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  A recuperação de empresa na nova Lei de Falências

 

Leon Frejda Szklarowsky*


CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS

Sumário: Os projetos de lei do Executivo. O substitutivo do Relator Deputado Osvaldo Biolchi – Subemenda aglutinativa global às emendas de Plenário ao substitutivo adotado A recuperação de empresa. Considerações históricas. A lei em vigor – Algumas observações pela Comissão Especial ao PL 4376-B, de 1993. A recuperação da empresa judicial e extrajudicial. Proposta de arbitragem. Conclusão. Propostas de alteração da subemenda aglutinadora.


          "O homem deve pensar, pode divergir, mas antes de tudo deve ser tolerante. Das idéias, nem sempre convergentes, brota a imensa variedade de pensamentos que norteiam a humanidade e lhe abrem o caminho da verdade."


          A vigente Lei de Falências merece ser reformada, imediatamente, para se adaptar ao novo milênio e a um mundo fascinante envolvido por novos mercados e blocos comerciais, profundas alterações político - sociais, queda e criação de novos impérios econômicos e Estados, numa universalização jamais vista, e por descobertas tecnológicas e científicas, que exigem do legislador mais que meros expedientes legislativos, senão intensa arte de ourivesaria, na elaboração legislativa, porque o verdadeiro direito é aquele que anda de mãos dadas com a justiça social e com a realidade.

          As leis são amostras de comportamento que traduzem a consciência social de um povo e de uma era e devem-se harmonizar com as novas realidades que despontam, para não se apartar de vez do homem e fenecer solitária.

          Fruto de um momento ultrapassado, as transformações sócio-econômicas deveriam, efetivamente, ser consideradas.

          O direito romano é fonte primeira do processo de execução, que recaía sobre o próprio devedor e não sobre seus bens, calcada no impiedoso sistema escravagista.

          No direito medieval, sob a influência da invasão bárbara, mas ainda envolvida pelo direito romano, a execução por dívidas fazia-se sobre o próprio devedor ou sobre seus bens móveis, com exclusão dos imóveis, em vista do regime corporativista da propriedade.

          Só na Itália do norte, surge com extrema nitidez, a execução de caráter coletivo, remanescendo ainda as penas severíssimas, para os devedores falidos e a falência, por si só, constituía-se em crime. A finalidade primeira era a liquidação do patrimônio do devedor, através da execução coletiva. Essa fase encerra-se com a primeira grande guerra mundial.

          A seguir, a preocupação maior era a preservação da empresa, todavia, ainda, de forma empírica, como o faziam a lei espanhola, francesa, inglesa, norte-americana (USA) e alemã.

          Numa fase posterior, que se iniciaria, para alguns, após a segunda guerra e, para outros, mais recentemente, o núcleo de toda discussão se centra especialmente numa postura inovadora, visando o saneamento da empresa e sua preservação, para se liquidar somente, quando inviável e inevitável aquela solução.

          A empresa é, hoje, encarada como uma entidade de suma importância e sua recuperação não advém de mera abstração, senão de uma realidade incontestável, com assento na doutrina e no direito alienígena.

          A Alemanha experimentou a Lei do Acordo, de 1935, a Espanha reconhece situações distintas entre a empresa que não paga, por dificuldades financeiras de momento, contornáveis, e a que simplesmente deixa de pagar.

          A França, na vanguarda, tem em vista a salvaguarda da empresa, a manutenção das atividades empresariais e o emprego.

          Roger Houin enriquece o relatório elaborado por uma comissão de juristas franceses, com um memorável comunicado, com reflexos não só no direito comercial francês, mas também no direito comparado, pois defende a permanência da empresa dentro da falência, já que ela interessa não apenas aos assalariados, mas também aos sócios, especialmente aos acionistas e à própria economia do país.

          O Estado tem, por dever ético, ofertar condições, para sua sobrevivência e não massacrá-la.

          Na Itália, Ferrara sugere que o instituto em vigor passe a chamar-se de saneamento da empresa. Os Estados Unidos da América cuidam de reorganizar a empresa permitindo ao devedor manter todos os poderes de gestão e representação da empresa.

          A simplificação, a conciliação de todos os interesses e a observância, fundamentalmente, da economia processual deverá nortear qualquer reforma.


          NO DIREITO BRASILEIRO

          No Brasil, as Ordenações Manuelinas tratava das quebras, expressão esta tomada pelo Direito Comercial, mas no sentido de falência, pois o artigo 798 do Código Comercial dispunha que a falência ou quebra podia ser causal, culposa ou fraudulenta.

          Entretanto, o Alvará 13 de novembro de 1756, segundo Cayru, é o instrumento básico do direito falimentar português e o que vigorou no Brasil.

          O Decreto 917, de 24 de outubro de 1890, integrou o vocábulo falência ao direito falimentar, assim permanecendo até os dias atuais. A falência é o estado em que se encontra um comerciante insolvente. O falido perde a administração e a disposição dos seus bens.

          O Decreto-lei 7661, de 1945, em vigor com as alterações posteriores, apresenta dois sinalizadores de envergadura: a impontualidade e os atos de falência. A insolvência distingue-se do ato de falir.

          Faz-se necessário um texto que, realmente, acompanhe as profundas mudanças por que vem passando a sociedade.

          Tribute-se, contudo, aos autores do projeto de lei que se transformou no Decreto-lei 7661, de 21 de junho de 1945, em vigor, os méritos de haverem construído uma arquitetura moderna, para a época, com inúmeras inovações, tais como maiores poderes ao magistrado, a concessão de benefício ao devedor honesto, traduzido pela concordata. (1)


          OS PROJETOS DO EXECUTIVO

          O Poder Executivo, através da Mensagem n º 1014, de 21 de dezembro de 1 993, enviou ao Congresso Nacional texto do projeto de lei, elaborado pelas Comissões constituídas pelas Portarias 233, publicada no DOU, de 9 de maio de 1991, e 552 MJ, acompanhado da Exposição de Motivos do então Ministro da Justiça, atualmente ornando o Supremo Tribunal Federal, Dr. Maurício Corrêa. O Projeto de Lei 4376/93 está em trâmite no Congresso Nacional, prestes a ser votado.

          Participaram da primeira Comissão, instituída pelo Ministro Jarbas Passarinho, coordenada pelo Dr. Raul Bernardo Nelson de Senna, os Drs. Leon Frejda Szklarowsky (secretário), Geraldo de Camargo Vidigal, assessorado pelos Drs. Geraldo Facó Vidigal, Marcos da Costa e Fernando D’ Almeida e Souza Júnior; Solange Nascimento Velloso, Carlos Alberto de São Tiago Hagstrom, Danilo José Loureiro, Maria Luíza Grossi Franco Neto e Marília Pinheiro de Abreu Miranda (2); e da segunda, presidida pelo Dr. Alfredo Bumachar Filho, os Drs. Leon Frejda Szklarowsky, Fran Martins, Rubens Requião, Werter R. Faria, José Fernando Mandel e João Raimundo Cysneiros Vianna. (3)

          Pela Mensagem 1014/93, o Poder Executivo encaminhou o Projeto de Lei 4376, de 1993, com o objetivo de regular a falência, a concordata preventiva e a recuperação de empresas que exercem atividade econômica regida pelas leis comerciais.

          Este projeto, fruto de duas comissões instituídas pelo Ministério da Justiça, traz à discussão uma questão sumamente polêmica, como a submissão da empresa pública e da sociedade de economia e outras entidades estatais que explorem atividade econômica.

          Algumas observações são dignas de apreciação, com relação a esse documento: pagamento parcial, antes do ajuizamento, e não apenas o total da dívida, e a novação, após o pedido de falência, são razão suficiente para impedir a decretação da liquidação judicial, como constava do projeto originário elaborado pelo Executivo. A legitimidade para requerer a recuperação deverá ser ampliada, nos moldes da redação originária do referido projeto.

          A nova modalidade de despacho, na petição inicial, ordenando a realização de vários atos, sucessivamente, visando a economia processual, como já o fizeram o artigo 7o. da Lei de Execução Fiscal e, atualmente, o CPC, em consonância com as saudáveis alterações propostas pelo Ministro Sálvio Teixeira, deverá, sem dúvida, ser encampada, pela subemenda global do Relator.

          O relator da Comissão Especial, Deputado Osvaldo Biolchi, em seu relatório, apreciando o projeto do Executivo, tece elogios a este, pela disposição de modernizar e trazer inovações necessárias, mas insurge-se contra a estrutura do mesmo, visto que, na sua opinião, manteve o esqueleto do decreto-lei vigente (4).

          Opõe-se à submissão das empresas públicas e das sociedades de economia mista à lei de recuperação e liquidação judiciais. No caso de empresas públicas, porque seu conceito é bastante amplo e, portanto, até as autarquias e fundações a ela estariam sujeitas.

          Quanto às demais, porque colidem com a política de desestatização que se vem iniciando, por razões estratégicas e de interesse público. Não obstante, aceita contribuições propostas por parlamentares, por juristas especialistas e pela OAB-DF, e propõe a aprovação do Projeto de lei do Executivo na forma do substitutivo.

          Os objetivos das Comissões, que elaboraram os anteprojetos de leis, concentravam-se primacialmente na modernização do vigente diploma legal, vez que, promulgado numa época em que o Brasil ainda se encontrava numa fase subdesenvolvida, está plenamente superado. (5)

          O projeto governamental apresentou inúmeras novidades revolucionárias, destacando-se o instituto da recuperação da empresa (6), visando reorganizá-la, ao invés de destruí-la, para a manutenção dos empregados e a preservação da produção e circulação da riqueza, tendo em vista o desenvolvimento e o bem estar sociais; extensão às empresas estatais dos benefícios da recuperação, se esta não ocorresse às custas do Tesouro Público e sim do próprio esforço; expressa submissão dessas empresas - sociedades de economia mista, empresas públicas e outras entidades estatais - à falência, desde que explorem atividade econômica, em consonância com o artigo 173 da Constituição da República; supressão da concordata suspensiva, porque, no curso desta e da falência, poder-se-á propor a recuperação da empresa.

          Também facultou que a publicação dos atos e termos do processo se fizesse por quaisquer meios idôneos de comunicação e as citações e intimações, também pelo correio ou qualquer meio idôneo de comunicação, acompanhando sem dúvida o progresso incontestável na área de comunicação.

          Desenha algumas figuras novas, como o administrador judicial (pessoa física ou jurídica), que administrará os bens do devedor, em liquidação judicial, ou auxiliá-lo-á na administração, durante a reorganização, e o comitê de recuperação, sob a supervisão do juiz, para assisti-lo, na superação da crise, ou fiscalizar os atos do administrador judicial, se decretada a liquidação judicial, novo nome dado à falência.

          A intervenção do Ministério Público continua obrigatória, contudo, para dinamizar o processo, este será imediatamente encaminhado ao magistrado, se não houver pronunciamento daquele órgão em tempo hábil. Esta novidade não poderá ser olvida pelo legislador, visto que impedirá a morosidade do processo e bvios prejuízos que acarreta.


          SUBSTITUTIVO DO RELATOR

          O substitutivo (7) inova, na denominação do projeto, e manteve a preocupação maior na recuperação econômica da empresa, ao invés de esmagá-la, alcançando ainda as micro-empresas, sem restrição de um mínimo de cem empregados, tal qual propuséramos, nas Comissões, porquanto a constrição simplesmente abortaria esse instituto. As comunicações processuais serão feitas, também, por meios eletrônicos e modernos, adotando sugestões de juristas e de entidades, o que é extremamente louvável. (8)

          Resguardou as linhas mestras do projeto, expurgando, contudo, algumas proposições, que realmente não se justificam, e a concordata preventiva deixa de existir, o que, de fato, se coaduna com o espírito do projeto.

          Efetivamente, não tem sentido que um texto inovador preserve o arcaico instituto da concordata preventiva, desde que tenha admitido a recuperação da empresa.


          SUBEMENDA AGLUTINATIVA GLOBAL ÀS EMENDAS DE PLENÁRIO AO SUBSTITUTIVO ADOTADO PELA COMISSÃO ESPECIAL AO PL Nº 4376/B, DE 1993 (PL Nº 205, de 1995, apensado) (9).

          O texto da SUBEMENDA AGLUTINATIVA GLOBAL ÀS EMENDAS DE PLENÁRIO AO SUBSTITUTIVO ADOTADO PELA COMISSÃO ESPECIAL AO PL Nº 4376/B, DE 1993 (PL Nº 205, de 1995, apensado), preservou e regula com muita propriedade a recuperação da empresa, no âmbito judicial, (10) e introduziu, com muita propriedade, a recuperação extrajudicial, no Capítulo IV (artigos 76 e segs.), muito embora não tenha absorvido notáveis novidades trazidas pelo projeto originário.

          A recuperação extrajudicial não constava do substitutivo inicial nem dos projetos do Poder Executivo e sua inserção enriqueceu sobremaneira a subemenda aglutinativa.

          Esse texto foi alterado pela SUBEMENDA GLOBAL DO RELATOR ÀS EMENDAS DE PLENÁRIO AO SUBSTITUTIVO ADOTADO PELA COMISSÃO ESPECIAL AO PL Nº 4376/B, DE 1993 (PL Nº 205, de 1995, apensado) e que será objeto de nosso estudo.


          SUBEMENDA GLOBAL DO RELATOR ÀS EMENDAS DE PLENÁRIO AO SUBSTITUTIVO ADOTADO PELA COMISSÃO ESPECIAL AO PL Nº 4376/B, DE 1993 (PL Nº 205, de 1995, apensado) (11)

          Fizeram-se inúmeras alterações ao texto da subemenda aglutinativa global às emendas de plenário ao substitutivo adotado pela Comissão Especial ao PL nº 4376/B, de 1993 (PL nº 205, de 1995, apensado), alterando ou suprimindo artigos.

          Trataremos, basicamente, da recuperação de empresa e dos princípios gerais da subemenda global do relator e algumas modificações pontuais, que dizem respeito à recuperação e à falência.


          RECUPERAÇÃO JUDICIAL

          A recuperação judicial da empresa está inscrita, no Capítulo III, e visa saneá-la da situação crítica do devedor, livrando-o da crise econômico-financeira.

          O QUE É

          A recuperação judicial é ação judicial.

          O foro competente, para a homologação da recuperação extrajudicial, da decretação da recuperação judicial ou da falência, é o do domicílio do devedor, onde esteja situado o seu principal estabelecimento ou a filial da empresa com sede fora do País.

          O objetivo é: 1- sanear a situação de crise econômico-financeira do devedor. 2- salvaguardar a manutenção da fonte produtora, do emprego de seus trabalhadores e os interesses dos credores e 3- viabilizar a função social da empresa.

          O alcance desse instituto é significativo.

          QUEM É O DEVEDOR

          O devedor em estado de crise econômico-financeira é aquele que está sujeito às dificuldades temporárias do negócio, caracterizadas pela iliquidez, insolvência ou situação patrimonial que exija readequação planejada de sua atividade.

          A viabilidade econômica tem como pressupostos, dentre outros fatores, a importância social e econômica da atividade do devedor no contexto local, regional e nacional, a mão-de-obra e a tecnologia empregadas, o volume do ativo e do passivo, o tempo de funcionamento e criação da empresa, o faturamento anual e o nível de endividamento.

          Outros aspectos poderão ser considerados, pois a relação não é exaustiva.

          QUEM SE SUBMETE A ESSE REGIME JURÍDICO

          A sociedade empresaria, a sociedade simples, a sociedade cooperativa e o empresário individual podem requerer a sua própria recuperação judicial.

          A recuperação judicial também poderá ser requerida, conforme o caso, pelo liquidante, cônjuge sobrevivente, herdeiros do devedor, inventariante e pelo sócio remanescente.

          Entretanto, não se sujeitam a esse regime as pessoas físicas que exerçam atividade econômica autônoma, de forma individual ou organizada, inclusive quem explore propriedade rural, desde que seu patrimônio líquido e sua renda anual não ultrapassem os limites estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal, para os fins de declaração do imposto de renda, pessoa física.

          O último texto da emenda aglutinativa, tal qual o substitutivo do relator e a atual subemenda global do relator não admitem nem a recuperação das empresas nem a falência dos ativos das empresas públicas e das sociedades de economia mista e das instituições financeiras, porque sobre elas deverão dispor leis específicas..

          Contudo, não há por que afastá-las. Os argumentos, data máxima vênia, não convencem.

          A subemenda adota a terminologia do projeto do Executivo voltando a chamar-se falência ao invés de liquidação judicial

          MINISTÉRIO PÚBLICO

          O Ministério Público passa a intervir necessariamente nos processos de falência e recuperação judicial.

          Não obstante, o ideal, como pretendia o projeto original, será a intervenção do parquet em todos os atos previstos na lei, mas se, sua manifestação não se der no prazo indicado, os autos retornarão ao Juízo, evitando-se desta maneira atrasos injustificáveis, com o que se dinamizará o curso do processo.

          QUEM PODE REQUERER

          Podem requerer a recuperação da empresa a sociedade empresaria, a sociedade simples, a sociedade cooperativa e o empresário individual e, conforme o caso, o liquidante, o cônjuge sobrevivente, os herdeiros do devedor, o inventariante e o sócio remanescente.

          CONDIÇÕES NECESSÁRIAS

          A condições imposta é: exercício de suas atividades por mais de dois anos, de forma regular, e ainda preencha o devedor os seguintes requisitos:

          I – não ser falido ou, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes;

          II – não ter, há menos de 5 (cinco) anos, requerido recuperação judicial ou não ter deixado de cumprir recuperação judicial anterior;

          III – não ter pedido de falência pendente, salvo se, julgado improcedente, encontrar-se em exame pela instância recursal; e

          IV – não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio-controlador de empresa, pessoa condenada por qualquer dos crimes capitulados nesta lei.

          FORMAS DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL

          A recuperação pode dar-se por meio da concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas, vincendas ou que se vencerem antecipadamente, em virtude da recuperação judicial.

          Também poderá ocorrer, por outros meios, tais como: I - concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas, vincendas ou que se vencerem antecipadamente por força do requerimento de recuperação judicial; II - cisão, incorporação, fusão, constituição de subsidiária integral ou cessão de quotas ou ações da sociedade; III - substituição total ou parcial dos administradores; IV - aumento de capital social; V – arrendamento, de preferência às sociedades cooperativas formadas por empregados da própria empresa, atendendo às exigências de seguro dos bens e outras que o juiz entender necessárias, sem que se caracterize a sucessão de dívidas ou transferência de direitos e obrigações; VI - celebração de acordo coletivo de trabalho, inclusive para reduzir salários e aumentar ou reduzir a carga horária dos trabalhadores; VII - dação em pagamento ou novação de dívidas do passivo, com ou sem constituição de garantia própria ou de terceiro; VIII - constituição de sociedade de credores; IX - venda parcial dos bens; X - equalização dos encargos financeiros relativos a débitos de qualquer natureza, tendo como termo inicial a data da distribuição do pedido de recuperação judicial, aplicando-se inclusive aos contratos de crédito rural, sem prejuízo do disposto nas legislações específicas que disciplinam a matéria; XI - usufruto da empresa; XII - administração compartilhada; XIII - emissão de debêntures, sujeita à condição de aceitação pela maioria em assembléia de credores; XIV – constituição de sociedade de propósito específico para adjudicar em pagamento dos créditos os ativos da empresa em recuperação judicial, ressalvado o direito dos credores dissidentes receberem seus créditos quando da realização dos ativos, pelo valor que lhes caberia em rateio proporcional aos valores de avaliação; e XV – substituição de garantia.

          O rol de hipóteses é exemplificativo, de sorte que poderá haver outras situações que autorizem a recuperação.

          PETIÇÃO INICIAL

          A petição inicial será instruída com os documentos indicados no artigo 52 desta subemenda, destacando-se o plano de recuperação judicial e o resumo, com a estimativa do prazo necessário para o cumprimento da mesma.

          A subemenda trata exaustivamente da matéria, prevendo a constituição pelo juiz do comitê e do administrador judicial e de todos os atos judiciais e o processo.

          A questão fundamental que se antepõe é saber-se se todo o processo não conduzirá a uma via crucis que, tal qual ocorre atualmente com concordata, eternizará a recuperação judicial com reais prejuízos para o devedor e para o credor, anulando as boas intenções do legislador.

          ASSEMBLÉIA GERAL DE CREDORES

          A assembléia geral de credores exerce função das mais importantes, seja na falência, seja na recuperação da empresa.

          Na recuperação judicial, aprova ou revê o plano apresentado pelo devedor, propõe alternativas ou concorda com o mesmo, requer a constituição do Comitê de Recuperação Judicial, indica seus membros, composto por cinco membros efetivos e suplentes, escolhidos dentre os grupos de credores (grupos de empregados, credores quirografários, com garantia real ou privilégios e do devedor), sem descurar de outros miteres.

          Na recuperação extrajudicial, delibera sobre o acordo de recuperação, produz documentos, aprova a proposta de recuperação do devedor, além de outros encargos.

          A convocação far-se-á, pelo juiz, na recuperação judicial e na falência, por meio de edital, publicado no órgão oficial. Conquanto preveja que a citação, a intimação, a interpelação, a reclamação e a comunicação possam ser feitas também por qualquer meio eletrônico de transmissão de mensagens, omitiu a subemenda global do relator a expressa menção da edição do aviso em site próprio da Internet, aproveitando a grande oportunidade de encampar uma das maiores conquistas, na área de comunicação.

          Em se tratando de recuperação extrajudicial, o devedor deverá fazê-lo, também mediante publicação de edital.

          ADMINISTRADOR JUDICIAL E COMITÊ DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL

          O juiz, no prazo de dez dias, deverá analisar o pedido de recuperação judicial e, se estiver de acordo com as exigências legais, determinará seu processamento e nomeará o administrador judicial, mandando constituir o comitê de recuperação judicial, se cabível, isto é, no caso de suma complexidade do procedimento concursal e em vista do poder econômico-financeiro do devedor.

          O comitê poderá ser constituído, por ordem do juiz, em qualquer fase da recuperação judicial, a requerimento da assembléia.

          O administrador deverá ser um profissional idôneo, de nível superior, com formação, preferencialmente, em uma das seguintes áreas: direito, economia, administração de empresa ou contabilidade.

          O comitê, presidido pelo administrador, terá a representação dos empregados, da classe de credores com garantia real ou de privilégios e do devedor.

          RECUPERAÇÃO EXTRAJUDICIAL

          Esta é uma novidade alvissareira, permitindo que o acordo de recuperação da empresa possa ocorrer fora do âmbito judicial, formalizado em instrumento próprio ou por deliberação da assembléia geral de credores. (12) Esta situação não caracteriza a falência.Trata-se de acordo, confluência de vontades, eis por que é perfeitamente compatível com o instituto da arbitragem.

          Segundo a proposta da subemenda global do relator, o devedor deverá apresentar o plano de recuperação extrajudicial, para os credores ou classe de credores, devidamente convocados.

          A assembléia geral dos credores, realizada na cidade, em que estiverem domiciliados os credores, representando a maior parcela do passivo, será convocada por edital, publicada duas vezes, com intervalo de cinco dias, em jornal de circulação nacional.

          O devedor deverá demonstrar a viabilidade da recuperação, da mesma forma prevista para a recuperação extrajudicial.

          HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL

          O artigo 77 dessa subemenda global do relator, tal qual a subemenda aglutinativa global, dispõe que o devedor poderá requerer sua homologação em Juízo.

          Ora, essa homologação descaracteriza totalmente o instituto da arbitragem ou da solução de conflitos mediante acordo, previsto na Lei 9307, de 2 de setembro de 1996, e também no Código Civil de 2001. Se o legislador tencionava permitir que a recuperação se fizesse, de maneira célere e desburocratizada, na verdade seu intento será anulado, em face dessa faculdade que, na prática, se tornará obrigatória.

          Nem se diga que, para valer perante terceiros, mister se faz sua homologação judicial, visto que a própria subemenda admitiu sua existência, independentemente da homologação pelo juiz.

          Essa prática – solução amigável das pendências – é universalmente aceita e operada, em todos os Países.

          A Lei de Sociedade por Ações foi contemplada com a alteração, permitindo a previsão, nos estatutos das sociedades por ações, da possibilidade de resolução das dissidências, por meio da arbitragem, entre os acionistas e a companhia, ou entre os acionistas controladores e os acionistas minoritários (Lei nº 6404, de 15 de dezembro de 1976, alterada pela Lei nº 10303, de 31 de outubro de 2001, artigo 109, parágrafo terceiro).

          A Lei 9307/96 não deixa margem a qualquer dúvida, quanto a sua constitucionalidade, porquanto o artigo 25 determina que, sobrevindo, no curso da arbitragem, divergência acerca de direitos indisponíveis, de cuja existência ou não, dependerá o julgamento, o árbitro ou o tribunal arbitral mandará as partes, para o Juízo competente. A seu turno, o artigo 31, erige a sentença arbitral, se condenatória, em título executivo, com os mesmos efeitos da decisão proferida pelo Poder Judiciário e não inibe a parte de ingressar, em Juízo, seja para embargar possível execução, seja para demandar sua nulidade (artigos 31 a 33). Neste sentido, a opinião dos doutos (Célio Borja, Frederico Marques e Hamilton de Moraes e Barros, apreciando a lei anterior, e, já, recentemente, José Janguiê Bezerra Diniz, Geraldo Brindeiro, Carlos de Laet, Stefânia Guimarães e Regis de Oliveira). A sentença arbitral estrangeira ficará sujeita apenas à homologação do Supremo Tribunal Federal, para ser reconhecida ou executada, no País. (13)

          O Supremo Tribunal Federal julgou constitucional a Lei 9307, de 23 de setembro de 1966, tendo como relator o Ministro Nelson Jobim.

          A Lei 8987/95, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão de serviços públicos previstos no artigo 175 da CF, estabelece como cláusula essencial a que diz respeito ao foro e ao modo amigável de solução das divergências contratuais, conquanto se aplique a esses contratos administrativos a Lei 8666/93, a qual estabelece as normas gerais sobre licitações e contratos com a Administração Pública. Assim, também a Lei Geral de Comunicações e a Lei do Petróleo.

          O Deputado Ricardo Fiúza aceitou nossa sugestão, no sentido de propor o acréscimo de um parágrafo ao artigo 853 do Código Civil, autorizando o Poder Público a submeter-se à arbitragem, nas relações de contrato público e licitações. (14)

          A melhor doutrina aconselha, com ênfase, essa postura, destacando-se os mestres, Carlos Mota Pinto e Maria C. Menezello.

          O mundo dos negócios exige presteza e não se compatibiliza com a burocracia e morosidade.

          CONCORDATA

          A concordata pode ser preventiva ou suspensiva e difere fundamentalmente da recuperação da empresa, pelos seus fundamentos e natureza.

          O Código Comercial admitia o instituto da moratória.

          De acordo com a lei vigente, Sampaio de Lacerda sustenta que a concordata preventiva ou suspensiva é o ato processual pelo qual o devedor propõe a melhor forma de proceder ao pagamento dos credores. Estuda o autor as várias teorias que explicam a natureza jurídica da concordata.

          Trata-se na verdade, como expõe esse estudioso, de ação visando a prorrogação do prazo para pagamento ou a remissão parcial dos débitos. Ou ainda da modalidade mista, que engloba as duas, com o objetivo de obter abatimento e pagar num prazo maior. (15)

          Conquanto a concordata tenha em vista também a recuperação do devedor, estendo-lhe o prazo e propiciando-lhe as condições para pagamento da dívida, mediante a moratória ou a remissão parcial da dívida, ou pela comunhão de ambas, sem dúvida, o instituto da recuperação da empresa não se confunde com aquela, por ser de natureza e modalidade diversas. Basta a simples comparação entre ambos os institutos para se chegar e esta conclusão.

          Deste entendimento também partilha Jorge Pereira Andrade, alicerçado nos ensinamentos de Messineo. (16)

          PRÁTICA DIUTURNA

          A recuperação extrajudicial, embora não nominalmente, já vem ocorrendo na prática diuturna.

          Exemplo típico é a possível fusão da VARIG e da TAM, visando a preservação da atividade, de extrema importância para o País e para os credores e empregados.

          A Encol talvez não fosse levada à falência, se esse instituto já existisse no direito positivo, sem embargo da punição que devesse ser imposta a maus administradores. Entretanto, é bom lembrar que, em parte, ela foi aplicada, quando compromissários-compradores se propuseram a terminar a construção de edifícios incorporados, conseguindo pleno êxito.

          Ademais, a utilização desse instituto, extra-oficialmente, ainda que não introduzido no direito positivo, não inibe a punição dos devedores relapsos e criminosos.

          MICROEMPRESAS E EMPRESAS DE PEQUENO PORTE

          A referida subemenda global do relator também trata da recuperação judicial das micro-empresas e empresas de pequeno porte (17), sem a restrição de um mínimo de cem empregados, tal qual propuséramos, na primeira Comissão ministerial, vez que aquele instituto traduz moderna orientação doutrinária, agasalhada por inúmeros países.

          Traça procedimento especial e manda aplicar a essas empresas as disposições contidas nas legislações específicas que dispõem sobre o tratamento jurídico diferenciado, simplificado e favorecido. Para os fins desse projeto, elas poderão manter escrituração comercial simplificada. Aplicam-se-lhes as disposições dessa subemenda no que com ele não colidir.

          Lamentavelmente, segundo se depreende da subemenda, somente da recuperação judicial poderá valer-se os empresários de micro-empresas e de pequeno porte.

          Essa restrição não tem sentido, visto que "quem pode o mais, pode o menos". Se o legislador faculta a utilização da recuperação extrajudicial, pelas empresas médias e grandes, por que não permitir também às pequenas empresas essa inovação?

          Na verdade, não há justificativa plausível para essa omissão, pois fere o princípio da isonomia.


          CONCLUSÃO

          A subemenda foi, sem dúvida, alvo de inúmeras inovações, na esteira do trabalho original.

          A empresa é, hoje, encarada como uma entidade de suma importância e sua recuperação não advém de mera abstração, senão de uma necessidade incontestável, com assento na doutrina e no direito alienígena. Afinal, não pode o Estado alhear-se dessa magna questão.

          Esta subemenda apresenta propostas inovadoras que somente enriquecem o projeto do Executivo.

          É extremamente louvável que as citações, reclamações e comunicações previstas no substitutivo em questão possam ser feitas por qualquer meio eletrônico de transmissão de mensagens, desde que seja precedido de atendimento pessoal. Também a carta, mediante assinatura de protocolo, é admitida.

          No entanto, não podia esse projeto desconsiderar a Internet, como meio eficaz e indispensável de comunicação e divulgação, de todos conhecida, assim que diplomas legais mais recentes tem-na adotado, expressamente, como por exemplo, a Lei n° 10520, de 17 de julho de 2002 (18), com fonte no Projeto de Lei de Conversão nº 19, de 2002 (19), da Medida Provisória 2182-18, de 23 de agosto de 2001 (20) (21), que instituiu a modalidade de licitação pregão, no âmbito da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, nos termos do inciso XXI do artigo 37, da Constituição (ementa da Lei) e admitiu o pregão eletrônico. (22)

          Assim, acolhendo a proposta do projeto do Executivo, a citação, intimação, interpelação, reclamação e comunicação serão feitas por qualquer meio eletrônico de transmissão de mensagem ou por carta com aviso de recebimento, ou pessoalmente, mediante assinatura de protocolo, aproveitando-se esta grande oportunidade, para atualizar-se o processo e harmonizá-lo, com os progressos científicos, já abrigados pelo Direito, vez que o direito informatizado é o direito do futuro ou, mesmo, do presente. Pena que não houve menção expressa à Internet.


SUGESTÕES PARA ALTERAÇÃO DA SUBEMENDA GLOBAL DO RELATOR ÀS EMENDAS DE PLENÁRIO AO SUBSTITUTIVO ADOTADO PELA COMISSÃO ESPECIAL AO PL 4376---B/1993 (PL 205, DE 1995, APENSADO) (23)

          Assim, fazemos algumas sugestões como contribuição para o aperfeiçoamento do texto (24).

          1. Pagamento Parcial

          SUGERE-SE A SEGUINTE REDAÇÃO PARA O INCISO IV DO ARTIGO 92 DA SUBEMENDA GLOBAL DO RELATOR

          Determina a subemenda global do relator que, se o requerido provar o pagamento da dívida, não será decretada a falência (artigo 92, IV).

          Sugerimos que, se paga parte da dívida ou for provada a novação, não será decretada sua falência.

          Esses fatos são também bastante fortes para obstar a decretação da falência, restaurando salutar disposição do projeto da primeira comissão, e conforma-se com os princípios que regem a instituição da recuperação da empresa, no nosso Direito, in verbis:

"A falência não será decretada, se o requerente provar o pagamento da dívida, novação após o pedido, ou o pagamento efetuado, antes do pedido, de parcela da dívida exigível".

          2. Legitimidade para requerer a recuperação judicial

          A legitimidade para requerer a recuperação deverá ser ampliada, nos moldes da redação originária do texto das Comissões do Executivo, acrescentando-se parágrafo ao artigo 48 da subemenda global do relator, in verbis:

"Parágrafo único: Podem, também, requerer a recuperação qualquer credor, o Poder Público, o Ministério Público, o administrador judicial e qualquer deles individualmente, bem como os empregados".

          Justifica-se essa postura, por haver o interesse púbico ou econômico, na recuperação da empresa, e, sem dúvida, eles o têm.

          3. Despacho único

          A nova modalidade de despacho, na petição inicial, ordenando a realização de vários atos, sucessivamente, visando a economia processual, como já o fez o artigo 7o. da Lei 6830/80, que dispõe sobre a cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública, de forma pioneira, e, mais recentemente, o Código de Processo Civil, através das salutares alterações propostas pelos Ministros Sálvio de Figueiredo e Athos Gusmão, deveria ser encampada, pela subemenda global do relator.

          A lei de execução fiscal é precursora das medidas saneadoras e desburocratizantes do processo, servindo de modelo, porque, em harmonia, com o princípio da segurança e presteza, proporciona-lhe mais agilidade, tão necessária e desejável quanto o processo de modernização, in verbis:

"O despacho do juiz que deferir a petição inicial importa em ordem para a execução de todos os atos de expediente posteriores".

          4. Certidão negativa de falência e concordata para o devedor contratar com o Poder Público

          O inciso II do artigo 31 da Lei 8666/93 exige certidão negativa de falência e concordata, para habilitação nas licitações, para contratação com a Administração Pública.

          Não se justifica a exigência da certidão negativa da recuperação da empresa, segundo a redação do substitutivo e da subemenda global do relator, pelos motivos que autorizam essa mesma recuperação.

          Conseqüentemente, a concordatária, segundo a lei em vigor, ou a empresa, em recuperação, não pode ser impedida de contratar com o Poder Público (25), visto que essa situação traduz-se em verdadeira contradição e paradoxo.

          Se a recuperação da empresa visa manter a fonte produtora, o emprego dos trabalhadores e o interesse dos credores e tornar viável a realização social da empresa, não pode a lei impedir a concretização desse ideário, mediante tão estapafúrdia exigência, como o faz a citada lei de licitações.

          Ademais, a concordata, na lei atual, ou a recuperação da empresa, com efeito, não pode ser óbice para o exercício de suas atividades empresariais. Qualquer obstáculo se afigura atentatória à Constituição. A restrição para contratar com a Administração Pública, porque em recuperação, encontra barreira intransponível, na definição constitucional do princípio fundamental da isonomia e da livre iniciativa, visto que a ordem econômica está fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, observada a livre concorrência (26).

          A todos assegura a Lei Maior o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente da permissão de órgãos públicos, salvo nos casos previstos na lei. A lei, entretanto, deverá regular o exercício dessa mesma atividade, sem restringir ou fazê-lo, de modo a impedir esse exercício.

          Há que se inserir um dispositivo, neste sentido, deixando bem claro que a recuperação da empresa não será óbice para a habilitação ou contratação com o Poder Público, em função da própria filosofia que a norteia, in verbis:

"Artigo... Não se exigirá do requerente da recuperação da empresa, ou do devedor que estiver no estado de recuperação, certidão negativa dessa situação, para habilitar-se nas licitações perante o Poder Público".

          5. Recuperação extrajudicial e arbitragem

          O artigo 77 da subemenda global do relator deve ser aperfeiçoada, adotando, no que couber, a arbitragem e suprimindo a faculdade de requerer a homologação da recuperação extrajudicial, em Juízo, pois, ao facultar, no caput, que o devedor possa requerer a homologação em Juízo, na verdade, estará na prática transformando a faculdade em obrigação. Essa prática desnaturará totalmente a natureza da recuperação extrajudicial.

          A recuperação extrajudicial, na realidade, é um meio amigável de solução de conflitos, via arbitragem.

          Ora, se a recuperação extrajudicial advém de acordo e a arbitragem é fruto de consentimento, não se justifica a homologação judicial, visto que representará um grande retrocesso, que se não concilia com a filosofia inovadora do projeto que quer celeridade e segurança. E, sem dúvida a arbitragem oferece tudo isso.

          Sugere-se a seguinte redação para o caput do artigo 77 da subemenda global do relator (supressão da faculdade de requerer a homologação judicial), acrescentando um parágrafo e renumerando-se os demais:

"Art. 77. O devedor que celebrar acordo de recuperação extrajudicial, observando os aspectos referidos no artigo 47 desta lei, juntará":

§ 1º Aplica-se, no couber, a Lei 9307, de 23 de setembro de 1996."

§ 2º.......................................................

          JUSTIFICATIVA

          Justifica-se essa proposta, porque a empresa é, hoje, encarada como uma entidade de suma importância e sua recuperação não advém de mera abstração, senão de uma necessidade incontestável, com assento na doutrina e no direito alienígena.

          O texto da subemenda global do relator é bom, contudo mostra-se tímido, em alguns pontos. Deve-se torná-lo, porém, mais leve, maleável e desburocratizante, num universo de constante mutação e que exige celeridade, notadamente quando se trata de assuntos econômicos e comerciais, que não podem ficar a mercê de morosa solução ou de fórmulas arcaicas imprestáveis, sob pena de não atingir o fim colimado, podendo o legislador aproveitar a grande oportunidade de realizar uma obra duradoira, que se harmonize com as necessidades do século XXI e da transformação produzida pelos meios de comunicação, que permite em segundos atinja o homem os rincões mais longínquos do planeta, revolucionando por completo os conceitos, o comércio e as relações humanas.

          Conquanto a subemenda global do relator tenha dado um grande passo, ao adotar a recuperação extrajudicial, não pode o Legislativo desprezar a arbitragem em sua plenitude, como notável instrumento utilizado por inúmeros países e que no Brasil ainda vem encontrando férrea resistência, muito embora a paulatina aceitação já é uma realidade inconteste, revolucionando a cultura a respeito.

          O Direito Comercial é, por excelência, dinâmico e consuetudinário. A sociedade deve afeiçoar-se a este novo mundo de gigantescas e rápidas mutações, quando, ironicamente, a sonda espacial Mars Pathfinder pousou, no planeta Marte, percorrendo 500 milhões de quilômetros, com uma precisão matemática, em apenas 7 meses.

          O Brasil, de há muito, prevê em seu ordenamento jurídico o desfecho de conflitos, através da arbitragem, um dos mais antigos e eficazes instrumentos utilizados pelo homem, seja para dirimir disputas internacionais, como para dirimir questões de direito privado, especialmente de direito comercial.

          A Constituição vigente expressamente manifesta sua adesão aos Tratados Internacionais de que o País seja parte (artigo 5o, § 2o.) e não se incompatibiliza com o juízo arbitral.

          A Lei de Sociedade por Ações foi contemplada com recente alteração, permitindo a previsão, nos estatutos das sociedades por ações, da possibilidade de resolução das dissidências, por meio da arbitragem, entre os acionistas e a companhia, ou entre os acionistas controladores e os acionistas minoritários (Lei nº 6404, de 15 de dezembro de 1976, alterada pela Lei nº 10303, de 31 de outubro de 2001, artigo 109, parágrafo terceiro). A Lei 9307/96 não deixa margem a qualquer dúvida, quanto a sua constitucionalidade, porquanto o artigo 25 determina que, sobrevindo, no curso da arbitragem, divergência acerca de direitos indisponíveis, de cuja existência ou não, dependerá o julgamento, o árbitro ou o tribunal arbitral mandará as partes, para o Juízo competente. A seu turno, o artigo 31, erige a sentença arbitral, se condenatória, em título executivo, com os mesmos efeitos da decisão proferida pelo Poder Judiciário e não inibe a parte de ingressar, em Juízo, seja para embargar possível execução, seja para demandar sua nulidade (artigos 31 a 33). Neste sentido, a opinião dos doutos (Célio Borja, Frederico Marques e Hamilton de Moraes e Barros, apreciando a lei anterior, e, já, recentemente, José Janguiê Bezerra Diniz, Geraldo Brindeiro, Carlos de Laet, Stefânia Guimarães e Regis de Oliveira). A sentença arbitral estrangeira ficará sujeita apenas à homologação do Supremo Tribunal Federal, para ser reconhecida ou executada, no País.

          O Supremo Tribunal Federal julgou constitucional a Lei 9307, de 23 de setembro de 1966, tendo como relator o ilustre Ministro Nelson Jobim.

          A Lei 8987/95, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão de serviços públicos previstos no artigo 175 da CF, estabelece como cláusula essencial a que diz respeito ao foro e ao modo amigável de solução das divergências contratuais, conquanto se aplique a esses contratos administrativos a Lei 8666/93, a qual estabelece as normas gerais sobre licitações e contratos com a Administração Pública. Assim, também a Lei Geral de Comunicações e a Lei do Petróleo.

          A melhor doutrina aconselha, com ênfase, essa postura, destacando-se os mestres, Carlos Mota Pinto e Maria C. Menezello.

          O mundo dos negócios exige presteza e não se compatibiliza com a burocracia e morosidade

          6. Ministério Público

          O Ministério Público intervirá necessariamente nos processos de falência e recuperação judicial, nos casos indicados na leil. Não obstante, o ideal, como pretendia o projeto original, será a intervenção do parquet em todos os atos previstos na lei, mas, se sua manifestação não se der no prazo indicado, os autos retornarão ao Juízo, evitando-se desta maneira atrasos injustificáveis, com o que se dinamizará o curso do processo.

          Pelo projeto originário, da primeira comissão do Executivo, a intervenção do Ministério Público continua obrigatória, contudo, para dinamizar o processo, este será imediatamente encaminhado ao magistrado, se não houver pronunciamento daquele órgão em tempo hábil.

          Propõe-se, assim, a restauração desse dispositivo, in verbis:

"A intervenção do Ministério Público é obrigatória nos casos previstos na lei, entretanto, se sua manifestação não ocorrer no prazo previsto, os autos serão conclusos ao juiz, presumindo-se sua anuência."

          9. Sociedades de economia mista e empresas públicas e estatais em geral

          Sua exclusão é injustificável, quer face ao artigo 173 da Constituição Federal, quer em virtude da moderna tendência doutrinária, a que o País aderiu.

          Sugere-se a restauração do dispositivo proposto pela comissão do Executivo, in verbis:

"A empresa pública, a sociedade de economia mista e outras entidades que explorem atividade econômica ficam sujeitas a esta lei."

          10. Edição na Internet

          Os atos de maior relevância e as convocações das assembléias gerais exigem ampla divulgação e não podem ficar à margem da Internet, atualmente, um dos instrumentos de suma importância, no mundo moderno.

          Sugere-se então o acréscimo de um parágrafo, o § 5º, ao artigo 230, in verbis:

"A convocação das assembléias de credores será editada também em página própria da Internet, além da publicação em órgão oficial na forma desta lei."


NOTAS

1.       A comissão era composta pelos eminentes juristas Noé Azevedo, Joaquim Canuto Mendes de Almeida, Sílvio Marcondes Machado, Filadelfo Azevedo, Hahnemann Guimarães e Luís Lopes Coelho. ilustre comercialista Rubens Requião, em palestra no Instituto dos Advogados Brasileiros, em 8 de março de 1974, iniciou o movimento pela reforma e modernização da atual lei de falências e concordatas (cf. Curso de Direito Falimentar, 1º volume, Falência, Edição Saraiva, 1975, p. 21).

2.       Texto e Nota Explicativa publicados, no DOU de 27 de maio de 1 992.

3.       Texto publicado, no DOU de 29 de julho de 1993.

4.       Cf. Avulso do Relatório, de 4 de outubro de 1996, Presidente Deputado José Luiz Clerot e Relator Deputado Osvaldo Biolchi, publicado pelo Centro Gráfico do Senado Federal – Brasília.

5.       Cf. anteprojeto do IASP encaminhado ao Ministério da Justiça, sob a coordenação do jurista Rubens Approbato, in Manual de Falências e Concordatas, de Jorge Pereira Andrade, Atlas, 1993; consulte-se a Reforma da Lei de Falências, de Waldírio Bulgarelli, in Revista de Direito Mercantil 83, de 1991, pp.122-136.

6.       Sobre o assunto, consulte-se, a excelente monografia, de Jorge Lobo, Da Recuperação da Empresa no Direito Comparado, Editora Lumen Juris, 1993.

7.       Cf. Substitutivo ao Projeto de Lei 4376-A, de 1993, de 4.12.93, encaminhado pelo Poder Executivo, através da Mensagem 1014/93.

8.       O professor e magistrado, Dr. Avenir Passo de Oliveira assessorou o relator nesta fase.

9.       O projeto, relatado pelo ilustre Deputado Osvaldo Biolchi, foi-nos encaminhado pela sua assessoria (Drs. Eliete e Guilherme Falcão) em 9 de abril de 2003, como SUBEMENDA AGLUTINATIVA GLOBAL ÀS EMENDAS DE PLENÁRIO AO SUBSTITUTIVO ADOTADO PELA COMISSÃO ESPECIAL AO PROJETO DE LEI 4376-B, DE 1993, do qual nos servimos para proferir a conferência no Seminário sobre a Nova Lei de Falências, organizada pela Mission – Desenvolvimento Profissional, em São Paulo, no Hotel CA’D’ORO, contando com a presença do Deputado Osvaldo Biolchi, relator do projeto de lei. Agradecemos a esses profissionais e ao Deputado Osvaldo Biolchi a assistência que nos tem prestado, com muito carinho.

10.     Cf. artigos 46 e segs. da emenda aglutinativa.

11.     Para efeitos didáticos, denominaremos apenas de SUBEMENDA GLOBAL DO RELATOR (texto de maio de 2003, encaminhado pela Dra. Eliete, do Gabinete do Relator, em 29 de maio de 2003).

12.     Propusemos nas Comissões do Ministério da Justiça a faculdade de submeter a instauração da recuperação da empresa, via arbitragem ou mediação, mas fomos vencidos.

13.     Cf. nosso A ARBITRAGEM E OS CONTRATOS PÚBLICOS (in Correio Braziliense, Direito & Justiça 5 julho 99 e REVISTA CONSULEX 29-6-99)

14. Cf. Projeto de lei 7160, de 27 de agosto de 2002, na Câmara dos Deputados.

15.     Contamos com a fidalga assistência do Dr. Mário Delgado, da assessoria do Deputado Ricardo Fiúza.

16.     Cf. Manual de Direito Falimentar, Biblioteca Jurídica Freitas Bastos, 9ª edição, os. 222 usque 230. Idem, 10ª edição.

17.     Cf. Manual de Falências e Concordatas, Atlas, 19993, p. 217. Consulte-se neste sentido, de Walter T. Álvares, Direito Falimentar, com ampla citação da doutrina, Sugestões Literárias,.6ª edição, 1977, ps. 449 456. Cf. ainda A CONCORDATA E A LEI DE LICITAÇÕES E CONTRATOSPublicado na CONSULEX 50, de 9.12.96, no Boletim de Licitações e Contratos - Edit. NDJ 1/97; no Suplemento Tributário LTR 6/97; na Revista dos Tribunais 737; na RTJE 158/9-17,maio/junho 97, e editado na TEIA JURÍDICA - INTERNET, dezembro 96/janeiro97 e na AMATRA, desde nov96).

18.     A subemenda global do relator remete, à legislação específica que rege esse tipo de empresa, para conhecer-se seu conceito. Melhor seria que trouxesse para essa lei, se aprovado for o projeto, os conceitos de micro-empresa e empresas de pequeno porte.

19.     Publicada no DOU de 18 de julho de 2002.

20.     Publicado no Diário do Congresso Nacional nº 10, de 28.6.2002, e 3.7.2002, relatado pelo Deputado Eunício Oliveira (parecer proferido oralmente).

21.     Sobre a constitucionalidade da Medida Provisória que deu origem à Lei 10520/02, cf. nosso Constitucionalidade da MP 2182-18 que deu origem á Lei 10520/02, em publicação.

22.     A MP 2026, de 4 de maio de 2000, foi a primeira Medida Provisória a instituir o pregão, para a aquisição de bens e serviços comuns, tendo sido reeditada 18 vezes, sob numeração diversa e com pequenas variações. Ei-las, pela ordem de edição: 2026-1, 2026-2, 2026-3, 2026-4, 2026-5, 2026-6, 2026-7, 2026-8, 2108-9, 2108-10, 2108-11, 2108-12, 2108-13, 2108-14, 2108-15, 2182-16 2182-17 e 2182-18. Fonte: Internet. Site da Presidência da República – Casa Civil, Subchefia para Assuntos Jurídicos -. www.planalto.gov.br .

23.     Cf. Aspectos Polêmicos do Pregão, in Boletim de Licitações e Contatos n° 9, Editora NDJ, setembro de 2002.

24.     Denominamos simplesmente subemenda global do relator, para maior facilidade.

25.     Em 23 de abril de 2003, entregamos as sugestões feitas com base no texto anterior – subemenda aglutinativa global às emendas de plenário ao substitutivo adotado pela Comissão Especial ao Projeto de Lei 4376-B/93 (PL 205/95,de 1995), ao Deputado Osvaldo Biolchi, relator do Projeto de Lei 4376-B, que regula a falência e a recuperação das empresas que exercem atividade econômica. As propostas atuais são feitas com base na subemenda global do relator, de maio de 2003, mas não diferem substancialmente das anteriores.

26.     Cf. A CONCORDATA E A LEI DE LICITAÇÕES E CONTRATOS, publicado na CONSULEX 50, de 9.12.96, no Boletim de Licitações e Contratos - Edit. NDJ 1/97; no Suplemento Tributário LTR 6/97; na Revista dos Tribunais 737; na RTJE 158/9-17,maio/junho 97, e editado em páginas da Internet, desde dezembro 96/janeiro97 e na AMATRA, desde nov96..

27. Cf. arts. 1o., caput, inciso IV, 5o. caput, 170, caput, inciso IV.

 

 

 

* Advogado e consultor jurídico em Brasília (DF), subprocurador-geral da Fazenda Nacional aposentado, editor da Revista Jurídica "Consulex".

 

 

 

Disponível em: < http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3212 >. Acesso em: 24/10/06.