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O DESAFIO DAS ELITES

As opções para estimular a criação de riquezas no país

 

Paulo Guedes

 

É cada vez mais ampla a aceitação de que fatores qualitativos são determinantes para a criação de riqueza na sociedade do conhecimento. São fatores como a superestrutura cultural. o capital institucional das nações, o capital organizacional das empresas e o capital educacional dos indivíduos. A tese não é propriamente nova, uma vez que está presente em obras de autores clássicos.

A novidade é o reconhecimento crescente de que essas dimensões sejam ainda mais importantes na sociedade moderna, especialmente depois de toda a experimentação realizada neste turbulento século 20. Testamos sem cessar a democracia liberal, o socialismo, o nacional-socialismo (nazismo e fascismo), o socialismo democrático e inúmeras variantes.

Depois do teste de tantos modelos de coordenação social e econômica, sobreviveram a democracia liberal e o capitalismo. Resistiram como os fundamentos da civilização ocidental. São produto de um processo evolutivo tão mais robusto quanto maiores tenham sido os desafios enfrentados.

Não se pense, porém, que a democracia liberal e o capitalismo sejam produtos acabados, o "fim da história". Embora tentadora, a idéia esbarra no colossal desafio de absorver dois terços da população mundial ainda não incorporados a esses modelos. Há uma série de questões a resolver. Como evitar o formidável "choque de civilizações"`? Como absorver a China? Os americanos sacrificariam os ideais da democracia liberal na China continental e em Taiwan para atender aos interesses econômicos? E o desafio da assimilação dos muçulmanos`.'

A importância dessas reflexões na sociedade do conhecimento resulta do ritmo acelerado de inovações tecnológicas e do decorrente desafio da globalização. Povos primitivos ou de civilizações antigas podiam mudar lentamente devido ao baixo ritmo de inovação tecnológica. A industrialização colocou o desafio da mudança cultural acelerada. A sociedade pós-industrial, baseada em novas tecnologias de informação e de telecomunicações, torna a globalização inevitável. Acelera de forma inédita os requisitos de adaptação cultural, institucional e educacional para a inclusão na nova ordem.

O processo de criação de riquezas das nações depende, portanto, de adaptações culturais chie produzam instituições consolidadas o suficiente paia coordenar ações sociais, políticas e econômicas de seus povos. Mas. ao mesmo tempo, as instituições devem ser flexíveis o suficiente para garantir sua cooperação e sua integração competitiva na construção da nova ordem internacional.

Decorre dai que a qualidade dos governos nacionais ou, de modo mais amplo. das elites dirigentes – mede-se pela capacidade de estimular estruturas institucionais chie acelerem o processo de criação de riquezas em suas fronteiras. Isso em meio ao grau crescente de mobilidade da mão-de-obra, dos capitais e da tecnologia. Elites dirigentes de baixa qualidade sofrerão as conseqüências não só da fuga de empresas, capitais e tecnologias como também de fluxos migratórios maciços em busca de melhor ambiente institucional.

É com esse pano de fundo que devemos examinar a atuação da classe política brasileira. Retiro-me às diversas instâncias não apenas do Poder Executivo mas também do Legislativo e do Judiciário. As elites dirigentes encontram-se diante de algumas opções. Aumento do salário mínimo c reposição de "perdas salariais- ou reforma das legislações trabalhista e previdenciária? Aumento de impostos ou reformas fiscal e tributária? Incentivos fiscais para montadoras de automóveis ou pólos de tecnologia de informação? Linhas de crédito de longo prazo para empresas escolhidas pelo BNDES ou reforma nas leis das S.A. e do mercado cie capitais`? Ensino superior subsidiado para os filhos de classes de alta renda ou reforma do ensino?

Por último, o que é melhor: a politização da moeda. que coloca em risco seu poder de compra a cada transição presidencial, ou a independência do Banco Central (em relação ao Executivo), que passaria a reportar-se ao Congresso e com mandato não coincidente com o do presidente da República?

EXAME/15 DE NOVEMBRO DE 2000