridade profissional, que vem da labuta responsável do dia-a-dia, da resolução de problemas concretos e da necessidade de ser parte ativa na consecução do bem comum, através da prática institucional, e não meramente espectador irresponsável, ou ator interessado na coleta dos bônus (poder ou dinheiro) que advirão da opinião jurídica oferecida em 'consultorias', como ocorre com muitos dos que se intitulam, entre nós, juristas e doutrinadores.

A instituição democrática e constitucional do Ministério Público, criação idiossincrática da nossa tradição, cuja antítese é o Estado-policial, deve fortalecer-se para poder incutir vida e energia ao regime democrático, que anda tão fraquinho.

Publicar será também um jeito de continuar existindo e construindo-se, resistir contra todos que tramam o nosso óbito, ou pelo menos, nossa pseudo-existência como instituição que convenha mais aos príncipes do que à defesa da ordem jurídica, como um "apêndice" do Poder Judiciário, como já voltam alguns a defender explicitamente.

Publicar ou perecer parece, enfim, uma disjuntiva autêntica. Publicando, tentaremos resgatar a cultura jurídica verdadeira, que sempre foi e sempre será pluralista e não unânime, para que saibam os novos intérpretes do espírito vivo da Constituição que haverá quem resista à democracia fictícia, que tudo decidirá pelo recurso a quantidades de opiniões previamente manipuladas, uma democracia em que todos somos finalmente iguais, mas igualmente nulos, porque o que é jurídico, moderno e constitucional será resolvido pelo método hiper-moderno do 0800-Disque-Juristas.

(05/07/2001)











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