Direito Comercial Autor : Sérgio Gabriel. Advogado militante na área empresarial em São Paulo, Professor Universitário nas disciplinas de Direito Empresarial, Direito do Consumidor, Direito Comercial e Prática Jurídica e membro da Comissão de Coordenação do curso de Direito da Universidade São Francisco, Coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da Universidade Cruzeiro do Sul, Membro do Fórum do Idoso Vítima de Violência. E-mail para contato: sergio.gabriel@ig.com.br.

 

(Artigo elaborado em 02 de setembro de 2001)

 

1. Introdução; 2. Previsão Legal; 3. Desrespeito aos princípios ; 4. Conclusão; 5. Bibliografia.

 

 

1. Introdução

 

Um assunto que muito tem sido discutido ultimamente é o da obrigatoriedade ou não da aceitação do cheque como forma de pagamento.

 

Muitos defendem que não podem os comerciantes se obrigar a efetivar a compra quando o único meio de que dispõe o consumidor para pagamento é o cheque, posição essa equivocada.

 

Para uma melhor compreensão do assunto, necessário se faz analisarmos algumas premissas básicas presentes nas relações mercantis e que contribuirão para a elucidação da vexata quaestio. Inicialmente, devemos lembrar que economicamente é o comércio o principal meio de circulação de riquezas e, que sem esta circulação, impossível será o desenvolvimento econômico de uma nação.

 

Ademais, os títulos de crédito, e entre eles incluí-se o cheque, tiveram seu aparecimento na idade média, para possibilitar o estímulo justamente da atividade mercantil, já que nem todas as pessoas dispunham de dinheiro em espécie para concretizar uma compra.

 

Ora, se foram os título de crédito criados justamente para alavancar as atividades dos comerciantes, e por conseqüência estimular a circulação de riquezas, claro está que esses títulos desenvolvem preponderante papel no desenvolvimento econômico mundial, como bem acentuou Fran Martins: “Com o aparecimento dos títulos de crédito e a possibilidade de circulação fácil dos direitos neles incorporados, o mundo na verdade ganhou um dos mais decisivos instrumentos para o desenvolvimento e o progresso”(1).

 

Talvez a falha dos que defendem a não obrigatoriedade da aceitação da cártula esteja na interpretação técnica do direito, sem considerar que a sua compreensão exige mais do que a simples técnica, como bem nos ensina o Professor Tércio Sampaio Ferraz Jr.: “Estudar o direito é, assim, uma atividade difícil, que exige não só acuidade, inteligência, preparo, mas também encantamento, intuição, espontaneidade. Para compreendê-lo é preciso, pois, saber e amar. Só o homem que sabe pode ter-lhe o domínio. Mas só quem o ama é capaz de dominá-lo rendendo-se a ele”(2).

 

2. Previsão Legal

 

Em se tratando de relação de consumo, submete-se à interpretação legal do assunto em tela, às determinações contidas na legislação consumerista.

 

Neste sentido, estabelece o artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor que: “é vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: (...) IX – recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação reguladas em lei especial”.

 

Vejam bem, o dispositivo citado estabelece que não pode o comerciante deixar de efetuar uma venda se o consumidor se dispuser ao pronto pagamento. Temos que pagamento, segundo o Moderno Dicionário da Língua Portuguesa: “é o cumprimento efetivo da obrigação exigível, pela realização da prestação; é o correspectivo em dinheiro, ou coisa de valor equivalente ao do objeto da compra e venda”(3).

 

Poderia o legislador, ter criado a restrição para que fosse obrigatória a venda quando do pagamento em dinheiro, mas não o fez, justamente para prestigiar os títulos de crédito tão importantes em nosso desenvolvimento econômico.

 

Ora, se o pagamento não exige que seja necessariamente em dinheiro, a recusa na aceitação do cheque configura a infringência por parte do comerciante do citado dispositivo, na medida em que recusando o título, e não dispondo de outro modo de pagamento, estará ele se recusando a vender.

 

Ademais, estabelece a Lei nº 7.357/85, também conhecida como Lei do Cheque, em seu artigo 1º, que: “o cheque contém (...) II - a ordem incondicional de pagar quantia determinada”, além da previsão de que é pagável á vista, considerando-se não-escrita qualquer menção em contrário, previsto no artigo 32 da mesma lei.

 

Assim sendo, em se tratando de um título que confere ordem de pagamento a vista, portanto servindo como forma hábil para pagamentos, e determinando a lei consumerista que não pode o comerciante se recusar a vender mercadoria quando se dispuser o consumidor ao pronto pagamento, por interpretação analógica, mister se faz à compreensão de que possui o cheque aceitação obrigatória no pagamento de compra e venda mercantil.

 

 

 

3. Desrespeito aos princípios

 

Considerando-se também, que a proteção do consumidor é garantia fundamental prevista na Constituição Federal, e que, a recusa da aceitação do cheque como forma de pagamento na compra e venda mercantil configura forma de discriminação ferindo os princípios fundamentais constitucionalmente previstos, temos que tal violação implica na corrosão do alicerce do sistema normativo pátrio.

 

É de se lembrar ainda, que a prática de discriminação fere o mais importante dos princípios constitucionalmente previstos que é o da Dignidade da Pessoa Humana, previsto no inciso III do artigo 1º da Carta Maior, bem explicado nas palavras do Professor José Afonso da Silva: “Dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida”(4).

 

Tal atitude discriminatória como já dissemos, fere da mesma forma o Princípio da Igualdade e também na lição do citado professor, temos que : “O dispositivo começa enunciando o direito de igualdade de todos perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. Embora seja uma declaração formal, não deixa de ter sentido especial essa primazia ao direito de igualdade, que, por isso, servirá de orientação ao intérprete, que necessitará de ter sempre presente o princípio da igualdade na consideração dos direitos fundamentais do homem”(5).

 

É de se verificar assim, que ao discriminar indistintamente o consumidor, o comerciante ferirá os princípios básicos que norteiam nosso ordenamento jurídico, e como ensina o ilustre Professor Celso Antonio Bandeira de Mello: “Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório mas a todo sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra. Isto porque, com ofendê-lo, abatem-se as vigas que o sustém e aluí-se toda a estrutura neles esforçada”(6).

 

4. Conclusão

 

Temos assim, que a recusa na aceitação do cheque, quando da efetivação de uma operação de compra e venda mercantil, implica em desrespeito a legislação do consumidor e fere os princípios mais básicos constitucionalmente previstos.

 

E não é só, da mesma forma que a legislação de defesa do consumidor considera infringência a recusa da venda quando o consumidor se dispuser ao pronto pagamento, a lei que define os crimes contra a economia popular, define em seu artigo 2º que: “são crimes desta natureza, I – recusar individualmente em estabelecimento comercial a prestação de serviços essenciais à subsistência; sonegar mercadoria ou recusar vende-la a quem esteja em condições de comprar a pronto pagamento”.

 

Com isso, é de se verificar que não se trata apenas de desrespeito a princípios ou mera infringência de dispositivo legal, trata-se também da prática de crime tipificadamente previsto em nosso ordenamento jurídico.

 

É natural, que como toda regra comportará suas exceções. Pois tem o cheque como requisito legal, o fato da identificação do sacador, ou seja, seu emissor. Desta maneira, somente o cheque emitido por pessoa física presente ao estabelecimento comercial, e na pessoa do comerciante, importará na obrigatoriedade que aqui defendemos, isto porque, só assim se fará à devida identificação do consumidor para a correta conferência dos dados e assinatura, restando necessária à apresentação de documento hábil com esta finalidade.

 

5. Bibliografia

 

FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito, São Paulo, Editora Atlas, 1991.

 

MARTINS, Fran. Títulos de Crédito, 13ª edição, volume I, Rio de Janeiro: Editora Forense, 1999.

 

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Elementos de Direito Administrativo, 2º edição, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991.

 

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, 12ª edição, São Paulo: Editora Malheiros, 1996.

 

______. Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Michaelis, São Paulo: Melhoramentos, 1998.

 

 

Notas :

 

1 - Títulos de Crédito, 13ª edição, volume I, Rio de Janeiro: Editora Forense, 1999, p. 5.

2 - Introdução ao Estudo do Direito, São Paulo, Editora Atlas, 1991, p. 25.

3 - Michaelis, São Paulo: Melhoramentos, 1998, p. 1527.

4 - Curso de Direito Constitucional Positivo, 12ª edição, São Paulo: Editora Malheiros, 1996, p. 106.

5 - obra citada, p. 187.

6 - Elementos de Direito Administrativo, 2º edição, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991, p.300.

 

 

Os artigos publicados são de responsabilidade de seus respectivos autores, não refletindo, necessariamente, a opinião do Farol Jurídico; vedada sua reprodução, total ou parcial, salvo, se com prévio consentimento do autor

 

 

 

® BuscaLegis.ccj.ufsc.br

Ação cambial

Autor : Rondinelli Santos de Matos Pereira. Estudante de Direito da Universidade Federal do

Ceará.

 

 

O presente trabalho versa sobre a Ação Cambial; ação esta que, através do rito executivo , enseja satisfazer a obrigação incorporada ao título de crédito, ora não cumprida espontaneamente.

 

Num primeiro momento, serão mostradas noções e características da ação cambial, seu objeto e a importância que possui, em se tratando de Direito Cambiário. Também serão apresentadas as modalidades de ação cambial (direta e regressiva), precedendo a análise das espécies de defesa do executado aceitas hodiernamente , sem esquecer de salientar a questão da inoponibilidade das exceções aos terceiros de boa-fé.

 

Já num segundo momento, receberão o merecido destaque a ação de anulação da cambial, a prescrição da ação cambial, bem como a ação de enriquecimento injusto.

 

Vale ressalvar que todos os tópicos desenvolvidos neste trabalho tiveram sua elaboração baseada na pesquisa bibliográfica, uma vez que foram consultadas as obras dos renomados doutrinadores a respeito do tema.

 

Finalmente, é bom que se diga que este trabalho objetiva apenas servir como incentivo para uma futura pesquisa mais aprofundada e detalhada acerca do assunto.

 

PRIMEIRA PARTE

 

1. Ação Cambial

 

1.1. Noção. Características

 

A ação cambial, no direito brasileiro, é uma ação executiva típica, já que a cambial(leia-se: letra de câmbio) de fato, integra o elenco dos títulos executivos extrajudiciais, enumerados no primeiro inciso do art. 585 da lei processual pátria: “ São títulos executivos extrajudiciais: I- a letra de câmbio, a nota promissória , a duplicata e o cheque...” Mesmo assim, em face do Decreto n° 2044, de 1908, e da Lei Uniforme de Genebra, não perde ela sua tipicidade, o que nos permite sustentar que sobrevive, nas suas peculiaridades, embora sujeita aos preceitos gerais do processo de execução moderno.

 

A ação deve ser proposta no lugar indicado para o pagamento da letra; se não constar, então no domicílio do principal devedor; no do sacado, se estiver aceita; e no do sacador em caso contrário.

 

A ação executiva cambiária decorre das relações cambiais; assim, não será cabível contra, por exemplo, o sacado que não aceitou a letra; ou contra o sacador que não fez provisão etc.

 

Por outro lado,a Lei permite, em razão da autonomia das obrigações cambiárias, que a ação seja proposta contra um, alguns ou todos os coobrigados, sem estar o credor adstrito à observância da ordem dos endossos.

 

Para o exercício da ação é necessária a apresentação da letra e em caso de exercício de direito de regresso contra os coobrigados, é indispensável, também, o instrumento de protesto.

 

O Decreto-Lei n° 7661, de 1945 (Lei de Falências) permite, no §1°, alínea 2, do art. 82, que as declarações de crédito, em que os títulos comprobatórios estiverem juntos a outro processo, poderão ser substituídos por certidões de inteiro teor, extraídas dos respectivos autos, dispensando-se a extração de cópia da letra.

 

1.2. Importância

 

A ação executiva é apontada como uma das grandes vantagens de que se revestem os títulos de crédito, como garantia da sua eficácia.

 

O Decreto n° 2044 conferiu a ação executiva às cambiais, no seu art. 49 e restringiu as defesas oponíveis ao credor, como será mostrado um pouco mais adiante.

 

A boa doutrina entende que a ação cambial é a executiva, e que por ela tem também o credor o direito de reclamar a importância que receberia pelo ressaque.

 

Estão providas as cambiais dessa característica forma processual de cobrança do título não pago, a qual, como se sabe, além de ser mais célebre que as ações ordinárias, inicia-se com a garantia de instância, por meio da penhora.

 

Trata-se, portanto, de verdadeiro benefício concedido ao credor, por título cambial, e nessa conformidade, inclusive, pode ele abrir mão, optando pela ação ordinária.

 

1.3. Objeto da ação cambiária

 

Em primeiro lugar, com a ação se pretende obter a importância da letra, que constitui o crédito nela incorporado. Em segundo, os juros e despesas de protesto, se tiver sido tirado.

 

A respeito da cláusula de juros, no dizer do prof. Rubens Requião, a Lei Uniforme inovou profundamente o direito cambiário brasileiro. O art. 5° permite ao sacador estipular na letra o pagamento de juros, mas apenas nas letras com vencimento à vista ou a tempo certo de vista, fluindo a partir da data do título. Nas demais letras, a dia certo ou a tempo certo de data, a cláusula reputa-se não escrita. Assim dispõe a lei porque nas primeiras não é possível contar os juros por dentro, previamente, como ocorre nas segundas.

 

O art. 48, §2°, dispõe, todavia, que o portador pode reclamar daquele contra quem exerce seu direito de ação, “os juros à taxa de 6% desde a data do vencimento”. Essa disposição legal vem excluir o princípio da vigência de juros legais desde a data do protesto por falta de pagamento. Pela Lei Uniforme, os juros moratórios passam a viger desde a data do vencimento independente do protesto.

 

Ficou revogada, conseqüentemente, a parte final do Decreto n° 22626, de 7 de abril de 1993, que dispunha que a “taxa de juros deve der estipulada em escritura pública ou escrito particular, e, não o sendo, entender-se-á que as partes acordaram nos juros de 6% ao ano, a contar da data da propositura da ação ou do protesto”. No direito cambiário novo, a taxa de juros legais passa a ser contada do simples vencimento da letra.

 

Essa taxa de 6% ao ano, expressamente fixada na Lei Uniforme, pode ser substituída pela taxa legal em vigor no território de qualquer dos países signatários da Convenção, conforme ressalva o art.13, Anexo II. O Governo brasileiro usou dessa ressalva, no Decreto n° 57663, muito embora a taxa legal vigente no Brasil seja também de 6% ao ano.

 

Por fim, podemos dizer que a pessoa que pagar a letra pode reclamar dos seus garantes a soma integral que pagou, os juros da dita soma, calculados à taxa de 6% ao ano desde a data do vencimento, e as despesas que tiver tido com o protesto.

 

1.4. Ação cambial direta

 

É sabido que a ação cambial pode ser proposta somente quando são exigíveis as obrigações cambiais e que pode ser movida contra todos quantos se obrigaram na letra. Ora, entre esses obrigados, alguns assumiram o dever de cumprir a obrigação de modo principal, ou seja, assumiram expressamente a obrigação de pagar a letra (aceitantes e seus avalistas) e outros o fizeram indireta e subsidiariamente, isto é, obrigaram-se a pagar o título no caso desse não ser pago pelo que se obrigou expressamente ou no caso da pessoa indicada para cumprir a ordem (sacado) recusar-se a acatá-la, não aceitando o título. Tais são os chamados obrigados indiretos ou regressivos - endossantes, sacador e seus avalistas.

 

Destarte, a ação cambial será direta quando proposta contra o aceitante ou seus avalistas. Contra estes últimos, pode o portador mover a ação, ainda mesmo que o título não tenha sido protestado na época do vencimento ou que não seja acionado o aceitante, uma vez que, entre avalista e avalizado, não há benefício de ordem pela simples razão de que as obrigações cambiárias são autônomas.

 

Se o avalista do aceitante, acionado ou não, paga a importância da letra, poderá ele agir contra o aceitante, por ser regressivo deste. Entretanto, se o aceitante paga, não pode, por sua vez, voltar-se contra o seu avalista, já que este, apesar de ser também obrigado principal, em relação ao aceitante é obrigado regressivo.

 

É válido acrescentar que, para propor a ação direta terá o portador que juntar a letra vencida à petição inicial.

 

1.5. Ação cambial regressiva

 

Chama-se de ação cambial regressiva aquela que o portador da cambial protestada move contra um, alguns ou todos os obrigados que lhe são anteriores para deles haver a soma da letra, acrescida das despesas que realizou para a satisfação do seu crédito.

 

A Lei Uniforme, a esse respeito, em seu art.47, 2ª al., esclarece que “ a ação cambial regressiva pode ser proposta contra um, alguns ou todos os coobrigados, sem estar( o credor) adstrito à ordem por que eles se obrigaram” . Isso significa que, tendo os obrigados cambiais assumido obrigação solidária , poderá o credor agir contra todos conjuntamente, ou contra alguns, ou apenas contra um, devendo os escolhidos satisfazerem a obrigação no modo em que foi proposta a ação. E diz mais a Lei : “ a ação intentada contra um dos coobrigados não impede acionar os outros, mesmo os posteriores àquele que foi acionado em primeiro lugar” (art.47,3ª al.), dando a entender que existe a faculdade de que seja acionado um outro obrigado depois de intentada a ação contra um que lhe era anterior, desde que esse primeiro acionado não tenha quitado a dívida, donde se conclui que o que libera de responsabilidade os coobrigados posteriores é, tão somente, o pagamento por parte de um obrigado anterior, não a simples ação movida contra esse , ao final, sem êxito.

 

Para que seja proposta a ação regressiva deverá o portador juntar o título vencido , o instrumento do protesto ou a sentença declaratória da falência , quando o protesto não é necessário.

 

2. A defesa do executado

 

O art.51 da Lei nº 2044 é taxativo ao declarar que : “ na ação cambial , somente é admitida defesa fundada no direito pessoal do réu contra o autor, em defeito de forma do título e na falta de requisito necessário ao exercício da ação”.Assim fez o legislador com um único objetivo : proteger, em sua acepção mais ampla , o direito de crédito representado pelo título.

 

2.1. Direito pessoal do réu contra o autor

 

Trata-se de exceções que dizem respeito não à obrigação cambiária , mas à pessoa do credor. São , portanto, exceções de caráter pessoal ,individual, que o escolhido para cumprir a obrigação cambial pode opor àquele que exige a prestação.

 

As defesas fundadas no direito pessoal do réu contra o autor referem-se basicamente a erro, dolo, fraude ou violência; causa ilícita ou sem causa; satisfação no todo ou em parte da quantia devida; compensação, novação etc. Como é óbvio, a alegação terá que ser provada e só depois de reconhecida e aceita judicialmente é que constitui motivo impeditivo de fazer o réu o pagamento da soma cambial ao autor, como era , em princípio , a sua obrigação.

 

2.2. Defeito de forma do título

 

Sabendo que a letra é um título formal ,que exige para a sua perfeição o cumprimento exato de certos requisitos ( Lei Uniforme, art. 1º), e verificada a ausência de qualquer desses requisitos essenciais, dizemos que o escrito não vale como letra de câmbio e, dessa maneira, há um defeito de forma que poderá ser argüido como defesa do réu perante uma ação cambial.Tais defeitos podem ser de duas ordens : defeitos de forma extrínseca (se revelam materialmente na redação do título) e os defeitos de forma intrínseca ( que afetam a obrigação cambial, em sua origem) . São dessa última ordem a incapacidade, a falsidade e a falta ou defeito do mandato ou representação legal , do obrigado.

 

2.3. Falta de requisito para o exercício da ação

 

A defesa com fundamento na falta de requisito para o exercício da ação é de natureza processual; diz respeito à ação e não ao título propriamente dito. Nesse sentido, arrolam os doutrinadores, dando exemplo, o caso da não legitimação do autor; a não exibição da própria cambial; o não vencimento do título; a falta ou irregularidade do protesto, quando se tratar de ação regressiva; e a prescrição da ação cambial.

 

Além das defesas retrocitadas, também podem ser invocadas as específicas do processo (como coisa julgada, litispendência, falta de capacidade processual etc.) e a exceção de dolo, uma vez que, nas palavras de Waldirio Bulgarelli, o Direito não compactua com a fraude, que tudo corrompe.

 

3. Inoponibilidade de exceções aos terceiros de boa fé

 

Esse é o princípio básico que informa o Direito Cambiário, consagrado, entre nós, pela Lei Uniforme (art.17) : “ As pessoas acionadas em virtude de uma letra não podem opor ao portador as exceções fundadas sobre as relações pessoais delas com o sacador ou com os portadores anteriores, a menos que o portador ao adquirir a letra tenha procedido conscientemente em detrimento do devedor”.

 

O dispositivo transcrito só vem a corroborar a idéia de que o Direito está sempre ao lado dos portadores de boa-fé.

 

SEGUNDA PARTE

 

4. A ação de anulação da cambial

 

Caso a cambial venha a ser extraviada ou destruída total ou parcialmente, o portador, nessa situação , impossibilitado de haver o crédito incorporado ao título, pode entrar com o pedido de anulação da cambial, procedimento este descrito pelo Decreto nº 2044,em seu art.36, que, conforme entende Requião, continua em pleno vigor, dado o silêncio da Lei Uniforme acerca do assunto.

 

Nesse contexto,é importante ver que a ação de anulação da cambial é distinta da ação de anulação e substituição de títulos ao portador(CPC,art.907 e ss.), posto que a ação anulatória de cambial enseja ao portador obter uma sentença de anulação que terá força de execução do direito contido no título. Já a ação de anulação e substituição de títulos ao portador terá como desfecho a declaração da caducidade do título, ordenando o magistrado ao devedor que lavre outro em substituição, nos termos da sentença. É de se notar também que tendo a Lei Uniforme vedado a emissão da letra de câmbio ao portador, e como também as notas promissórias não podem ser emitidas ao portador, obviamente, as cambiais não se enquadrariam na ação de anulação e substituição de títulos ao portador.

 

5. A prescrição da ação cambial

 

Fran Martins, em sua obra “Títulos de Crédito” (vol.I) nos diz que “...prescrição é a perda da ação que é atribuída a um direito, motivada pela inércia do titular do direito num certo espaço de tempo.”

 

Em se tratando de títulos cambiários , os prazos prescricionais são consideravelmente curtos,estabelecidos que foram pela Lei Uniforme (art.70) : a) as ações contra o aceitante prescrevem em três anos a contar da data do vencimento; b) as ações do portador contra os endossantes e contra o sacador prescrevem em um ano, a contar da data do protesto feito em tempo útil, ou da data do vencimento , se se trata de letra com cláusula “sem despesas”; c) as ações dos endossantes uns contra os outros e contra o sacador prescrevem em seis meses a contar do dia em que o endossante pagou a letra ou em que ele próprio foi acionado.

 

A prescrição pode ser interrompida, mas só produz efeitos em relação à pessoa contra quem foi dirigida (art.71,Lei Uniforme).Isto se deve ao fato de na solidariedade cambial, mesmo sendo todos os signatários do título solidariamente responsáveis para com o portador , o que paga tem o direito de receber a totalidade da dívida do obrigado que lhe é anterior, sendo exonerados do pagamento os obrigados posteriores ao pagante(Lei Uniforme,art.49).

 

Por último vale a ressalva, seguindo o entendimento do STF (Súmula n° 153), de que “ simples protesto cambiário não interrompe a prescrição”.

 

6. A ação de enriquecimento injusto

 

Tendo seu conteúdo convalidado pelo art.15,do Anexo II da Lei Uniforme,o art.48 do Decreto nº 2044,sobre esse assunto,nos diz que: “Sem embargo da desoneração da responsabilidade cambial, o sacador ou o aceitante fica obrigado a restituir ao portador, com os juros legais, a soma com a qual se locupletou à custa deste.”

 

Nesse caso, trata-se de ação não cambial, que visa ressarcir o portador do prejuízo que tenha tido pelo não-recebimento da soma cambial. A ação do portador,portanto, para esse fim, é a ordinária.

 

Nesta ação, baseada nos princípios gerais da eqüidade , o autor deve provar o locupletamento à sua custa por parte do réu,isto é : a) o enriquecimento do réu; b) o seu empobrecimento; c) a falta de justa causa; d) a relação de causalidade entre o enriquecimento e o empobrecimento.

 

Nesse contexto, aspecto bastante debatido nos tribunais consiste em saber se basta a simples apresentação do título cambiário para comprovação do prejuízo experimentado pelo autor e o enriquecimento sem causa do réu.

 

Embora não seja posicionamento pacífico, tende-se a aceitar a idéia no sentido positivo,ou seja, de que a prova do prejuízo é feita pelo portador com a mera exibição do título não pago.

 

CONCLUSÃO

 

Conhecendo bem a diferença que há entre o processo de conhecimento (que visa à formulação da regra jurídica para disciplinar o caso em litígio) e o processo de execução (que tem por finalidade fazer valer, na prática, aquela norma jurídica ditada), percebemos o quão importante é o rito executivo para a ação cambial, uma vez que a lei confere eficácia executiva a certos títulos, ao considerar que neles já se acha contida a norma jurídica disciplinadora das relações entre as partes.

 

Tudo isso se justifica, na verdade, com a intenção do Direito de ver satisfeito o crédito em questão, da maneira mais célere possível; celeridade esta que deveria, com certeza,se fazer presente em toda a atividade processual.

 

 

Os artigos publicados são de responsabilidade de seus respectivos autores, não refletindo, necessariamente, a opinião do Farol Jurídico; vedada sua reprodução, total ou parcial, salvo, se com prévio consentimento do autor

Retirado de: www.faroljuridico.com.br

 

 

 

 

É