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                  CONTRATOS DE LEASING
               Natureza jurídica - Ações revisionais


 


 Angélica Carro
 advogada em Presidente Prudente (SP)

 INTRODUÇÃO

 Os contratos de Arrendamento Mercantil — "leasing", muito utilizado nos
 tempos atuais, tem causado grandes problemas de ordem financeiras
 àqueles que celebraram um contrato dessa natureza. Com o decorrer do
 tempo, a estabilidade da moeda brasileira, trouxe a tona da grande
 desvantagem de tais contratos, que demonstram em série os abusos do
 poder econômico, estabelecendo cláusulas repelidas pelo Código de
 Proteção do Consumidor.

 Sendo o contrato de "leasing" um contrato nominado, que envolve vários
 institutos contratuais, sua natureza jurídica tem sofrido grande distorção
 quanto ao seu conteúdo, chegando a descaracterizar a estrutura do
 contrato.

 As ações revisionais terão caráter essencial na idealização dos contornos
 dos contratos de "leasing", visando precipuamente a limitar as práticas
 abusivas e estruturar os contratos na órbita de sua natureza.

 Ainda sob este contexto, necessário de faz adaptar os contratos
 bancários, neste caso, especificamente os de "leasing", nos moldes do
 Código de Proteção do Consumidor, que prevê tratamento especial,
 tratando dos direitos básicos do consumidor que tem sido levado a
 situações de extrema insignificância diante da Instituição Financeira. Além
 disso, o mesmo Código rejeita as práticas abusivas, dando total proteção
 contratual ao consumidor que diante da necessidade, e sem opção de
 escolha se vê na necessidade de depender de negócios bancários para
 conseguir sobreviver em seu negócio, assinando contratos que não
 suportam o mínimo de respeito ao consumidor e distorcem a função social
 das Instituições Financeiras, como prevê a Constituição Federal.

 Diante das imposições dos contratos de adesão, a mora torna-se provável
 e diante disso, os valores pagos até então, serão levados através de uma
 liminar de reintegração de posse, deixando o patrimônio do arrendante
 desprovido do bem, não bastando a inadimplência que irá negativá-lo junto
 às instituições de crédito, impedindo a sobrevivência dos negócios.

 Outro fator importante que deve ser levado em consideração são as taxas
 de juros cobradas, impraticáveis diante da economia atual, onde em
 qualquer negócio que se pratique, os preços não tem tido aumento
 proporcional aos índices aplicados. A dissonância entre a prática comercial
 ou industrial e os índices aplicados é absurda, além dos juros capitalizados
 que também merecem análise.

 Esses motivos e outras tantas cláusulas que compõem cada contrato,
 serão analisandos em conjunto, como um só todo que irá compor um
 negócio jurídico . Ao analisar um contrato de "leasing", deve-se analisar as
 cláusulas tendo em vista as determinações do Código de Proteção do
 Consumidor e o fim social das Instituições financeiras, determinados na
 Constituição Federal.

 Vale lembrar que os direitos do arrendante devem ser mantidos e
 defendidos em juízo, por esse motivo, necessário se faz o estudo, visando
 atingir a viabilidade das Ações Revisionais. O Código de Proteção do
 Consumidor deve ser colocado em prática e fazer valer sobre outros
 interesses.

 Para tanto, é necessário inicialmente um estudo sobre o tema analisando o
 seu conteúdo e prática, no propósito de estabelecer as diretrizes da sua
 formação, para a sua revisão pelo judiciário.
 
 

 1. FORMAÇÃO HISTÓRICA

 A formação histórica dos contratos de "leasing" busca inspiração em
 operações realizadas na antigüidade, praticadas por centenas de anos.
 Tais operações eram difundidas nas operações utilizadas pelo governo
 ateniense sobre as minas de propriedade do Estado, onde os indivíduos
 pagavam ao Estado, determinada quantia em dinheiro como garantia de
 exploração e uma renda anual era fixada com percentagem dos lucros. Ao
 arrendatário cabia duas opções: vender o minério ou subarrendar o direito
 à exploração.

 Segundo a doutrina, os contratos de "leasing" surgiram no Direito
 Contemporâneo, nos Estados Unidos da América, na década de 50,
 recebendo sua estruturação e aplicação. O "leasing" progrediu devidos a
 três fatores, segundo anota Arnaldo Rizzardo ("Leasing", 2ª ed. São Paulo:
 Editora Revista dos Tribunais, 1996) em alusão à José Wilson Nogueira de
 Queiroz: "a) restrição e inacessibilidade do mercado de capitais a prazo
 médio; b) fiscalização demasiadamente severa com taxas de lucro
 substancial; c) economia em franca prosperidade com taxas de lucro
 substancial; d) empresas compelidas a uma renovação rápida de seus
 equipamentos, em face do célere progresso científico".

 Essas foram as razões que acentuaram o grande crescimento do negócio
 do "leasing", em outras palavras citados por Arnoldo Wald ("A introdução
 do "leasing" no Brasil", in RT 415/10): "os motivos do sucesso do "leasing"
 nos Estados Unidos foram a ausência no país de um mercado de capitais
 para o crédito a médio prazo, uma tributação muito severa no tocante às
 depreciações, uma economia geralmente próspera com altas percentagens
 de lucro e a existência de empresas obrigadas a uma renovação contínua
 e rápida dos seus equipamentos diante do progresso tecnológico".

 O instituto do "leasing", assim se tornou em operador de crédito em médio
 prazo, necessidade das empresa que eram vítimas da depreciação
 contínua e exagerada, amparada pela legislação rígida que se
 fundamentava.

 Depois de se expandir em todo território americano, o "leasing" surtiu
 interesse pelos países europeus, que na França foi instituído em 1963,
 devido à escassez de recursos financeiros concedidos pelas instituições
 bancárias, e a impossibilidade de aplicação nos investimentos. Na
 Inglaterra, o "leasing" já tinha seus traços conhecidos na modalidade de
 locação-compra, em negócios realizados diretamente entre as indústrias,
 especificamente de máquinas de costura e vagões para locomotivas. O
 negócio abrangia o aluguel dos bens, e a opção de compra do mesmo que
 poderia ser exercida livremente. Com o aumento de demandas de
 investimentos, as instituições financeiras foram conquistando espaço e
 colaboraram para o grande desenvolvimento do instituto, que na década
 de 60, através da introdução de companhias americanas, denominou-se
 "leasing", com regulamentação em 1965.

 Assim, seguindo os mesmos caminhos dos Estados Unidos e Inglaterra, os
 demais continentes foram adaptando-se à nova espécie, e a incorporaram
 às suas leis.

 No Brasil, a sua implantação não tem data definida, mas acredita-se que
 em 1967 as primeiras operações foram realizadas. A regulamentação
 ocorreu em 1974, através da Lei 6099, apesar de saber-se que nos
 grandes centros industriais, como São Paulo e Rio de Janeiro, contratos do
 tipo "leasing", desde a década de 60, já estavam sendo praticados. A
 primeira companhia de "leasing" fundada no Brasil foi a "Rent a Maq" em
 1967, e mesmo antes da sistematização legal, foi fundada a Associação
 Brasileira de Empresas de "leasing" - ABEL, visando a regulamentação do
 instituto e interesses peculiares.

 A partir da sistematização do "leasing" em nosso ordenamento jurídico, as
 regulamentações fizeram aperfeiçoar o tratamento, editando leis e
 resoluções que travaram do assunto, incrementando as operações. Porém,
 cerca de 1975, as operações mantiveram-se estagnadas até 1978. E em
 1982 o país chegou ao auge das operações, computando um saldo de dois
 bilhões e meio de dólares de investimentos. E em 1984, as operações
 foram ampliadas, admitindo-se então o "leasing" para pessoas físicas, para
 investimentos em setores agropecuários, agro-industriais, e demais
 atividades rurais, além de firmas individuais e trabalhadores autônomos e
 profissionais liberais. Com a universalização do instituto, uma comissão tem
 estudado a possibilidade de adoção de regras uniformes internacionais
 para os contratos de "leasing".
 
 

 2. CONCEITO

 O Contrato de "leasing" trazido à nossa legislação pela Res. 980/84, é, sem
 dúvida, um negócio jurídico realizado entre instituição financeira e cliente,
 no propósito de oferecer recursos para aquisição de bens, sem que o
 arrendatário tenha que dispor de capital.

 A denominação "leasing", trazida dos países onde teve origem, mas
 precisamente dos Estados Unidos, como bem recorda Arnaldo Rizzardo
 (Ob. cit. pág. 12), é composto do sufixo ing que significa continuidade
 (gerúndio), e o verbo to lease traduzido como alugar ou arrendar.

 Sua aplicação é iniciado quando a Instituição financeira, denominada
 arrendante, adquire o bem indicado pelo arrendatário, e lhe dá em locação
 por determinado tempo, com opção de compra do mesmo ao término da
 operação locativa. Assim ocorre nos contratos de "leasing" financeiro.

 Em outros casos, nos chamados contratos de lease-back, a instituição
 financeira adquire o bem do próprio arrendatário, que passa a alugar o
 mesmo com as mesmas opções do contrato de "leasing" financeiro. Nestes
 casos, a propriedade do bem, que antes era do arrendatário, passa a ser
 do arrendante e este o dá em locação ao primeiro. É uma forma de obter
 capital sem se desfazer do bem.

 Outra modalidade é o "leasing" operacional, que ocorre quando o
 arrendante é o próprio fabricante do bem, assim como ocorria na Inglaterra
 como citado na evolução histórica do instituto.

 A modalidade prática mais encontrada é o "leasing" financeiro e o
 lease-back, que serão os institutos estudados nesta oportunidade, sem
 grandes referências ao "leasing" operacional que não possui grande
 aplicabilidade nos dias atuais.

 Arnaldo Rizzardo , identifica o conceito no Direito universal como sendo um
 contrato de natureza econômica e financeira, pelo qual uma empresa cede
 em locação a outrem um bem móvel ou imóvel, mediante o pagamento de
 determinado preço. Para Arnoldo Wald (Ob. cit. pág. 12) trata-se:

 de um contrato pelo qual uma empresa, desejando utilizar determinado equipamento,
 ou um certo imóvel, consegue que uma instituição financeira adquira o referido bem,
 alugando-o ao interessado por prazo certo, admitindo-se que, terminado o prazo
 locativo, o locatário possa optar entre a devolução do bem, a renovação da locação ou a
 compra pelo preço residual fixado no momento inicial do contrato.

 Ainda, de forma didática, Carlos Alberto Di Agustini ("Leasing", 1ª ed. São
 Paulo: Atlas, 1995), descreve:
 
 
 
 

 O "leasing" pode ainda ser definido, de maneira mais prática, como um contrato através
 do qual a empresa de ""leasing"" confere à empresa arrendatária o direito de usar um
 bem por determinado período de tempo, mediante o pagamento de prestações, sendo
 regido por cláusulas e tratamento legal específico.

 A definição legal trazida pelo artigo 1º da Lei nº 6.099/74 e o artigo 1º da
 Lei nº 7.132/83 definem o "leasing" como:

 Considera-se arrendamento mercantil a operação jurídica realizada entre pessoas
 jurídicas, que tenham por objeto o arrendamento de bens adquiridos a terceiros pela
 arrendadora, para fins de uso próprio da arrendatária e não atendam as especificações
 desta. (Lei 6.099/74)

 Considera-se arrendamento mercantil, para os efeitos desta Lei, o negócio jurídico
 realizado entre pessoa jurídica, na qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o
 arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo as especificações da
 arrendatária e para uso próprio desta. (Lei 7.132/83)
 
 

 3. NATUREZA JURÍDICA

 A natureza jurídica dos contratos de "leasing" é muito discutida entre os
 doutrinadores brasileiros pois não há determinação legal que o conceitue.

 Para a maioria dos autores, o contrato de "leasing" é um contrato atípico,
 reunindo elementos da locação, do financiamento e da compra e venda.
 Outros autores, no entanto, o consideram como contrato complexo, e
 outros ainda, como contratos misto.

 No entendimento de Aramy Dornelles da Luz (Negócios jurídicos bancários.
 1ª ed. São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais):

 O contrato de "leasing" é em linhas gerais, um negócio jurídico de financiamento, que
 toma a forma de uma locação de bens móveis ou imóveis, onde o locador atribui ao
 locatário direito de opção entre renovar a locação, devolver o bem ou comprá-lo,
 pagando então apenas o valor residual nele previsto, findo o prazo contratual.

 Segundo ainda, Orlando Gomes (Contratos. 13ª ed. Rio de Janeiro:
 Forense), a modalidade contratual do "leasing" não trata da locação e sim
 de uma figura bem próxima à locação, cujas regras se lhe aplicam se não
 há próprias. Da relação locativa distingue-se fundamentalmente,
 entretanto, pela causa; no conteúdo, apresenta, porém, muitas
 semelhanças.

 Jorge Pereira Andrade (Contratos nominados - doutrina e jurisprudência.
 Coord. Yussef Said Cahali. Editora Saraiva), em sua obra sobre contratos,
 traz as posições de alguns doutrinadores pátrios:

 Fran Martins: O arrendamento Mercantil é de natureza complexa, compreendendo uma
 locação, uma promessa unilateral de venda (em virtude de dar o arrendador opção de
 aquisição do bem pelo arrendatário) e ás vezes um mandato quando é o próprio
 arrendatário quem trata com o vendedor na escolha do bem. (...) (apud Contratos e
 obrigações comerciais, 1981)

 Waldirio Bulgarelli: Para a empresa ""leasing"", no ""leasing"" financeiro trata-se de
 operação normal decorrente de seu objeto de atividade, ou seja, a prática de
 arrendamento com tríplice opção. (...) Conclui que, estruturalmente, a seqüência das
 obrigações decorrentes do contrato de ""leasing"" caracteriza-o muito mais como misto
 do que como complexo.(...) (apud Contratos de "leasing". Revista dos Tribunais, São
 Paulo: nº 13, 1968)

 Philomeno Joaquim da Costa: O ""leasing"" é um contrato complexo e não um contrato
 coligado onde as figuras jurídicas que concorrem para sua formação têm uma causa
 comum, afunilando-se para um fim determinado. (apud Simpósio Nacional sobre
 "leasing" - IDORT, 1973)

 Assim sendo, passamos a analisar separadamente os institutos jurídicos
 que envolvem a formação dos contratos de "leasing".
 
 

 4. DA CLASSIFICAÇÃO DO CONTRATO DE "LEASING"
 

 4.1 Contrato Misto ou Complexo

 Conforme exposto, os contratos de "leasing" são compostos por diversos
 elementos, que associados, dão origem à um novo contrato nominado
 "arrendamento mercantil". Tal denominação, não define o conteúdo do
 contrato de "leasing", tornando assim indefinidas as regras a serem
 aplicadas à este instituto.

 A jurisprudência tem sido diversa quanto à classificação do contrato de
 "leasing".

 O "leasing" financeiro é um contrato complexo, que, não sendo mera locação,
 assemelha-se à compra e venda com reserva de domínio, ou mesmo ao contrato com
 cláusulas de alienação fiduciária. Isto leva à aplicação analógica da legislação pertinente
 a estes institutos. (2ª Câmara do Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São paulo, 7.2.90,
 RT, 653:117)

 O "leasing" é contrato complexo, consistindo fundamentalmente num arrendamento
 mercantil com promessa de venda do bem após o término do prazo contratual, servindo
 então as prestações, como pagamento antecipado da maior parte do preço. (4ª Turma
 do Superior Tribunal de Justiça, 23.3.93, Revista do STJ, 50:217, e Repertório IOB de
 Jurisprudência, 3:8657)

 Arnaldo Rizzardo (ob. cit., p. 12) defende o mesmo posicionamento da
 jurisprudência acima:

 O instituto mereceu, por conseguinte, tratamento legal, sendo suas operações típicas, e
 constituindo um contrato complexo pela combinação de dois ou mais elementos
 próprios, ou subcontratos, que vêm a formar uma unidade nova, pela sua fusão, na
 criação de um relacionamento mais complexo e extenso do que resultaria da união de
 vontades através dos elementos integrantes.
 
 

 O contrato de "leasing", apesar de trazer aspectos de outros contratos
 típicos, como já citado acima, é um contrato autônomo, que segundo
 Orlando Gomes (ob. cit., p. 16), resulta da combinação de elementos de
 diferentes contratos, formando nova espécie contratual não
 esquematizada na lei.

 Dessa forma, essa corrente doutrinária afirma que o contrato de "leasing"
 é um contrato misto, composto de elementos e aspectos de outros
 contratos, tornando-os inseparáveis, tendo uma função comum, que é
 assegurar o resultado do negócio jurídico. O descumprimento ou a
 inexistência de um desses elementos, descaracterizam o contrato de
 "leasing", frustando seu resultado.

 4.2 Do Contrato de Adesão

 O contrato de adesão se caracteriza pela forma de sua constituição.
 Nesse tipo de contrato somente uma das partes elabora as cláusulas
 contratuais, e a parte aderente, fica condicionada à aceitação de sua
 totalidade, sem participação e discussão de cláusulas. As cláusulas
 contratuais são impostas ao aderente, que tem como faculdade,
 aceitá-las ou recusar-se a celebrar o contrato.

 Essas cláusulas, pré-elaboradas, para prevalecer uma das partes, têm sido
 muito questionadas na doutrina, e foram limitadas pelo Código de Defesa
 do Consumidor, conforme veremos adiante.

 Não nos restam dúvidas que os contratos de "leasing" são de adesão, pois
 como todos os outros contratos bancários, a Instituição Financeira, os
 elabora em impressos próprios e os aplicam a qualquer pessoa que queira
 celebrar um contrato de mesma natureza. Não há ajustamento de
 particular para particular. As cláusulas contratuais são uniformes e
 aplicáveis em qualquer hipótese.

 Para tanto, a interpretação de cláusulas de um contrato de adesão
 necessita ser feita com muito cuidado, vez que não houve participação
 bilateral em sua formação, e isso pode causar dúvidas ao aderente, que
 teve boa-fé e as aceitou em bloco, desconhecendo o conteúdo
 pragmático das cláusulas. Orlando Gomes observa bem (ob. cit., p. 16):
 
 

 Mas, mesmo que possua natureza contratual, a singularidade da sua estruturação não
 permite seja interpretado do mesmo modo que os contratos comuns, porque é relação
 jurídica em que há predomínio categórico da vontade de uma das partes. É de se
 aceitar, como diretriz hermenêutica, a regra segundo a qual, em caso de dúvida, as
 cláusulas do contrato de adesão devem ser interpretadas contra a parte que as ditou.

 Silvio Rodrigues, elenca algumas regras de hermenêutica, que devem ser
 aplicadas na interpretação dos contratos. A primeira delas, já citada
 acima, determina que em caso de dúvidas, a interpretação deverá ser
 feita em favor de quem aderiu ao contrato; as cláusulas devem ser
 diferenciadas entre principais e acessórias para determinar a força
 vinculante daquelas que chamaram a atenção do aderente, e finalmente,
 deve-se dar maior valia às cláusulas escritas, que tendem a revogar o
 conteúdo das impressas.

 Dessa forma, é clara a adaptação dos contratos de "leasing" dentro dos
 contratos de adesão, pois o arrendante ao assinar um contrato de
 "leasing" está mais preocupado com o negócio que se está celebrando do
 que com o conteúdo de um contrato que lhe é imposto em cláusulas
 impressas que não despertam qualquer interesse na leitura, pois, além de
 serem pré-dispostas, são impressas de modo que dificultam a leitura, não
 sendo inteligíveis à primeira vista, necessitando de maior esforço, e quem
 sabe, de auxilio profissional para sua total compreensão.

 O Dr. Roberto W. Amarante em seu brilhante artigo (Contratos bancários,
 de quem é a culpa? in Revista Jurídica nº 226) constata que:

 neste passo, imperioso lembrar que a maioria dos contratos bancários constituem-se
 em pactos de adesão, não havendo possibilidade de uma ampla discussão das
 cláusulas no momento da contratação, restando ao mutuário apenas a possibilidade de
 aderir ao que já está previamente estabelecido pelo conglomerado econômico.

 Os ensinamentos de Nelson Nery Junior (Código de Defesa do Consumidor,
 Ed. Forense Universitária, 4ª ed., 1995, págs. 300 e 302), de valioso
 conteúdo, eleva que:

 Os contratos de adesão são a concretização das cláusulas contratuais gerais, que
 enquanto não aceitas pelo aderente são abstratas e estáticas, e, portanto, não se
 configuram ainda como contrato. As cláusulas gerais de contratação tornar-se-ão
 contrato de adesão, dinâmicas, portanto, se e quando forem aceitas pelo aderente.

 No mesmo artigo, traz a posição da Dra. Helena Cunha Vieira: são os
 primeiros (contratos bancários) como facilmente se constata, tipicamente
 de adesão, com cláusulas impostas e até incompreensíveis, assinando o
 aderente o contrato muitas vezes sem que tenha condições de saber com
 segurança o conteúdo da avença.

 Em apelação civil da 5ª Câmara do Tribunal de Justiça do Rio Grande do
 Sul, decidiu-se: ... O apelante está esquecido de que tais regras devem
 ser atenuadas quando se trata de contratos de adesão, cujas cláusulas
 gerais diminuem sensivelmente a aplicação e o respeito ao enunciado da
 autonomia da vontade e aos que dele derivam, em razão das
 peculiaridades destes contratos de massa.

 Por esses motivos, o Judiciário tem amenizado a soberania de cláusulas
 que prejudicam o arrendatário em favor do arrendante, detentor do poder
 econômico, através de lides que discutem a aplicação do Código de Defesa
 do Consumidor bem como nulidade e abusividade de cláusulas contratuais.
 
 

 5. DOS ELEMENTOS JURÍDICOS
 

 5.1 DA LOCAÇÃO

 A locação tem sua essência nos contratos de "leasing", porém não é capaz
 de defini-lo como tal. O caráter locativo está na composição do contrato,
 pois a propriedade do bem é do arrendante, com a posse ao arrendatário,
 mediante pagamento de renda mensal.

 A posição da doutrina é unânime ao localizar a locação na essência do
 contrato de "leasing". Porém, faz-se necessário lembrar que, as parcelas
 cobradas como contraprestação nos contratos não estão compostas
 exclusivamente de caráter locativo.

 Seu valor é sempre além do que se poderia considerar como justo nos
 casos de locação. Nas contraprestação, em muitas vezes, estão
 embutidos parcelas de juros, depreciação, lucros da instituição e
 prestação de serviços, que fogem do âmbito da locação. Se fossemos
 considerar uma locação pura e simples, o valor dado em contraprestação
 deveria conter apenas o aluguel do bem.

 Dessa forma, não nos parece muito viável considerar que os valores pagos
 a título de contraprestação são aluguéis do bem. A locação apenas se
 insinua, mas não se concretiza, existe uma aproximação contratual mas
 não uma incorporação elementar.

 Paulo Restiffe (Locação - Questões Processuais, 3ª ed., p. 7) argumenta
 muito bem sobre o contrato de "leasing":

 tem na locação a médio prazo a sua essência, com a eventualidade de transformar-se
 ao final em venda, em que as importâncias pagas a título de aluguel passam a
 constituir parte do pagamento do preço estimado, segundo as conveniências do
 empresário-locatário, isto é, o aluguel converte-se em amortização da dívida que, ao
 final, pode surgir da efetivação da compra e venda desde o início possibilitada na opção
 franqueada do locatário.

 É certo que a primeira vista, pode-se perceber o caráter locativo, mas ao
 analisar o contrato e ser surpreendido com a opção de compra do bem
 mediante pagamento de valor residual garantido fixado em quantia ínfima,
 nada mais coerente do que atribuir aos pagamentos mensais o caráter de
 locação em simbiose com o financiamento cumulado com o interesse da
 instituição, ou seja, lucros, custos administrativos e financeiros e
 depreciação do bem, pois não se poderia explicar a aquisição do bem
 mediante pagamento tão somente irrisório. São por esses motivos que
 podemos perceber que a locação não tem caráter predominante nos
 contratos de "leasing". O que se procura é disfarçar o financiamento
 através de prestações que são denominadas alugueis.

 Arnaldo Rizzardo (ob. cit., p. 12) comenta: Em suma, é a figura em exame
 uma alternativa de financiamento para aquisição de qualquer tipo de
 veículo, máquina ou equipamento de fabricação nacional ou estrangeira,
 novo ou usado, incluindo também, financiamento de imóveis. (Grifo nosso).
 E continua adiante:

 Mas é sabido que, no "leasing" financeiro e no "lease back", as prestações não se
 equiparam a simples aluguéis. Mais que isso, significam a própria satisfação do preço
 do bem, tanto que, no final, para dar-se a transferência de propriedade a favor do
 usuário, basta exercer o direito à opção e depositar a quantia residual prevista, que é
 insignificante em comparação do preço real do material locado.

 Ainda em sua obra (ob. cit., p. 12), Arnaldo Rizzardo confirma nosso
 posicionamento trazendo parecer de José Wilson Nogueira de Queiroz:

 engloba integralmente o total dos custos, que a operação deverá supor, bem como o
 acréscimo do lucro, o que poderia dificultar a consideração do ""leasing"" como uma
 locação pura e simples, de vez que o uso da coisa não é dado ao locatário mediante a
 contraprestação equivalente ao uso da coisa. (apud Arrendamento Mercantil ("leasing").
 2ª ed., Rio, Forense, 1983.)

 Diante de tais considerações, podemos crer que as contraprestações não
 são pagamentos de aluguel mensal, mas sim, o conjunto: locação mais as
 figuras do financiamento. O caráter locatício está envolto por outros
 elementos estranhos à sua natureza, portanto não podemos considerar o
 contrato de ""leasing"" como uma locação, com promessa de compra e
 venda, e sim, locação com caráter de financiamento, ou seja: parcela de
 aluguel, mais parcela de amortização do valor do bem, diante disto,
 podemos dizer que a compra e venda já se efetivou através de parcelas
 mensais. É o que passamos a analisar.

 5.2 DA COMPRA E VENDA

 Mediante o pagamento das parcelas do contrato de ""leasing"", está se
 consumando a compra e venda do bem, pois, como já exposto, em cada
 contraprestação, tem-se o valor da amortização do bem, portanto, as
 parcelas pagas significam em parte, o pagamento do preço do bem,
 caracterizando superficialmente a compra e venda a prazo.

 Na compra e venda a prazo, o preço é pago em prestações, e a
 propriedade somente se transfere ao comprador depois do pagamento
 total. Assim como ocorre nos contratos de ""leasing"" onde o valor residual
 garantido foi fixado em quantia ínfima, ao final do tempo determinado,
 quitando-se as contraprestações, a instituição arrendante dá a opção ao
 arrendatário de "adquirir" o bem mediante pagamento do valor residual
 garantido.

 Nos casos em que o arrendatário opta pelo pagamento do valor residual
 garantido, ele está nada mais do que consumando a compra e venda
 através do pagamento da última parcela, momento pelo qual estará
 recebendo a propriedade do referido bem. No entanto, se o arrendatário
 optar pela devolução do bem, ele perderá os valores pagos
 "obscuramente" a título de preço diluído nas prestações, sofrendo grandes
 prejuízos.

 Vale lembrar que estes argumentos devem ser levados em consideração
 em tratando-se de contratos de "leasing" quando o valor residual garantido
 foi fixado conforme já exposto, em valor simbólico, como acontece na
 maioria dos casos.

 Se a propriedade somente se transfere depois de pagas as
 contraprestações e o valor residual garantido, encontramos um figura bem
 próxima à venda a prazo com reserva de domínio.

 Orlando Gomes define (ob. cit., p. 16): A reserva de domínio é o pacto
 adjeto ao contrato de compra e venda pelo qual o comprador só adquire a
 propriedade da coisa ao integralizar o pagamento do preço, não obstante
 investir-se em sua posse desde o momento da celebração do contrato.
 Porém, o mesmo autor afasta a hipótese de aplicação de venda a prazo
 com reserva de domínio pois na venda com reserva o concedente se
 obriga a transferir a propriedade do bem, depois de pagas as prestações,
 já no contrato de "leasing" não existe a obrigação e sim uma faculdade do
 arrendatário de optar pela compra no final do contrato.

 Assim sendo, como encontra-se nas prestações um aparência de locação,
 encontramos uma figura bem próxima à venda a prazo com reserva de
 domínio, mas não podemos defini-la como tal.
 
 

 A compra e venda é instituto que se demonstra nos contratos de "leasing",
 mas o pacto adjeto da reserva de domínio não pode estar explícito na sua
 natureza jurídica. A compra e venda, apesar de, como já vimos, estar
 presente nas prestações, somente se consuma no pagamento por opção
 do valor residual garantido.

 5.3 DO FINANCIAMENTO

 Outra figura citada por autores na natureza jurídica dos contratos de
 "leasing" é o financiamento.

 O financiamento é o meio pelo qual a instituição financeira concede crédito
 à terceiro, para aquisição de bens, recebendo deste o crédito que lhe
 cedeu, mediante pagamento de taxa de juros fixada, capaz de sustentar
 os lucros da instituição e custos administrativos e financeiros.

 Assim como no financiamento estão incluídas no valor final da operação,
 lucros e custos, os contratos de "leasing" também estão compostos por
 tais elementos.

 Para o pagamento das prestações, como já explanado alhures, tem-se o
 valor do aluguel, a depreciação do bem e a essência do financiamento:
 lucros e custos, pois as prestações são fixadas bem além do valor ideal
 para locação.

 Carlos Alberto Di Agustini (ob. cit., p. 16) faz a distinção entre o
 financiamento e o "leasing": no financiamento, o usuário (adquirente)
 adquire o bem com recursos provenientes de terceiros, passando a ter o
 direito de posse e uso do mesmo. E continua: Nesse caso, o bem é
 registrado no ativo permanente do adquirente e o financiamento gera uma
 passível exigível. Em determinados contratos, o adquirente pode alienar o
 bem como garantia da dívida contraída, pela figura jurídica denominada de
 "alienação fiduciária".

 Como se pode perceber, são duas figuras bem distintas, mas bem
 próximas. No financiamento, há a transferência de propriedade, apesar da
 alienação, e no "leasing" a transferência somente se efetivará depois da
 opção de compra pelo arrendatário.

 6. DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

 O art. 3º define o conceito de fornecedor, incluindo nestes os de natureza
 bancária, financeira, de crédito e securitária. Deixa, portanto, bem claro o
 interesse do legislador em incluir os usuários de serviços de tais
 instituições na Defesa legal do Código de Defesa do Consumidor.

 Toshio Mukai (Comentários ao código de proteção do consumidor. 1ª ed.
 São Paulo: Saraiva, 1991) analisa o parágrafo segundo deste artigo: Já o
 art. 2º deste artigo define o que seja serviço, fazendo-o também de modo
 amplo. É sempre atividade que seja fornecida no mercado de consumo
 mediante remuneração. Assim se considerando, é perfeitamente admissível
 a aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor aos contratos
 de "leasing".

 Esse mesmo Código veda a prática abusiva nos contratos de crédito e
 similares. Além disso, dispõe em capítulo específico sobre os contratos de
 adesão. Portanto, os contratos de "leasing", especificamente, estão
 duplamente amparados pelo Código de Defesa do Consumidor.

 A jurisprudência tem se mostrado indefinida quanto à aplicabilidade do
 Código de Defesa do Consumidor aos contrato de "leasing" . O Tribunal de
 Alçada Civil tem entendido:

 Não se aplica o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de arrendamento
 mercantil, sendo amplamente admitido o foro de eleição no contrato. (2[ Câmara do
 Tribunal de Alçada Civil do Rio de Janeiro, Apelação 5.304/93, 27.5.93, Repertório IOB
 de Jurisprudência, 3:9165)

 Clóvis V. do Couto e Silva traz que no termo genérico, consumidor estão
 todos os que se utilizam de bens e serviços, incluindo-se, também, os
 serviços financeiros ou de crédito (no simpósio sobre As Condições Gerais
 dos Contratos Bancários e a Ordem Pública Econômica, realizado em
 Curitiba, nos dias 24, 25 e 26 de agosto de 1988, por iniciativa do Tribunal
 de Alçada do Paraná).

 Não nos resta dúvida que o Código de Defesa do Consumidor deve ser
 aplicado nos contratos de "leasing", seja por efeito do art. 4º do referido
 estatuto, seja por tratar-se de contrato de adesão.

 Sendo assim, as cláusulas do contrato de "leasing" devem estar de acordo
 com as normas estabelecidas no Código de Defesa do Consumidor,
 evitando-se a lesão contratual em desfavorecimento do arrendatário.
 

 6.1 DA LESÃO CONTRATUAL

 Depois de verificados os elementos que compõem a natureza jurídica dos
 contratos de "leasing", sua classificação como contrato de adesão e
 Defesa face ao Código de Defesa do Consumidor, devemos estabelecer
 argumentos sobre as lesões contratuais, tendo em vista o referido Código
 e a Constituição Federal.

 A lesão contratual que mais nos oferece argumentos são as cláusulas
 abusivas. A abusividade de uma cláusula é de fácil detectação. Deve-se
 levar em consideração a boa-fé contratual, de modo que as cláusulas que
 contiverem exagerados benefícios para uma das partes, e levando-se em
 consideração os objetivos contratuais, pode ser percebido o desequilíbrio
 das partes, como por exemplo, nos casos de eleição de foro que limita a
 atuação jurisdicional provocada pelo aderente, em comarca da sede da
 instituição, e permite à esta, a faculdade de eleger o foro que melhor lhe
 convier. Isso é uma cláusula abusiva que deve ser limitada pelo poder
 judiciário, pois dificulta o acesso ao mesmo para o aderente e o facilita
 para a Instituição financeira.

 O Dr. Marcio Mello Casado (Considerações sobre a lesão nos contratos.
 Revista Jurídica nº 226) explica: O lesado vê-se minorizado perante a
 outra parte, pois esta é que "dita as regras", é ela que determina as
 condições do contrato, normalmente por deter o poder econômico.

 Não se pode considerar contrato lesionário comparado a um mau contrato,
 o mau contrato trata de um negócio mau feito, enquanto que o contrato
 lesionário, cuida de um contrato perfeito, que em fator de algumas
 cláusulas contratuais o tornam lesivo.

 Devido a preponderância dos interesses do poder econômico sobre os
 interesses do particular, faz-se necessário que o Judiciário interfira nessas
 relação, fazendo valer o equilíbrio e a boa-fé entre as partes. Com o
 advento do Código de Defesa do Consumidor, a teoria da lesão ganhou
 força, afastando a teoria da intangibilidade da vontade contratual: "pacta
 sunt servanda", limitando o princípio de que o contrato somente poderá
 ser modificado através da vontade das partes. Ao judiciário agora é
 permitido a revisão contratual, conforme § 4º do art. 51 do Código de
 Defesa do Consumidor:

 Art. 51, § 4º: É facultado a qualquer consumidor ou entidade que o represente requerer
 ao Ministério Público que ajuíze a competente ação para ser declarada a nulidade de
 cláusula contratual que contrarie o disposto neste Código ou de qualquer forma não
 assegure o justo equilíbrio entre direitos e obrigações das partes.

 Em comentários ao Código de Defesa do Consumidor, Alberto do Amaral
 Junior trata do assunto (Toshio Mukai et al. ob. cit., p. 32):

 O controle das cláusulas contratuais abusivas, tal como instituído pelo Código de Defesa
 do Consumidor, em absoluto se choca com o princípio da liberdade contratual, pela
 simples razão de que este princípio não pode ser invocado pela parte que se encontra
 em condições de exercer o monopólio de produção das cláusulas contratuais , a ponto
 de tornar difícil ou mesmo impossível a liberdade contratual do aderente.
 
 

 6.2 DAS CLÁUSULAS ABUSIVAS

 O art. 39 do Código de Defesa do Consumidor é exaustivo ao determinar as
 práticas abusivas. Elenca nove práticas que são consideradas lesivas ao
 consumidor, enquanto que o art. 51 do mesmo estatuto estabelece o que
 são consideradas cláusulas abusivas, declarando-as nulas de pleno direito.

 A primeira delas, trata da responsabilidade do fornecedor pelos produtos
 colocados no mercado. Nos casos dos contratos de "leasing", essa
 cláusula é de importância, visto que, o bem adquirido pela arrendante,
 para uso da arrendatária, conforme disposição contratual verificada na
 maioria dos casos, prevêem que a responsabilidade por vícios de qualquer
 natureza é do fornecedor do bem, ou seja, a empresa da qual a instituição
 adquiriu o bem para oferecê-lo em arrendamento mercantil ao arrendatário,
 e que caberá a este, reclamar pela reparação dos vícios.

 Esse inciso deve ser analisado juntamente com o inciso III do mesmo
 artigo.

 Nesse aspecto, verifica-se a abusividade das cláusulas, pois, o
 arrendatário, faz a opção pelo bem que necessita, e a arrendante se
 incumbe de adquiri-lo para o uso daquele. Ora, se ocorrer algum vício
 oculto nesse bem, a responsabilidade deveria ser da arrendante, senão
 vejamos:

 a) Levando-se em consideração o caráter locativo do "leasing", os vícios
 sobre o bem locado são de responsabilidade do locador. Se, por exemplo,
 alguém loca uma residência e dado algum tempo, essa residência
 apresenta rachaduras que impedem o seu uso (vícios ocultos), o locatário
 desocupa o imóvel e tem o contrato rescindido, conforme dispõe o art. 22,
 IV da Lei 8.245/1991. Dessa forma, nada mais justo que responder o
 arrendante pelos vícios ocultos do bem, objeto do contrato de "leasing",
 suspendendo-se o pagamento das prestações até que o vício seja sanado.

 b) considerando ainda, o caráter de compra e venda, ainda assim, a
 responsabilidade pelos vícios são da arrendante. Ao adquirir, mesmo que
 mediante pagamento parcelado (valor residual garantido diluído nas
 prestações) o bem, o fornecedor (antigo proprietário) é a instituição
 financeira, e é ela a responsável pelo bem alienado.

 O inciso segundo não merece menor atenção. A opção de reembolso de
 que trata esse dispositivo também é indiferente nos contratos de "leasing".

 Em falando-se em maioria de contratos já analisados, podemos perceber a
 freqüência com que esta cláusula é infringida nestes tipos de contrato.
 Determinam os contratos de "leasing" que se na vigência do referido
 contrato, a arrendatária optar pela devolução do bem, perderá as quantias
 pagas e além disso, deverá reembolsar a arrendante em verificando-se
 diferença entre o produto do bem vendido e a soma das parcelas
 vincendas.

 É de total abusividade as cláusulas que tratam desse conteúdo, ainda
 mais, naqueles casos em que o valor residual garantido é pago diluído nas
 contraprestações. Conforme já explanado, as contraprestações estão
 compostas por aluguel, amortização do bem, lucros da instituição e taxas
 de administração. Dessa forma, após o pagamento de parcelas
 contratuais, o arrendatário vem quitando parcialmente o valor do bem.
 Neste caso, se resolver pela devolução do mesmo, não terá de volta os
 valores pagos a título de amortização, pois, propositadamente, essas
 parcelas estão identificadas somente como aluguel.

 A cláusula IV trata das obrigações consideradas iníquas, abusivas,
 incompatíveis com a boa-fé ou a equidade, que colocam o consumidor em
 grande desvantagem. Aqui trataremos da onerosidade dos contratos de
 "leasing".

 As taxas de juros aplicadas nos contratos de "leasing" têm sido analisadas
 por economistas como taxas inaplicáveis, que colocam o
 consumidor-arrendatário em situação de inadimplemento previsível. As
 taxas aplicadas nos percentuais de 10, 15, ou 20% é inadimplível pois, na
 realidade econômica, com inflação praticamente estável, oscilando em
 12% ao ano, é inaceitável que algumas instituições insistam na utilização
 de tais taxas (lato sensu).

 Dr. Roberto W. Amarante (ob. cit., p. 23) pondera que:

 Ocorre que pagar taxas de juros ("lato sensu") de 10%, 15%, 18% ou mais, é suicídio
 administrativo. Não há atividade lícita atualmente que proporcione o lucro suficiente para
 cobrir o pagamento de tal encargo financeiro, e a tendência de todo aquele que se lança
 na senda dos pagadores de juros culmina por ser a bancarrota, a quebra total, com a
 inevitável inadimplência. ...

 O lucro - "spread"- do banco e demais instituições financeiras, hoje, é perfeitamente
 viável num patamar de 3,0% a.m. ... Quando o adimplemento torna-se impossível por
 força da excessiva onerosidade imposta, que exige da outra parte, gasto absurdo, que
 o sacrifica inteiramente, sujeitando-o a perda material intolerável, não ocorre mora por
 parte do devedor.

 Devemos ainda considerar, que por tratar-se de contratos de "leasing", o
 prazo para pagamento é estendido a 2, 3 anos, não podendo o
 arrendatário antever a economia diante das cláusulas expressas em
 fórmulas inteligíveis ao homem médio.

 Além das taxas de juros, há a correção monetária, muitas vezes
 mascarada por índices que não revelam a verdadeira correção da moeda, e
 sim que espelham os interesses das instituições e que são ditadas por
 elas, conforme seus recursos de captação de lucros. É o caso da TR (Taxa
 Referencial). Além da Taxa Referencial, outras têm sido usadas e
 denominadas por correção monetária, mas que devem estar sempre sob os
 olhares do Poder Judiciário, evitando a abusividade contratual.

 Outro fator importante observado nos contratos de "leasing" é a
 capitalização de juros - anatocismo - combatido pelo Judiciário, e
 sumulada (Súm. 121 do STF), mas que tem sido ignorada nos contratos
 bancários em geral.

 Os demais incisos do Art. 51, merecem análise aplicada aos casos em
 concreto, fazendo-se valer as regras do Código de Defesa do Consumidor,
 sobre os interesses manipuladores e inconseqüentes do Poder Econômico.
 Esse processo de concientização sobre os direitos do consumidor e os
 deveres das instituições Financeiras, na finalidade de fazer valer os
 princípios constitucionais, é dever do Judiciário, e é através deles que a
 sociedade poderá buscar saída às dificuldades econômicas de quem
 depende de crédito para ter seu negócio adiante.

 Infelizmente, a instituição financeira, não atende à expectativa para que
 fora criado, conforme a Constituição Federal, senão vejamos:

 Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o
 desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, será
 regulado e, lei complementar, que disporá, inclusive sobre: ...

 É função social das instituições financeiras a promoção do
 desenvolvimento social equilibrado, e não promover a inadimplência e
 sacrifício de consumidores e empresas que geram recursos sociais,
 empregos, impostos, etc. Os interesses da coletividade estão muito longe
 de ser amparados pelo poder econômico, aliás, seus interesses tem sido
 cada vez mais abusar de contratos de crédito de modo que proporcione
 angariação de lucros inconcebíveis na sociedade brasileira. É da
 inadimplência e insolvência que as instituições financeiras têm obtido
 recursos (leia-se lucros). E são por essas razões que o Poder Judiciário
 deve intervir, através do pleito de revisões contratuais.
 
 

 7. DAS AÇÕES REVISIONAIS

 Conforme citado acima, os contratos que possuem cláusulas leoninas,
 devem ser revistos pelo judiciário considerando-se nulas as cláusulas que
 infringem o dispositivo no art. 51 do Código de Defesa do Consumidor. O
 acesso ao judiciário tem sido gradual e os consumidores ainda têm
 encontrado certa dificuldade de caracterizar os contratos de "leasing"
 como contratos lesivos que são repelidos pelo Código de Defesa do
 Consumidor. Muitos Juizes não tem aplicado as normas do Código de
 Defesa do Consumidor aos contratos bancários, entendendo que as
 normas do referido estatuto somente atingem as relações de consumo, e a
 relação do cliente com as instituições financeiras não envolvem consumo.

 Arnoldo Wald (Lei de Defesa do Consumidor, Cadernos IBCB 22) ratifica
 esse posicionamento:

 b) a nova lei também não se aplica às operações de empréstimos e outras análogas
 realizadas pelos Bancos, pois, o dinheiro e o crédito não constituem produtos adquiridos
 ou usados pelo destinatário final, sendo ao contrário, instrumentos ou meios de
 pagamentos, que circulam na sociedade e em relação aos quais não há destinatário
 final (a não ser os colecionadores de moeda e o Banco Central, quando retira a moeda
 de circulação).

 As instituições financeiras, em suas operações, ativas ou passivas, não podem ser
 consideradas como produtoras ou fornecedoras de serviços. À luz do Código de Defesa
 do Consumidor, só se caracterizariam como fornecedoras quando efetivamente
 prestassem serviços (art. 3º, § 2º, da L. 8.078/90)

 Porém, a corrente doutrinária majoritária é do posicionamento da
 abrangência das instituições financeiras pelo Código de Defesa do
 Consumidor, como já exposto alhures.

 As ações revisionais intentadas, tem vindo de encontro com o princípio da
 manifestação da vontade para alteração contratual, em virtude da
 aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Ao Judiciário agora é
 permitido rever as cláusulas contratuais, controlando supremacia de
 interesses do poder economicamente mais forte (instituições financeiras)
 em face aos consumidores. Como bem posiciona-se Cláudia Lima Marques
 (Contratos no Código de Defesa do Consumidor. RT, 1992, pág. 60):

 É o intervencionismo estatal, que, ao editar leis específicas, pode, por exemplo, inserir
 no quadro das relações contratuais novas obrigações (...), mesmo que as partes não as
 queiram, não as tenham previsto "ou as tenham expressamente excluído no
 instrumento contratual".

 (...) Assim também, a vontade das partes não é mais a única fonte de interpretação
 que possuem os juizes para interpretar um instrumento contratual. A evolução
 doutrinária do direito dos contratos já pleiteava uma interpretação teleológica do
 contrato, um respeito maios pelos interesses sociais envolvidos, pelas expectativas
 legítimas das partes, especialmente das partes que só tiveram a liberdade de aderir ou
 não aos termos pré-elaborados.
 
 

 O Art. 52 do Código de Defesa do Consumidor, elenca os requisitos
 obrigatórios na celebração do contrato. Tais requisitos devem ser de suma
 importância na análise do contrato em ação revisional, podendo a partir
 desse momento estabelecer se houve má-fé. Havendo supressão de um
 desses requisitos, pode-se perceber a lesividade e a má-fé contratual, que
 deve rigorosamente ser repelida pelo judiciário.

 Os contratos devem sempre elevar a vontade das partes, harmonizando os
 interesses, alcançando um acordo satisfatório para ambas as partes. O
 Projeto de Código Civil, prevê a intervenção do judiciário nas relações
 contratuais (Projeto de Lei nº 634-B/75) trazendo um artigo sobre a
 onerosidade excessiva nos contratos:

 Seção IV Da resolução por onerosidade excessiva

 Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das
 partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em
 virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a
 resolução do contratos.

 Os efeitos da sentença, que a decretar, retroagirão à data da citação.

 Como se pode perceber, a tendência é realmente a intervenção do
 judiciário nas relações contratuais. Nos contratos de "leasing", enquadrado
 em operação de crédito, as mesmas considerações tem sido elevadas. O
 tratamento diferenciado que é dado às instituições financeiras, deixando
 ao seu livre arbítrio as cláusulas contratuais, bem como as taxas
 aplicadas, não encontra respaldo na Constituição Federal, pois, como já
 citado, as instituições financeiras devem ter caráter social, com finalidade
 de promover o desenvolvimento equilibrado e atender aos interesses da
 coletividade. E ainda, a aplicação de juros superiores a 12% ao ano é
 literalmente proibida pela nossa Carta Magna.

 Dr. Roberto W. Amarante discute (ob. cit., p. 23):

 Com efeito não existe nenhum argumento plausível para que se dê tratamento
 diferenciado aos bancos, também discutível a posição do STF, em negar aplicabilidade
 ao art. 192, § 3º da CF, uma vez que o dispositivo está tecnicamente perfeito e
 resolvido, se alga há para regulamentar, certamente não é o conceito de "taxas de
 juros", "juros" ou "juros legais".
 
 

 Neste sentido se manifestou com propriedade o então Min. Paulo Brossard, que também
 entende serem auto-aplicáveis as disposições constitucionais proibitivas, não sendo
 necessário norma que regulamente o que nelas já está contido.

 Dessa forma, é necessário que o Poder Judiciário lance mão de todos os
 meios que possa ter para promover o equilíbrio nas relações que envolvem
 instituições financeiras e consumidores. Seria ferir o princípio do acesso ao
 Judiciário, negar provimento as ações revisionais, pois trata-se de direito
 de cidadania. Brilhante e sensível a posição do Dr. Eugênio Facchini Neto,
 Juiz de Direito da 3º Vara Cível de Passo Fundo, concluindo que:

 (...) o exercício de um direito por parte do autor (direito de acesso ao Judiciário para ver
 discutidas e revisadas algumas cláusulas do seu contrato), não pode acarretar prejuízos
 ao mesmo, o que ocorreria se, para evitar o desapossamento do bem, tivesse que
 efetuar o pagamento das importâncias exigidas pela requerida (Proc. nº 21196001800)

 O ilustre Juiz da 1ª Vara Cível da Comarca de Presidente Prudente Dr.
 Eduardo Gesse, com brilhantismo tem entendido a aplicação do Código de
 Defesa do Consumidor nas ações revisionais de "leasing":

 (...) Pois bem, a requerente não se conforme com algumas condições estabelecidas no
 contrato firmado entre os demandantes e almeja anulá-las. É evidente que ela não
 poderia alterar unilateralmente o contrato. Necessita, portanto, da intervenção judicial. A
 via eleita pela requerente, inegavelmente, é adequada. Não há pois que se falar em
 falta de interesse de agir.

 (...) A vulnerabilidade do arrendatário em contratos dessa natureza é marcante, bom
 como não se pode negar que ele ostenta a condição de destinatário final e o arrendador
 pode e deve ser equiparado como fornecedor do bem arrendado, de modo que pode ser
 aplicado o Código de Defesa do Consumidor para anular cláusulas que geram
 obrigações sem vantagens para o arrendatário, ou que para este sejam excessivamente
 onerosas.

 Dessa forma, podemos concluir indubitavelmente que as ações revisionais
 de contrato de "leasing" é o meio adequado para requerer provimento
 jurisdicional no sentido de ver-se valer as normas do Código de Defesa do
 Consumidor, limitando assim, a soberania e ostentação de poder
 econômico ante os institutos contratuais, como o contrato de "leasing". A
 prestação jurisdicional é imprescindível à equiparação das partes e
 igualdade de condições suprimidas nos contratos atuais, onde o poder dita
 as regras e o economicamente mais fraco e dependente de crédito as
 adere em bloco e se submete ao rigorismo e abusividade de suas
 cláusulas.
 
 
 

 8. CONCLUSÃO

 O contrato de "leasing", trata do negócio realizado entre a instituição
 financeira e o cliente, no propósito de oferecer recursos para utilização de
 bens, sem a necessidade de sua aquisição.

 A natureza jurídica dos contratos de leasing, muito discutida
 doureinariamente traz a posição de grandes doutrinadores, das quais
 podemos destacar a classificação contratual desse instituto como
 contrato misto, conforme posição de Orlando Gomes. Tratando-se de
 contrato misto, sua composição é assemelhada a alguns institutos
 jurídicos contatuais, como a locação, a compra e venda e o
 financiamento. O contrato de leasing é insituto autônomo, tem sua própria
 definição, mas está composto por características diversas, que juntas
 asseguram o resultado do negócio.

 A essência de locação é marcante na natureza do contrato de leasing. O
 pagamento de contraprestações mensais, figuram como alugueres, mas
 assim não podem ser consideradas, pois estão compostas de outros
 elementos, como taxa de depreciação do bem, juros, lucros da instituição
 e prestação de serviços. Dessa forma, o caráter locativo apenas se
 insinua nos contratos de leasing.

 Os aspectos da compra e venda a prazo, também surgem nos contratos
 de leasing, mas de forma superficial, eis que as parcelas pagas
 mensalmente, são consideradas como alugueis, e a opção de compra do
 bem somente se consumará com o pagamento do valor residual garantido.

 A compra e venda a prazo não é aplicadas aos contratos de leasing
 porque no final do contrato, o arrendatário não está obrigado à adquirir o
 bem. Trata-se de uma faculdade que poderá ser exercida ou não. Em
 exercendo-a, tem-se consumada a compra e venda, caso contrário, o bem
 é devolvido e os valores pagos nas parcelas, passam a ter caráter
 exclusivamente de locação, pois o contrato não prevê a devolução de
 valores pagos a título de amortização do bem quando da devolução.

 Outra característica importante dos contratos de leasing é a do
 financiamento. Nestes contratos, no valor final da operação, estão
 incluídos os lucros e custos da instituição, como no financimento, sendo
 que a trsnferência da propriedade do bem somente se transferirá ao
 término do contrato, mediante a vontade do arrendatário.

 Além de suas características peculiares, o contrato de leasing é contrato
 de adesão, pois suas cláusulas já se apresentam elaboradas para a
 aceitação integral pelo aderente. Não há a possibilidade de participação do
 arrendatário na elaboração das cláusulas contratuais, tendo que acitá-las
 em bloco. Para tanto, a interpretação desses contratos merece cuidado,
 para evitar a prática de cláusulas abusivas, repelidas pelo Código de
 Defesa do Consumidor.

 O Código de Defesa do Consumidor enquadra os contatos de natureza
 bancária, financeira e de crédito como fornecedores de serviços,
 protegendo os usuários desses serviços, conforme suas normas, repelindoa
 lesão contratual, muito praticada nos contratos de crédito, onde o
 consumidor não possui escolha, e sim é levado a procurar crédito junto às
 instituições e submete-se aos interesses destas.

 As cláusulas abusivas devem ser consideradas nulas pelo judiciiário através
 de ações revisionais propostas, tendo como fundamento a Constituição
 Federal e o Código de Defesa do Consumidor. Somente através da
 intervenção judicial, as instituições financeiras farão a adaptação de seus
 contratos às normas vigentes, facilitando a aplicação da equidade e
 justiça social, para ao final fazer valer os preceitos constitucionais sobre o
 sistema financeiro nacional.
 As ações revisionais são de suma importância na aplicação das normas de
 proteção ao consumidor, e devem ser analisadas pelo Judiciário com base
 na lesão contratual e fragilidade de participação do aderente na
 elaboração do contrato, assim como, a supremacia economica das
 instituições financeiras e intocabilidade de suas operações até pouco
 tempo amparadas pelo princípio do pacta sunt servanda.

 Trabalho monográfico apresentado ao curso de Pós-Graduação em Direito
 Civil e Processo Civil mantido pela Instituição Toledo de Ensino de
 Presidente Prudente em convênio com o INBRAPE - Instituto Brasileiro de
 Pesquisa e Estudo Sócio-Econômico, para obtenção de título de
 especialista. Orientadora: Prof. Dra. Jussara Susi Assis Borges Nasser
 Ferreira.

 E-mail da autora: legis@prudenet.com.br

 Extraído de : www.direitobancario.com.br