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Reflexões jurídicas
sobre títulos de crédito
Anderson Santos Moura
“Título de crédito é o documento necessário
para o exercício do direito, literal e autônomo , nele mencionado”.
O conceito formulado por Cesar Vivante é, sem dúvida,
o mais completo, afinal como disse Fran Martins “encerra, em poucas palavras,
algumas das principais características desses instrumentos (títulos de crédito)”.
Tal é a razão pela qual , segundo Fábio Ulhoa , “é aceita pela unanimidade
da doutrina comercialista” .
Os elementos fundamentais para se configurar o
crédito decorrem da noção de confiança e tempo. A confiança é
necessária, pois o crédito se assegura numa promessa de pagamento, e como tal
deve haver entre o credor e o devedor uma relação de confiança. A temporalidade
é fundamental, visto que se subentende que o sentido do crédito é , justamente
, o pagamento futuro combinado , pois se fosse à vista , perderia a idéia de
utilização para devolução posterior.
Para Fábio Ulhoa três são as características que
distinguem os títulos de crédito dos demais documentos representativos de
direitos e obrigações: primeiramente o fato dele referir-se unicamente a
relações creditícias, posteriormente por sua facilidade na cobrança do crédito em
juízo (não há necessidade de ação monitória) e, finalmente, pela fácil
circulação e negociação do direito nele contido.
Concordamos com a opinião do douto autor, porém
acrescentaríamos uma característica, que dá aos títulos de crédito o caráter de
seguridade e confiabilidade, que o torna capaz de atender aos interesses da
coletividade: o rigor formal, rigor este, que deve ter o documento para que
seja considerado um título de crédito. Afinal, caso ficasse a critério de cada
indivíduo o preenchimento do texto de tais escritos teríamos, segundo Fran
Martins, “milhares de válvulas abertas à exploração de terceiros e à
utilização da má-fé”
Assim resumiríamos suas características com três
palavras-chaves: o Formalismo, a Excutividade e a Negociabilidade
Quando comparamos, especificamente, um contrato
privado com um título de crédito, temos que o contrato, como instituto
consagrado pelo Direito Civil, detêm como pressupostos , alguns princípios
norteadores para que haja a eficácia jurídica , entre os quais : a autonomia
da vontade - em que as partes ao proporem um contrato devem fazer por
deliberação - , a capacidade das partes para contratar e objeto
lícito . Na prática, o contrato, devido a característica subjetiva das
partes, não se transfere por mera circulação, ou seja, o contrato não gera
efeitos se ocorrer circulação, pois este ato jurídico, fica adstrito as partes
contratantes . Aí está a primeira diferença entre este e o títulos de crédito,
haja visto , o último não necessitar , exclusivamente , de vontade das partes
devido seu caráter peculiar de negociabilidade , até porque , o título é uma
criação comercial , e como tal deve possuir caráter mercantil .
Outra diferença está , quando analisamos a prática
processual , afinal os contratos, de modo geral, necessitam de um processo
ordinário ( ação monitória ), em que o juiz conhece dos fatos e julga a “res
in iudicium deducta”, resultando num título executivo , enquanto que nos
títulos suprimi-se tal fase, pois já possuem no seu corpo o atributo de executividade
, o que facilita a perspectiva de reaver o crédito , além de permitir que
terceiros que tenham adquirido o título demande em caso de resistência de forma
mais eficaz.
Segundo Fran Martins “o art. 17 da Lei Uniforme de
Genebra sobre as Letras de Câmbio e Notas Promissórias consagra a regra da Inoponibilidade
de Exceções, de maneira que o obrigado em uma letra não pode recusar o
pagamento ao portador alegando suas relações pessoais como sacador ou outros
obrigados anteriores do título” . Fábio Ulhoa diz que “o executado em
virtude de um título de crédito não pode alegar, em seus embargos, matéria de
defesa estranha à sua relação direta com o exequente, salvo provando má-fé dele”.
Aqui devemos fazer uma ressalva, pois enquanto Fábio
Ulhoa diz que “o simples conhecimento, pelo terceiro, da existência do fato
oponível já é suficiente para caracterizar a má-fé”, Fran Martins considera
a mesma ser “caracterizada pelo fato de haver o terceiro agido
conscientemente em prejuízo do devedor, sendo, desse modo, insuficiente o
simples conhecimento para evidenciar a má-fé” .
Um dos princípios importantes que orientam os títulos
de crédito é o Princípio da Literalidade, segundo o qual, o que não está
contido no título, expressamente, não terá eficácia. Sendo assim, no caso de um
aval ser outorgado por um instrumento privado, este não terá nenhuma eficácia,
pois não gera vínculo jurídico com o título de crédito, já que como foi dito,
seria necessário que o seu conteúdo estivesse contido no próprio título.
Outro importante princípio é o Princípio da
Cartularidade, que nos dizeres de Fábio Ulhoa “é a garantia de que o
sujeito que postula a satisfação do direito é mesmo o seu titular, sendo, desse
modo, o postulado que evita o enriquecimento indevido de quem, tenha sido
credor de um título de crédito, o negociou com terceiros ( descontou num banco,
por exemplo )”. Como conseqüência temos que, não há possibilidade de
executar-se uma divida contida num título de crédito acompanhado, somente, de
uma xérox autenticada, afinal, com a simples apresentação de cópia autenticada
poderia o crédito, por exemplo , ter sido transferido a outra pessoa .
Daí o porquê de sempre que o advogado possuir o
título original, viável e fundamental, é que, após a protocolização da ação e a
ciência do advogado da parte “ex adversa”, através da citação, que
aquele pegue o processo já registrado e leve a um cartório de registros mais
próximo e autentique todas as páginas, bem como o recibo do cartório e a cópia
do mandado de citação e guarde em sua posse, pois ocorrendo qualquer
eventualidade, como por exemplo, a ação dos famosos “Advogados
Papa-Títulos”, provas documentais ajudarão na solução do problema .
A teoria mais importante relacionada aos títulos de
crédito é a Teoria de Vivante, que sustenta o duplo sentido da vontade.
Através de sua teoria, Vivante buscava explicar qual o ânimo do devedor quando
da entrega do título, de maneira que, para ele, existem duas vontades, uma
originária, de pessoalidade, com o credor principal, e uma outra que se
concretiza pela liberdade de circulação do crédito. Assim, em relação ao credor
principal existe uma relação contratual, e em relação a terceiros possuidores,
um fundamento na obrigação de firma, pois é através deste ato que expressa a
sua vontade de se obrigar.
Outras teorias importantes, que inclusive geram
debates, são a Teoria da Criação e a Teoria da Emissão. A
primeira diz que o direito deriva da criação do título através da assinatura,
enquanto a segunda diz que o direito deriva através da emissão voluntária do
título. A legislação brasileira não adotou nenhuma das teorias, procurando,
apenas, conciliar pontos importantes de ambas. A teoria da criação está
presente no art. 1506 do Código Civil ( “A obrigação do emissor subsiste,
ainda que o título tenha entrado em circulação contra a sua vontade” ) ,
enquanto a da emissão está presente no art. 1509 do mesmo instituto ( “A
pessoa injustamente desapossada de títulos ao portador , só mediante
intervenção judicial poderá impedir que ao ilegítimo detentor se pague a
importância do capital , ou seu interesse” ) .
A classificação mais importante dos títulos de
crédito é feita quanto a sua circulação, da seguinte maneira:
a) Títulos ao Portador, que são aqueles que
não expressam o nome da pessoa beneficiada. Tem como característica a
facilidade de circulação, pois se processa com a simples tradição.
b) Títulos Nominativos, que são os que possuem
o nome do beneficiário. Portanto, tem por característica o endosso em preto
c) Títulos à Ordem, que são emitidos em favor
de pessoa determinada, transferindo–se pelo endosso.
Para Vivante os títulos nominativos “distinguem-se essencialmente dos
títulos de crédito à ordem e do portador porque se transferem com o freio de
sua respectiva inscrição no Registro do devedor, que serve para proteger o
titular contra o perigo de perder o crédito com a perda do título” .
Para Fábio Ulhoa, porém, não há distinção entre
títulos à ordem a nominativos, pois ele vê na classificação tradicional uma
limitação aos títulos de créditos próprios, além de que não há alternativa para
os títulos com cláusula de “não à ordem”.
O estudo dos títulos de crédito é importantíssimo, dado sua praticidade, afinal, são largamente utilizados no cotidiano, pois contribuem para a melhor utilização dos capitais existentes , que , de outra forma , ficariam improdutivos em poder de quem não quer ou não deseja aplicá-los diretamente .
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
MARTINS, Fran; Títulos de Crédito – Rio de
janeiro: Forense, 2000.
COELHO, Fábio Ulhoa; Curso de Direito Comercial
– São Paulo: Saraiva, 2000.
Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/x/26/02/2602/> Acesso em: 12 de mai. de 2006.