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PARECER: questão de exame de ordem







Félix Valois Coelho Júnior

Advogado OAB/AM 339

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Bacharéis em direito, que se submeteram ao último exame de seleção realizado pela Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Amazonas, pedem meu parecer sobre o critério adotado pela Comissão examinadora, no que pertine à correção da questão atinente à elaboração de peça profissional, constante da prova subjetiva de Direito Penal.



Assim está elaborado o quesito, ipsis litteris virgulisque:



"Paulo Roberto foi condenado pelo Tribunal do Júri da Comarca de Manaus a vinte e três anos de reclusão, por conta de ter dolosamente matado Caio, valendo-se de recurso que tornou impossível a defesa da vítima. Ressalte-se que por ocasião do julgamento o representante do Ministério Público juntou fotografias de uma festa em que Paulo e Caio apareciam juntos, discutindo. As fotografias foram exibidas ao Conselho de Sentença, muito embora você, Defensor do acusado, tenha impugnado a apresentação na hora. Além disso, durante o julgamento você levantou a tese da legítima defesa própria, mas no momento da leitura dos quesitos, em plenário, o juiz incluiu em um só deles todos os requisitos da legítima defesa, contra o que você também protestou, argumentando que assim os jurados estariam em dificuldade para deliberar.



Indique o prazo e redija a peça recursal adequada à impugnação, fundamentando a escolha do recurso".



Aos examinandos que optaram por interpor o recurso de apelação foi atribuída nota zero no quesito, tendo os examinadores feito, em cada uma das provas, a seguinte observação, aqui também transcrita literalmente:



"O recurso cabível é o Protesto Por Novo Júri.



A eleição de Ap. constitui erro grave".



Com este sucinto relatório, passo a opinar.



Que o protesto por novo júri é cabível na espécie é conclusão que deflui da simples leitura do art. 607, do Código de Processo Penal.



Não consigo, porém, atinar como, nos moldes em que foram expostos os fatos, possa ser considerado "erro grave" o uso da apelação.



O enunciado do quesito aponta, clara e deliberadamente, para a ocorrência de duas nulidades posteriores à pronúncia, quais sejam: a) a produção de prova em plenário (fotografias) pelo Ministério Público, sem a prévia comunicação à parte contrária, o que encontra vedação expressa no art. 475, do CPP, além de ofender o princípio constitucional da ampla defesa e do contraditório; b) a evidente deficiência dos quesitos, nos termos do que prevê o parágrafo único, do art. 564, do mesmo estatuto processual.



A nenhuma dessas nulidades deu causa a defesa que, ao contrário, contra elas protestou oportuno tempore, sendo igualmente certo que ambos os fatos poderão ter influído na decisão da causa (arts. 565 e 566, do CPP).



Ora, o diploma adjetivo já citado estatui com meridiana clareza:



"Art. 593 - Caberá apelação no prazo de 5 (cinco) dias:



omissis



III - das decisões do Tribunal do Júri, quando:



A ) ocorrer nulidade posterior à pronúncia".



Resulta evidente, pois, que ao advogado do réu Paulo Roberto não pode ser imputado "erro grave" se, em se valendo do recurso apelatório, pleitear perante o tribunal ad quem sejam declaradas tais nulidades para o efeito de obter a submissão de seu cliente a novo julgamento pelo Tribunal Popular.



De lege data, portanto, é indiscutível que o advogado poderia optar:



1. Pelo protesto por novo júri, em razão do quantum da pena, ex vi do art. 607, do CPP;



2. Pela apelação, com suporte no art. 593, III, a, em virtude das nulidades ocorridas após a pronúncia.



Não se há de ter como impedimento para essa alternativa o § 2 º, do art. 607, segundo o qual "o protesto invalidará qualquer outro recurso interposto". Muito ao contrário, o que aí se expressa é que, dispondo de vários recursos, inclusive o protesto por novo júri, a parte pode optar por qualquer deles, mas, se interpuser o protesto, todos os demais ficarão prejudicados.



Nem se diga (muito menos) que o teor do art. 608 seria óbice à solução pela qual me inclino. O dispositivo simplesmente cogita da hipótese (que nada tem a ver com a da questão formulada no exame) em que, julgado pelo Júri, por exemplo, por homicídio qualificado e lesão corporal grave, determinado réu seja condenado pelo primeiro crime a uma pena igual ou superior a 20 anos e a outra pena inferior a 20 anos, pelo segundo, quando, então, poderá ser usado o protesto quanto ao homicídio e apelação quanto à lesão. Mesmo, neste caso, contudo, nada impediria que, também com relação ao homicídio, fosse usada a apelação se as condições a indicassem como mais favorável aos interesses do réu.



Reconheço que, de um ponto de vista meramente pragmático (mas, nem por isso, absoluto), alguém menos avisado poderia formular a seguinte indagação: O que levaria o advogado do réu a escolher a apelação, quando o protesto por novo júri é de formulação rigorosamente mais simples e de efeito automático pela sua só interposição?



Sem cometer a leviandade de acreditar que tenha sido uma consideração dessa ordem, absolutamente desprovida de qualquer base científica, que embasou a decisão da douta Comissão Julgadora, permito-me enfrentar o detalhe.



Se, na questão posta, o advogado protestasse por novo júri, indiscutível que seu cliente seria automaticamente submetido a novo julgamento. Admitindo que voltasse a ser condenado à mesma pena de vinte e três anos, já não seria possível usar o protesto (art. 607, in fine) e, ao interpor apelação quanto a este veredito, não poderia o defensor argüir as nulidades ocorridas no anterior julgamento porque, por motivos óbvios, estariam elas sanadas. Restar-lhe-ia, assim (admitindo que nenhuma outra nulidade tivesse ocorrido no plenário do segundo julgamento), sustentar o apelo na alínea d, do inc. III, do art. 593, o que (sabem-no todos com o mínimo de experiência em júri) é de quase impossível êxito nos tribunais togados, quando o recurso é oriundo da defesa.



De outra face, interpondo a apelação, no caso sob exame, só uma decisão teratológica do tribunal ad quem poderia recusar a anulação do julgamento, tão óbvias e gritantes são as nulidades apontadas. Com a anulação, por esse motivo, teria o causídico à sua disposição, na hipótese de nova condenação à mesma pena e ainda admitindo a não ocorrência de nova nulidade, o singelo e simples protesto por novo júri.



Vale dizer, sob o tal ângulo pragmático, que o uso do protesto, no caso ocorrente, acabaria por redundar em prejuízo do cliente, que se veria privado de utilizar tal recurso se novamente condenado à mesma pena, quando poderia ter ele ficado como uma espécie de reserva para o novo julgamento decorrente da apelação.



Tudo, como se vê, mera questão de tática profissional, sem que, todavia, se possa acoimar de errado (gravemente errado?) o advogado que optasse por qualquer das duas soluções.



Admitindo-se, apenas para argumentar¸ que estivesse correta a postura assumida pela digna Comissão Julgadora, não posso imaginar um magistrado que, ao receber a petição de apelação, lhe negasse seguimento, alegando que se tratava de "erro grave" e que o único recurso cabível seria o protesto por novo júri. Tendo os dois recursos o mesmo prazo, seria o caso de aplicação art. 579 e seu parágrafo, do CPP, com o que, na verdade, a quizila assim levantada se revela mero bizantinismo. Trata-se, se não estou em equívoco, do princípio da fungibilidade dos recursos.



Feitas essas considerações, concluo:



1. Nos termos em que fornecidos os dados para elaboração da peça profissional, na prova subjetiva de Direito Penal, do exame de Ordem recentemente realizado pela OAB/AM, são opções corretas de resposta tanto o protesto por novo júri como a apelação.



2. Em conseqüência, não procede a observação feita nas provas dos que optaram pela apelação, segundo a qual "o recurso cabível é o Protesto Por Novo Júri. A eleição da Ap. constitui erro grave".



3. Têm, portanto, os que interpuseram apelação o direito de verem examinadas e corrigidas suas peças, atribuindo-se-lhes a nota (de zero a seis) que lhes competir.



É o parecer, s.m.j.



Manaus, 26 de abril de 2000.





Felix Valois Coêlho Junior

OAB/AM 339

(Advogado licenciado para o exercício de cargo incompatível)



Retirado de: http://www.internext.com.br/valois