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Autores: Walter Douglas Stuber e Ana Cristina de Paiva Franco
A Tributação de Bens e Serviços na Internet

Outro dos grandes impactos causados pelo uso da Internet como meio de concretização de negócios comerciais é a questão da incidência de tributos sobre estas relações. Os conceitos fundamentais do direito tributário, como a territorialidade, a competência, o estabelecimento comercial, dentre outros, adquirem contornos muito diferentes quando os negócios são realizados on-line, pois a Internet desconhece as fronteiras físicas, jurídicas ou legais, dificultando a instituição de tributos e a determinação de quem é competente para cobrá-los.

Quando a Internet é utilizada como um mera ferramenta de comunicação entre o comprador e o vendedor, por exemplo, as dificuldades de determinação dos tributos incidentes na operação são mais facilmente resolvidas. Assim, quando um brasileiro residente no Brasil faz uma reserva em um hotel na Inglaterra mediante o acesso ao site do hotel na Internet, os impostos incidentes nesta transação são os que normalmente incidiriam caso a reserva tivesse sido realizada por telefone, carta ou fax. O hotel pagará o equivalente ao imposto sobre a renda e imposto de prestação de serviços ao governo inglês, enquanto que o hóspede pagará o contribuição sobre movimentação financeira, correspondente à operação de retirada de dinheiro de sua conta bancária, ao governo brasileiro.

No entanto, como já foi discutido acima, as técnicas de negociação e os recursos oferecidos pela Internet estão se desenvolvendo rapidamente. A utilização do e-cash como meio de pagamento no comércio on-line, por exemplo, trará com certeza muitas dificuldades em se estabelecer o governo competente para instituir e cobrar impostos referentes à negociação (imposto de renda, sobre a prestação de serviços, sobre movimentação financeira, inclusive sobre a remessa de fundos ao exterior, dentre outros), além de ser, até o momento, muito difícil rastrear os sujeitos da operação e o local onde a mesma foi efetuada.

Um exemplo dessas inovações é a possibilidade do comprador adquirir um novo programa de software diretamente na Internet, simplesmente realizando um “download”, ou seja, gravando em seu computador o material que está circulando na rede. Apesar de ainda não ser uma forma muito difundida, até mesmo o pagamento pode ser realizado via Internet, utilizando-se o dinheiro eletrônico ou e-cash. Nesses casos, a instituição de impostos, tanto diretos quanto indiretos, é muito complicada, principalmente se for considerada a necessidade de evitar que os mesmos fatos geradores sejam tributados por dois ou mais países. As soluções para estes casos estão longe de serem atingidas, e as discussões a respeito ainda são, na maioria das vezes, meras especulações.

*. A Tributação dos Serviços prestados pelos Provedores de Acesso no Brasil

Um problema mais concreto é a discussão acerca da tributação das atividades das empresas chamadas provedoras. A palavra provedor tem duplo significado no âmbito da Internet, podendo referir-se tanto àquele que alimenta a rede com informações (provedor de informações), como àquele que viabiliza a conexão de alguém à rede (provedor de acesso). De qualquer forma, a principal função dos provedores é a de efetuar a ligação entre rede e usuário, seja provendo informações, seja permitindo o acesso dos mesmos à Internet.

No Brasil, como em todo o mundo, discute-se muito a tributação dos serviços prestados pelos chamados provedores de acesso à rede. Faz-se necessário, portanto, procedermos à análise da natureza desses serviços, para somente então podermos definir quais os tributos incidentes sobre tal atividade. Com efeito, os provedores de acesso oferecem efetivamente acesso à Internet através de linha telefônica ou de outro meio adequado para a comunicação entre duas pessoas. Utilizando-se uma figura de linguagem, o provedor seria apenas uma chave que destranca a porta da Internet, que libera um espaço virtual proporcionado por ela.

De fato, os provedores de acesso não realizam o transporte de sinais de telecomunicações, mas tão-somente utilizam o sistema de transporte de sinais já existente. Ao estabelecer a conexão do usuário com a Internet, seja via Embratel ou por qualquer outro meio localizado no País ou no exterior, os provedores de acesso utilizam-se da rede pública de telecomunicações. Desse modo, a atividade dos provedores de acesso consiste unicamente na conexão do usuário à Internet através de linha telefônica ou de outro meio adequado para a comunicação entre duas pessoas. No caso da linha telefônica, cabe lembrar que o serviço de telefonia já é tributado pelo Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS).

Acrescente-se que, nos termos da Lei nº 9.295, de 19 de julho de 1996, artigo 10, a atividade dos provedores de acesso é caracterizada pelo acréscimo de recursos e um serviço de telecomunicações que lhes dá suporte, criando novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, movimentação e recuperação de informações, não caracterizando exploração de serviço de telecomunicações. Neste contexto, diante dos argumentos expostos, a atividade dos provedores da Internet deveria ser considerada como serviço de valor adicionado e não como serviço de comunicação, ficando, portanto, fora do campo de incidência do ICMS.

Em outros termos, as atividades dos provedores de acesso dependem intimamente do sistema de transporte de sinais já existente e explorado pelas empresas componentes do sistema de telefonia pública. Nesse sentido, os serviços por eles prestados de conexão dos usuários à Internet somente representaria um acréscimo de recursos ao serviço de telecomunicações pré-existente, não constituindo, sob essa ótica, um serviço de comunicação, apto a ensejar a incidência do ICMS.

É importante ressaltar que este não é o entendimento manifestado pelos fiscos estaduais. A Secretaria da Fazenda do Estado do Paraná, através da Consulta nº 168/96, entendeu que os serviços prestados pelos provedores de acesso constituem serviço de comunicação e, portanto, sujeitos à incidência do ICMS. Transcrevemos abaixo um trecho da referida Consulta:

“No caso sob análise, a comunicação é realizada por meio de ligação direta do interessado à rede Internet. Para tanto, necessita de toda a estrutura da Rede Pública de Telecomunicações no provimento dos Serviços de Conexão à Internet e, além dos serviços especializados dos intermediários que promovem o elo de ligação, entre informações disponibilizadas e os usuários. Este canal de ligação produz informação, no conceito de serviço, suporte fático da tributação”.

Outra questão que se apresenta é a de se considerar ou não os serviços de acesso do usuário à Internet como sujeito à incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS), de competência dos Municípios. É de se ressaltar que, o pressuposto legal da incidência do ISS é a prestação, por empresa ou profissional autônomo, de serviço definido em lei complementar, não compreendido na competência tributária dos Estados (artigo 156, inciso II, da Constituição Federal).

Entretanto, a Lei Complementar nº 57, de 15 de dezembro de 1987 (Lei Complementar 57/87), ao definir os serviços sujeitos ao ISS, não inclui item específico a respeito da atividade exercida pelos provedores de acesso à Internet. Tendo em vista que a aludida lista de serviços é taxativa e considerando, ainda, que o serviço prestado pelos provedores de acesso não se encontra expressamente previsto na mesma, é de se concluir pela não incidência do ISS sobre o mesmo.

É evidente que essa não incidência do ISS somente perdurará enquanto o serviço não for incluído na lista de serviços constante da Lei Complementar nº 57/87, o que não deve tardar a acontecer, em razão da relevância que o negócio vem adquirindo.

Como se vê, não existe uma posição pacífica a respeito deste assunto, devido ao grau de complexidade da matéria e ao interesse do Fisco em regular e instituir tributos sobre estas relações, que têm crescido muito nos últimos tempos.

*retirado de: http://www.amarostuber.com/info10cd.htm