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Indenização por cadastramento indevido de consumidor em banco de dados

CARLOS ALBERTO ETCHEVERRY

Não se passa um só dia, praticamente, sem que uma empresa seja condenada a indenizar os danos morais resultantes da inscrição ou manutenção indevida de consumidor em banco de dados de consumidores inadimplentes. Em qualquer dos casos, fica caracterizada a negligência do comerciante, que não contabilizou pagamento efetivamente realizado ou não tomou providências, com a rapidez exigível, para o cancelamento do registro negativo quando da reabilitação do consumidor.
Tais condenações constituem, simplesmente, a aplicação da regra contida no art. 159 do Código Civil Brasileiro, que estabelece a obrigação de indenizar os danos resultantes de atos ilícitos. Isto é, praticados com imprudência, imperícia ou negligência.
Até a promulgação da Constituição de 1988, discutia-se ainda no Brasil a possibilidade de indenizar também os danos morais, que se verificam apenas na esfera psíquica da vítima - dor física, humilhação, frustração, por exemplo. Parte expressiva dos doutrinadores e dos tribunais entendia que só comportava ressarcimento aquele dano que tivesse reflexo patrimonial direto, como ocorre nos acidentes de trânsito, e no caso de crimes contra a honra (injúria, calúnia ou difamação), em que havia previsão legal expressa de ressarcimento do dano moral.
Essa situação se modificou completamente com a nova Carta Constitucional, que deixa clara a indenizabilidade dos danos morais, restando como pontos discutíveis, a partir daí, apenas os critérios para fixar o valor da indenização, variáveis em cada caso. É que são relevantes para esse fim, de maneira geral, a gravidade do dano, a condição pessoal do ofendido, o comportamento do causador do dano e sua condição econômica. A condenação, considerados todos esses fatores, deve ser uma soma em dinheiro que, a um só tempo, não seja insignificante ao ponto de não ter qualquer valor compensatório e/ou pedagógico, e também não leve à ruína o réu.
Daí resulta que, pela prática do mesmo fato, um banco e um pequeno comerciante possam ser condenados a pagar quatrocentos salários mínimos, o primeiro, e quatro salários mínimos, o segundo. Para este último, o desembolso de dez por cento do valor primeiramente mencionado já poderia pôr em risco a própria continuidade dos negócios.
Em qualquer dos dois casos, uma condenação isolada não teria maior relevância. A continuidade dos fatores que levaram ao registro ou manutenção indevida de registro de consumidor como inadimplente - basicamente, manutenção descuidada de cadastros - pode ter resultados calamitosos. A soma de sucessivas condenações pode comprometer a saúde financeira da empresa e, por outro lado, também sua imagem frente aos consumidores, com a conseqüente diminuição das vendas ou da demanda pelos serviços que presta no mercado.Daí a necessidade, para o empresário, de implementar controles contábeis precisos e eficientes, sob pena de acrescentar aos riscos naturais dos negócios - que já não são pequenos: diminuição das vendas, inadimplência de consumidores e custo do crédito - outro que pode lhe ser fatal.

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Factoring

De quem é o risco

Assim como acontece com o contrato de leasing, a lei brasileira não regulamenta o contrato de factoring ou, como também é chamado, de faturização.
Há consenso, entretanto, nos tribunais e entre os doutrinadores do direito, de que esse tipo de contrato caracteriza-se pela compra, pela operadora de factoring (ou faturizadora), de títulos de crédito - duplicatas e cheques, geralmente -, representativos de créditos do comerciante e, evidentemente, não vencidos. Essa compra é feita com um deságio, constituído pela custo financeiro da antecipação do crédito representado pelo ativo vendido e pela taxa de risco pelo eventual inadimplemento do emitente do título, justificável, esta, pelo fato de que o vendedor fica exonerado de qualquer responsabilidade quanto a este aspecto.
Por isto que, embora formalmente transmitida a propriedade dos títulos de crédito por endosso, o faturizador- endossatário não pode promover execução contra o endossante, como ocorreria normalmente, em aplicação do princípio da autonomia das obrigações cambiárias: é da essência do contrato de factoring que o vendedor perca a qualidade de coobrigado cambiário - afinal, pagou por isto. (Claro que essas considerações não valem no caso da assim chamada duplicata fria, emitida sem que tenha havido uma compra e venda, conduta que sujeita o responsável pela sua emissão à pena de um a cinco anos de detenção e multa equivalente a vinte por cento sobre o valor da mesma, como dispõe o art. 172 do Código Penal.)

Como fica o consumidor

No que diz respeito ao consumidor, entretanto, a transmissão por endosso ao faturizador, antes do vencimento, continua tendo os efeitos previstos nas diversas legislações que disciplinam os títulos de crédito: os vícios do negócio que deu origem ao título vendido não podem ser alegados contra o novo possuidor da cártula. Em conseqüência, pouco importa, por exemplo, que o eletroméstico que comprou tenha sido devolvido, deixando de existir a obrigação de pagar o respectivo preço. Ainda assim, continuaria obrigado a pagar o valor constante do cheque entregue ao vendedor e repassado à empresa de factoring, a menos que esta o tenha adquirido, na fórmula utilizada na Lei do Cheque, "em detrimento do devedor." Outra hipótese é a de pagamento ao fornecedor quando este já não detinha a posse da cambial, por tê-la endossado ao faturizador. O crédito deste último continua subsistente e o legitima a executar o consumidor, que se verá na contingência de pagar duas vezes.

Como se proteger

Apenas de uma forma o consumidor pode evitar os efeitos do endosso enumerados acima: ao emitir o cheque, nominar o beneficiário - o vendedor ou prestador de serviço - e inserir a cláusula "não à ordem". Havendo endosso, o efeito é de simples cessão de crédito. Deixa de haver a autonomia da obrigação cambiária e, conseqüentemente, toda defesa que o emitente poderia apresentar contra o beneficiário inicial vale também em relação àqueles que se seguiram na cadeia de endossos.

CARLOS ALBERTO ETCHEVERRY, Juiz de Direito, titular do 3º Juizado Especial Cível.
 


Retirado de: http://www.direitobancario.com.br/doutrina_acessolivre/1dez99_26.htm