® BuscaLegis.ccj.ufsc.br
 
 

JUROS NOS CONTRATOS PARTICULARES DE MÚTUO


 




E FINANCIAMENTO BANCÁRIO DE CRÉDITO

(Publicada na RJ nº 240 - OUT/97, pág. 21)

Gustavo Saad Diniz - JUROS NOS CONTRATOS PARTICULARES DE MÚTUO E FINANCIAMENTO BANCÁRIO DE CRÉDITO

Discente do Curso do Direito da FHDSS da UNESP

SUMÁRIO: 1. Introdução e Delimitação do Tema. 2. Conceito e Natureza Jurídica. 3. Estado das Questões. 3.1. Juros Constitucionais e auto-aplicabilidade do § 3º do art. 192 da Constituição Federal. 3.2. Capitalização e usura. 4. Conclusões. 5. Bibliografia.

1. INTRODUÇÃO E DELIMITAÇÃO DO TEMA

Uma das questões (1) mais freqüentes que o judiciário brasileiro tem enfrentado é a abrangência e incidência de juros sobre os negócios jurídicos de direito privado que envolvem a concessão de crédito para contratos de mútuo e financiamentos bancários (comerciais, rurais e industriais). Senão óbvia, a justificativa pode ser abstraída das próprias circunstâncias econômicas e políticas, com evidentes reflexos na sociedade brasileira da pretensa estabilidade econômica com integração em mercados regionalizados e globalizados.

Nessa fase transitória e de dinâmica das bases sociais em que se assentam as normas positivadas, o que se tem verificado alhures são dois fenômenos distintos, oriundos da defasagem do tema em relação à economia estável: a.) há o completo desvirtuamento da instituição (2) dos juros, sejam moratórios ou compensatórios; b.) as normas que regulam a matéria estão desatualizadas ou sequer regulamentadas para a realidade (3). Não é sem motivo dizer, de forma exemplificativa, que o contratante, polo ativo da obligatio que estipula cláusula acessória de juros moratórios e compensatórios, dela se tem aproveitado incorretamente como forma de aumentar a lucratividade e por vezes capitalizar o objeto contratual.

Com efeito, o advento da Constituição Federal de 1988 e da Lei nº 8.078/90 (CDC) maior proteção trouxe às relações de direito privado, especialmente no concernente à questão dos juros e à fixação de obrigações iníquas a partir desse instituto. Essas serão as bases de discussões desse estudo, com especial atenção para as práticas abusivas do anatocismo e da fixação de juros exorbitantes nos contratos de mútuo e financiamentos bancários.

2. CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA

Importa compreender que o instituto dos juros poderá ser observado sob prismas econômicos, políticos e jurídicos (4).

Nesse compasso, a economia conceitua juros como sendo a remuneração paga pelo tomador de um empréstimo junto ao detentor do capital emprestado. A evolução dos juros acompanharia o culturalismo de seu tempo. Assim é que os economistas clássicos atribuíram a qualidade produtividade do capital ou pagamento de serviço. KARL MARX, por sua vez, conformou a cobrança de juros à taxa de lucro, associando como "participação financeira no lucro (forma de expressão da mais-valia) do capitalista produtivo, e afirma que a taxa de juros deve ser inferior à taxa média de lucro, resultante da produção capitalista" (5). Entretanto, JOHN MAYNARD KEYNES foi quem conferiu completude ao conceito econômico do juro, apresentando-o com critérios objetivos e subjetivos que, respectivamente, consistiam na escassez de capital e renúncia à liquidez monetária, aliada à oferta e procura da moeda em investimentos (6). A partir dessa concepção keynesiana, os juros passaram a ser instrumento de políticas de desenvolvimento econômico com manipulação da oferta monetária disponível. Essa, aliás, a compreensão política que deixa impregnado o instituto (7)

A ciência jurídica, por outro lado, aproveita-se das conceituações econômicas e acresce o elemento imperativo-normativo, para qualificar os juros como sendo "o preço do uso do capital. Vale dizer, é fruto produzido pelo dinheiro, pois é como fruto civil que a doutrina o define. Ele a um tempo remunera o credor por ficar privado de seu capital e paga-lhe o risco em que incorre de o não receber de volta" (8). Lançam-se os elementos da acessoriedade; privação do capital mediante posterior remuneração; pagamento do risco assumido na concessão do crédito através do mútuo de transmissão da coisa fungível (capital).

Delimitam-se os elementos obrigacionais dos juros, na qualidade de acessórios (9), fungíveis, para remuneração do consumo da coisa, adimplemento do capital tomado e cobertura do risco do credor na concessão do crédito, por exemplo.

O conteúdo obrigacional assumido traz como características a possibilidade de fixação de juros através de convenção das partes ou então, sua delimitação por dispositivos legais. No primeiro caso, dispõe o art. 1.062 do CC que a taxa de juros, quando não for contratualmente estipulada, será de 6% ao ano ou 0,5% ao mês, na modalidade de contagem simples. A livre pactuação tem previsão no art. 1.262 do CC, consoante o qual será permitida a livre fixação de juros ao empréstimo de dinheiro e outras coisas fungíveis, abaixo ou acima da taxa mínima, limitados ou não ao dobro da taxa mínima (art. 1º do Decreto nº 22.626/33), capitalizados ou não (10). Por outro enfoque, os juros por lei fixados e que se impõem acessoriamente à obligatio terão vez, v.g., no adimplemento de perdas e danos do ressarcimento de ilícitos civis.

Ainda no campo obrigacional, os juros impendem análise sob sua forma de moratórios e compensatórios. Aqueles decorrem da mora no adimplemento da obrigação, enquanto estes, com conotação de cláusula penal comumente convencionada, retribuem o fato de o credor estar privado do uso de seu capital e calculados pelo tempo que durou o empréstimo (11).

Valendo-se de brilhante síntese de SERPA LOPES, CAIO MÁRIO apresenta rol que determina o início da fluência dos juros, nos seguintes termos: "a) se a obrigação é líquida e certa, com prazo determinado de vencimento, são devidos os juros desde o termo, porque o não-pagamento constitui o devedor em mora pleno iure (art. 960); b) se for positiva e líquida a obrigação, mas sem prazo, os juros fluem da interpelação, por ser ela necessária à constituição do devedor em mora (art. 960, segunda parte); c) correm juros desde o momento em que o devedor descumpre obrigação negativa, porque incorre de pleno direito em mora quando pratica o ato de que devia abster-se (art. 961); d) se a obrigação provém de um delito, os juros são devidos desde quando foi perpetrado, porque a lei considera automática a incidência da mora (art. 962); e) sendo a prestação pecuniária, são devidos do momento em que se lhes fixa o valor (art. 1.064); f) nas obrigações decorrentes de ato ilícito, se não houve motivo de sua fluência anterior, correm desde a citação inicial (art. 1.536, §2º)" (12). Em relação à Fazenda Pública, a regra é que os juros passam a fluir a partir do trânsito em julgado da decisão condenatória de valores líquidos.

O pagamento de juros, seguindo o principal, prova-se de acordo com regras jurídicas ordinárias. Entretanto, se o credor deu quitação ao capital principal, sem necessária reserva dos juros, presumem-se pagos (13). Quanto ao pagamento, ainda existem as disposições do art. 1.263 do CC e 251 do CCom , consoante os quais quem pagar juros não estipulados não os poderá reaver (teoria das obrigações naturais), salvo se excederem os limites legais. Diferentemente, se estipulados, mas pagos além da taxas pactuadas, poderá haver repetição do indébito por enriquecimento ilícito (art. 964 do CC).

Por outro lado, como decorrência do art. 178, §10, do Código Civil, prescrevem em cinco anos as pretensões referentes aos juros, a não ser que já tenham sido atingidas pela prescrição extintiva do art. 167 do CC.

Resta analisar, nesse tópico de apertada síntese, por derradeiro, a natureza de norma cogente que assumem os dispositivos referentes aos juros. Trata-se de decorrência de um substrato valorativo de manutenção do ordenamento jurídico, sobretudo por questões intrinsecamente relacionadas ao interesse geral que direciona a teleologia da norma. Senão porque, estes dispositivos concernentes a juros, nas relações de direito privado, garantem segurança jurídica nos negócios e também limitam a abusividade de uma parte economicamente mais forte, no uso dos juros para capitalizar indevidamente o seu crédito. Argumentariam: e a potencial disponibilidade existente na possibilidade de convenção da cláusula de juros? Apesar de existir a possibilidade de escolha da taxa de juros, conforme o demonstrado acima, existe a eminente prevalência das disposições de ordem pública, regulando a disponibilidade aparente, isto pela prevalência do interesse público, para não dizer das limitações legais que coíbem as práticas abusivas na aplicação de juros (14).

3. ESTADO DAS QUESTÕES

Conforme a introdução do trabalho, é importante desenvolver análise sobre as questões que envolvem juros e os contratos particulares de financiamento de crédito, especialmente os que envolvem as instituições financeiras (15). Após rápido desenvolvimento conceitual acerca dos juros, importante restringir a discussão sobre os dois pólos principais que se absorvem da análise supra, quais sejam, a auto-aplicabilidade da norma do art. 192, § 3º da CF/88 e a capitalização dos juros nos contratos.

3.1. Juros Constitucionais e a auto-aplicabilidade do § 3º do art. 192 da

Constituição Federal

O dispositivo normativo do § 3º do art. 192 tem sido objeto de amplas discussões doutrinárias e jurisprudenciais, principalmente em relação à sua auto-aplicabilidade. Duas correntes se superpõem, sendo que a majoritária, inclusive com respaldo de decisões não unânimes do STF (16) e que socorre às expectativas das instituições financeiras, posicionando-se no sentido da auto-aplicabilidade da norma. A esse respeito, insignes juristas, dentre os quais HELY LOPES MEIRELLES, CAIO TÁCITO, FREDERICO MARQUES, MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, CELSO BASTOS, IVES GANDRA, ROSAH RUSSOMANO e JOSÉ ALFREDO DE OLIVEIRA BARACHO, emitiram pareceres à Federação Brasileira das Associações de Bancos (17), deixando consignada a necessidade de regulamentação do Sistema Financeiro Nacional através de lei complementar, incluindo-se aqui os juros constitucionais. É de se considerar, contudo, que os pareceres estão marcados por uma sensibilidade exclusiva à época inflacionária (chegando o Prof. CELSO BASTOS a proclamar a liberdade do campo econômico nesse ponto), procurando integrar o dispositivo, sob o aspecto formal, dentro da imprescindibilidade de regulamentação do Sistema Financeiro. Em que pese a respeitabilidade latente dos pareceristas, a base social de aplicação do dispositivo alterou-se sensivelmente em relação à época de suas doutrinas, não mais subsistindo o período do vicioso inflacionamento corrosivo. Além disso, imperioso se torna observar que existe conteúdo material específico no § 3º do art. 192, vinculativo da regulamentação infra-constitucional e do estrato social dinâmico, inobstante exista o esforço desses eminentes juristas na demonstração do contrário.

Em exata contraposição, enfileram-se aqueles que creditam auto-aplicabilidade mínima à regra, sobretudo na limitação dos juros no percentual de 12% a.a. Apesar de ainda ser minoritária, representada pelos Ministros dissidentes nos acórdãos do STF, pelos Pretórios gaúchos (18) e também juízes paulistas de primeira instância (19), essa corrente tem se disseminado pelas fontes de direito, exatamente por representar interpretação mais consistente e consciente da realidade monetária nacional.

As chamadas normas constitucionais de eficácia principiológica programática, também conhecidas por não auto-executáveis ou de eficácia limitada, conceito pacificado na doutrina, são normas integrantes da unidade constitucional (20) e que carecem de regulamentação específica de seu conteúdo, de forma a alcançar ampla aplicabilidade concretizada. Fixam, outrossim, mais do que comandos-regras, também comandos-valores subsumidos em princípios vinculadores do legislador e até mesmo dos particulares adstritos a suas proposições limitadas (21).

Deve-se frisar, antes de mais, que o grande debate está nos efeitos possuídos por essa espécie de norma constitucional e a dimensão exegética sem a necessária regulamentação. Apesar de ser da essência de sua eficácia contida a regulamentação por norma infra-constitucional, o dispositivo programático traça limites de ordem pública que deverão ser obedecidos pelas bases sociais, necessariamente, mesmo que não exeqüível a norma por si mesma (22). "Precisamente por isso, e marcando uma decidida ruptura em relação à doutrina clássica, pode e deve dizer-se que hoje não há mais normas constitucionais programáticas. Existem, é certo, normas-fim, normas tarefa, normas programa que impõem uma atividade (...) Às normas programáticas é reconhecido hoje um valor jurídico constitucionalmente idêntico ao dos restantes preceitos da Constituição" (23).

Afirmamos com JOSÉ AFONSO DA SILVA: "Em conclusão, as normas programáticas têm eficácia jurídica imediata, direta e vinculante nos casos seguintes: I - estabelecem um dever para o legislador ordinário; II - condicionam a legislação futura, com a conseqüência de serem inconstitucionais as leis ou atos que as ferirem; III - informam a concepção do Estado e da sociedade e inspiram sua ordenação jurídica, mediante a atribuição de fins sociais, proteção dos valores da justiça social e revelação dos componentes do bem comum; IV - constituem um sentido teleológico para a interpretação e aplicação das normas jurídicas; V - condicionam a atividade discricionária da Administração e do Judiciário; VI - criam situações jurídicas subjetivas, de vantagem ou desvantagem" (24).

Com efeito, lançados esses pressupostos, é fundamental compreender que a norma do art. 192, § 3º comporta a seguinte análise: a.) o dispositivo é auto-aplicável, bastando-se por si na qualidade de diretiva material permanente, e regulamentação prescinde a segunda parte do dispositivo, no sentido de tipificar a conduta criminosa da usura; b.) admitindo-se, para argumento, a necessidade de regulamentação, deve-se obtemperar que a Constituição delimitou clara e explicitamente o percentual de 12% anuais, vinculando o legislador, julgador e os particulares nesses limites (25); c.) também ad argumento, ainda que programático, o dispositivo tem conteúdo limitativo e eventual lei complementar regulamentadora não poderia ultrapassar a taxa estipulada, sob a pena de declaração de inconstitucionalidade. Nesse sentido foi o posicionamento dos Ministros MARCO AURÉLIO (26) e CARLOS VELLOSO nos julgamentos da ADIN 4-7/DF e do MI nº 362-0-RJ (RT 732/143) aos quais nos reportamos. Dessa forma também tem sido gradativamente reconhecida pelos Tribunais auto-aplicabilidade da limitação de juros, remetendo-se também à Lei de Usura. Assim: "Limite de 12% a.a. - Incidência imediata da norma constitucional - A norma do parágrafo 3º do art. 192 da Constituição Federal é de eficácia plena, por isso que contém, em seu enunciado, todos os elementos necessários à sua aplicação. Logo é auto-executável, de incidência imediata" (27). Também a 8ª Cam. Civ. do 1º TACivSP, em julgamento dos Embargos de Declaração 419.730-0-1: "A limitação dos juros em 12% ao ano, pela CF/88 é auto-aplicável, incluindo quaisquer taxas de serviços relativas ao empréstimo, mas não incidindo sobre pagamentos já efetuados quando do advento da nova CF"(28).

Portanto, o que se conclui, s.m.j., é que os financiamentos bancários, apesar de não vinculados aos juros do Art. 1.062 do CC e ao art. 1º do Decreto nº 22.626/33, deverão possuir a cláusula que fixa juros até os limites constitucionais de 12%, consoante o disposto pelo § 3º do art. 192 da CF/88 (29).

De se ponderar: as cláusulas estipuladas fora limites são nulas, anuláveis ou importam em redução imediata e ex officio? Por sua desconformidade com o ordenamento jurídico, essas cláusulas são fulminadas pela nulidade absoluta, importando sua redução aos patamares admissíveis, quando discutidas em processo judicial. É possível separar o percentual admissível da abusividade repudiada (art. 153 do CC), contudo, o excesso é ilícito, ficando assegurado ao devedor a repetição do que houver pago a mais.

3.2. Usura e capitalização

A capitalização dos juros consiste na operação matemática de contagem de juros, dos juros já contados (30). Trata-se, na prática, de método que faz aumentar o valor do capital tomado, acrescendo-lhe valores que somente podem ser obtidos pela aplicação composta dos juros. Vê-se, por um primeiro ponto de análise, a exorbitação da característica principal dos juros, a assecuração do risco assumido pelo credor, sobrevalorizando a remuneração do credor através dos juros e possibilitando a caracterização da usura.

Culturalmente, essa extrapolação da liquidez monetária passou até por condenações da igreja (31) à chamada prática de usura do crédito, e no direito brasileiro foi objeto de apreciação do art. 253 do Código Comercial e o tema mereceu a anotação de repúdio do comercialista TULLIO ASCARELLI, comentando as vendas e pagamentos feitos em prestações, sendo que "justamente nas vendas em prestações que se escondem hoje, às vezes, juros e práticas usurárias, contra os quais as leis começam a dispor na justa luta contra a usura" (32).

Entretanto, é no campo jurídico que deverá ser cuidadosamente observada essa espécie de lucratividade. Mister dividir em ordinário e especial, para melhor didática, o âmbito de incidência dos juros.

O regime ordinário de incidência tem aplicação a todos os atos jurídicos civis e comerciais praticados por sujeitos de direito que não se configurem como instituições financeiras. Sua normatividade implica afirmar que a taxa aplicável é aquela arrolada pelos arts. 1.062 e 1.063 do CC, nos limites legais de 6% a.a. ou convencional até o dobro (12%, conforme o disposto no Decreto nº 22.626/33 e incidentemente § 3º do Art. 192 da CF/88), incidindo sempre na modalidade de cálculo simples. A capitalização, nesses casos comuns, é terminantemente vedada, com incidência do art. 4º do Decreto 22.626/33 e dos arts. 39 e 51 do CDC para a anulação das cláusulas contratuais extorsivas e, na esfera penal, a abusividade nos juros tipifica o delito de usura (art. 13 da Lei nº 1.521/51).

Pelo princípio da especialidade das disposições normativas, as instituições financeiras têm tratamento diferenciado nos regimes de estipulação de juros. Esse o ponto maior de debate e discussão. Referidas instituições têm aplicado elevadas taxas e variações às cláusulas acessórias de juros nos contratos de financiamento, seguindo a orientação do enunciado nº 596 da Súmula do STF, inspirado nos art. 4º, cumulado com os arts. 17 e 18 da Lei nº 4.595/64, consolidando compreensão que: "As disposições do Decreto 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional".

É de se convir, como pressuposto, que a inexistência de efeito vinculante na Súmula do STF permitiu com que os Tribunais interpretassem de forma diversa o entendimento do Excelso Pretório, e com maior consonância com realidade, sem privilégios, diga-se de passagem (33). O primeiro argumento que se usa é que a lei que disciplina o sistema financeiro nacional (4.595/64) não revogou expressa, nem muito menos tacitamente (34) os dispositivos contrários à usura em relação às instituições financeiras, embutidos no Decreto 22.626/33. Por segundo, coloca-se que a atual Constituição revogou delegação que se julgava implícita na Lei nº 4.595/64 do Banco Central para regulamentação dessa matéria, e com o art. 192 da CF/88, transferiu-a completamente para o Congresso para que regulamente a norma. Derradeiro sustentáculo é a aplicabilidade do dispositivo constitucional do § 3º do art. 192, para limitar os juros em 12% a.a. Outrossim, as práticas usurárias poderão também ser atribuídas às instituições financeiras.

O direito brasileiro não autoriza a convenção de juros acima da taxa legal, o que não se deve confundir com a cumulação de juros e correção monetária (35).

Com efeito, outro enfoque, afirmando com a autoridade merecida pelo enunciado 121 da Súmula do STF, é a vedação do anatocismo consubstanciado na capitalização dos juros, ainda que expressamente convencionado. Assim julgou o Colendo STJ: "CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS - É vedada, inclusive para instituições bancárias, salvo nas hipóteses expressas em lei. Recurso especial conhecido e provido, em parte" (36).

Isto não quer dizer que a lei não possa estipular a capitalização como essencial ao acessório contratual dos juros. É o caso da Cédula de Crédito Rural, regulamentada pelo Decreto-Lei nº 167/67, que em seu art. 5º faculta ao financiador a capitalização dos juros, lógico que dentro dos limites constitucionais (37). Curioso notar que a mesma disposição não é encontrada no art. 5º do Decreto-Lei 413/69, que regula a Cédula de Crédito Industrial, afastando-se a possibilidade de capitalização, sem que se caracterize a usura e até mesmo as violações às disposições do CDC.

4. CONCLUSÕES

Após a sintética discriminação dos contornos atuais dos juros, e em sede conclusiva, resta apresentar a importância de uma correta aplicação do instituto, máxime em se tratando de uma economia potencialmente em estabilização.

Admitir que sejam utilizadas as elevadas taxas que as instituições financeiras estão fazendo incidir sobre os contratos de financiamento, além de ilegal (face aos preceitos analisados) e anulável, é servir de conduta geradora de ilícito perfeitamente reparável e com fundamento no art. 1.531 do Código Civil e o CDC (arts. 39 e 51). Está autorizada, até mesmo, a revisão das cláusulas pactuadas abusivamente, conformando-as à realidade pelo desaparecimento das circunstâncias objetivas que conferiam suporte à relação jurídica de equivalência (teoria da imprevisão) (38). Assim é que o Judiciário deve aplicar as regras jurídica corretamente interpretadas em sua teleologia e no contexto social inserido, alheio aos azares do Poder Executivo e aos temores de uma sociedade viciada na ciranda financeira de usura.

As empresas, ao contrário do que entende o Prof. FÁBIO KONDER COMPARATO (39), têm uma função social a cumprir, aliada à produção e seus consectários de projeção na sociedade. Contudo, a especulação disfarçada obliquamente nos juros, defendida por muitos doutrinadores e julgadores, é o perfeito reconhecimento de conversão do capital produtivo em capital exclusivamente especulativo, causando a quebra da atividade produtiva.

5. BIBLIOGRAFIA

ALVES, VILSON RODRIGUES. Responsabilidade Civil dos Estabelecimentos Bancários. Campinas: Bookseller, 1996.
 
 

ASCARELLI, TULLIO. Teoria Geral dos Títulos de Crédito. 2ª ed. Trad. Nicolau Nazo. São Paulo: Saraiva: 1969.
 
 

A Constituição na visão dos Tribunais: interpretação e julgados artigo por artigo. Brasília: Tribunal Regional Federal da 1ª Região, Gabinete da Revista. São Paulo: Forense, 1997.
 
 

BOLETIM CARTA MAIOR. nº 2/3 - fevereiro-março/97. p. 2.
 
 

CALDAS, PEDRO FREDERICO. As Instituições Financeiras e a Taxa de Juros. Revista de Direito Mercantil. nº 101. janeiro-março/1996. p. 76.
 
 

CANOTILHO, J.J. GOMES. Direito Constitucional. 5ª ed. Coimbra: Almedina, 1992.
 
 

CARBONNIER, JEAN. Derecho Civil. Tomo I. vol. I. Disciplina General y Derecho de las personas. Barcelona: Bosh, 1960.
 
 

CARNELUTTI, FRANCESCO. La Prova Civile. Roma: Athenaeum, 1915.
 
 

COELHO, FÁBIO ULHOA. Código Comercial e Legislação Complementar Anotados. São Paulo: Saraiva, 1995.
 
 

COMPARATO, FÁBIO KONDER. Estado, empresa e função social. Revista dos Tribunais. Outubro de 1996. vol. 732. p 38.
 
 

CUNHA GONÇALVES, LUIZ DA. Princípios de Direito Civil Luso-Brasileiro. São Paulo: Max Limonad, 1951.
 
 

DINAMARCO, CÂNDIDO RANGEL. Intrumentalidade do Processo. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 1993.
 
 

LARENZ, KARL. Base del Negocio Juridico y Cumplimiento de los Contratos. Trad: Carlos Fernandez Rodrigues. Madrid: Revista de Derecho Privado, 1956.
 
 

MARTINS, ADRIANO KALFELZ. Dos Efeitos das Normas Constitucionais Programáticas. Revista dos Tribunais. vol. nº 715 - maio de 1995 - p. 7.
 
 

MIRANDA, JORGE. Manual de Direito Constitucional. tomo II. 2ª ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1988.
 
 

MIRANDA, PONTES DE. Tratado de Direito Privado. tomo XXIV. 3ª ed. 2ª Reimpressão. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1984.
 
 

NASCIMENTO, EDSOM BUENO. MENDES, ANTÔNIO. Estudo de Direito Monetário: a moeda e suas funções; obrigações monetárias; estipulação e indexação de obrigações monetárias. São Paulo: Pinheiro Neto Advogados, 1991.
 
 

NERY JUNIOR, NELSON. et alii. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. 4ª ed. São Paulo: Forense Universitária, 1995.

Código de Processo Civil Comentado. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1996.
 
 

PARIZATTO, JOÃO ROBERTO. Multas e Juros no Direito Brasileiro. Leme: Led, 1996.
 
 

PEREIRA, CAIO MÁRIO DA SILVA. Instituições de Direito Civil. vol. II. 6ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981.
 
 

REALE, MIGUEL. Filosofia do Direito. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 1965.
 
 

RODRIGUES, SILVIO. Direito Civil. Parte Geral das Obrigações. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 1977.
 
 

SANDRONI. Novo Dicionário de Economia. 2ª ed. São Paulo: Best Seller, 1994.
 
 

SILVA, JOSÉ AFONSO. Curso de Direito Constitucional Positivo. 9ª ed. São Paulo: Malheiros, 1993.

Aplicabilidade das Normas Constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1968.
 
 

WEBER, MAX. Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. São Paulo: Guazelli & Cia Ltda, 1983.

Notas:

(1) Questões, aqui é adotada no sentido que lhe atribuiu CARNELUTTI (CARNELUTTI. La Prova Civile. Roma: Athenaeum, 1915. n. 3, pp. 16 ss.), considerando-se ponto de fato ou de direito controvertido na demanda judicial.

(2) Instituições jurídicas consideram-se os conjuntos de normas jurídicas de mesmo objeto, compreendidas por uma série de relacionamentos sociais dirigidos para o mesmo escopo (nesse sentido CARBONNIER. Derecho Civil. Tomo I. vol. I. Disciplina General y Derecho de las personas. Barcelona: Bosh, 1960).

(3) A inferência é feita ao art. 192, § 3º da Constituição Federal. Trata-se de norma objeto de discussão na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4-7-DF, em acórdão da lavra do Min. SYDNEY SANCHES, que por maioria de votos (Publicado no DJU de 25/06/93, p. 012637 e RTJSTF. nº 147/170) entendeu ser norma de eficácia contida, não auto-aplicável. Igual sentido teve a apreciação do Mandado de Injunção nº 362-0-RJ (RT 732/140) pedido junto ao STF, e que em Acórdão relatado pelo então Min. FRANCISCO REZEK, Julgado em 01/08/94, por maioria, manteve o entendimento da necessidade de regulamentação da norma, com anotação de mora do legislativo e exortação a que legisle, conforme manda a CF/88 (aliás, cabe notar que até esta data a matéria não foi regulamentada pelo Congresso, e jocosamente, infirma-se mais uma vez a necessidade de um Mandado de Injunção para regulamentar o próprio Mandado de Injunção). Entretanto, com o devido respeito, esse trabalho tentará demonstrar, oportunamente, a prejudicialidade do texto constitucional que existiu na decisão do Excelso Pretório, reconhecida até pelos Ministros que votaram dissidentemente em referidos julgados.

(4) De se notar que o objeto material do estudo se assemelha, aparecendo distinção científica justamente no objeto formal e a especial maneira com que a matéria é apreciada, consoante a lição de MIGUEL REALE (REALE. Filosofia do Direito. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 1965. p. 68).

(5) SANDRONI. Novo Dicionário de Economia. 2ª Ed. São Paulo: Best Seller, 1994. p. 180.

(6) SANDRONI. op. cit. p. 180.

(7) No mesmo sentido escreve PEDRO FREDERICO CALDAS, em artigo publicado na Revista de Direito Mercantil (CALDAS. As Instituições Financeiras e a Taxa de Juros. Revista de Direito Mercantil. nº 101. janeiro-março/1996. p. 76).

(8) SILVIO RODRIGUES. Direito Civil. Parte Geral das Obrigações. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 1977. p. 315). No mesmo sentido se posiciona PONTES DE MIRANDA, definindo, ainda, dois elementos de composição dos juros: valor da prestação e tempo, ambos se imbricando na composição do quantum a ser instituído como juros da prestação (PONTES DE MIRANDA. Tratado de Direito Privado. tomo XXIV. 3ª ed. 2ª Reimpressão. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1984. p. 15).

(9) O eminente civilista carioca CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, alude e refuta a possibilidade de conversão dos juros em obrigação principal, alegando que aparentemente teria caráter de obrigação principal, mas o seu desprendimento de uma obrigação anterior pressuposta não lhe retira a natureza acessória. "Eventualmente pode desprender-se do principal, mas juridicamente não teria explicação sem ele. Como fruto civil, recebe o tratamento que o direito dá aos frutos" (CAIO MÁRIO. Instituições de Direito Civil. vol. II. 6ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981. p. 111). Contudo, o juro poderá ser o objeto de uma obrigação vinculativa autônoma, momento em que perderá sua natureza de juros, para ser quantia pactuada entre as partes. Repare-se que não há obrigação pressuposta geradora do acessório.

(10) No próximo tópico (Estado das Questões) será amplamente discutida a possibilidade de livre pactuação acima do limite constitucional do art. 192, §3º da CF/88, além de se observar a capitalização. Desde já se discorda de PONTES DE MIRANDA, que nega vigência ao art. 4º do D. 22.626/33 caso não haja mora anterior à citação que forma a relação processual e interpela o devedor, constituindo a mora (PONTES DE MIRANDA. op. cit. p. 29). Acredita-se, com toda venia, que o dispositivo sob comento também tem aplicabilidade no caso suscitado, porquanto seja norma clara, incidente e determinante de interesses públicos dominantes.

(11) CAIO MÁRIO arrola alguns casos de juros compensatórios por lei fixados, dentre outros: devidos pelo mandatário ao mandante sobre as somas que a este cabia entregar ou dele recebeu, desde o momento em que houve o abuso de direito (art. 1.303 do CC); somas adiantadas pelo mandatário, para execução do mandato, vencem juros, desde a data do desembolso, como dispõe o art. 1.311 do CC (CAIO MÁRIO. op. cit. p. 111). Por outro lado, a jurisprudência do pretório tem fixado casos em que incidem juros compensatórios, cumulados com moratórios, como por exemplo na desapropriação (Enunciados nº 12, 69, 70, 102 e 113 da Súmula do STJ).

(12) SERPA LOPES apud CAIO MARIO, op. cit., p. 115. Também merece referência e consulta PONTES DE MIRANDA e sua doutrina acerca de aspectos de fluência e contagem dos juros moratórios, conferindo especial relevo à constituição em mora através de processo judicial e fluência a partir da citação, que no Direito pátrio também teria a natureza interpelatória (PONTES DE MIRANDA. op. cit. p. 25).

(13) Trata-se de presunção jure et de jure, advinda do dispositivo dos art. 252 do Código Comercial e do art. 944 do Código Civil.

(14) Somente para exemplificar, pode-se colocar o Arts. 39, V e 51, IV do CDC, além da D. 22.626 de 07/04/33 e a posterior Lei nº 1.521/51, ambos vedando a prática da usura.

(15) Os dados mais recentes demonstram que as taxas de juros das instituições financeiras nacionais são das mais elevadas do mundo, com detenção de fatia de renda nacional não igualada em nenhum país desenvolvido (14% do PIB, em 1993, contra 6% a 7%, em média, das economias da OCDE (Boletim Carta Maior. nº 2/3 - fevereiro-março/97. p. 2). Além disso, o "spread" (diferença entre a taxa de juros que o sistema financeiro paga a quem aplica o dinheiro, e a taxa que cobra nos empréstimos) é demasiadamente alto e causador de desequilíbrios na relação contratual.

(16) Vide nota nº 5. No mesmo sentido: RT 713/240 e 715/301.

(17) Os pareceres encontram-se consolidados na Revista de Direito Público nº 88, outubro-dezembro/88, p. 147 a 189 e Revista de Direito Público nº 89, janeiro-março/89, p. 63 a 86.

(18) TARS - Apelação Cível nº 196.018.311 - 3ª Câm. Cível - Cruz Alta; Rel. Juiz GASPAR MARQUES BATISTA. j. 23.10.96. REVISTA JURÍDICA Síntese nº 236 - jun/97. p. 78, assim ementada: "A norma contida no § 3º, do art. 192 da CF é auto-aplicável, não estando os Tribunais inferiores obrigados a seguir a mesma linha de entendimento do STF, por ofensa ao princípio da independência do juiz, mesmo ante a EC 03".

(19) Em primeira instância exsurgem decisões que ordenam a limitação, como pode ser observado no dispositivo da sentença da lavra Juiz Titular da 2ª Vara Cível da Comarca da Araçatuba, CLÓVIS POLETO, nos autos do processo nº 1469/95, publicada no DOE (Foro do Interior) no dia 04/12/96, declarando-se a nulidade das cláusulas contratuais que fixam juros superiores aos 12% permitidos. Também nesse sentido, o juiz ÉLCIO TRUJILLO, proferiu sentenciamento nos autos do Proc. nº 1470/96, que tramita perante a 2ª Vara Cível da Comarca de Franca, reconhendo a auto-aplicabilidade do dispositivo (sentença publicada na Internet: http:\\www.teiajuridica.com).

(20) Sobre o princípio da unidade da Constituição v. J.J. GOMES CANOTILHO. Direito Constitucional. 5ª ed. Coimbra: Almedina, 1992. p. 197.

(21) Consoante entendimento do constitucionalista JORGE MIRANDA (MIRANDA. Manual de Direito Constitucional. tomo II. 2ª ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1988. p. 219 e 220). Também CANOTILHO, em seu gênio, preceitua: "Como directivas materiais permanentes, elas vinculam positivamente todos os órgãos concretizadores, devendo estes tomá-las em consideração em qualquer dos momentos da actividade concretizadora (legislação, execução, jurisdição)" (CANOTILHO. op. cit., p. 190).

(22) Nesse sentido, e defendendo a auto-aplicabilidade do § 3º do art. 192: ADRIANO KALFELZ MARTINS. Dos Efeitos das Normas Constitucionais Programáticas. Revista dos Tribunais vol. nº 715 - maio de 1995 - p. 7).

(23) CANOTILHO. op. cit. p. 190.

(24) JOSÉ AFONSO DA SILVA. Aplicabilidade das normas constitucionais. São Paulo: RT, 1968. p. 150.

(25) Sobre a vinculação das bases de concretização do direito e a aplicabilidade direta da normas-fim, CANOTILHO doutrina: "Além de constituírem princípios e regras definidoras de directrizes para o legislador e a administração, as normas programáticas vinculam também os tribunais, pois os juízes tem acesso à constituição, com o conseqüente dever de aplicar as normas em referência (por mais geral e indeterminado que seja o conteúdo) (...)" (CANOTILHO, op. cit., p. 193). Seguindo a orientação: JOSÉ AFONSO DA SILVA. Curso de Direito Constitucional Positivo. 9ª ed. São Paulo: Malheiros, 1993. p. 703 e NELSON NERY JÚNIOR et alii. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. 4ª ed. São Paulo: Forense Universitária, 1995. p. 375.

(26) O Ministro MARCO AURÉLIO também se posicionou nesse sentido através de Acórdão por ele lavrado e que julgou Recurso Extraordinário (STF, 2ª T., RE 183955-4-RS, rel. Min. MARCO AURÉLIO, j. 15.12.1994, DJU 10.8.1995, p. 23617)

(27) (TARS - autos nº 189.078.439 - 1ª C. - rel. Juiz LUIZ FELIPE AZEVEDO GOMES - j. 10.10.89 - Fonte: REVISTA JURÍDICA), Síntese nº 152. p. 81). Com mesma orientação o respeitado TARS teve outra decisão publicada na RT 683/157.

(28) Julgamento em 04.04.90, publicação JB 158/287.

(29) Assim também se posiciona JOSÉ AFONSO DA SILVA (JOSÉ AFONSO. Curso... op. cit. p. 704), entendendo, ainda, que os juros reais "são aqueles que constituem valores efetivos, e se constituem sobre toda desvalorização da moeda. Revela ganho efetivo e não simples modo de corrigir desvalorização monetária". Em sentido contrário: PARIZATTO. Multas e Juros no Direito Brasileiro. Leme: LED, 1996. p. 79), inclusive apresentando ementa do STJ em que se prevê permissão ao CMN para fixação das taxas acima dos 12%.

(30) Somente a título de ilustração, por demais simplória, é importante apresentar as três principais formas de cálculos dos juros: a.) simples; b.) compostos (contam-se novos juros dos juros já contados, capitalizando-os) Ex. 1544 do CC. Tomando como hipótese um período de incidência de juros de 10 meses, sob uma taxa de 1% ao mês, e capital tomado de R$ 1.000,00, teremos: a.) Obtenção dos juros simples: 10% X 1.000,00 = 100,00. Aplicado sobre o capital = R$ 1.100,00. b.) Compostos: 10% em 10 meses resultam = 10,4622 X 1.000,00 = 104,62. Aplicado sobre o capital = R$ 1.104,62.

(31) CAIO MÁRIO, op. cit., p. 112, que inclusive faz remissão a Santo Tomás que condenou a usura à máxima peccat contra iustitiam. De se notar, contudo, que a coibição das práticas usurárias estão presente nos países de tradição romano-germânica. Isto não ocorre, por outro lado, naqueles em que impera a ética capitalista protestante advinda da Reforma (MAX WEBER. Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. São Paulo: Guazelli & Cia Ltda, 1983. p. 29). Também nesse sentido: PONTES DE MIRANDA. op. cit. p. 18, p. 43, § 2.896 - p. 46).

(32) ASCARELLI. Teoria Geral dos Títulos de Crédito. 2ª ed. Trad. Nicolau Nazo. São Paulo: Saraiva: 1969. p. 8. nota 6. Exata justificação da coibição da usura apresenta CUNHA GONÇALVES (Princípios de Direito Civil Luso-Brasileiro. vol. II. São Paulo: MAX LIMONAD, 1951. p. 983).

(33) Nesse sentido: TARS - 4ª Cam. Cível - Ap. Civ. nº 194184883 - Rel. Juiz MARCIO OLIVEIRA PUGGINA. j. 10.11.94, com a seguinte ementa: "CONTRATO BANCÁRIO - JUROS REMUNERATÓRIOS - LIMITE LEGAL - LEI DE USURA - DESATUALIDADE DA SÚMULA 596. Lei 4.595. A lei 4.595 não excepciona o Dec. 22.626. A Súmula 596 tinha aplicação histórica ao período em que o processo inflacionário não dispunha do mecanismo da correção monetária". No mesmo sentido: TARS - Ap. Cível nº 196.004.204 - 4ª Cam. Cível - Rel. MARCIO OLIVEIRA PUGGINA. j. 11.04.96 - REVISTA JURÍDICA, Síntese vol. 229 - novembro/96 - p. 85).

(34) Interpretação do art. 2º da Lei de Introdução ao CC, especialmente o § 1º e § 2º. Este último permite dizer que a Lei nº 4.595/64 contém disposições gerais que não revogaram os dispositivos especiais do Decreto 22.626/33. Aliás, somente para ilustração, a esse Decreto tem a força de Lei, porquanto tenha sido editado durante o regime provisório de Getúlio Vargas e essa espécie de norma se conferia a força de lei.

(35) STJ - Ac. 4ª Turma do STJ, no REsp. 1.511-GO - Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO - DJU 5.3.90.

(36) STJ - 3ª T. - REsp. nº 49.877-SP - Rel. Min. EDUARDO RIBEIRO - j. 09.10.1995 - v.u. ementa. Com mesmo entendimento: RSTJ 22/197, RSTJ 76/278.

(37) É importante, por outro lado, demonstrar o entendimento de dois julgados do E. Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul: "EXECUÇÃO - Transação confirmatória - Incidência de novação - Discussão possível do débito originário. A transação não implica novação quando simplesmente confirma a obrigação anterior. Aplicação do art. 1.000 do CC. Inexistindo novação, possível a discussão das parcelas integradas na transação. JUROS. Embora não auto-aplicável o art. 192, § 3º da CF, os juros são limitados a 12%, porque a Carta revogou a delegação ao Banco Central para regular essa matéria, que hoje é de competência exclusiva do Congresso Nacional. Arts. 22, 48, 68, § 1º, da CF e art. 25 do ADCT. Revogada a delegação, cai por terra a legislação anterior nessa parte - Lei 4.595 e Resoluções do BACEN, voltando a incidir a lei de Usura, que nunca foi revogada, apenas se entendia não aplicável. Enquanto não for editada pelo Congresso Nacional outra lei, ainda vige o Dec. 22.626. CAPITALIZAÇÃO MENSAL. É indevida quando se trata de crédito rural regulado pelo DL 167/67, aplicando-se, também, a Lei de Usura. MULTA. É ela devida quando a mora se evidencia, porém limitada a 10%, por aplicação da Lei de Usura e do CDC. COMPENSAÇÃO. Descabe pretender compensar quantias tidas como recebidas a menor pelo produtor junto à Cooperativa. Os embargos não se prestam a criar título condenatório, por possível em ação ordinária. Ausente título executivo, inviável qualquer compensação. Apelo provido, em parte (TARS - Ac. 195.037.338 - 5ª C. Cível - Rel. Juiz ALCEBÍADES PERRONE DE OLIVEIRA - j. 21.12.95). No mesmo sentido: TARS - EI nº 194.229.555 - 3ª Gr. Cível - Rel. Juiz JASSON AYRES TORRES - j. 26.05.95).

(38) LARENZ. Base del Negocio Juridico y Cumplimiento de los Contratos. Trad: Carlos Fernandez Rodrigues. Madrid: Revista de Derecho Privado, 1956. p. XXIX.

(39) COMPARATO. Estado, empresa e função social. Revista dos Tribunais outubro de 1996. vol. 732/38.
 
 

.....................................................