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Ensino e aprendizagem em ambientes virtuais: algumas considerações

 

Carlos Henrique Medeiros de Souza

Fernanda Castro Manhaes

 

 

Compreendida como fato social, a Educação não está descolada da realidade material e subjetiva que a gera e lhe confere especificidade. Nesse sentido, o desenvolvimento de relações sociais de novo tipo, promovidas e propiciadas, sobretudo por transformações que se operam na base material de vida e conseqüentemente nas novas configurações de poder, resultam na necessidade de desenvolvimento de processos educativos novos.

 

É assim que as novas tecnologias da informação e da comunicação, e especificamente o ciberespaço, com as possibilidades que encerram, adquirem importância fundamental e merecem destaque em qualquer reflexão que venha a ser feita sobre a importância e as demandas para uma educação na atualidade, uma vez que, estas já vêm  sendo amplamente utilizadas em diversos setores da  cultura contemporânea, correspondendo, portanto, o importante elemento constitutivo da base histórica sobre a qual se desenvolve o que vem sendo conhecida como sociedade da informação.

 

A professora Paiva (2002) apresenta a seguinte reflexão:

 

“Estamos imersos na era das redes digitais hipervelozes, que disponibilizam incessantemente, informações de acesso imediato, em uma ambiência de usos partilhados e interatividades. Os fluxos infoeletrônicos reconfiguram o campo da difusão simbólica, seja em decorrência da brusca aceleração tecnológica, seja pelas modalidades dialógicas que se manifestam.”

 

A questão das novas tecnologias e conceitos como saber flexível, aprendizagem cooperativa, interdisciplinaridade, transdisciplinaridade, currículo integrado, redes de aprendizagem e educação continuada e à distância começam a se fazer cada vez mais presentes nos ambientes acadêmicos e políticos, sobretudo quando está em pauta a discussão sobre a necessidade de renovação dos processos educacionais.

 

“Trabalhar hoje equivale cada vez mais a aprender a transmitir saberes e produzir conhecimentos.

 

(...) o ciberespaço suporta tecnologias intelectuais que ampliam, exteriorizam e alteram muitas funções cognitivas humanas. (LEVY ,1999)

 

Nesse sentido, ainda nas palavras do autor, torna-se imperativa a adaptação dos dispositivos e do aparato do aprendizado aberto e à distância no cotidiano e no ordinário da educação e a criação de um novo estilo de pedagogia que incorpore as novas tecnologias e favoreça, ao mesmo tempo, os aprendizados individualizados e o aprendizado coletivo, em rede.

 

Não se debate, portanto, a importância da discussão em questão no âmbito deste trabalho, ou seja, o estudo sobre as comunidades de trabalho/aprendizagem em rede. A inter e transdisciplinaridade, tão requisitadas pelas necessidades impostas na atualidade pelo modo de produção hegemônico típico da sociedade contemporânea, demandam e estimulam o saber construído coletivamente e a construção de redes e comunidades de trabalho. As novas tecnologias da informação e da comunicação (NTIC) e o ciberespaço apenas as viabilizam e potencializam se utilizadas adequadamente em um contexto pedagógico.

 

O uso das novas tecnologias da informação e comunicação (NTIC) encerram potenciais e limites e conferem singularidades específicas se aplicadas ao ensino presencial ou à distância  e suscitam uma longa discussão quando analisadas em relação a uma ou a outra modalidade de  ensino. A sua utilização, portanto, encerra a necessidade de construção de um modelo pedagógico que dê suporte à implementação de projetos. Estas duas modalidades tendem a ser complementares, uma vez que, cada uma delas, por si só, encerra também potenciais e limites.

 

No entanto, o uso das NTIC amplia as possibilidades do ensino à distância  e  podemos acreditar, que, pelas possibilidades que oferecem em termos de superação das   barreiras impostas pelo tempo e espaço, sua utilização, em um futuro não muito distante, tenderá a superar a presencial, principalmente pela abrangência que vem sendo almejada  pelos projetos institucionais, que têm buscado, cada vez mais, a conquista de mercados que se definem para além das fronteiras nacionais.

 

Deter-nos-emos, portanto, no âmbito do presente trabalho, a uma breve reflexão sobre a constituição de comunidades de trabalho e aprendizagem em rede em sistemas de educação à distância que utilizam a Web como suporte tecnológico e seus potenciais para responder às demandas e desafios postos pela sociedade contemporânea.

 

Compreendemos aqui como comunidade virtual de aprendizagem em rede, os grupos que se constituem em ambientes virtuais estruturados com funções pedagógicas explícita e normalmente definidas e que lançam mão das ferramentas de informática on-line disponíveis para a promoção da aprendizagem.

 

As possibilidades de utilização das novas tecnologias da comunicação em projetos educacionais à distância a partir da interconexão pelo universo on-line são ilimitadas. No entanto, no momento, ainda variam segundo duas abordagens básicas a depender da concepção de educação que fundamente a respectiva proposta pedagógica. Utilizaremos aqui, a tipologia proposta por D. JONASSEM (1996), que qualifica dois tipos de abordagens: a objetivista, que prioriza e persegue a potencialização ao acesso à informação que os novos  meios encerram, ou a abordagem construtivista, que prioriza e define a utilização dos meios como possibilidade de ampliação dos sistemas de interação e a construção gradativa da autonomia do aprendiz.

 

Reconhecemos aqui a fragilidade da tipologia proposta para o fim que almejamos, tendo em vista o fato de que esta não suporta a existência de variações que correspondam a modelos  intermediários, que mesclem elementos das duas abordagens. No entanto, teremos as duas aqui como "tipos ideais" que deverão servir para evidenciar as implicações e riscos da adoção exclusiva de cada uma delas.

 

Segundo a abordagem objetivista, na definição da estratégia pedagógica a ser utilizada em um projeto educacional que incorpore as novas tecnologias da comunicação e da informação, a ênfase permanece no processo de transmissão de conteúdos previamente estabelecidos, no qual a tecnologia apenas otimiza e potencializa o acesso a estes. Embora a adoção desta abordagem não implique, necessariamente, o desprezo da experiência vivida, o conhecimento é concebido como algo pronto e que , portanto, recomenda a criação de formas para que esteja cada vez mais acessível.

 

A utilização da Web como suporte tecnológico, assim como a constituição de comunidades de trabalho/aprendizagem em rede, segundo essa concepção, é importante principalmente por potencializar o acesso a esse conhecimento.Os projetos que se fundamentam nesta abordagem, geralmente, tendem a oferecer os conteúdos de forma previamente estruturada de maneira a dar seqüência ao processo de aprendizagem a partir do oferecimento do suporte tecnológico ao aluno .

 

A adoção desta abordagem implica mudança significativa no processo educacional na medida em que redimensiona o papel do professor no processo pedagógico. No entanto a questão da promoção de maior autonomia por parte do discente deve ser vista com cautela, uma vez que, a ênfase do trabalho recai sobre a tecnologia e as possibilidades ilimitadas que  estas encerram e não na promoção de uma mediação pedagógica qualificada especificamente para este fim. Embora não se despreze e até possa ser ressaltada a importância da experimentação e da colaboração entre os pares para a promoção e consolidação do processo de aprendizagem, este não se constitui no foco principal do processo.

 

Nestas circunstâncias, nos parece que o uso das novas tecnologias em projetos educacionais à distância em nada contribui para uma mudança qualitativa substancial em termos de modelo educacional e práticas pedagógicas vigentes, sendo estas utilizadas apenas para potencializar características já existentes em modelos anteriores. O acesso a um número maior de informações e a autonomia que o aluno possa vir a conquistar em relação à figura do professor, não implica necessariamente desenvolvimento de competências e habilidades suficientes e necessárias para interagir e explorar os novos potenciais em termos de aprendizagem postos pela sociedade contemporânea.

 

A segunda abordagem, a construtivista, ressalta o potencial das novas tecnologias para a promoção do processo de interação entre os discentes e destes com os professores, considerados fundamentais, segundo esta abordagem, para a realização da aprendizagem.

 

Segundo esta concepção, o conhecimento é uma construção humana de significados, que se dá ancorado no contexto em que as pessoas aprendem e que se opera a partir do estímulo causado pelo desejo ou necessidade. Sendo assim, o processo de aprendizagem verdadeiramente significativo, ou seja, que atribui e adquire significado, é individual e, o conhecimento não pode ser transmitido, na medida em que se dá a partir de um processo de construção independente em cada pessoa e pode ser otimizado em situações de trocas e de experimentação, a proporção que adquire significado compartilhado socialmente.

 

Levando em consideração as características de uma aprendizagem significativa (ativa; construtiva; reflexiva; colaborativa; intencional; contextual; etc.), as novas tecnologias adquirem importância na medida em que permitem a reconceitualização de projetos educacionais à distância a partir da superação dos limites à interatividade impostos pelas tecnologias anteriores como o rádio, a televisão e o vídeo, permitindo a concepção e operacionalização de projetos pedagógicos que tenham a abordagem construtivista na base de sua fundamentação.

 

Frente ao uso das novas tecnologias, o redimensionamento do papel do professor,  segundo esta abordagem, avança não no sentido do seu descarte, mas da transcendência do papel de mero transmissor de conteúdos, rumo à sua transformação em facilitador e estimulador do processo de aprendizagem.

 

Assim, a incorporação das novas tecnologias a projetos educacionais à distância  suportam duas possibilidades de leitura: potencialização do acesso à informação e ampliação das possibilidades de interação, colaboração e autonomia do aprendiz.

 

 

 

REFERÊNCIAS

 

ANTUNES, Celso. Como transformar informações em conhecimento. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001

 

AUGÉ, Marc. Não-lugares: introdução a uma antropologia da supermodernidade.São Paulo: Papirus, 1994.

 

BAUDRILLARD, Jean. A troca impossível. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2002

 

________. Da sedução.Campinas, São Paulo: Papirus, 1991

 

CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. São Paulo: Paz e Terra,1999.

 

LÉVY, P. A Inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço.    São Paulo: Loyola, 1998

 

_____. As tecnologias da inteligência. Rio de Janeiro: Ed. 34. 1990.

 

_____. Cibercultura. Rio de Janeiro: Ed.34,1999

 

_____. O que é o virtual? Rio de Janeiro: E.d. 34, 1996

 

NEGROPONTE, Nicholas. A vida digital. São Paulo: Companhia das     letras, 1995.

 

PARENTE, A . O virtual e o hipertextual. Rio de Janeiro: Pazulin, 1999.

 

SOUZA, Carlos H.M. Comunicação Educação e Novas Tecnologias. Rio de Janeiro: FAFIC. 2003

 

______. A Informática na Educação : Um caso de emergência . Rio de Janeiro: Damadá. 1999.

 

WIENER, N. Cibernética e sociedade: O uso humano dos seres humanos. São Paulo: Cultrix, 1954

 

 

 

 

SOUZA, Carlos Henrique Medeiros de. MANHAES, Fernanda Castro. Ensino e aprendizagem em ambientes virtuais: algumas considerações. Disponível em: < http://www.espacoacademico.com.br/065/65souza.htm >. Acesso em: 27 out 2006.