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Aliança pelo
conhecimento
Carlos Henrique de Brito Cruz
Num recente seminário, que reuniu empresários, acadêmicos e
representantes do governo, na Unicamp, discutiu-se o papel da empresa, da
Universidade e do Estado na inovação tecnológica.
O debate é fundamental para o Brasil, que pretende se inserir ativamente
na era do conhecimento como insumo da produção de riqueza e do desenvolvimento
econômico e social.
Diferentemente do que reza o senso comum, que associa a atividade de
pesquisa exclusivamente à academia, verificou-se no simpósio que a empresa é o
lugar da pesquisa tanto quanto a Universidade; ou até mais.
Esse reconhecimento, apesar do estágio incipiente das relações que
deveriam juntar, no Brasil, política industrial e política para ciência e
tecnologia, está exatamente em sintonia com a tradição e a experiência dos
países mais industrializados, onde a maioria dos cientistas trabalha em
empresas, e não em Universidades ou institutos de pesquisa.
Assim é nos EUA, na Alemanha, no Japão, na França e na Inglaterra, onde
às Universidades está reservada a missão prioritária de ensinar e formar
quadros qualificados. Para essa formação qualificada, as atividades de pesquisa
desenvolvidas no meio acadêmico são essenciais e insubstituíveis.
É ilustrativo o exemplo da Coréia do Sul, cujas empresas mantêm em seus
quadros cerca de 75 mil pesquisadores -naturalmente fornecidos pelas
Universidades-, enquanto no Brasil somente 10% de nossos cientistas (menos de
9.000) trabalham fora do meio acadêmico.
Como a quantidade de pessoas está relacionada à quantidade de tecnologia
que se produz, não é difícil explicar por que os brasileiros registram
anualmente nos EUA uma centena de patentes, enquanto os coreanos ultrapassam o
patamar de 3.500.
À empresa cabe fazer a inovação tecnológica, porque é ela que entende de
mercado, possui a cultura de analisar demandas e está apta a aproveitar as
oportunidades.
Por outro lado, o papel da Universidade nessa economia do conhecimento
está na formação dos quadros que, dentro da empresa, vão promover a inovação
tecnológica e gerar riqueza.
É uma boa notícia que o Brasil produza 6.000 doutores por ano em seu
excelente sistema de pós-graduação - poucos países do hemisfério Sul são
capazes disso -, mas é de lamentar que a indústria não os absorva ou, por
outra, não encontre motivação para o fazer.
Resolver isso requer o apoio do Estado às atividades de pesquisa nas
empresas, com o auxílio das Universidades e dos Institutos de Pesquisa, o que o
governo está tentando fazer através dos fundos setoriais e da Lei de Inovação
Tecnológica, que tramita no Congresso.
Para ser bem-sucedida, essa política requer o estabelecimento de uma
forte aliança entre academia, empresa e Estado - uma aliança pelo conhecimento,
capaz de juntar a capacidade acadêmica e educacional de nossas boas
Universidades à atividade de geração de conhecimento e inovação na empresa.
Em alguma medida, o país já faz isso e, pelas razões acima, a partir do
esforço estatal.
Há uma lista de bons exemplos, cada qual medido em unidades de bilhões de
dólares por ano, a mostrar que o salto da qualidade manufatureira e produtiva
indica um começo para desenvolver a capacidade inovadora.
Basta lembrar que os dois principais itens da pauta de exportações
brasileira - os aviões da Embraer e a soja -- devem-se à ciência e à
tecnologia. No primeiro caso, aos engenheiros do ITA; no segundo, aos
pesquisadores da Embrapa.
Do mesmo modo, dificilmente o país chegaria a 85% de auto-suficiência em
petróleo, não fossem as 20 escolas de geologia que fazem a Petrobras funcionar,
todas públicas.
Juntas, essas escolas não custam mais de US$ 20 milhões por ano. No
último ano, a Petrobras registrou um faturamento de US$ 10 bilhões.
Mais difícil é mensurar a riqueza gerada a partir da academia por meio da
capacidade empreendedora de seus ex-alunos ou mesmo de seus pesquisadores; mas
pode-se ter uma idéia.
Apenas nos últimos dez anos, os alunos formados nos vários cursos da
Unicamp criaram empresas que já faturam mais de R$ 600 milhões por ano.
O ponto a considerar é que a Universidade, nesse caso, gerou valor
econômico muito maior ao formar quadros capazes de promover a inovação
tecnológica - e de torná-la um empreendimento - do que o faria se se dedicasse
exclusivamente a resolver os problemas da indústria. É um caso clássico, ao
qual se aplica a proverbial diferença entre dar o peixe e ensinar a pescar.
Com isto não se pretende excluir a Universidade do papel de auxiliar, no
sentido mais imediatista, a empresa. A Unicamp tem longa tradição nessa atividade
e a realiza sempre que isso contribui para sua missão mais singular, que é
educar.
No plano do governo, é indispensável que o tema da inovação e do
conhecimento ultrapasse o campo de ação do Ministério da C&T e envolva
outros ministérios, como o da Indústria e Comércio, da Saúde e da Fazenda, além
do Banco Central. Só assim a inovação será um tema efetivamente incluído na
agenda nacional.