O I Congresso Mundial contra a exploração sexual de crianças, realizado em Estocolmo de 27 a 31 de Agosto de 1996, estabeleceu um plano de ação coordenador entre os diferentes Estados e os Serviços policiais internacionais. Contudo, as questões de fundo sobre o significado e as causas da Pedofilia permaneceram em aberto.
Os tentáculos desta rede ignominiosa internacional estendem-se desde o Brasil, com 500 mil crianças prostituídas, e os Estados Unidos, com 300 mil, até os países da Europa, como a Bélgica, onde o iníquo pedófilo Marc Dutroux, com as suas caves de tortura e servícias sexuais de crianças, comoveu, recentemente, o mundo.
Em Portugal não há estatísticas publicadas, mas calcula-se que cerca de 900 crianças, de meios e grupos marginais, se prostituam na periferia e centro das grandes cidades, ou estejam implicadas em redes internacionais de prostituição.
Na maior parte dos países de Leste da Europa, não há qualquer legislação contra a prostituição infantil. Em Bucareste, há cerca de 2 mil crianças na rua, que se vendem por um dólar ou por 3 hambúrgueres. Na Hungria, as adolescentes de 13 e 14 anos maquilhadas, vendem o corpo nas auto-estradas a automobilistas estrangeiros de países ocidentais. A Alemanha é o país com maior número de turistas sexuais e de maior demanda de material pornográfico. Seguem-se os Estados Unidos, a Austrália, a França e a Nova Zelândia. Mais de 60 por cento das jovens prostituídas de Berlim provêm dos países de Leste e, muitas vezes, contentam-se com a remuneração duma cama limpa, dum pouco de comida e dum duche quente.
Os Pedófilos de todo o mundo comunicam-se entre si através de imagens e mensagens servidas por meio de técnicas sofisticadas, como a internet. Entre as causas da pedofilia mencionadas no Congresso de Estocolmo, está a pobreza, que induz muitos pais a prostituírem os filhos para sobreviverem, a urbanização não planejada, as migrações, a desintegração familiar e o medo de contágio da aids.
As manifestações púberes dos adolescentes vêm despertar nos pais os problemas não resolvidos da sua própria adolescência.
Tudo o que acontece na adolescência em relação à sexualidade, acontece do mesmo modo na crise de meia idade dos pais, mas em sentido inverso.
Ao canto do cuco na Primavera, corresponde o canto do cisne no Outono. A melodia é a mesma. O desejo é que é diferente. É neste contexto familiar conflitivo, agravado pela desintegração da vida familiar, pela precocidade sexual das crianças, pelo abuso de poder dos adultos e pelas perturbações do comportamento dos pais, que se insere o ato incestuoso. O incesto é uma violência sexual que transgride as leis da vida familiar e perverte a harmonia entre pais e filhos. A passagem ao ato incestuoso é sempre desestabilizador da ordem afetiva e sexual da vítima e do agressor.
O incesto compromete os membros da família a guardar silêncio, sob ameaças de ruptura e de desintegração familiar. Calcula-se que 65 por cento das mulheres foram vítimas alguma vez, durante a infância, de um ato de abuso sexual incestuoso.
O incesto pai - filha é o mais freqüente e as suas conseqüências perniciosas fazem-se sentir:
Na Infância, com insucesso escolar, com perturbações do comportamento, fobias em relação à sexualidade, sexualização das relações (perversões, precocidade sexual), etc.
Na Adolescência, com dificuldades na identidade feminina, rejeição da imagem corporal, estados depressivos graves, perturbações alimentares (anorexia) e outras, delinqüência e prostituição, etc.
Na Adulta, com crises afetivas freqüentes, depressão, disfunções sexuais na relação conjugal (frigidez, vaginismo, etc) e projeção das próprias fantasias incestuosas na sexualidade dos filhos.
Na Velhice, com surtos de angústia e depressão suicidária, sobretudo no início da menopausa.
Numa amostra de 95 casos de relacionamento incestuoso (Estados Unidos, 1989), 42 casos tiveram lugar entre pai e filha, 26 entre irmãos, 17 entre avô e neta e 10 entre primos e outros.
Neste tipo de violência sexual, as circunstâncias, a personalidade do agressor e o aparelho judiciário ocupam um lugar de destaque.
As Circunstâncias - A maior parte das crianças vítimas de abuso sexual urbano ou suburbano são surpreendidas em jardins públicos, à saída das escolas, nos prédios em ruínas ou em descampados. A taxa relativamente baixa de adolescentes-vítimas explica-se, em parte, pela percentagem de uniões contratadas circunstancialmente para ocultar a violação.
A criança curiosa e inexperiente do mundo é facilmente sugestionável pelas propostas e atitudes de um adulto diferente, aparente simpático.
Além disso, é próprio de uma criança em idade escolar acreditar, incondicionalmente, no dogma da infabilidade do amor dos adultos para com ela.
Por vezes, as más condições de vida familiar levam a criança desamparada a vaguear pelas ruas e pelos becos, à procura do pai ou da mãe imaginários, que acabam por encontrar, dramaticamente, na pessoa do pedófilo.
A Personalidade do Agressor - Há pedófilos de todas as condições sociais. Os mais perigosos são, certamente, aquelas em quem a criança confia por natureza, como um idoso, um amigo da família ou aqueles que a criança idealiza pelas suas funções, como um clérigo, um professor, um bombeiro ou um polícia. O ato perverso destas pessoas inesperadas deixa cicatrizes profundas na alma da criança sob a forma de culpa e de angústia. Os pedófilos menos perigosos, do ponto de vista psicológico, são os marginais, os exibicionistas da rua ou os "coitadinhos porque não sabem o que fazem". Estes atuam desde fora, compulsivamente como um relâmpago, e depois são punidos e encarcerados, com grande alívio reparador para a criança. A imagem do mostro é irreversível, mas os efeitos brutais do seu ato acabam por diluir-se criticamente com o tempo: "Afinal é um maluco, um tarado que não sabe o que faz".
O Aparelho Judiciário - A intervenção judiciária é indispensável para a segurança e reparação dos indivíduos. Contudo, a maneira como se atua judicialmente resulta, a maior parte das vezes, traumática, por falta de preparação psicológica dos agentes. O simples fato de se ter de reconstruir os fatos em pormenor e de se ter de sujeitar a exames médicos e psicológicos é já, em si, um segundo trauma. A criança vítima é obrigada a reviver o que para ela foi motivo de grande sofrimento.
Enquanto o Psicólogo é um técnico compreensivo que tenta desdramatizar a situação, o juiz é um técnico obsessivo que dramatiza ainda mais os acontecimentos (hora, dia, lugar, idade...) em nome da justiça.
Como conciliar estas duas abordagens, aparentemente contraditórias, uma de caráter culpabilizante (a judiciária) e outra de caráter sublimatório (a psicológica) para o bem da criança?
Aterrorizados com o oráculo, os pais abandonaram o filho na montanha, onde foi encontrado por um pastor que o levou para a corte do rei de Coríntio. Aí cresceu, convencido de que era o príncipe herdeiro de Coríntio. Entretanto, o adivinho de Delfos voltou a falar ao jovem Édipo para lhe predizer a mesma tragédia. Horrorizado, Édipo deixou o país e dirigiu-se para Tebas. Às portas da cidade, lutou e venceu a esfinge que impedia o caminho aos transeuntes. Contudo, só conseguiu entrar na cidade, depois de ter morto um caçador que lhe bloqueava a passagem.
Na cidade, os habitantes choravam a morte do seu rei que nunca mais regressara da caça e aclamava Édipo, rei de Tebas, porque os livrara da esfinge sanguinária, dando-lhe como esposa a rainha Jocasta.
A tragédia de Édipo, que inspirou milhares de poetas, de escritores e de artistas pelo seu caráter psicologicamente expressivo e coletivo, tornou-se uma referência obrigatória para se compreender a sexualidade humana. A longa história do amor humano, enigmática por natureza, está sujeita a turbulências e desvios na relação com as pessoas amadas, podendo derivar numa tragédia. A Pedofilia, como acidente de percurso da sexualidade, é uma maneira trágica de se relacionar afetivamente com o outro.
Faz parte do destino humano resolver o conflito edipiano com os pais, na devida altura, antes da adultícia, para se viver em paz consigo mesmo e com os outros. O pedófilo é um Edipiano revoltado porque perverteu o amor do pai/mãe para assegurar o próprio prazer. O seu Édipo não resolvido, por razões misteriosas do tempo da infância, levou-o a fixar-se afetivamente em crianças como objetos preferenciais do seu amor perverso.
Incapaz de se relacionar sexualmente com um adulto, a sua sexualidade permanece polimorfa como a da criança. A criança é o alvo dos seus impulsos desgovernados.
Todo o ato de abuso sexual com crianças é edipiano, não só pela sua natureza arcaica, mas pela desproporção entre os 2 parceiros.
A pedofilia transgride a lei das diferenças sexuais e torna-se
uma violação do direi
to a ser o próprio, sem qualquer interferência brutal
do estranho.
Na dinâmica do incesto, o agressor é o pai e a vítima são os filhos/as sob o olhar resignado da mãe impotente.
Finalmente, nas Redes de Prostituição Infantil, a agressão vem da indústria sexual organizada, que, sob o pretexto de turismo, atua sobre milhões de crianças da miséria e da fome, face à passividade complacente dos Estados e dos Governos do mundo inteiro.
Que será do nosso mundo, quando o último tabu que ainda resta for transgredido?
A perversão sexual com crianças começa já a pagar-se caro.
É cada vez maior o número de indivíduos, de grupos e de famílias que, imersos na promiscuidade de costumes, são incapazes de distinguir a proximidade afetiva dentro da distância, a temporalidade do amor dentro da intemporalidade, o ilimitado do coração humano dentro dos limites do espaço e do tempo.
É então que a vida começa a perder sentido e continuar a viver tornar-se-á mais absurdo do que uma aventura maravilhosa.
Na África e na América há milhões de crianças que pagam com a sua integridade física ou mental as dívidas fabulosas dos seus respectivos países.
Mais de 70% das crianças que morrem nestes países é por doenças facilmente curáveis e ainda mais facilmente preveníveis, como o sarampo, a diarréia, o tétano, a pneumonia, etc.
Nos países onde a exploração sexual de crianças é mais intensa, como na Tailândia, nas Filipinas, no Sri Lanka e no Brasil, assiste-se a uma verdadeira catástrofe silenciosa: 40 mil crianças morrem diariamente de desnutrição e de outras doenças, inclusive a aids, por contágio com turistas sexuais do ocidente; 150 mil lutam desesperadamente contra a fome ou contra as seqüelas da mesma; e 100 mil de idade escolar não vão à escola.
Em circunstâncias normais, as raparigas parecem ser mais resistentes do que os rapazes aos riscos dos primeiros anos de vida. Contudo, em determinados países de discriminação sexual contra moças (Índia, Paquistão, etc...), mais de 1 milhão de meninas morrem anualmente, simplesmente por não terem nascido varões. Elas são preteridas aos rapazes no acesso à escola, à saúde e até à distribuição de alimentos em tempos de crise.
Na Europa do final do século, a época que atravessamos não se apresenta nada propícia para as crianças. Com a industrialização urbana e com a alta tecnologia sofisticada, o abandono das crianças e os maus tratos físicos e psíquicos nunca atingiram proporções tão alarmantes: 6 milhões de crianças de famílias ditas normais sofrem de depressão. O trabalho competitivo e excessivamente prolongado dos pais fora de casa veio alterar as relações da vida familiar. Com menos tempo para os filhos e, sobretudo, com menos disponibilidade para ouvi-los, os pais sentem-se culpados. É rara a família onde os pais e filhos conseguem reunir-se para sorrir, chorar, cantar ou simplesmente estar juntos, por causa da interferência da televisão.
Milhões de crianças passam milhões de horas diante do televisor. Além disso, a expansão epidêmica do divórcio vem contribuir ainda mais para que o lar deixe de ser um espaço de segurança e de estabilidade afetiva para milhões de crianças.
As novas famílias de compromisso ou reajustadas depois do divórcio, raramente conseguem sanar as feridas dolorosas dos filhos, provocadas pela separação dos pais.
O resultado desta situação é que muitos pais, consciente ou inconscientemente, rejeitam os filhos, sobretudo quando estes apresentam sinais de revolta ou de sofrimento. Na comunicação pais-filhos, passa-se facilmente ao ato, com maus tratos da parte dos pais ou com violência psicológica da parte dos filhos.
Muitas vezes, os pais, esgotados todos os recursos interiores por falta de tempo para eles próprios, procuram nos filhos e filhas a satisfação sexual que não encontram no parceiro ou como compensação a carências profundas da sua própria infância, nunca satisfeitas.
Neste mundo em transformação, será ainda a criança com o seu mundo próprio uma das nossas maiores prioridades?
O bebê só aprende o que pode assumir, pessoalmente, dando-lhe um significado próprio. Por isso, rigorosamente, ninguém ensina ninguém, em qualquer idade.
Na idade escolar, a criança distancia-se mais dos adultos ao adquirir uma certa maneira de saber, de sentir e de ver as coisas.
A sua filosofia do mundo e da vida torna-se uma "escola própria", diferente da dos adultos.
Na adolescência, a autonomia atinge proporções maiores com a capacidade de estar só, de criar um projeto de vida e de experimentar o seu mundo interior.
O fio condutor deste processo interior para a autonomia é a sexualidade com a erotização do corpo, as novas possibilidades de relacionamento, a curiosidade persistente e a força do desejo.
Quando a sexualidade se altera, é toda a personalidade que entra em crise com perda do gosto de viver. Por isso, qualquer interferência sexual da parte dos adultos, a nível do corpo ou dos desejos da criança, como acontece na pedofilia, compromete gravemente a sua felicidade.
O adulto que respeita a dinâmica própria da autonomia infantil está atento às suas manifestações sexuais e, longe de impor-se, procura viver com a criança, aprendendo com ela.
O fato da criança não andar não significa que não tenha um espaço próprio de proporções ilimitadas. O fato de não falar não quer dizer que não tenha desejos para comunicar. O fato de ser biologicamente imatura não significa que não tenha vida sexual própria a respeitar.
Além disso, está provado que as crianças influem, mais do que se pensava, na vida privada e comportamental dos pais. Assim, os beijos e a afetividade da menina repercute-se na maturidade feminina da mãe, ajudando-a a sentir-se cada vez mais realizada como mulher.
Retirado de : http://www.redemptor.com.br/logos-rd/report/criancas.htm