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CONTRATO DE LEASING À LUZ DA “REBUS SIC STANTIBUS”

Eduardo Calmon
Acadêmico do 6º semestre de Direito na Universidade Mackenzie/ São Paulo

                   

                    Com o advento da nova política monetária nacional estabelecida pelo Governo Federal, no início do mês de Janeiro, flexibilizando a variação cambial, provocou o aumento de litígios em relação, especialmente, aos contratos de leasing com variação cambial possibilitando assim a formação de diversos posicionamentos doutrinários.

                    Mister se faz, para entender o assunto, esclarecer o principal fundamento utilizado, a “rebus sic stantibus”.

                    No Direito Civil, a cláusula, implícita em todos os contratos bilaterais comutativos de duração ou execução diferida,  conhecida como “rebus sic stantibus”, consiste na superveniência de onerosidade excessiva, vindo a sobrecarregar uma das partes contratuais, decorrente de acontecimentos sucessivos à contratação, imprevistos e imprevisíveis ao momento da celebração, resultando com a continuação do mesmo conteúdo contratual, enriquecimento exagerado para uma parte e ruína excessiva para a outra.

                    Esta cláusula requer, segundo o consagrado jurista Caio Mário, quatro requisitos de ordem essencial, a saber: a) vigência de um contrato de execução diferida, b) alteração radical das condições econômicas objetivas no momento da execução, em confronto com o ambiente objetivo no da celebração, c) onerosidade excessiva para um dos contratantes e benefício exagerado para o outro e d) imprevisibilidade daquela modificação.

                    Em observância a estes requisitos, é correto admitirmos que o leasing, na sua classificação jurídica, se caracteriza como um contrato de execução diferida, ou seja, um contrato a prazo, visto que apenas adquiri-se o objeto com o adimplemento da última parcela da opção de compra, transferindo-se assim a propriedade do mesmo. Nota-se também que o momento da celebração do contrato, tendo em vista a política nacional, a declaração de vontade, decorre em virtude das condições apresentadas, sendo injusto continuar a desigualdade, apresentada no contrato, visto que se fosse previsto esta mesma situação no momento “a quo”, não ocorreria tal declaração. É necessário portanto que tais acontecimentos sejam imprevisíveis e imprevistos que produzam uma onerosidade excessiva que resulte enriquecimento de uma parte e empobrecimento e ruína da outra.

                    O direito, sabiamente, diante destes fatos e preenchidos seus requisitos essenciais, prevê a possibilidade do prejudicado com as modificações econômicas, ajuizar uma ação com fundamento na teoria da imprevisão visando reequilibrar a obrigação constante no contrato em termos do “quantum debeatur”, visto que admitir a cobrança sobre a tal exigência nestas condições caracterizaria até um abuso de direito.

                    É necessário o real desequilíbrio das partes, não apenas dificuldade no adimplemento, visto que todo contrato que não seja aleatório, sempre existe uma margem de ganho e perda em razão do momento em que foi celebrado.

                    É importante também ressaltar que a teoria da imprevisão visa reajustar as prestações, de modo que, possibilite o adimplemento de maneira suportável, jamais permitindo, a rescisão pelas circunstância demostradas, o que violaria o princípio da força obrigatória dos contratos, “pacta sunt servanda”.

                    Com esta alteração do estado de fato, o juiz ao acolher a inicial, alterará o conteúdo do contrato, restaurando o equilíbrio desfeito.

                    Segue abaixo o embasamento jurisprudencial:

                    “a cláusula rebus sic stantibus só aproveita a parte diligente empenhada no cumprimento das obrigações assumidas no contrato, mas surpreendida durante a sua execução por acontecimentos excepcionais e imprevistos, que provocam seu empobrecimento e o enriquecimento injusto de outrem, no caso de ser mantido o pactuado” ( TJGB, Ap 64.475, ac. De 23/03/70, in Revista Forense, 233/130).

                    Outra dúvida levantada entre alguns estudiosos do Direito se refere a norma disciplinadora para a fundamentação legal e a competência para propor a ação.

                    Ao nosso entendimento, os contratos de leasing, suportaria o enquadramento como relação de consumo, logo, a fundamentação legal seria a mencionada no artigo 6º, inciso V, do Código de Defesa do Consumidor. – Transcrição do inciso citado do artigo 6º: “ a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas”.

                    Segue a explicação lógica do nosso entendimento: De acordo com a dúvida sobre a natureza do contrato de leasing, ora aludida por alguns como de natureza financeira, consideramos que a sua relação embora comercial, pode ser entendida como de consumo, visto que o pagamento em dinheiro, apesar de ser o meio instrumental pelo qual irá se adquirir o objeto pretendido no contrato, a sua vinculação é com o destinatário final, e a definição do seu serviço é exatamente enquadrada no artigo 3º, §2, do Código de Defesa do Consumidor.

                    Com referência a competência discordamos de alguns que continuam a afirmar que a competência para a propositura da ação seria o Juizados Especial de Pequenas Causas, não sendo admitidos por nós, tendo em vista que: embora se considere como uma relação de consumo, no nosso direito encontra-se como regra de caráter especial, ao contrário do que se nota no Direito Francês e Alemão, por isso sendo considerado uma questão ainda muito complexa para ordenar a sua competência no Juizados Especial de Pequenas Causas, tendo em vista a oscilação de julgados a favores e contras, não estando ainda pacífica o entendimento jurisprudencial, logo não adequado a estrutura que roga o artigo 3º, da lei 9.099 do Juizado Especial Civil.

                    Admitimos a competência pertencente a Justiça Ordinária Comum, observando que a “rebus sic stantibus”, existe desde o Direito Romano muito antes do sonhado berço do Direito do Consumidor, e, no Brasil, a sua utilização se deu muito antes do advento deste, baseando-se a sua aplicabilidade no estudo comparado do Direito Francês e Alemão, pois nestes países a sua regulamentação vem expressa no texto legal de caráter geral.

                    Na seara processual, pretensiosa é nossa vontade de analisar a questão por completo.

                    Com o pedido inicial julgamos correto requisitar a antecipação da tutela de cunho satisfativo, com fulcro no artigo 273, do Código de Processo Civil, preenchendo os requisitos de verosimilhança, ou seja, a aparência da verdade quanto ao próprio “fumus boni iuris” e “periculum in mora”, e a prova inequívoca, na qual se tenta preservar o direito subjetivo.

                    Requisita-se esta medida, com o escopo de evita um dano irreparável ao pagamento do “quantum debeatur” desproporcional ao esperado, levando a um prejuízo de difícil reparação tendo em vista que o direito não pode, nesses casos, suportar a longa e inevitável demora da sentença final.

Retirado de: http://www.infojus.com.br/area2/eduardocalmon.htm