Vinculação de sociedade comercial:
É necessária a aposição da qualidade de gerência por quem subscreve um
acto em nome da mesma ?
É comum verificarmos que num cheque, letra ou documento subscrito por
quem representa uma sociedade comercial, nem sempre é aposto o carimbo da
sociedade ou a expressão "o gerente".
Ora, nos termos do artº 260º, nº 4 do Código das Sociedades Comerciais
(CSC)"os gerentes vinculam a sociedade, em actos escritos, apondo a sua
assinatura, com indicação dessa qualidade".
Trata-se de uma questão relevante pois, nos casos em que se entenda que
falta essa indicação, é a sociedade parte ilegítima quer quando demandada (v.g.
em processo executivo) quer quando demanda terceiros.
Conforme refere Raul Ventura (Sociedades por Quotas, II, p. 171), a
assinatura com a firma como forma válida de vincular a sociedade por quotas,
constante dos artigos 29° e 30° da Lei das Sociedades por Quotas, foi
substituída pela assinatura dos gerentes, com menção dessa qualidade.
Na esteira da mais moderna jurisprudência (v.g., entre outros, acórdãos
do S.T.J., de 95.05.03 e de 88.03.09, BMJ 447/515 e 375°/385, respectivamente;
acórdãos da Relação de Coimbra, de 06.01.94, do Porto, de 08.07.94, C.J., XIX,
I, 5, XV, C.J., XIX, IV, 177, respectivamente e de Lisboa de 20.11.97, CJ, V,
p. 94), a norma do nº 4 do artº 260 do CSC visa proteger os interesses daqueles
que contratam com a sociedade, no sentido de poderem os mesmos estar seguros de
que quem contratou foi a sociedade e que será na esfera jurídica dela - que não
na dos gerentes - que radicam os direitos e obrigações assumidos. Ou seja, a
menção da qualidade de gerente destina-se a afirmar que o assinante não agiu em
nome próprio, mas em nome da sociedade.
Tem-se assim entendido que quando a assinatura esteja acompanhada da
firma social, aposta por carimbo da sociedade, ainda que sem a menção
"gerente" ou "a gerência", tal corresponde à identificação
da qualidade da respectiva assinatura (a saber, como gerente, pois só assinará
sob o carimbo / firma da sociedade quem, perante terceiros - e é isso que
interessa -, tem os respectivos poderes de representação e vinculação). Diz-se
a esse propósito que seria "intoleravelmente violento" - nesse caso -
(para usar a terminologia usada pelo último citado acórdão da Relação de
Lisboa) considerar que a sociedade executada não se teria vinculado validamente
só porque do título não constasse a simples expressão "gerente" ou
"a gerência".
O Tribunal da Relação do Porto tem seguido, também, precisamente, esta
jurisprudência. Assim, conforme constam publicados no sítio da Internet do TRP
(http://www.trp.pt), sob os nºs 664 e 509, "para que a assinatura do
gerente vincule a sociedade em documento escrito, basta a assinatura do mesmo
colocada por debaixo do carimbo identificativo da sociedade por quotas, assim
se cumprindo o nº 4 do art. 260º do C.S.C" e "A identificação da
sociedade no local destinado à indicação do titular da conta, não dispensa a
repetição da forma social junto à assinatura do respectivo gerente,
nomeadamente através do carimbo ou a aposição da palavra "gerente" ou
"gerência", para que quem o assina possa deixar de responsabilizar-se
pessoalmente. Ainda que o executado-embargante possa ser efectivamente legal
representante da sociedade comercial em nome da qual figura a conta do cheque
dado em execução, perante os princípios da literalidade e abstracção
incorporados no cheque, deve ser o mesmo responsabilizado pelo seu pagamento,
nos termos do art. 11.º da LUCH, se no local da assinatura não existir a menção
de que é feita na qualidade de gerente da sociedade".
Assim, concluímos que para a vinculação jurídica e cambiária de uma
sociedade, basta a aposição sobre a assinatura do gerente de carimbo da
sociedade ou a menção da qualidade de gerente.
Disponível
em http://www.verbojuridico.net/