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Questões de Direito Bancário

na recente jurisprudência do TJSC

 

 

Des. JOÃO JOSÉ RAMOS SCHAEFER

1o Vice-Presidente do TJSC

 

 

 

Sumário

- Notas sobre a especialização das Câmaras. - As questões mais discutidas. – O arrendamento mercantil e a cobrança do VRG - A vinculação dos contratos ao dólar. - Permanência do bem em poder do devedor acionado judicialmente. - Contrato de abertura de crédito rotativo e crédito fixo. - A demonstração do débito nos contratos de crédito fixo. - Possibilidade de emenda da inicial da execução. - Aplicação aos contratos bancários do CDC. - Controvertido o entendimento na 3a Câmara Civil em relação à aplicação do CDC a contratos anteriores à sua vigência. - Admissibilidade do depósito por consignação na revisional. - Comissão de permanência. - Inacumulabilidade com a correção monetária. - A capitalização de juros. - A taxa de juros. Auto-aplicabilidade ou não do art. 192, § 3o da CF. - Inscrição do devedor no cadastro do SERASA e afins. - A TR como fator de correção monetária. - A cláusula de mandato. – A prisão civil. - Outras questões também relevantes. – Conclusão.

 

 

 

Notas sobre a especialização das Câmaras

 

A especialização das Câmaras Civis no Tribunal de Justiça de Santa Catarina era uma aspiração antiga, até mesmo como fórmula de atenuar, pela redução do espectro de temas a cargo de cada Câmara, a notória insuficiência do número de membros do Tribunal frente ao crescimento vertiginoso dos recursos aportados ao órgão.

No ano 2.000, elevado de 27 para 30 o número de Desembargadores, foi possível instituir a especialização, transformando as quatro (4) Câmaras Civis então existentes, cada uma com quatro (4) integrantes e competência ampla em todas as matérias não criminais, em seis (6) Câmaras, cada uma com três (3) membros, sendo duas (2) Câmaras de Direito Civil, duas (2) de Direito Comercial e duas (2) de Direito Público.

Os julgamentos – a especialização começou na verdade em janeiro de 2001 – se tornaram mais céleres, porque não havia, em cada sessão a multiplicidade de temas, de Direito Administrativo, Civil (Família, Posse, Propriedade, Coisas, Sucessões) e Comercial (execuções de contratos, de cambiais, falências, sociedades, etc) e questões processuais relacionadas àqueles três ramos do Direito, mas competência definida de cada grupo de duas Câmaras, em temas ou de Direito Civil, de Direito Comercial ou de Direito Público em Geral.

Tendo presidido a 4a Câmara Civil por cerca de 10 anos, de cujo período guardo recordações as mais gratas, pelo ambiente cordial que ali sempre reinou e pela notável contribuição que seus demais membros sempre ofereceram para o perfil da jurisprudência da Corte, decidi, após 18 meses dela afastado pelo exercício das funções de 1o Vice-Presidente, “revisitá-la” e a sua coirmã, 3a Câmara Civil, para conhecer, no conjunto da obra que realizam, como vêm decidindo as questões de Direito Comercial – agora sua especialidade – que lhe são submetidas.

Não se trata de uma incursão profunda, abrangente de toda a gama de decisões que as duas Câmaras têm proferido, mas da tomada de flagrantes, a partir de cinco ou seis publicações de seus acórdãos, sobre algumas das questões mais freqüentes na pauta de seus julgamentos.

 

As questões mais discutidas

 

Levantamentos que precederam à instituição da especialização das Câmaras evidenciaram que cerca de 35% dos recursos envolviam no pólo ativo ou passivo uma instituição financeira.

Começo, pois, pelo exame da jurisprudência das duas Câmaras em torno dos contratos bancários.

 

O arrendamento mercantil e a cobrança do VRG

 

As discussões em torno do arrendamento mercantil têm provocado inúmeros recursos, estando pacificado o entendimento, a partir do julgado do Min. Ruy Rosado de Aguiar, do STJ, no REsp. n. 178.272/RS, de que a cobrança antecipada do chamado valor residual garantido (VRG) desfigura o contrato, “que passa a ser uma compra e venda a prazo (art. 5o, “c”, c/c o art. 11, § 1o da Lei 6.099/74, alterada pela Lei 7.132/83)...”.

Estão nesse linha, entre outros, votos vencidos do Des. Silveira Lenzi (AC 01.004711-0) e acórdãos da lavra dos Des. Pedro Manoel Abreu (AI 2000.015772-4, DJ de 25.06.01, p. 34) e Cláudio Barreto Dutra  (AC 2000.010353-5, DJ de 2.7.01, p. 25).

Diverge na 3a Câmara Civil quanto ao reconhecimento de ofício da desfiguração do contrato de arrendamento em tais condições, o Des. Cláudio Barreto Dutra cuidando que não se trata de matéria de ordem pública (AC 2000.010353-5), votando o Des. Silveira Lenzi pela admissão, de ofício, do cabimento da antecipação do pagamento da VRG, conforme voto manifestado na aludida apelação, no que é acompanhado pelo Des. Sérgio Paladino, sendo essa também a posição da 4a Câmara Civil.

 

A vinculação dos contratos ao dólar

 

Os contratos de arrendamento mercantil são freqüentemente pactuados com cláusula de correção das prestações pela variação do dólar, matéria que tem suscitado inúmeras controvérsias.

A posição das duas Câmaras parece firmada, contudo, em que tal correção deva ser feita pelo indexador oficial do País, INPC. Nesse sentido o julgamento do AI 2000.0126636-5, de Chapecó, rel. o Des. Trindade dos Santos (DJ de 25.06.01, p. 33), ao fundamento de que “a alta abrupta do dólar americano não se inseria nesse contexto de previsibilidade”, tendo havido uma “elevação a níveis inesperados da cotação da moeda americana”, a justificar a substituição do indexador pactuado pelo INPC.

Assim também o sustentou o Des. Pedro Manoel Abreu no AI 2000.010709-3, entendendo que “se a discrepância entre as condições existentes quando da contratação e a situação no momento da execução for grande o suficiente para romper o equilíbrio contratual, quebrada estará a base do negócio jurídico, a justificar a adequação do contrato à nova realidade”.

Foi essa orientação adotada também na AC 2000.006977-9, Desª. Maria do Rocio Luz Santa Ritta, ao entendimento de que a alta significativa do dólar em relação ao real importou em onerosidade excessiva, autorizando a revisão do contrato conforme o art. 6o do CDC.

Na mesma linha acórdão da 3a Câmara Civil, rel. o Des. Silveira Lenzi, deferindo o depósito incidente pelo INPC “tendo em vista que a repentina desvalorização do Real em relação ao dólar norte-americano, decorrente da drástica mudança da política cambial”, onerou excessivamente as contraprestações pactuadas em dólar.

No AI 2000.010709-3, o Des. Pedro Manoel Abreu, contudo, teve por válida a cláusula se feita prova pelo arrendante “da captação de recursos no exterior; da utilização destes para a aquisição do bem arrendado; e da não-quitação do débito junto ao credor estrangeiro”.

 

Permanência do bem em poder do devedor acionado judicialmente

 

Ainda com respeito ao arrendamento mercantil, têm decidido as duas Câmaras que se o objeto do contrato de arrendamento mercantil é essencial ao desenvolvimento da atividade profissional do arrendatário, pode o bem dado em arrendamento permanecer em seu poder até decisão final do litígio (AI 2000.025037-6, rel. Des. Silveira Lenzi, DJ de 25.06.01, p. 47).

Se a empresa, entretanto, possui vários outros bens e o objeto do arrendamento não se mostra imprescindível ao exercício da atividade do devedor, de defere-se a apreensão (AI 97.006718-6, Des. Cláudio Barreto Dutra).

 

Contrato de abertura de crédito rotativo e crédito fixo

 

Pacificado nas duas Câmaras o entendimento de que os contratos de abertura de crédito rotativo, mesmo acompanhados de demonstrativos da movimentação da conta não constituem títulos executivos extrajudiciais, conforme, de resto, a Súmula n. 14 do Tribunal, rel. o Des. Nilton Macedo Machado, vai se tornando iterativa a orientação de que os contratos de abertura de crédito fixo são títulos executivos extrajudiciais (CPC, art. 585, II), porque neles não há “a simples disponibilização de um limite em favor do correntista, mas sim, na verdade, a liberação imediata de um valor certo e determinado” (AC 2000.005727-4, rel. o Des. Trindade dos Santos, DJ 25.06.01, p. 43).

No mesmo sentido o acórdão na AC 1999.021063-4, rel. o Des. Sérgio Paladino (DJ 02.07.01, p. 24).

 

 

A demonstração do débito nos contratos de crédito fixo

 

A execução desses contratos não dispensa a apresentação do demonstrativo do débito que acórdão da lavra do Des. Pedro Manoel Abreu na AC 99.019541-4 considerou suficiente , se a memória respectiva for “discriminada e atualizada do débito”, com “demonstração do período de tempo, base de cálculo dos encargos e respectivos percentuais incidentes”.

 

Possibilidade de emenda da inicial da execução

 

Acórdãos da  lavra do Des. Sérgio Paladino (AC 00.13134-2 e 00.017614-1), na 3a Câmara Civil, contra o voto do Des. Cláudio Barreto Dutra, anulou processo a partir da inicial, a fim de que o magistrado enseje ao exeqüente oportunidade para emenda da inicial, nos termos do art. 616 do CPC, para correção do demonstrativo do débito, invocando o relator lição de J.J. Calmon de Passos, “Inovações”, 1995, p. 136/7 e o REsp 156.116, Min. Waldemar Zveiter.

 

Aplicação aos contratos bancários do CDC

 

Aos contratos bancários são aplicáveis as normas do Código de Defesa do Consumidor, porque “de ordem pública e de interesse social”, conforme decidido nas AC 99.009986-0, rel. o Des. Nelson Schaefer Martins, sendo-lhes aplicáveis as disposições quanto à redução (de ofício) da multa contratual para o percentual de 2%, conforme a Lei 9.298/96, alterando parcialmente a Lei 8.078/90 – foi também o que assentou o aludido acórdão, de lavra do Des. Schaefer Martins.

Análogo o entendimento do Des. Trindade dos Santos (AC 98.004129-5, DJ 25.06.01, p. 38), “ainda que se trate de contrato firmado antes da vigência da lei alteradora do percentual de 10%, não havendo que se cogitar, nem sequer, da existência de direito adquirido...”, por se estar diante de “norma econômica de ordem pública”.

 

Controvertido o entendimento na 3a Câmara Civil em relação à aplicação do CDC a contratos anteriores à sua vigência

 

Da orientação pela aplicação da redução partilha o Des. Silveira Lenzi, na 3a Câmara Civil, consoante, entre outros, acórdãos nas AC 1997.005962-0, DJ de 30.10.00 e 1999.011239-0, DJ de 4.12.00, mas a matéria ali não é pacífica, uma vez que na AC 1998.007301-4, rel. o Des. Sérgio Paladino, sustentou-se que “aos contratos bancários celebrados antes do advento da Lei 9.298/96” não se pode aplicar a redução da multa contratual de 2%.

 

Admissibilidade do depósito por consignação na revisional

 

Nas ações de revisão de contratos, inclusive bancários, “admite-se o depósito por consignação incidente”, dispensando-se “o procedimento especial da ação de consignação em pagamento”. E mais: “Pelo julgamento do principal se definirá a sorte, e a eficácia da consignação”.

Foi  o  que  assentou  a  4a  Câmara  Civil no AI 2000.004870-4, rel. o Des. Pedro Manoel Abreu.

 

Comissão de permanência

 

Sua cobrança, às taxas de mercado, é controvertida.

Acórdão da lavra do Des. Sérgio Paladino na 3a Câmara (AC 2001.000097-6), tem como legal sua cobrança, se devidamente pactuada.

Já na 4a Câmara, ao entendimento de que “as taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações (...) não poderão ser superiores a doze por cento ao ano”, decidiu-se que “A submissão do débito a índice de comissão de permanência tem cristalino caráter potestativo ...”, ficando o contraente “inteiramente a mercê dos órgãos que atuam exclusivamente no interesse das instituições financeiras” (AC 1997.010949-0, Des. Pedro Manoel Abreu, DJ de 25.06.01, p. 36).

A comissão de permanência à taxa de mercado tem sido condenada pela 4a Câmara Civil (AC 1998.016989-5, Des. Trindade dos Santos e AC 1999.021407-9, Des. Nelson Schaefer Martins, entre outros julgados).

 

Inacumulabilidade com a correção monetária

 

Tem-se assentado que a comissão de permanência é inacumulável com a correção monetária, nos termos, alias, da Súmula n. 30 do STJ (4a Câmara AC 97.015021-0, Des. Pedro Manoel Abreu e 98.016989-5, Des. Trindade dos Santos e 3a Câmara, AC 99.012337-5 e 99.011239-0, Des. Silveira Lenzi).

 

 

A capitalização de juros

 

A capitalização de juros tem sido, admitida nas operações regidas por leis especiais através de cédulas de crédito rural, comercial e industrial – Decretos-Lei ns. 167/67 e 413/69 e Lei n. 6.840/80, mas respeitada a periodicidade semestral.

Adotaram esse entendimento, entre outros, na 3a Câmara Civil, os Des. Silveira Lenzi (AC 97.005962-0, DJ de 30.10.00 e 99.012337-5) e Sérgio Paladino (AC 97.013135-6, DJ de 2.07.01) e na 4a Câmara o Des. Pedro Manoel Abreu (AC 98.014097-8, DJ de 19.02.01).

A capitalização de juros, contudo, não é admitida nos contratos bancários comuns, na forma da Súmula n. 121 do STF, prevalecendo a proibição do Decreto 22.626/33, art. 4o, como decidido na AC 98.010806-3, Des. Sérgio Paladino.

 

A taxa de juros

Auto-aplicabilidade ou não do art. 192, § 3o da CF

 

Em relação aos juros compensatórios, não há uniformidade de entendimento.

Nos Embargos Infringentes 2000.0011424-9, julgados no 2o Grupo de Câmaras, o Des. Alcides Aguiar sustentou que o limite de juros previsto no texto constitucional (§ 3o do art. 192), organizado “num parágrafo, com normatividade autônoma, sem referir-se a qualquer previsão legal ulterior, detém eficácia plena e aplicabilidade imediata” (José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo), invocando, a seguir, o acórdão do Des. Trindade dos Santos nos  EI n. 1999.020788-9.

Na 4a Câmara, é pacífico entendimento no sentido de que os juros devem ser cobrados à taxa máxima anual de 12%, conforme o art. 192, § 3o da Constituição Federal.

Para o Des. Pedro Manoel Abreu, “As taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze por cento ao ano; a cobrança acima deste limite será conceituada como crime de usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei determinar”, conforme o acórdão na AC 97.015021-0 e 99.019541-4.

Por igual o Des. Trindade dos Santos, consoante o aresto na AC 98.016989-5, quando definiu que

“O art. 192, § 3° da Magna Carta de 1988, ao limitar em 12% a taxa anual máxima dos juros compensatórios revela, não uma norma simplesmente programática ou de eficácia condicionada à edição de qualquer lei regulamentadora. Ao contrário, é ela de incidência imediata, definindo uma situação efetivável de pronto, tornando automaticamente inválida qualquer obrigação contratualmente assumida em desacordo com o enunciado constitucional”.

 

Essa orientação já adotava no então 2o Grupo de Câmaras, nos EI n. 00.001423-0, quando destacou que ”A legislação complementar, quando editada, acresça-se, não poderá, pena de franca inconstitucionalidade, autorizar a cobrança de qualquer remuneração outra, ligada direta ou indiretamente à concessão do crédito, com essa remuneração atendo-se, com exclusividade, aos juros reais, que, insista-se, terá que se ater à taxa máxima prevista no refalado preceito constitucional”.

Esse também o entendimento sufragado pelo Des. Solon Neves (EI 00.001430-3) e pelo Des. Nelson Schaefer Martins, na AC 99.021407-9, DJ de 22.01.01.

A questão não é pacífica, contudo, na 3a Câmara Civil, que, pela maioria de seus membros, Des. Cláudio Barreto Dutra (AC 97.014177-7 e 98.003538-4) e Des. Sérgio Paladino (AC 97.010290-9) têm a norma do art. 192, § 3o da Constituição Federal como não auto-aplicável, conforme pacífica e reiterada jurisprudência do egrégio Supremo Tribunal Federal, enquanto o Des. Silveira Lenzi sustenta a auto-aplicabilidade daquele preceito, sustentado que “o dispositivo ... não for extirpado do texto constitucional, deve prevalecer o limite de juros estabelecido”.

 

Inscrição do devedor no cadastro do SERASA e afins

 

A inscrição no cadastro dos chamados órgãos de proteção ao crédito não tem sido admitida de modo geral, se o débito está em discussão judicial, conforme, entre outros, os acórdãos no AI 99.009375-1, Des. Pedro Manoel Abreu, AI 01.002925-7, Des. Trindade dos Santos, ambos da 4a Câmara Civil e AI 00.025302-2 e 00.014064-3, Silveira Lenzi, e AI 00.012265-3, Des. Sérgio Paladino: “A discussão Judicial do débito impossibilita a inscrição do nome da devedora nos cadastros das entidades de proteção ao crédito”.

No mesmo sentido, AC 99.015605-2, Des. Nelson Schaefer Martins e AC 98.007266-2, Des. Sérgio Baasch Luz (DJ 9.7.01).

No AI 00.012266-1, relator o Des. Silveira Lenzi, foi transcrito acórdão da lavra do Min. Aldir Passarinho, pela legitimidade do procedimento da inscrição do inadimplente, “por autorizado na legislação pertinente”, tendo-se por cabível, contudo, a tutela antecipada para evitar a inscrição, havendo discussão jurídica, sob pena de frustrar, ao menos em parte, o direito de fundo discutido, “pela imediata perda da credibilidade do mutuário na praça em que atua”.

Cabível tal inscrição, outrossim, uma vez  transitada em julgado decisão contrária ao mutuário (AI 01.004462-5, Des. Silveira Lenzi , DJ de 9.7.01).

 

A TR como fator de correção monetária

 

A TR, se pactuada, foi admitida como fator de correção (AC 98.002679-2, Des. Cláudio Barreto Dutra; AC 97.010290-9, Des. Sérgio Paladino na 3a Câmara Civil.

De tal entendimento tem discordado a 4a Câmara, consoante acórdãos relatados pelos Des. Pedro Manoel Abreu (AC 99.017191-4), Trindade dos Santos (AC 00.018624-4), Nelson Schaefer Martins (AC 97.0011877-5) e Sérgio Baasch Luz (AC 98.002828-0), tendo prevalecido esse entendimento no Grupo de Câmaras de Direito Comercial, conforme EI 01.002056-0, rel. o Des. Pedro Manoel Abreu, vencidos os Des. Cláudio Barreto Dutra e Sérgio Paladino.

 

A cláusula de mandato

 

A cláusula mandato tem sido repelida como nula, conforme, entre outros, os acórdãos na AC 98.006234-9, Des. Pedro Manoel Abreu; AC 97.014579-9, Des. Silveira Lenzi e AC 97.009986-0, Des. Nelson Schaefer Martins.

 

A prisão civil

 

Inclina-se a maioria dos integrantes das duas Câmaras pela inadmissão da prisão civil ante a falta de restituição ao valor do bem dado em alienação fiduciária.

A diversidade de hipóteses em que o tema é suscitado exigiria, na verdade, uma abordagem específica, não seu exame sumário ao longo destas notas.

As decisões pelo incabimento da prisão civil fundam-se no disposto no art. 5o, LXVII da Constituição Federal e no Pacto de San José da Costa Rica, firmado pelo Brasil, que levaram o eminente Min. Marco Aurélio, no STF, a rejeitar peremptoriamente a prisão civil em caso de depósitos decorrentes de obrigações comerciais.

Neste Tribunal datam de alguns anos, cinco pelo menos, os acórdãos em tal sentido.

Como esse estudo pretendeu realizar um vôo panorâmico sobre a jurisprudência atual das duas Câmaras nas questões comerciais, registre-se a 4a Câmara Civil ainda recentemente enfrentou o tema.

No AI 00.020408-0, o Des. Trindade dos Santos anota que

"A prisão civil do depositário de bem alienado fiduciariamente vem sendo expungida, dia após dia, decisão após decisão, do mundo jurídico pátrio, com os magistrados e Tribunais considerando-a inconstitucional, por nada mais expressar do que uma coerção imposta em favor das instituições financeiras nas cobranças de seus créditos. Entretanto, transitada em julgado a sentença que a determinou, o desfazimento da situação reclama a impetração, no momento próprio, de habeas corpus”.

 

Na AC 97.015330-9, o Des. Pedro Manoel Abreu referiu que

"Segundo corrente expressiva da jurisprudência, somente é admissível a prisão civil por dívida nas hipóteses de inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e de depositário infiel (CF, art. 5º, LXVII), não se comparando a este o devedor-fiduciário, pois o contrato de depósito disciplinado na lei civil (CC arts. 1.265 a 1.267) não se equipara à regra do art. 1° do Decreto Lei n° 911/69".

 

E ainda:

"Ademais, o § 2º, do art. 5º da Constituição Federal dispõe que os direitos e garantias nela expressos não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais de que o país seja parte. Assim, pelo Decreto Legislativo n. 226, de 12.12.1991, foi incorporado em nosso ordenamento constitucional o texto do pacto internacional sobre direitos civis e políticos, que em seu art. 11 veda taxativamente a prisão civil por descumprimento de obrigação contratual"

 

A 3a Câmara Civil, contudo, em acórdão da lavra do Des. Cláudio Barreto Dutra, no HC n. 01.007354-4, entendeu, por maioria de votos, inaplicável o Pacto de San José da Costa Rica à prisão civil prevista no Dec.-Lei 911/69, fundando-se em precedentes do STF nos HC 72.131, Min. Nelson Jobim; HC 79870, Min. Moreira Alves e em julgados deste Tribunal no AI 98.002686-5 (Des. Nilton Macedo Machado) e no HC 00.024534-8, rel. o Des. Jaime Ramos.

Nesse precedente do Des. Jaime Ramos, julgado da Câmara de Férias, o Des. Nilton Macedo Machado votou pela denegação da ordem porque comprovada nos autos a existência de cláusula de depósito no ajuste entre as partes, tendo eu, Presidente da Câmara de Férias, votado pela concessão da ordem porque, a despeito de antiga e reiterada orientação, por maioria de votos do Excelso Pretório, vai-se firmando no STJ o entendimento de que a prisão civil está reservada, agora, apenas às hipóteses de inadimplemento de obrigações alimentares.

Destaquei no voto vencido tópico de manifestação do eminente Min. Marco Aurélio no STF de que “o Brasil, ao subscrever o Pacto de San José da Costa Rica, situado no mesmo patamar da legislação ordinária, veio a derrogar o Código Civil, o Código de Processo Civil e, com maior razão, o Dec.-Lei 911/69, alterado pelo art. 4o da Lei n. 6017/74, no que disciplinavam matérias estranhas à prestação alimentícia”.

 

Outras questões também relevantes

 

São os acima alguns dos principais temas que afloram nos julgamentos das duas Câmaras, ou, excepcionalmente, na Câmara de Férias.

O exame completo da matéria exigiria tempo e pesquisas infindáveis, mais ainda para quem não domina o computador, o que obriga a recorrer à tradicional consulta direta aos Diários da Justiça, sem dispensar é claro, o exame de cópias de xerox ou extraídas das bases de dados da jurisprudência do Tribunal.

Inúmeros outros temas poderiam ser enfrentados, como a aplicabilidade do CDC à dívidas por cartões de crédito (AI 00.022530-0, Des. Trindade); a impenhorabilidade, como bem de família, do imóvel residencial alugado, servindo a renda para a subsistência familiar (AC 00.005715-0, Des. Cláudio, fundado no REsp. 98.958, Min. Ruy Rosado de Aguiar); sobre a taxa de juros de 6% a.a.  na monitória, (AC 99.017826-9, Des. Lenzi, com precedente do Des. Trindade); inincidência de multa contratual sobre juros moratórios (AC 99.004764-4, Des. Lenzi, com precedente do saudoso Des. Eder Graf); índices de correção das cadernetas de poupança iniciadas antes de janeiro de 89, de 42,72% (AC 98.010316-9, Des. Pedro Manoel Abreu, com precedente no REsp. 69.131, Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira); legitimidade passiva do banco depositário para as ações relativas à atualização das cadernetas de  poupança  em  face do Plano Verão (MP 32/89, Lei n.7.730/89, AC 98.010316-9, Des. Pedro Manoel Abreu, fundado no REsp. 241.694, Min. Aldir Passarinho Júnior), um mundo, a final, de temas que, vindos de todo o Estado, versados por profissionais competentes e combativos, exigem solução do Tribunal que, tendo a última palavra nas questões de prova, de interpretação de cláusulas contratuais e de aplicação de direito local (estadual e municipal), está, contudo, na interpretação e aplicação das leis federais, sujeito à jurisdição revisora do STJ, que dirime, igualmente, os conflitos de entendimento entre os Tribunais de Justiça e outras Cortes nacionais, inclusive STJ e STF.

Das decisões do Tribunal em temas constitucionais (inclusive quanto à taxa de juros) cabe recurso extraordinário ao STF, atendidos, claro, os pressupostos para a subida dos recursos, que são extremamente rigorosos, como bem o sabem os advogados.

 

Conclusão

 

O que me moveu, sobretudo, à análise da jurisprudência das duas Câmaras de Direito Comercial, pouco mais de 6 (seis) meses da implantação da especialização, foi a visão de milhares de processos empilhados em Varas e Comarcas no Estado, aguardando sentenças, num quadro de carência extrema do número de Juízes.

Quem sabe as notas aqui alinhadas possam contribuir para facilitar um pouco o estafante trabalho que, nessa e noutras matérias, desafia a capacidade laborativa, a argúcia e o senso de justiça dos dignos magistrados catarinenses.

 

 

 

 

SCHAEFER, João José Ramos. Questões de Direito Bancário na recente jurisprudência do TJSC. Disponível em: < http://www.tj.sc.gov.br/cejur/doutrina/direitocomercial.rtf>. Acesso em: 11 nov 2006.