Des.
JOÃO JOSÉ RAMOS SCHAEFER
1o
Vice-Presidente do TJSC
Sumário
A
especialização das Câmaras Civis no Tribunal de Justiça de Santa Catarina era
uma aspiração antiga, até mesmo como fórmula de atenuar, pela redução do
espectro de temas a cargo de cada Câmara, a notória insuficiência do número de
membros do Tribunal frente ao crescimento vertiginoso dos recursos aportados ao
órgão.
No
ano 2.000, elevado de 27 para 30 o número de Desembargadores, foi possível
instituir a especialização, transformando as quatro (4) Câmaras Civis então
existentes, cada uma com quatro (4) integrantes e competência ampla em todas as
matérias não criminais, em seis (6) Câmaras, cada uma com três (3) membros,
sendo duas (2) Câmaras de Direito Civil, duas (2) de Direito Comercial e duas
(2) de Direito Público.
Os
julgamentos – a especialização começou na verdade em janeiro de 2001 – se
tornaram mais céleres, porque não havia, em cada sessão a multiplicidade de
temas, de Direito Administrativo, Civil (Família, Posse, Propriedade, Coisas,
Sucessões) e Comercial (execuções de contratos, de cambiais, falências,
sociedades, etc) e questões processuais relacionadas àqueles três ramos do
Direito, mas competência definida de cada grupo de duas Câmaras, em temas ou de
Direito Civil, de Direito Comercial ou de Direito Público em Geral.
Tendo
presidido a 4a Câmara Civil por cerca de 10 anos, de cujo período
guardo recordações as mais gratas, pelo ambiente cordial que ali sempre reinou
e pela notável contribuição que seus demais membros sempre ofereceram para o
perfil da jurisprudência da Corte, decidi, após 18 meses dela afastado pelo
exercício das funções de 1o Vice-Presidente, “revisitá-la” e a sua
coirmã, 3a Câmara Civil, para conhecer, no conjunto da obra que
realizam, como vêm decidindo as questões de Direito Comercial – agora sua
especialidade – que lhe são submetidas.
Não
se trata de uma incursão profunda, abrangente de toda a gama de decisões que as
duas Câmaras têm proferido, mas da tomada de flagrantes, a partir de cinco ou
seis publicações de seus acórdãos, sobre algumas das questões mais freqüentes
na pauta de seus julgamentos.
Levantamentos
que precederam à instituição da especialização das Câmaras evidenciaram que
cerca de 35% dos recursos envolviam no pólo ativo ou passivo uma instituição
financeira.
Começo,
pois, pelo exame da jurisprudência das duas Câmaras em torno dos contratos
bancários.
As
discussões em torno do arrendamento mercantil têm provocado
inúmeros recursos, estando pacificado o entendimento, a partir do julgado do
Min. Ruy Rosado de Aguiar, do STJ, no REsp. n. 178.272/RS, de que a cobrança
antecipada do chamado valor residual
garantido (VRG)
desfigura o contrato, “que passa a ser uma
compra e venda a prazo (art. 5o, “c”, c/c o art. 11, § 1o
da Lei 6.099/74, alterada pela Lei 7.132/83)...”.
Estão
nesse linha, entre outros, votos vencidos do Des. Silveira Lenzi (AC
01.004711-0) e acórdãos da lavra dos Des. Pedro Manoel Abreu (AI 2000.015772-4,
DJ de 25.06.01, p. 34) e Cláudio Barreto Dutra
(AC 2000.010353-5, DJ de 2.7.01, p. 25).
Diverge
na 3a Câmara Civil quanto ao reconhecimento de ofício da
desfiguração do contrato de arrendamento em tais condições, o Des. Cláudio
Barreto Dutra cuidando que não se trata de matéria de ordem pública (AC
2000.010353-5), votando o Des. Silveira Lenzi pela admissão, de ofício, do
cabimento da antecipação do pagamento da VRG, conforme voto manifestado na
aludida apelação, no que é acompanhado pelo Des. Sérgio Paladino, sendo essa
também a posição da 4a Câmara Civil.
Os
contratos de arrendamento mercantil são freqüentemente pactuados com cláusula
de correção das prestações pela variação do dólar, matéria que tem suscitado
inúmeras controvérsias.
A
posição das duas Câmaras parece firmada, contudo, em que tal correção deva ser
feita pelo indexador oficial do País, INPC. Nesse sentido o julgamento do AI
2000.0126636-5, de Chapecó, rel. o Des. Trindade dos Santos (DJ de 25.06.01, p.
33), ao fundamento de que “a alta abrupta do
dólar americano não se inseria nesse contexto de previsibilidade”, tendo havido
uma “elevação a níveis inesperados da cotação da
moeda americana”, a justificar a substituição do indexador pactuado pelo
INPC.
Assim
também o sustentou o Des. Pedro Manoel Abreu no AI 2000.010709-3, entendendo
que “se a discrepância entre as condições existentes
quando da contratação e a situação no momento da execução for grande o
suficiente para romper o equilíbrio contratual, quebrada estará a base do
negócio jurídico, a justificar a adequação do contrato à nova realidade”.
Foi
essa orientação adotada também na AC 2000.006977-9, Desª. Maria do Rocio Luz
Santa Ritta, ao entendimento de que a alta significativa do dólar em relação ao
real importou em onerosidade excessiva, autorizando a revisão do contrato
conforme o art. 6o do CDC.
Na
mesma linha acórdão da 3a Câmara Civil, rel. o Des. Silveira Lenzi,
deferindo o depósito incidente pelo INPC “tendo em vista
que a repentina desvalorização do Real em relação ao dólar norte-americano,
decorrente da drástica mudança da política cambial”, onerou
excessivamente as contraprestações pactuadas em dólar.
No
AI 2000.010709-3, o Des. Pedro Manoel Abreu, contudo, teve por válida a
cláusula se feita prova pelo arrendante “da captação de
recursos no exterior; da utilização destes para a aquisição do bem arrendado; e
da não-quitação do débito junto ao credor estrangeiro”.
Ainda
com respeito ao arrendamento mercantil, têm decidido as duas Câmaras que se o
objeto do contrato de arrendamento mercantil é essencial ao desenvolvimento da
atividade profissional do arrendatário, pode o bem dado em arrendamento
permanecer em seu poder até decisão final do litígio (AI 2000.025037-6, rel.
Des. Silveira Lenzi, DJ de 25.06.01, p. 47).
Se
a empresa, entretanto, possui vários outros bens e o objeto do arrendamento não
se mostra imprescindível ao exercício da atividade do devedor, de defere-se a
apreensão (AI 97.006718-6, Des. Cláudio Barreto Dutra).
Pacificado
nas duas Câmaras o entendimento de que os contratos de abertura de
crédito rotativo, mesmo acompanhados de demonstrativos da movimentação
da conta não constituem títulos executivos extrajudiciais,
conforme, de resto, a Súmula n. 14 do Tribunal, rel. o Des. Nilton Macedo
Machado, vai se tornando iterativa a orientação de que os contratos de
abertura de crédito fixo são títulos executivos extrajudiciais (CPC,
art. 585, II), porque neles não há “a simples
disponibilização de um limite em favor do correntista, mas sim, na verdade, a
liberação imediata de um valor certo e determinado” (AC
2000.005727-4, rel. o Des. Trindade dos Santos, DJ 25.06.01, p. 43).
No
mesmo sentido o acórdão na AC 1999.021063-4, rel. o Des. Sérgio Paladino (DJ
02.07.01, p. 24).
A
execução desses contratos não dispensa a apresentação do demonstrativo do
débito que acórdão da lavra do Des. Pedro Manoel Abreu na AC 99.019541-4
considerou suficiente , se a memória respectiva for “discriminada
e atualizada do débito”, com “demonstração
do período de tempo, base de cálculo dos encargos e respectivos percentuais
incidentes”.
Acórdãos
da lavra do Des. Sérgio Paladino (AC
00.13134-2 e 00.017614-1), na 3a Câmara Civil, contra o voto do Des.
Cláudio Barreto Dutra, anulou processo a partir da inicial, a fim de que o
magistrado enseje ao exeqüente oportunidade para emenda da inicial, nos termos
do art. 616 do CPC, para correção do demonstrativo do débito, invocando o
relator lição de J.J. Calmon de Passos, “Inovações”, 1995, p. 136/7 e o REsp
156.116, Min. Waldemar Zveiter.
Aos
contratos bancários são aplicáveis as normas do Código de Defesa do Consumidor,
porque “de ordem pública e de interesse social”, conforme
decidido nas AC 99.009986-0, rel. o Des. Nelson Schaefer Martins, sendo-lhes
aplicáveis as disposições quanto à redução (de ofício) da multa contratual para
o percentual de 2%, conforme a Lei 9.298/96, alterando parcialmente a Lei
8.078/90 – foi também o que assentou o aludido acórdão, de lavra do Des.
Schaefer Martins.
Análogo
o entendimento do Des. Trindade dos Santos (AC 98.004129-5, DJ 25.06.01, p.
38), “ainda que se trate de contrato firmado antes da
vigência da lei alteradora do percentual de 10%, não havendo que se cogitar,
nem sequer, da existência de direito adquirido...”, por se estar
diante de “norma econômica de ordem pública”.
Da
orientação pela aplicação da redução partilha o Des. Silveira Lenzi, na 3a
Câmara Civil, consoante, entre outros, acórdãos nas AC 1997.005962-0, DJ de
30.10.00 e 1999.011239-0, DJ de 4.12.00, mas a matéria ali não é pacífica, uma
vez que na AC 1998.007301-4, rel. o Des. Sérgio Paladino, sustentou-se que “aos
contratos bancários celebrados antes do advento da Lei 9.298/96” não se pode
aplicar a redução da multa contratual de 2%.
Nas
ações de revisão de contratos, inclusive bancários, “admite-se
o depósito por consignação incidente”, dispensando-se “o
procedimento especial da ação de consignação em pagamento”. E mais: “Pelo
julgamento do principal se definirá a sorte, e a eficácia da consignação”.
Foi o
que assentou a 4a
Câmara Civil no AI 2000.004870-4, rel. o Des. Pedro Manoel Abreu.
Sua
cobrança, às taxas de mercado, é controvertida.
Acórdão
da lavra do Des. Sérgio Paladino na 3a Câmara (AC 2001.000097-6),
tem como legal sua cobrança, se devidamente pactuada.
Já
na 4a Câmara, ao entendimento de que “as
taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações
(...) não poderão ser superiores a doze por cento ao ano”, decidiu-se
que “A submissão do débito a índice de comissão de
permanência tem cristalino caráter potestativo ...”, ficando o
contraente “inteiramente a mercê dos órgãos que atuam
exclusivamente no interesse das instituições financeiras” (AC
1997.010949-0, Des. Pedro Manoel Abreu, DJ de 25.06.01, p. 36).
A
comissão de permanência à taxa de mercado tem sido condenada pela 4a
Câmara Civil (AC 1998.016989-5, Des. Trindade dos Santos e AC 1999.021407-9,
Des. Nelson Schaefer Martins, entre outros julgados).
Tem-se
assentado que a comissão de permanência é inacumulável com a correção
monetária, nos termos, alias, da Súmula n. 30 do STJ (4a Câmara AC
97.015021-0, Des. Pedro Manoel Abreu e 98.016989-5, Des. Trindade dos Santos e
3a Câmara, AC 99.012337-5 e 99.011239-0, Des. Silveira Lenzi).
A capitalização de juros tem sido, admitida nas
operações regidas por leis especiais através de cédulas de crédito rural,
comercial e industrial – Decretos-Lei ns. 167/67 e 413/69 e Lei n. 6.840/80,
mas respeitada a periodicidade semestral.
Adotaram esse entendimento, entre outros, na 3a
Câmara Civil, os Des. Silveira Lenzi (AC 97.005962-0, DJ de 30.10.00 e
99.012337-5) e Sérgio Paladino (AC 97.013135-6, DJ de 2.07.01) e na 4a
Câmara o Des. Pedro Manoel Abreu (AC 98.014097-8, DJ de 19.02.01).
A capitalização de juros, contudo, não é
admitida nos contratos bancários comuns, na forma da Súmula n. 121 do STF,
prevalecendo a proibição do Decreto 22.626/33, art. 4o, como
decidido na AC 98.010806-3, Des. Sérgio Paladino.
Em
relação aos juros compensatórios, não há uniformidade de entendimento.
Nos
Embargos Infringentes 2000.0011424-9, julgados no 2o Grupo de
Câmaras, o Des. Alcides Aguiar sustentou que o limite de juros previsto no
texto constitucional (§ 3o do art. 192), organizado “num
parágrafo, com normatividade autônoma, sem referir-se a qualquer previsão legal
ulterior, detém eficácia plena e aplicabilidade imediata” (José Afonso
da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo), invocando, a seguir, o
acórdão do Des. Trindade dos Santos nos
EI n. 1999.020788-9.
Na
4a Câmara, é pacífico entendimento no sentido de que os juros devem
ser cobrados à taxa máxima anual de 12%, conforme o art. 192, § 3o
da Constituição Federal.
Para
o Des. Pedro Manoel Abreu, “As taxas de juros
reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou
indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a
doze por cento ao ano; a cobrança acima deste limite será conceituada como
crime de usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei
determinar”,
conforme o acórdão na AC 97.015021-0 e 99.019541-4.
Por
igual o Des. Trindade dos Santos, consoante o aresto na AC 98.016989-5, quando
definiu que
“O art. 192, § 3° da Magna Carta de 1988,
ao limitar em 12% a taxa anual máxima dos juros compensatórios revela, não uma
norma simplesmente programática ou de eficácia condicionada à edição de
qualquer lei regulamentadora. Ao contrário, é ela de incidência imediata,
definindo uma situação efetivável de pronto, tornando automaticamente inválida
qualquer obrigação contratualmente assumida em desacordo com o enunciado
constitucional”.
Essa
orientação já adotava no então 2o Grupo de Câmaras, nos EI n.
00.001423-0, quando destacou que ”A legislação
complementar, quando editada, acresça-se, não poderá, pena de franca
inconstitucionalidade, autorizar a cobrança de qualquer remuneração outra,
ligada direta ou indiretamente à concessão do crédito, com essa remuneração
atendo-se, com exclusividade, aos juros reais, que, insista-se, terá que se
ater à taxa máxima prevista no refalado preceito constitucional”.
Esse
também o entendimento sufragado pelo Des. Solon Neves (EI 00.001430-3) e pelo
Des. Nelson Schaefer Martins, na AC 99.021407-9, DJ de 22.01.01.
A
questão não é pacífica, contudo, na 3a Câmara Civil, que, pela maioria de seus
membros, Des. Cláudio Barreto Dutra (AC 97.014177-7 e 98.003538-4) e Des.
Sérgio Paladino (AC 97.010290-9) têm a norma do art. 192, § 3o da
Constituição Federal como não auto-aplicável, conforme pacífica e reiterada
jurisprudência do egrégio Supremo Tribunal Federal, enquanto o Des. Silveira
Lenzi sustenta a auto-aplicabilidade daquele preceito, sustentado que “o
dispositivo ... não for extirpado do texto constitucional, deve prevalecer o
limite de juros estabelecido”.
A
inscrição no cadastro dos chamados órgãos de proteção ao crédito não tem sido
admitida de modo geral, se o débito está em discussão judicial, conforme, entre
outros, os acórdãos no AI 99.009375-1, Des. Pedro Manoel Abreu, AI 01.002925-7,
Des. Trindade dos Santos, ambos da 4a Câmara Civil e AI 00.025302-2 e
00.014064-3, Silveira Lenzi, e AI 00.012265-3, Des. Sérgio Paladino: “A
discussão Judicial do débito impossibilita a inscrição do nome da devedora nos
cadastros das entidades de proteção ao crédito”.
No
mesmo sentido, AC 99.015605-2, Des. Nelson Schaefer Martins e AC 98.007266-2,
Des. Sérgio Baasch Luz (DJ 9.7.01).
No
AI 00.012266-1, relator o Des. Silveira Lenzi, foi transcrito acórdão da lavra
do Min. Aldir Passarinho, pela legitimidade do procedimento da inscrição do
inadimplente, “por autorizado na legislação pertinente”, tendo-se por
cabível, contudo, a tutela antecipada para evitar a inscrição, havendo
discussão jurídica, sob pena de frustrar, ao menos em parte, o direito de fundo
discutido, “pela imediata perda da credibilidade do
mutuário na praça em que atua”.
Cabível
tal inscrição, outrossim, uma vez
transitada em julgado decisão contrária ao mutuário (AI 01.004462-5,
Des. Silveira Lenzi , DJ de 9.7.01).
A
TR, se pactuada, foi admitida como fator de correção (AC 98.002679-2, Des.
Cláudio Barreto Dutra; AC 97.010290-9, Des. Sérgio Paladino na 3a
Câmara Civil.
De
tal entendimento tem discordado a 4a Câmara, consoante acórdãos
relatados pelos Des. Pedro Manoel Abreu (AC 99.017191-4), Trindade dos Santos
(AC 00.018624-4), Nelson Schaefer Martins (AC 97.0011877-5) e Sérgio Baasch Luz
(AC 98.002828-0), tendo prevalecido esse entendimento no Grupo de Câmaras de
Direito Comercial, conforme EI 01.002056-0, rel. o Des. Pedro Manoel Abreu,
vencidos os Des. Cláudio Barreto Dutra e Sérgio Paladino.
A
cláusula mandato tem sido repelida como nula, conforme, entre outros, os
acórdãos na AC 98.006234-9, Des. Pedro Manoel Abreu; AC 97.014579-9, Des.
Silveira Lenzi e AC 97.009986-0, Des. Nelson Schaefer
Martins.
Inclina-se
a maioria dos integrantes das duas Câmaras pela inadmissão da prisão civil ante
a falta de restituição ao valor do bem dado em alienação fiduciária.
A
diversidade de hipóteses em que o tema é suscitado exigiria, na verdade, uma
abordagem específica, não seu exame sumário ao longo destas notas.
As
decisões pelo incabimento da prisão civil fundam-se no disposto no art. 5o,
LXVII da Constituição Federal e no Pacto de San José da Costa Rica, firmado
pelo Brasil, que levaram o eminente Min. Marco Aurélio, no STF, a rejeitar
peremptoriamente a prisão civil em caso de depósitos decorrentes de obrigações
comerciais.
Neste
Tribunal datam de alguns anos, cinco pelo menos, os acórdãos em tal sentido.
Como
esse estudo pretendeu realizar um vôo panorâmico sobre a jurisprudência atual
das duas Câmaras nas questões comerciais, registre-se a 4a Câmara
Civil ainda recentemente enfrentou o tema.
No
AI 00.020408-0, o Des. Trindade dos Santos anota que
"A prisão civil do depositário de
bem alienado fiduciariamente vem sendo expungida, dia após dia, decisão após
decisão, do mundo jurídico pátrio, com os magistrados e Tribunais considerando-a
inconstitucional, por nada mais expressar do que uma coerção imposta em favor
das instituições financeiras nas cobranças de seus créditos. Entretanto,
transitada em julgado a sentença que a determinou, o desfazimento da situação
reclama a impetração, no momento próprio, de habeas corpus”.
Na
AC 97.015330-9, o Des. Pedro Manoel Abreu referiu que
"Segundo corrente expressiva da
jurisprudência, somente é admissível a prisão civil por dívida nas hipóteses de
inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e de
depositário infiel (CF, art. 5º, LXVII), não se comparando a este o
devedor-fiduciário, pois o contrato de depósito disciplinado na lei civil (CC
arts. 1.265 a 1.267) não se equipara à regra do art. 1° do Decreto Lei n° 911/69".
E
ainda:
"Ademais, o § 2º, do art. 5º da
Constituição Federal dispõe que os direitos e garantias nela expressos não
excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos
tratados internacionais de que o país seja parte. Assim, pelo Decreto
Legislativo n. 226, de 12.12.1991, foi incorporado em nosso ordenamento
constitucional o texto do pacto internacional sobre direitos civis e políticos,
que em seu art. 11 veda taxativamente a prisão civil por descumprimento de
obrigação contratual"
A
3a Câmara Civil, contudo, em acórdão da lavra do Des. Cláudio
Barreto Dutra, no HC n. 01.007354-4, entendeu, por maioria de votos,
inaplicável o Pacto de San José da Costa Rica à prisão civil prevista no
Dec.-Lei 911/69, fundando-se em precedentes do STF nos HC 72.131, Min. Nelson
Jobim; HC 79870, Min. Moreira Alves e em julgados deste Tribunal no AI
98.002686-5 (Des. Nilton Macedo Machado) e no HC 00.024534-8, rel. o Des. Jaime
Ramos.
Nesse
precedente do Des. Jaime Ramos, julgado da Câmara de Férias, o Des. Nilton
Macedo Machado votou pela denegação da ordem porque comprovada nos autos a
existência de cláusula de depósito no ajuste entre as partes, tendo eu,
Presidente da Câmara de Férias, votado pela concessão da ordem porque, a
despeito de antiga e reiterada orientação, por maioria de votos do Excelso
Pretório, vai-se firmando no STJ o entendimento de que a prisão civil está
reservada, agora, apenas às hipóteses de inadimplemento de obrigações
alimentares.
Destaquei
no voto vencido tópico de manifestação do eminente Min. Marco Aurélio no STF de
que “o Brasil, ao subscrever o Pacto de San José da
Costa Rica, situado no mesmo patamar da legislação ordinária, veio a derrogar o
Código Civil, o Código de Processo Civil e, com maior razão, o Dec.-Lei 911/69,
alterado pelo art. 4o da Lei n. 6017/74, no que disciplinavam
matérias estranhas à prestação alimentícia”.
São
os acima alguns dos principais temas que afloram nos julgamentos das duas Câmaras,
ou, excepcionalmente, na Câmara de Férias.
O
exame completo da matéria exigiria tempo e pesquisas infindáveis, mais ainda
para quem não domina o computador, o que obriga a recorrer à tradicional
consulta direta aos Diários da Justiça, sem dispensar é claro, o exame de
cópias de xerox ou extraídas das bases de dados da jurisprudência do Tribunal.
Inúmeros
outros temas poderiam ser enfrentados, como a aplicabilidade do CDC à dívidas
por cartões de crédito (AI 00.022530-0, Des. Trindade); a impenhorabilidade,
como bem de família, do imóvel residencial alugado, servindo a renda para a
subsistência familiar (AC 00.005715-0, Des. Cláudio, fundado no REsp. 98.958,
Min. Ruy Rosado de Aguiar); sobre a taxa de juros de 6% a.a. na monitória, (AC 99.017826-9, Des. Lenzi,
com precedente do Des. Trindade); inincidência de multa contratual sobre juros
moratórios (AC 99.004764-4, Des. Lenzi, com precedente do saudoso Des. Eder
Graf); índices de correção das cadernetas de poupança iniciadas antes de
janeiro de 89, de 42,72% (AC 98.010316-9, Des. Pedro Manoel Abreu, com
precedente no REsp. 69.131, Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira); legitimidade
passiva do banco depositário para as ações relativas à atualização das
cadernetas de poupança em
face do Plano Verão (MP 32/89, Lei n.7.730/89, AC 98.010316-9, Des.
Pedro Manoel Abreu, fundado no REsp. 241.694, Min. Aldir
Passarinho Júnior), um mundo, a final, de temas que, vindos de todo o Estado,
versados por profissionais competentes e combativos, exigem solução do Tribunal
que, tendo a última palavra nas questões de prova, de interpretação de
cláusulas contratuais e de aplicação de direito local (estadual e municipal),
está, contudo, na interpretação e aplicação das leis federais, sujeito à
jurisdição revisora do STJ, que dirime, igualmente, os conflitos de
entendimento entre os Tribunais de Justiça e outras Cortes nacionais, inclusive
STJ e STF.
Das
decisões do Tribunal em temas constitucionais (inclusive quanto à taxa de
juros) cabe recurso extraordinário ao STF, atendidos, claro, os pressupostos
para a subida dos recursos, que são extremamente rigorosos, como bem o sabem os
advogados.
O
que me moveu, sobretudo, à análise da jurisprudência das duas Câmaras de
Direito Comercial, pouco mais de 6 (seis) meses da implantação da
especialização, foi a visão de milhares de processos empilhados em Varas e
Comarcas no Estado, aguardando sentenças, num quadro de carência extrema do
número de Juízes.
Quem
sabe as notas aqui alinhadas possam contribuir para facilitar um pouco o
estafante trabalho que, nessa e noutras matérias, desafia a capacidade
laborativa, a argúcia e o senso de justiça dos dignos magistrados catarinenses.
SCHAEFER, João José Ramos. Questões de Direito Bancário na recente jurisprudência do TJSC. Disponível em: < http://www.tj.sc.gov.br/cejur/doutrina/direitocomercial.rtf>. Acesso em: 11 nov 2006.