® BuscaLegis.ccj.ufsc.br
 
OS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE:
POR ONDE CAMINHAM ?
Josiane Rose Petry Veronese
 
 

O processo de construção de um novo direito - o Direito

da Criança e do Adolescente - que não tem a pretensão de ser

autônomo, haja vista que cada vez mais tomamos consciência da

interdisciplinariedade, se apresenta hoje como uma das mais

importantes discussões. Esse direito, sobre o qual nos

debruçamos, evidencia não somente a importância mas a

imprescindibilidade da conjugação de conhecimentos.

O novo Direito da Criança e do Adolescente se constrói

com vistas ao Direito Internacional Público e Privado, ante os

Tratados e as Convenções Internacionais; ao Direito

Constitucional, que no caso brasileiro, defere absoluta prioridade à

criança e ao adolescente; ao Direito Civil, Penal, Trabalhista,

Processual e, ainda, certas leis extravagantes, como a Lei da Ação

Civil Pública, imprescindível em se tratando da tutela dos

interesses difusos.

Há que se considerar, ainda, o seu entrelaçamento com

outras áreas do conhecimento, que não o jurídico, como a

sociologia, psicologia, a criminologia, etc.

Este primeiro tema: Os Direitos da Criança e do

Adolescente: por onde caminham? pretende situar o leitor, ainda

que brevemente, sobre a origem dessa suposta proteção à criança

nas esferas legal e assistencial.

Para tanto, entendo como necessário elaborarmos um

resgate histórico das nossas leis e ações em favor da criança

brasileira, para daí compreendermos no que consiste, efetivamente,

a mudança de paradigma ocorrida. Ou seja, do Direito Tutelar,
cacterizador da "doutrina da situação irregular", para um Direito

Protetor- responsabilizador, da "doutrina da proteção integral".

Reconstituir a história da criança e do adolescente

através das legislações e iniciativas assistenciais surgidas em seu

favor no Brasil, a partir de 1823 - logo após a independência

política de Portugal (7 de setembro de 1822) -, implicou em

resgatar aspectos específicos que traçaram e estruturaram esse
movimento.

O tímido surgimento das primeiras leis e instituições foi

sendo firmado gradativamente. Quando da primeira colocação

sobre o problema da criança, atente-se: da criança negra, em

virtude do nosso sistema escravocrata, na Constituinte de 1823,

não houve uma preocupação com a criança negra em si, quando

JOSÉ BONIFÁCIO defendia que a escrava depois do parto teria

m mês de convalescência, e durante o ano que se seguisse não

trabalharia longe "da cria" ; antes, o que se pretendia era zelar

or aquele que constituiria em breve força de trabalho gratuito: o

escravo.

Com a decretação, em 1871, da Lei do Ventre Livre,

fruto da campanha abolicionista, os senhores de escravos

elineavam dois caminhos: ou recebiam do Estado uma

indenização, deixando no abandono as crianças libertas cujos pais

permaneciam no cativeiro, ou as sustentariam e, em seguida,

cobrariam tal generosidade através de trabalhos forçados até que

completassem 21 anos.

Observando-se o processo de formação das instituições

que prestavam serviços de assistência a menores, verifica-se que

no período colonial e no Império, a mesma se dava em três níveis:

uma caritativa, prestada pela Igreja através das ordens religiosas e

associações civis; outra filantrópica, oriunda da aristocracia rural e

mercantilista e, a terceira, em menor número, fruto de algumas

realizações da Coroa Portuguesa.

Com as mutações sociais, políticas e econômicas que se

sucederam à abolição dos escravos (1888) e à Proclamação da

República (1889), a proteção e assistência à criança carente

tornou-se cada vez mais uma necessidade, sentida sobretudo pelo

próprio corpo social.

A partir de 1920, fortaleceu-se a opinião de que ao

Estado caberia assistir a criança. Tanto que surge desse

período o

trabalho de formulação de uma legislação específica para menores,

o que se consolidou no Decreto n. 17.943 - A, de 12 de outubro de

1927, cuja elaboração foi confiada pelo Presidente Washington

Luiz, ao jurista Mello Mattos.

O Código de Menores de 1927 conseguiu corporificar

leis e decretos que, desde 1902, propunham-se a aprovar um

mecanismo legal que desse especial relevo à questão do menor de

idade. Alterou e substituiu concepções obsoletas como as de

discernimento, culpabilidade, responsabilidade, disciplinando,

ainda, que a assistência à infância deveria passar da esfera

punitiva para a educacional.

A concepção dessa Lei pôs em relevo questões

controversas em relação à legislação civil em vigor. Com o Código

de Menores, o pátrio poder foi transformado em pátrio dever, pois

ao Estado era permitido intervir na relação pai/filho, ou mesmo

substituir a autoridade paterna, caso este não tivesse condições ou

se recusasse a dar ao filho uma educação regular, recorrendo então

o Estado à utilização do internato. Já para o Código Civil (1916),

o pai, enquanto chefe da prole continuava detendo o pátrio poder

sobre todos os que compunham a estrutura familiar: mulher, filhos,

agregados, pessoas e bens sob o seu domínio.

Na esfera constitucional, as Cartas de 1824 e 1891 são

omissas com relação à criança. A primeira a se referir sobre o

assunto foi a Constituição de 1934, ao proibir o trabalho para os

de idade inferior a 14 anos. A partir de 1937, é ampliada a esfera

de proteção à criança desde a infância, ficando ao encargo do

Estado assisti-la nos casos de carência. A Constituição de 1946,

continuou, de igual modo, protegendo-a, desde a maternidade.

Por sua vez a Constituição Federal de 1967, seguida

pela Emenda Constitucional n. 1, de 1969, ao instituir a assistência

ao universo infanto-juvenil, não seguiu no todo as constituições

precedentes, determinando duas modificações específicas. A

primeira, referente à idade mínima para a iniciação ao trabalho,

que passa a ser de 12 anos, e, a segunda, instituindo o ensino

obrigatório e gratuito nos estabelecimentos oficiais para as

crianças de 7 a 14 anos de idade. A postura assumida pelo Estado

brasileiro de permitir o trabalho de crianças com 12 anos, a partir

de 1967, significou um retrocesso com relação às legislações da

maioria dos países.

A Constituição da República Federativa do Brasil,

promulgada em 5 de outubro de 1988, significou um grande avanço

nos direitos sociais e isto por sua vez beneficiou, entre outros, a

criança e o adolescente. Nessa perspectiva, tem-se,

exemplificativamente, que a idade mínima para admissão ao

trabalho é, novamente, fixada aos 14 anos - art. 7º, XXXIII.

Quanto à educação, tal Carta Política, em seu art. 208, determina

como dever do Estado garantir ensino fundamental (primeiro grau),

obrigatório e gratuito, até mesmo para os que a ele não tiverem

acesso na idade própria.

Consoante a presente análise histórica, verificou-se que

a expressão "menor" foi usada como categoria jurídica, desde as

Ordenações do Reino, como caracterizadora da criança ou

adolescente envolvido com a prática de infrações penais. Já no

Código de Menores de 1927, o termo foi utilizado para designar

aqueles que se encontravam em situações de carência material ou

moral, além das infratoras.

Com o surgimento do Código de Menores de 1979,

surge uma nova categoria: "menor em situação irregular", isto é, o

menor de 18 anos abandonado materialmente, vítima de maus-

tratos, em perigo moral, desassistido juridicamente, com desvio de

conduta ou autor de infração penal.

O Código de Menores de 1979, apesar de ter

constituído, em relação ao anterior (de 1927), um avanço em

alguma direções, continha, no entanto, aspectos controversos que

permitiam questionamentos e críticas, como é o caso das

características inquisitoriais do processo envolvendo crianças e

adolescentes, quando a própria Constituição garantia ao maior de

18 anos defesa ampla; o referido Código não previa o princípio do

contraditório. Outro fato que pode ser colocado como exemplo

dessa distorção era a existência para os menores de 18 anos da

"prisão cautelar", uma vez que o menor, ao qual se atribuía a

autoria de infração penal, podia ser apreendido para fins de

verificação, o que significava uma verdadeira afronta aos direitos

da criança, na medida em que para o adulto a prisão preventiva só

poderia se aplicada em dois casos: flagrante delito ou ordem

escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente - art.

5º, LXI da C.F.

O Estatuto da Criança e do Adolescente veio pôr fim a

estas situações e tantas outras que implicavam numa ameaça aos

direitos das crianças e dos adolescentes, suscitando, no seu

conjunto de medidas, uma nova postura a ser tomada tanto pela

família, pela escola, pelas entidades de atendimento, pela

sociedade e pelo Estado, objetivando resguardar os direitos das

crianças e adolescentes, zelando para que não sejam sequer

ameaçados.

Do universo de documentos internacionais que

objetivam os resguardos das garantias dos Direitos Infanto-juvenis,

destaca-se a Convenção sobre os Direitos da Criança, aprovada

com unanimidade pela Assembléia das Nações Unidas em sua

sessão de 20 de novembro de 1989. Se elaborarmos uma análise

pormenorizada desse tratado de Direitos humanos constatamos a

sua efetiva influência sobre o Estatuto da Criança e do

Adolescente.

Nesse sentido, chama atenção o fato de que a

Convenção Internacional, diferentemente da Declaração Universal

dos Direitos da Criança, não se configura numa simples carta de

intenções, uma vez que tem natureza coercitiva e exige do Estado

Parte que a subscreveu e ratificou um determinado agir,

consistindo, portanto, num documento que expressa de forma

clara, sem subterfúgios, a responsabilidade de todos com o futuro.

A citada Convenção, trouxe para o universo jurídico a

Doutrina da Proteção integral. Situa a criança dentro de um

quadro de garantia integral, evidencia que cada país deverá dirigir

suas políticas e diretrizes tendo por objetivo priorizar os interesses

das novas gerações; pois a infância passa a ser concebida não

mais como um objeto de "medidas tuteladoras", o que implica

reconhecer a criança sob a perspectiva de sujeito de direitos.

Interessante ressaltar que o Estatuto não apenas

reconhece os princípios da Convenção como os desenvolve,

convencido de que a criança e o adolescente são merecedores de

direitos próprios e especiais e que, em razão de sua condição

específica de pessoa em desenvolvimento, estão a necessitar de

uma proteção especializada, diferenciada e integral, consoante os

ditames da atual Constituição, art. 227.

O Estatuto da Criança e do Adolescente ao assegurar

em seu art. 1º a proteção integral à criança e ao adolescente,

reconheceu como fundamentação doutrinária o princípio da

Convenção que em seu art. 19 determina: "Os Estados Partes

adotarão todas as medidas legislativas, administrativas, sociais e

educacionais apropriadas para proteger a criança contra todas as

formas de violência física ou mental, abuso ou tratamento

negligente, maus tratos ou exploração, inclusive abuso sexual,

enquanto a criança estiver sob a custódia dos pais, do

representante legal ou de qualquer outra pessoa responsável por

ela".

A nível constitucional, a Constituição Federal de 1988

dispõe em seu art. 227, caput: "É dever da família, da sociedade e

do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta

prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao

lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à

liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-

los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,

exploração, violência, crueldade e opressão".

Assim, também a atual Carta Política tem essa nova

base doutrinária, a qual implica que, fundamentalmente, as

crianças e adolescentes brasileiros passam a ser sujeitos de

direitos. Essa categoria encontra sua expressão mais significativa

na própria concepção de Direitos Humanos de LEFORT: "o direito

a ter direitos" , ou seja, da dinâmica dos novos direitos que surge

a partir do exercício dos direitos já conquistados. Desse ponto de

partida o sujeito de direitos seria o indivíduo apreendido do

ordenamento jurídico com possibilidades de, efetivamente, ser um

sujeito-cidadão.

Convém recordar que a Lei anterior ao Estatuto da

Criança e do Adolescente, o Código de Menores de 1979,

fundamentava-se na Doutrina da situação irregular, isto é, havia

um conjunto de regras jurídicas que se dirigiam a um tipo de

criança ou adolescente específicos, aqueles que estavam inseridos

num quadro de patologia social, elencados no art. 2º do referido

Código. O que equivale afirmar, entende AMARAL E SILVA, que

tal doutrina "confunde na mesma situação irregular, abandonados,

maltratados, vítimas e infratores. Causa perplexidade que se

considerasse em situação irregular o menino abandonado ou

maltratado pelo pai, ou aquele privado de saúde ou da educação

por incúria do Estado". Salienta o autor citado que estará sim em

situação irregular "aquele que descumprir os deveres inerentes ao

pátrio poder ou quem negligenciar políticas sociais básicas. Está

em situação irregular, de ilegalidade, o pai que abandona ou o

Estado que negligencia, nunca o abandonado, a vítima".

O Código de Menores de 1979, ao se dirigir a uma

categoria de crianças e adolescentes, os que se encontravam em

situação irregular, colocava-se como uma legislação tutelar. Na

realidade tal tutela pode ser ententida como culturalmente

inferiorizadora, pois implica no resguardo da superioridade de

alguns, ou mesmo de grupos, sobre outros, como a história

registrou ter ocorrido, e ainda, ocorrer com as mulheres, índios e

outros.

Dessa forma, a Lei n. 8.069/90 significou para o direito

infanto-juvenil uma verdadeira revolução, ao adotar a doutrina da

proteção integral.

Essa nova postura tem como alicerce a convicção de

que a criança e o adolescente são merecedores de direitos próprios

e especiais que, em razão de sua condição específica de pessoas

em desenvolvimento, estão a necessitar de uma proteção

especializada, diferenciada e integral.

O surgimento de uma legislação que se ocupasse

seriamente dos direitos da infância e da adolescência era de

caráter imprescindível, pois havia uma necessidade fundamental de

que estes passassem da condição de menores para a de cidadãos.

O Estatuto da Criança e do Adolescente tem a relevante

função, ao regulamentar o texto constitucional, de fazer com que

este último não se constitua em letra morta. No entanto, a simples

existência de leis que proclamem os direitos sociais, por si só não

consegue mudar as estruturas, antes há que se conjugar aos

direitos uma política social eficaz, que de fato assegure

materialmente os direitos já positivados.

E isto significa que se dê um impulso aos dois grandes

princípios da Lei n. 8.069/90: o da descentralização e o da

participação. A implementação deste primeiro princípio -

descentralização - deve resultar numa melhor divisão de tarefas, de

empenhos, entre a União, os Estados e os Municípios, no

cumprimento dos direitos sociais. No que tange à participação,

esta importa na atuação sempre progressiva e constante da

sociedade em todos os campos de ação. Faz-se assim imperiosa a

edificação de uma cidadania organizada, ou seja, o próprio corpo

social a mobilizar-se. Eis aí o porquê do grande estímulo que o

ECA dá às associações, na formulação, reivindicação e controle

das políticas públicas.

Outra questão presente na Lei 8.069/90 diz respeito a

possibilidade dos direitos da criança e do adolescente serem

demandados em juízo. Portanto, ao tratar da tutela jurisdicional

dos interesses individuais, difusos e coletivos, chama a atenção o

fato de que o Estatuto da Criança e do Adolescente está em

consonância com as novas diretrizes da processualística civil, por

três motivos:

Primeiro, ao contemplar os meios judiciais garantidores

dos interesses da criança e do adolescente, sobretudo no que diz

respeito aos coletivos e difusos, percebe-se que a natureza

privatista do direito processual está sendo objeto de profundas

modificações, as quais remetem à necessidade de superação de

determinadas estruturas tradicionais. Por conseguinte, a Lei n.

8.069/90, ao admitir o ingresso em juízo dos mais variados tipos

de demandas que visem à proteção de seus interesses, importa um

significativo avanço no campo processual, uma vez que não está

presa à idéia de procedimento, de rito, considerando merecedor de

atenção o conteúdo do direito que está sendo pleiteado.

Segundo, ao se preocupar com o tema do acesso à

Justiça, está a nova Lei atenta ao fato de que hoje a garantia desse

acesso se constitui num dos mais elementares direitos, pois a

sociedade pouco a pouco passou a compreender que não mais é

suficiente que o ordenamento jurídico contemple direitos, antes é

imprescindível que estes sejam efetivados, sendo que a propositura

em juízo é, portanto, um dos mecanismos que visam a sua

aplicabilidade.

Terceiro, o acesso à Justiça na interposição de

interesses afetos à criança e ao adolescente se constitui, ainda, em

mais um fator a corroborar no processo de transformação do

próprio Poder Judiciário, o qual passa a ser um instrumento de

expansão da cidadania. Isso se dá porque, da antiga posição de

árbitro de litígios de natureza inter-subjetiva, agora é chamado a

posicionar-se diante de situações de caráter transindividual, como

o são os direitos sociais.

Uma das inovações trazidas pelo Estatuto da Criança e

do Adolescente consiste, justamente, na possibilidade de cobrar do

Estado através, por exemplo, da interposição de uma Ação Civil

Pública, o cumprimento de determinados direitos como o acesso à

escola, a um sistema de saúde, a um programa especial para

portadores de doenças físicas e mentais, etc., previstos na

Constituição Federal e regulamentados pela Lei 8.069/90

Como afirma NOGUEIRA, inegável é o fato de que no

Brasil há toda uma produção legislativa "em favor do cidadão,

concedendo-lhe os direitos individuais, difusos ou coletivos,

através da Constituição Federal, das Constituições Estaduais e das

Leis Orgânicas Municipais, além de outras leis ordinárias, como o

Estatuto da Criança e do Adolescente, mas o que falta, nesse

complexo de leis, é fazer justamente o Estado funcionar, através

de seus governantes, que conhecem os problemas e têm as

soluções, mas que só se preocupam em desfrutar o poder"

Entende PAULA que a lei anterior, ou seja, o Código

de Menores de 1979, "a despeito de ser tratado, por alguns, como

instrumento de proteção e tutela, olvidou que o Estado é o grande

responsável por essa degradante situação na qual se encontra a

maioria da população infanto-juvenil, isentando-o de qualquer

responsabilidade. Considerando os pais ou responsável como

exclusivos causadores da situação irregular, nenhuma menção

existe em relação à omissa participação do Estado e, via de

conseqüência, tão pouco contempla o Código de Menores

mecanismos jurídicos visando compelir o Poder Público a cumprir

suas funções. Assim, restringiu-se a Justiça de Menores do

julgamento de conflitos eminentemente individuais, jamais

colocando a Administração no banco dos réus. O Estado nunca foi

chamado perante o judiciário, sequer para justificar suas

constantes omissões".

Isto posto entendemos que o postular junto ao Poder

Judiciário, visando à garantia dos direitos e interesses individuais,

difusos e coletivos, representa uma evolução do processo

civilizatório. Eis que se evidencia que não mais é suficiente que os

ordenamentos jurídicos proclamem direitos, tornando

imprescindível antes que os mesmos sejam concretizados.

Portanto, o acesso à Justiça se coloca como um dos

direitos humanos, isto é, consiste num caminho ou numa

possibilidade de que os direitos existentes a nível formal, de fato,

venham a ter eficácia plena no mundo dos fatos.

Diante dessas colocações acerca da interposição de

demandas que visam resguardar os interesses afetos à criança e ao

adolescente, o tema conduz também a uma reflexão de que tal

acesso constitui um avanço na construção da cidadania em dois

planos: o primeiro, no sentido de que torna mais explícitos os

direitos da criança e do adolescente, possibilitando à sociedade

uma maior conscientização no que tange ao seu papel de contínua

reivindicação dos citados direitos e interesses. Em segundo lugar,

o próprio Poder Judiciário passa ser encarado como um

instrumento de expansão dessa cidadania, pois suas sentenças, se

deferidoras dos direitos pleiteados, ensejarão, para a sua eficácia,

determinadas realizações por parte do Poder Executivo,

notadamente no campo social.

O tema do acesso à Justiça, o qual não pode ser

entendido como mera capacidade de ingressar em juízo, tem em

seu fundamento a necessidade de uma maior politização por parte

das camadas populares. Nesse sentido, o entendimento de que toda

pessoa humana é sujeito de direitos faz-se imprescindível na

formulação do conceito de cidadania, isto é, como a condição que

identifica os direitos e garantias dos indivíduos, os quais já

satisfeitos em suas necessidades humanas básicas, tenham

condições, quer enquanto indivíduos singularmente considerados,

quer enquanto organizados em grupos, de participarem

efetivamente nos destinos da sociedade e da vida política do país.

Segundo tal leitura, as inovações trazidas pelo Estatuto da Criança

e do Adolescente devem gradativamente revolucionar o modo da

família, da sociedade e do Estado de encararem as questões

relativas à infância e juventude brasileira.

Resta colocar que, ao longo da pesquisa, foi possível

constatar que a questão da criança e do adolescente não deixou de

ser contemplada em leis. No entanto, nem sempre as mesmas

foram obedecidas, o que reforça a idéia de que meros dispositivos

legais não resolvem os problemas sociais. Urgem, portanto,

medidas públicas adequadas à demanda. Faz-se necessária a

implantação de políticas que garantam acesso a uma educação

popular, ao trabalho e ao salário justo; o engajamento de todo o

corpo social, na edificação de uma nação efetivamente cidadã.
 
 
 

Retirado de:  http://www.ccj.ufsc.br/~a9612212/crianca/tema1.txt