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 Construindo a relação entre o Direito da Criança e do Adolescente e o Direito Orçamentário

 

Rinaldo Segundo*

 

Sumário:1. Efetivação de Direitos e Interlocução Orçamentária. 2. Orçamento quase-garantia e efetivação de direitos da criança e do adolescente. 3. Decisão Política Orçamentária: requisitos explícitos e implícitos. 4. O Princípio da Prioridade Absoluta e o Orçamento. 5.A Prioridade Absoluta na Elaboração Orçamentária. 6. A Prioridade Absoluta na Execução Orçamentária. 7. Mandado de Injunção. 8. Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente. 9. Papel dos Órgãos de Defesa e Promoção dos Direitos da Infância e Juventude no Orçamento. 10. Conclusão.


1. Efetivação de Direitos e Interlocução Orçamentária

            Antes de mais nada, dois aspectos devem ser considerados. Primeiro, não é demais lembrar que há dispositivos de cunho orçamentário no direito da criança e do adolescente (Eca, lei nº 8.069/90). (1)

            Segundo, uma possível relação entre os dois ramos jurídicos deve ter em consideração que:

            a) o direito da criança e do adolescente enuncia direitos, prevê programas e ações considerando que estes sejam efetivados prioritariamente;

            b) o orçamento público atua enquanto instrumento de realização das políticas governamentais. Além disso, possui princípios e valores que o informam e caracterizam.

            Isto posto, se se considerar que as políticas governamentais somente se efetivam por meio da interlocução orçamentária e que os direitos da criança e do adolescente, para que se efetivem prioritariamente, exigem a formulação de ações e programas que estejam previstos no orçamento, a conclusão é a de que tais direitos exigem a relação com o direito orçamentário.

            Em suma, reconhecendo-se que – mesmo em se tratando dos direitos civis e políticos, onde, em tese, se exige uma ação negativa do poder público –, os direitos, de uma forma geral, e os direitos da infância e da juventude, em particular, exigem recursos financeiros, a construção da relação entre os dois ramos jurídicos é necessária.

            Resulta daí a concepção de que o orçamento pode ser um "parceiro" privilegiado para a efetivação dos direitos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente.


2. Orçamento quase-garantia e efetivação de direitos da criança e do adolescente

            Pode-se traçar um paralelo entre a relação dos direitos da e garantias constitucionais com os direitos da criança e do adolescente e o orçamento público. Tal como o este, as garantias constitucionais não são um fim em si mesmas, mas instrumentos que tutelam um direito principal. As garantias constitucionais especiais "estão a serviço dos direitos humanos fundamentais". Delineia-se aí a natureza processual das garantias constitucionais especiais que atuam instrumentalmente, pois, servem de meio para a obtenção de direitos e vantagens decorrentes dos direitos que visam garantir. (2)

            Contrariamente, os direitos são um fim em si, na medida em que constituem um conjunto de faculdades e prerrogativas que asseguram vantagens e benefícios diretos e imediatos a seu titular". (3) Em suma, direitos são os bens e vantagens auferidas diretamente pelo seu titular.

            Quando se disse linhas atrás que o orçamento pode atuar como um garantidor de direitos previstos no ECA, não se está a afirmar que ele é uma garantia constitucional especial nos moldes das ações constitucionais. Certamente, o orçamento não é uma norma jurídica concedida aos particulares com o objetivo de exigir o respeito e a observância dos direitos fundamentais em concreto, impondo ao Poder Público atuações que vedem a continuidade do impedimento ao exercício do direito ou possibilitem o exercício de direito ou a sua imediata efetivação. Orçamento, enquanto instrumento de garantia, não é uma ação constitucional nos moldes do mandado de segurança ou do Habeas Corpus.

            Portanto, quando se diz que o orçamento pode ser visualizado como um garantidor de direitos, esta garantia não é aquela prevista no texto constitucional que assegura a observância de direitos em caso de descumprimento ou inobservância de direitos, não possuindo natureza de uma ação constitucional. Garantidor de direitos, no caso em questão, tem o significado de efetivar direitos por meio da realização orçamentária dentro daquela idéia de que há que se ter recursos para efetivar direitos.

            Por não assegurar o respeito ou a observância de direitos, o ideal é que se diga que o orçamento pode assegurar os direitos da criança e do adolescente. O verbo "poder", empregado na expressão acima, remete à noção de possibilidade, isto é, um acontecimento suscetível a ocorrer ou não.

            Daí por que pensarmos que a expressão quase-garantia representa adequadamente a condição do orçamento garantidor de direitos que, não é modalidade de garantia constitucional (ações constitucionais), mas que é imprescindível para que os direitos da criança e do adolescente sejam exercitáveis na medida em que se reconhece que carentes de recursos.

            A expressão quase-garantia remete-nos, também, à idéia de potencialidade, melhor explicando, o orçamento público possui natureza e características possibilitadoras de que a sua exploração seja efetuada com o objetivo de abrigar os direitos da infância e juventude

            Estando no campo da possibilidade e da potencialidade para a efetivação de direitos, indaga-se acerca dos fatores que podem atuar e interferir na dinâmica orçamentária de modo a que o orçamento não seja um mero instrumento possível e potencial, mas sim, um instrumento real e efetivo para a garantia dos direitos das crianças e dos adolescentes?

            Sem pretender esgotar o tratamento da questão, pensamos que dois fatores podem contribuir para "ativar" a energia potencial e as possibilidades de realização de um orçamento próximo da idéia de garantia. São elas:

            a) O Interesse e a Mobilização da Sociedade Civil: fatos sociais, visíveis e perceptíveis, a todo momento, em todos os lugares, demonstram que a infância ainda não é a prioridade em nosso país, em que pese discursos retóricos em contrário.

            Um raciocínio plausível pressupõe que o manejo do orçamento pelo poder estatal atenda às necessidades sociais mais prioritárias. Contudo, a disciplina orçamentária está submetida ao juízos políticos decisórios que podem se curvar às conveniências ou aos lobbies que inverteriam àquelas prementes necessidades que requereriam uma satisfação estatal mais urgente.

            Talvez até em função tem havido um crescente interesse pela sociedade civil em atuar na área da infância e juventude através de projetos e ações que promovam uma formação cidadã de crianças e adolescentes. É o que se denomina de terceiro setor. A ação da sociedade civil também pode ser dirigida sobre a coisa pública, constituindo-se o orçamento público em um espaço privilegiado de atuação já que é nele que se materializam as prioridades governamentais.

            A ação da sociedade civil, em todos os momentos do orçamento, ensejaria "olhar de tigre" sobre o orçamento público, inibindo comportamentos eivados de vícios ou imorais e impondo a pauta de prioridades da infância e juventude.

            A atuação da sociedade civil, dentre outros, pode ser efetuada através de:

            a.1) na fase de elaboração orçamentária, elaboração de propostas e organização de diagnósticos que permitam a visualização do quadro geral da situação da infância e juventude com vistas à sensibilização do corpo técnico do poder executivo bem como dos parlamentares. Na verdade, a referida medida conquistaria o apoio da opinião pública, podendo reduzir a margem de manobra política na elaboração do orçamento;

            a.2) na fase de elaboração e execução orçamentária, atenção aos prazos que disciplinam o processamento e a vigência das leis orçamentárias. Isso é de fundamental importância haja vista ser este o momento para a apreciação/inclusão/atendimento das propostas da sociedade civil. Assim é que, ante a inexistência da Lei Complementar a que se refere o artigo 165, § 9º, I e II da C.F., aplica-se o § 2º do art. 35 do ADCT, CF/88 segundo o qual:

            a.2.1) o projeto do plano plurianual será encaminhado até quatro meses antes do encerramento do primeiro exercício financeiro e devolvido para sanção até o encerramento da sanção legislativa. A vigência do plano plurianual inicia-se no segundo ano de mandato e vai até o primeiro exercício financeiro do mandato presidencial, estadual, municipal subseqüente;

            a.2.2) o projeto de lei de diretrizes orçamentárias deve ser encaminhado até oito meses e meio antes do encerramento do exercício financeiro e devolvido para sanção até o encerramento do primeiro período da sessão legislativa;

            a.2.3) o projeto de lei orçamentária deve ser encaminhado até quatro meses antes do encerramento do exercício financeiro e devolvido para sanção até o encerramento do primeiro período da sessão legislativa.

            a.3) na fase de execução orçamentária, articulação junto ao poder executivo para a execução das propostas atinentes à infância e à juventude previstos no orçamento. Sob esse aspecto, é interessante também que exista um acompanhamento das receitas públicas, haja visto que os dados relativos àquela podem fornecer importantes subsídios para a tão usual argumentação de insuficiência de recursos.

            a.4) na fase de fiscalização orçamentária, fiscalização eficiente dos recursos públicos, identificando se o poder público atuou privilegiadamente na formulação e execução de políticas públicas voltadas à infância e à juventude. Há de certificar-se sobre a execução dos recursos previstos na peça orçamentária, inquirindo-se se houve coerência/prioridade paralelamente à execução do orçamento efetuada nas demais áreas.

            Para tal empreitada, exige-se a assessoria de técnicos capacitados aptos a análise dos gastos públicos. Sugerindo que tal fiscalização seja feita com o auxílio do Tribunal de Contas, Universidade e Ministério Público, Valéria Bronzeado informa que: "não há notícia que em algum município brasileiro este trabalho tenha sido desenvolvido". (4)

            b) A observância de dispositivos orçamentários legais e constitucionais em conformidade com o direito da criança: Como se disse, em sua condição peculiar de quase-garantia, o orçamento público representa uma potencialidade que pode contribuir (ou não) para que os direitos da criança e do adolescente sejam efetivados. Nesse particular, a observância de dispositivos orçamentários legais/constitucionais no manejo orçamentário representa um importante passo para a ativação deste orçamento-garantia.

            O respeito e observância dos dispositivos legais e constitucionais é pressuposto da ação estatal. (5) Enquanto princípio geral do direito, o princípio da legalidade estabelece limites e define os contornos da ação estatal, significando, a contrario sensu, que o Estado não pode se omitir no cumprimento de suas obrigações legais e constitucionais.

            O que se está a propor aqui é que os dispositivos legais e constitucionais sejam submetidos ao condicionante do direito da criança e do adolescente. Isso significa, por um lado, que deve-se considerar se o processo orçamentário foi efetuado em atendimento aos dispositivos legais e constitucionais, sobretudo aqueles de natureza orçamentária, constantes do ECA e da Constituição Federal, sem prejuízo aos dispositivos legais e constitucionais que informam a atividade orçamentária.

            O tratamento dos preceitos legais e constitucionais em consonância ao direito da criança possibilita a ativação do orçamento como um instrumento garantidor de direitos, um orçamento quase-garantia.


3. Decisão Política Orçamentária: requisitos explícitos e implícitos

            Os programas e as ações previstas no orçamento baseiam-se em critérios políticos, vinculando-se às idéias e convicções políticas, filosóficas, religiosas dos grupos que estão no poder. Chega-se mesmo a dizer que "em todos os tempos e lugares, a escolha do objetivo da despesa envolve um ato político", definido a partir "do entrechoque dos grupos detentores do poder". Sendo a decisão orçamentária de natureza política, cabe aos governantes estabelecer quais as necessidades do Estado e da sociedade que exigem satisfação através do serviço público e, portanto, pelo processo de despesa pública. (6)

            O fundamento disso é a garantia de que o Executivo tenha a liberdade para definir as prioridades governamentais e um plano de governo fundado nas aspirações populares e legitimado pelas urnas. A natureza política não objetiva possibilitar a prática, muito costumeira entre nós, de interrupção de programas governamentais bem sucedidos. O fato é que as prioridades governamentais alteram-se conforme as paixões e ideologias dos governos.

            Assim, se a liberdade de decisão política no orçamento permite a correção de equívocos ou mesmo a substituição de políticas governamentais insatisfatórias, por outro, está a decisão política, por sua própria natureza, submetida às concepções de seus governantes. Aliomar Baleeiro leciona muito seguramente sobre a matéria ao manifestar que:

            "Se o país for dominado por uma elite rica e requintada, esta exigirá do governo, provavelmente, construções de luxo e obras de conforto ou embelezamento. Se as circunstâncias mudam, as despesas públicas se dirigirão para a construção de hospitais, maternidades, postos de puericultura, escolas primárias". (7)

            À liberdade de decisão nos gastos orçamentários, excetuam-se os casos previstos no inciso IV, artigo 167, CF que tem a seguinte redação:

            "Art. 167. São vedados:

            (...);

            IV – a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os arts. 158 e 159, a destinação de recursos para as ações e serviços públicos de saúde e para manutenção e desenvolvimento do ensino, como determinado, respectivamente, pelos arts. 198, § 2º, e 212, e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita, previstas no art. 165, § 8º, bem como o disposto no § 4º deste artigo;". (8)

            Tanto o momento da elaboração, quanto o da execução orçamentária são marcados pelo aspecto político. A conseqüência disso é que "tanto mais lúcido, cultos e moralizados sejam os governantes quanto mais probabilidades existem de que se realize aquele cálculo da máxima vantagem social" (9)ou seja, a de que a despesa pública reflita a constatação de que os gastos sociais tem maior grau de vantagem àqueles indivíduos que possuem menos recursos financeiros.

            Na elaboração orçamentária, o ato político de decisão orçamentária é compartilhada pelo Executivo e pelo Legislativo, expressando decisões políticas baseadas em modelos e aspirações que os governantes têm para o Estado e para a sociedade, o que explicaria as variações nas prioridades orçamentárias existentes de governo para governo. Já na fase de execução do orçamento, a decisão orçamentária é exercida exclusivamente ao Poder Executivo na medida em que lhe cabe, privativamente, a organização e o funcionamento da administração federal, exercendo atos de provimento e extinção de cargos públicos e exercendo outras atribuições previstas na Constituição (art. 84, VI, XXV, XXVII), ressalvados os casos previstos no inciso IV do artigo 167, CF, onde, evidentemente, não há que se falar em decisão orçamentária por inexistir discricionariedade.

            Viu-se que a decisão de gastar é política, devendo, contudo, atender requisitos legais (ex: lei nº 4.320/64) e constitucionais (art. 167). O que se pretende salientar nesse ponto é que a decisão política de gastar – expressa seja no momento de elaboração, quanto no de execução orçamentária – já está submetida à observância de preceitos normativos que lhe conferirá legitimidade.

            Não haveria sentido conceder ao poder legislativo (somente no momento de elaboração orçamentária) e ao poder executivo o poder de definir e alterar as prioridades orçamentárias sem que, ao mesmo tempo, lhes fossem definidas condições para a realização do ato de decisão. Exemplificando: o administrador público somente pode iniciar programas e ações desde que previstos na lei orçamentária anual. (art. 167, I, CF). Isso significa que a decisão política no momento da execução do orçamento só pode ser exercida em consonância a esse dispositivo constitucional. Outro exemplo: os parlamentares tem a decisão política para alterar o orçamento durante a sua elaboração, alteração esta condicionada ao disposto no artigo 167, §3º, I, II e III, CF/88.

            Quando se atende aos requisitos legais e constitucionais que condicionam a decisão política de gastar, pode-se dizer que estão presentes os requisitos explícitos da decisão. Feitas essas considerações, é hora de se investigar os requisitos implícitos que devem constar da decisão política de gastar. Tais requisitos implícitos cumpririam a mesma função dos dispositivos explícitos, ou seja, condicionam a decisão de gastar.

            Entendemos que o requisito essencial da decisão política de gastar é a observância e a efetivação dos direitos fundamentais. Dentre várias razões que podem ser apontadas, tem-se que:

            a) enquanto cláusulas pétreas da Constituição Federal, tais direitos gozam de aplicabilidade imediata, devendo ter um tratamento jurídico que lhes reconheça a importância no ordenamento jurídico.

            b)os direitos fundamentais representam uma limitação ao poder estatal, portanto, é uma garantia ao ser humano e aos valores que com ele se identificam, a saber, a liberdade, a justiça e a igualdade. É em oposição ao arbítrio, ao autoritarismo, ao abuso de autoridade, às desigualdades sociais e trabalhistas que tais direitos emergiram e se mantém;

            c)da mesma forma, tais direitos, ao limitarem o poder estatal, servem de garantia à própria existência do Estado Democrático de Direito, condicionando a ação estatal ao estabelecido em lei. Dificulta-se a adoção de regimes de exceção, o enfraquecimento e à própria extinção dessa forma de Estado encontraram limites e objeções mais resistentes;

            d) em adendo ao que vem sendo aqui exposto, o Estado Democrático de Direito somente existe para que o ser humano seja a finalidade primeira da ação governamental. Esta é a idéia do contrato social. Todos entregam uma parcela de poder que possuiriam em um estado natural em troca do atendimento em troca do reconhecimento de direitos fundamentais e de prestações estatais mínimas que assegurem tais direitos.

            e) a garantia dos direitos fundamentais implica, particular e prioritariamente, o atendimento de crianças e adolescentes.

            O reconhecimento de que os direitos fundamentais pautam a temática orçamentária enquanto um requisito implícito não significa o abrandamento do caráter político da decisão de gastar. Primeiro, não é o conjunto dos gastos estatais que é empregado no atendimento de tais direitos. Certamente, a organização estatal deve atender a outros fins que não guardem necessariamente relação com os direitos fundamentais. Segundo, um governo investido no poder, através da legitimação das urnas, possui as suas prioridades que, em tese, foram aprovadas pela população que poderão ser implementadas. Todavia, enfatize-se: os direitos fundamentais, enquanto requisitos orçamentários implícitos, devem ser implementados independentemente das prioridades do plano de governo em questão proposto pelo governante.

            Não há contradição entre a característica política da decisão orçamentária e a implementação dos direitos fundamentais independentemente do governo em questão. Isto por que esta está em um plano mais elevado que aquela na medida em que é condição indispensável à própria manutenção do Estado Democrático de Direito como acima mencionado.

            Em conformidade ao critério político e à autonomia para as questões orçamentárias, o governo já deveria, de antemão, contemplar o atendimento aos direitos fundamentais. Agindo assim, não se discutiria sobre a interferência judicial (nos casos em que as decisões judiciais tem implicações orçamentárias) (10) nas atividades do Executivo, tampouco sobre a relativização do critério político constante das decisões orçamentárias.

            O administrador público deve estar consciente de que os direitos fundamentais são requisitos, exigências implícitas à execução orçamentária. Mas não sejamos ingênuos: o apelo à consciência, a recomendação ou o aconselhamento do administrador público são iniciativas com reflexo no campo moral, podendo gozar de pouca ou nenhuma eficiência na incorporação dos direitos fundamentais à decisão de gastar. Há que se ter, assim, um remédio que goze de eficácia jurídica ante a omissão ou resistência do administrador público.

            Isso significa constatar, metaforicamente, que o critério político constante da decisão de gastar entregue à responsabilidade do administrador não é um "salvo-conduto", que lhe permite decidir sobre o orçamento público conforme o seu arbítrio. Como se pode perceber, requisitos legais e constitucionais e implícitos devem "vigiar" a decisão política de gastar.

            Em virtude disso, deve-se reconhecer que os direitos fundamentais (e aí os direitos das crianças e dos adolescentes) são exigíveis judicialmente ainda que não haja provisão orçamentária, não incidindo, portanto, as vedações constantes dos incisos I e II do artigo 167 da C.F. que vedam o início de programas ou projetos não incluídos na lei orçamentária anual ou que realizem despesas que excedam os créditos orçamentários. Objetivando o equilíbrio financeiro das contas públicas, tais dispositivos visam conter, sobretudo, o ímpeto governamental em dispor ilimitadamente dos recursos governamentais amparado na idéia de decisão orçamentária política.

            O que deve estar patente, é que o conjunto das decisões políticas com reflexos orçamentários (elaboração e execução) devem prever o atendimento dos direitos fundamentais.


4. O Princípio da Prioridade Absoluta e o Orçamento

            O artigo 5º da Constituição Federal enuncia que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza". Trata-se de igualdade formal, segundo a qual os seres humanos devem ser tratados da mesma forma. (11) Esse tipo de igualdade, baseada em uma lei geral, abstrata e impessoal, incidindo para todos igualmente, acabaria por gerar mais desigualdades e injustiças, já que leva em conta apenas a igualdade dos indivíduos e não a igualdade de grupos. (12)

            Em oposição à igualdade formal, têm-se a igualdade material, que, segundo Perelman, (13) seria "a especificação da justiça formal, informando a característica constitutiva da categoria essencial, chegando-se às formas: a cada um segundo sua necessidade; a cada um segundo seus méritos; a cada um a mesma coisa".

            A igualdade material ou real reconhece que as pessoas se encontram em desigualdade no "mundo real", e, por isso, propõe soluções também desiguais, conforme a situação ocupada pelos membros da sociedade. O referido princípio há que ser entendido não de forma individualista, mas de acordo com as peculiaridades e diferenças das pessoas inseridas em determinado grupo.

            Para o legislador, o princípio significa "que, ao elaborar a lei, deve reger, com iguais disposições - os mesmos ônus e as mesmas vantagens - situações idênticas, e, reciprocamente, distinguir, na repartição de encargos e benefícios, as situações que sejam entre si distintas, de sorte a aquinhoá-los ou gravá-los em proporção às suas diversidades". (14)

            Esta nova interpretação proposta ao artigo 5º da Constituição Federal pode ser compreendida de modo a que toda pessoa humana, sem distinção, possui direitos que devem ser atendidos por uma ação estatal eficiente, não significando que a todos será concedida as mesmas benefícios ou prestações estatais.

            Sem dúvida, a inexistência de distinção entre a qualidade da pessoa humana não implica em concluir pela inexistência de prioridades para determinados grupos inseridos em posições de desigualdade ou de fragilidade social. Em outras palavras, enquanto seres humanos apresentamos as mesmas características biológicas e fisionômicas, fato que nos torna pertencentes a mesma espécie animal. Aí reside o campo da igualdade formal. Contudo, talvez justamente por sermos seres humanos, criam-se desigualdades sociais, culturais e econômicas entre os diversos grupos humanos, resultando daí que a igualdade deve pressupor a redução do campo das desigualdades bem como a redução das fragilidades de cada grupo humano.

            É assim que o caput do artigo 5º deve ser entendido, considerando os grupos mais fragilizados da sociedade, entre os quais, destacam-se crianças e adolescentes. O artigo 227 da Constituição Federal expressamente confirma isso ao estabelecer que: "Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão".

            O artigo, por si só, é inovador por representar, pela primeira vez, a preocupação do constituinte com a temática da criança e do adolescente, gerando reflexos na elaboração do planejamento das políticas públicas governamentais. Como estabelecido pela Convenção de Nova York sobre a Criança em 1989, as ações relativas às crianças devem considerar primordialmente o interesse da criança que se materializa nas condições e possibilidades que lhe são oferecidas para um desenvolvimento sadio e harmonioso.

            O artigo 4º do ECA tem redação muito próxima do artigo 227 da CF, sendo que, em seu parágrafo único, especifica-se o campo de abrangência da expressão "garantia prioritária". "In verbis":"Parágrafo único. A garantia de prioridades compreende: a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; b) precedência no atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas; d) distinções privilegiadas de recursos públicos nas áreas relacionadas com proteção à infância e à juventude". (negrito nosso)

            As palavras primazia, precedência, preferência, privilegiada e prioritária guardam a mesma sintonia semântica implicando na constatação de que o reconhecimento de direitos às crianças e adolescentes não é mera repetição do reconhecimento dos direitos fundamentais efetuado a todos os seres humanos pelo artigo 5º da Constituição Federal.

            Instituindo um reconhecimento de direitos às crianças e adolescentes, qualificado pela precedência no gozo de direitos diante de qualquer outro grupo social, o artigo 227 da CF em cotejo com o art. 4º do ECA não significa que outros grupos não possam acessar direitos ou que não os possam acessar na mesma intensidade que crianças e adolescentes. Significa, sim, o reconhecimento da fase peculiar de desenvolvimento que é a infância e a adolescência.

            A prioridade absoluta se incorpora à temática orçamentária na medida em que esta se constitui em um instrumento imprescindível para que direitos possam ser concretizados por meio de políticas públicas. O financiamento destas políticas é obtido mediante a cobrança de tributos que gera os recursos orçamentários, certamente, não esgotáveis. Submetidas às restrições do possível e às escolhas trágicas, o orçamento público condiciona o atendimento dos direitos. Mundo real e mundo ideal se contrapõem: de um lado, direitos exigíveis, de outro, restrições orçamentárias ao atendimento desses direitos. Claro que há fatores que não legitimam a idéia de restrições orçamentárias, tais como, o mau gerenciamento dos recursos desde a elaboração orçamentária até a sua execução, o deficiente controle de fiscalização, a reduzida possibilidade de participação popular. Contudo, mesmo que todo o sistema orçamentário funcionasse sem falhas (e essa deve ser a meta. É a presença do ideal que condiciona e impulsiona a realidade.) e que toda a política orçamentária estatal se orientasse, em última instância, conforme o preceito de que a pessoa humana é o fim, ainda assim, possivelmente, haveria novos direitos não contemplados dada as restrições orçamentárias.

            É diante desse quadro de limitações orçamentárias e de indispensabilidade de efetivação dos direitos fundamentais que a prioridade absoluta se instala, condicionando o orçamento público. Em termos orçamentários, isto significa que, antes de definidas as políticas públicas governamentais, deve-se avaliar se tais iniciativas atendem aos direitos de crianças e adolescentes. Logo, seja na elaboração orçamentária, seja na execução financeira, as decisões governamentais devem ter como pressupostos o conceito de prioridade absoluta à infância e juventude. Nenhuma interpretação lógica parece afastar a idéia de que, como direitos têm um custo para sua concretização, é o orçamento quem a pavimenta.

            Lembre-se que a inexistência de distinção entre a qualidade da pessoa humana não implica em concluir pela inexistência de prioridades na destinação dos recursos públicos. Considerar a criança e o adolescente sujeitos de direitos, garantia constitucional prevista no artigo 227 da C.F. e no próprio ECA, significa assegurar prioritariamente a efetivação de políticas públicas que estimulem positivamente o seu desenvolvimento e os ponha a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.

            A inexistência de tais políticas públicas, em quantidade ou em qualidade impossibilita o exercício da cidadania e torna direitos nada mais do que símbolos da retórica. Deixa-se de interferir na realidade social. Perde-se a sensação de que a própria humanidade pode se realizar.

            Irradiado pelo princípio da prioridade absoluta, o orçamento público incorpora os objetivos de realização da igualdade material, convencendo-se de que as situações desiguais em que se encontram crianças e adolescentes reclama soluções diferenciadas inclusive orçamentárias.


5. A Prioridade Absoluta na Elaboração Orçamentária

            Elaboração orçamentária é o processo pelo qual se formula e aprova a peça orçamentária, seguindo-se procedimentos determinados na lei (ex: lei nº 4.320/64) e na Constituição Federal. O Poder Executivo elabora o orçamento e o envia à análise e votação ao Poder Legislativo que pode alterá-lo (dentro de alguns parâmetros já estudados) e até mesmo rejeitá-lo. Cotejada diante dos dispositivos do direito da criança, a elaboração orçamentária apresentará novos contornos.

            O artigo 4º do ECA possui redação e conteúdo muito próximo ao artigo 227 da Constituição Federal. Declarando direitos, o mencionado artigo dispõe que: "É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização..." (grifo nosso). A seguir, em seu parágrafo único, o legislador ordinário estabelece a abrangência da prioridade mencionada no "caput" do art. 4º, declarando que a garantia de prioridade compreende, dentre outros, a preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas ("c") e a destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude ("d").

            As referidas alíneas "c" e "d" remetem nitidamente o intérprete ao momento de elaboração orçamentária, particularmente, a formulação da peça orçamentária. A questão é saber se tais dispositivos condicionam a formulação da proposta orçamentária pelo executivo. E, caso a resposta seja positiva, em que medida tais dispositivos condicionam a formulação orçamentária. Em outros termos, as alíneas "c" e "d" do parágrafo único do artigo 4º do ECA possuem eficácia jurídica capaz de condicionar a elaboração da proposta orçamentária? Se sim, como se aufere a preferência na formulação das políticas sociais públicas à infância e a juventude? O que é e como se verifica a destinação privilegiada de recursos públicos para a infância e a juventude?

            Tais questões ganham interesse a partir da constatação de que é, basicamente, através das políticas públicas que os direitos da criança e do adolescente se concretizam, que, por sua vez, exigem recursos orçamentários.

            A primeira questão a ser resolvida é a da eficácia jurídica das alíneas "c" e "d" do parágrafo único do artigo 4º do ECA.

            Ambos dispositivos prescrevem uma regra jurídica, dotada de juridicidade. Relembre-se a lição de José Afonso Silva segundo a qual todos os dispositivos constitucionais possuem algum grau de juridicidade. Isso significa que tais dispositivos tem, em algum grau, repercussão no mundo jurídico e, aí, necessariamente, sobre o direito orçamentário.

            De certo modo, um dos efeitos alcançados pela interpretação do professor José Afonso foi a de revificar preceitos constitucionais que eram entendidos como "letras mortas", sem qualquer possibilidade de eficácia jurídica. É possível traçar o mesmo raciocínio no que tange às normas infra-constitucionais: a de que as normas legais, desde que constitucionais, possuem repercussão jurídica.

            Em função disso, deve-se investigar acerca do alcance dos mencionados dispositivos, isto é, quais os efeitos esperados dos dispositivos"c" e "d", parágrafo único, artigo 4º, ECA? Tais efeitos (da destinação privilegiada de recursos e a preferência na formulação e execução das políticas públicas para à infância e à juventude) representa o "comportamento" esperado que tais normas desempenham no mundo jurídico.

            Sob tal perspectiva, a prioridade à infância e a juventude pressupõe que, antes de planejada/formulada qualquer política pública governamental, deve-se planejar/formular as políticas sociais voltadas à infância e à juventude, elaborando-se diagnósticos e planos para a redução das violações e atendimento dos direitos. Esse é principal efeito resultante dos dispositivos "c" e "d", parágrafo único, art. 4º, ECA: determinar que o poder público, em sua atividade de planejamento e elaboração orçamentária, conceba, em primeiro lugar, as políticas da infância e da juventude, sendo que em caso de insuficiência de recursos, o poder público deve escolher preferencialmente as políticas públicas que envolvam crianças e adolescentes na proposta orçamentária.

            Observe-se que o momento adequado para se visualizar e avaliar a ação estatal orçamentária à ocasião da elaboração orçamentária é no momento de envio da proposta ao Parlamento, momento em que se consolida a intenção governamental de políticas públicas.

            Todavia, a grande questão a ser resolvida consiste em oferecer instrumentos que permitam auferir e controlar as ações do poder público, determinando se e em que medida se está cumprindo o efeito de garantia da prioridade na destinação de recursos orçamentários. Sendo constitucionais e possuindo eficácia jurídica, os dispositivos "c" e "d", parágrafo único, art. 4º, ECA, sem que invadam a competência do Poder Executivo e Legislativo, podem ser auferidos e controlados através da adoção das seguintes medidas executadas na fase de elaboração orçamentária, sem que se pretenda esgotar a matéria:

            a)interposição de ação com o objetivo de compelir o poder público a justificar a proposta e o planejamento orçamentário prioritário às ações voltadas às crianças e aos adolescentes, incluindo-se, aí, a realização de diagnósticos acerca dos principais problemas da infância e as alternativas governamentais para a erradicação das violações;

            b)prévia realização de Termo de Ajustamento de Conduta entre o Poder Executivo e o Ministério Público, para a correção de falhas e omissões porventura existentes nos programas governamentais, inclusive, através do compromisso de inclusão na peça orçamentária de recursos e programas que corrijam tais falhas e omissões. Aí, pode-se incluir, também, o compromisso de que o orçamento seja discutido com as entidades da sociedade civil.

            No primeiro caso, através da ação de justificação, será investigada o cumprimento da prioridade aos direitos da criança na proposta orçamentária, buscando as razões pelas quais o poder público destina (ou não) determinado volume de recursos à área da infância e juventude. Aí, o poder público deve justificar o planejamento prioritário das políticas públicas voltadas às crianças e aos adolescentes, através de diagnósticos que tenham norteado a sua decisão política na elaboração da proposta orçamentária. Em suma, os principais problemas da infância e juventude encontrados devem guardar consonância com as alternativas governamentais para a erradicação das violações que necessariamente exigem recursos orçamentários.

            Um dos objetivos dessa iniciativa é possibilitar a formação de subsídios para a responsabilização administrativa e civil da autoridade pública mediante ação civil pública desde que tais omissões possam repercutir na violação de direitos. Ex.: comunicado o chefe do poder executivo de que os recursos destinados à manutenção do conselho tutelar são insuficientes ou de que não há previsão orçamentária para a ampliação da oferta de vagas no ensino primário, deve aquele justificar, mediante a ação proposta, de que forma pretende efetivar a resolução destes direitos sem previsão orçamentária. Pode-se, também, exigir dados do governante acerca da situação da infância e juventude ou da fonte utilizada pelo governo sobre o qual se fundou a elaboração da proposta orçamentária. Certamente, a justificação insatisfatória do governante propiciaria o fortalecimento da proposição da ação civil pública.

            Perceba-se que não há violação ao princípio da separação de poderes, não se podendo falar em intromissão de um poder sobre o outro haja vista que não se está obrigando o poder executivo a fazer constar dispositivos orçamentários na lei orçamentária anual.

            No segundo caso, o Termo de Ajuste de Conduta é medida coercitiva e condicional proposta pelo Ministério Público aos administradores públicos que desrespeitem o cumprimento de preceitos legais e constitucionais, possibilitando a readequação de ações e comportamentos governamentais através do compromisso do administrador público de ajustamento de sua conduta às exigências legais, sendo que este título tem eficácia de título executivo extrajudicial.

            A oferta de ajuste de conduta oferecida ao administrador público, implicitamente, firma um compromisso de implementação ou alteração de aspectos da política governamental para a área da infância e juventude que, para se processar eficazmente, deve estar respaldada em previsão orçamentária. Isso não significa que o Termo de Ajuste de Conduta, documento em que o administrador público se compromete em implementar ou alterar políticas, enseje a intromissão do Ministério Público sobre a questão orçamentária. De fato, o compromisso do governante não cria a obrigatoriedade de inserção de recursos e programas destinados à infância na peça orçamentária. Contudo, o descumprimento do referido Termo gera efeitos que, possivelmente, coagiriam o administrador público (é título executivo) à inclusão de recursos e programas na peça orçamentária.

            Como a possibilidade de interferência judicial para assegurar recursos no orçamento na fase de elaboração orçamentária tem se mostrado inviável, as alternativas explicitadas acima seriam meios legais de compelir o poder público a incluir programas destinados à infância e à juventude ainda na lei orçamentária, sem, contudo, resultar na violação do princípio da separação dos poderes.

            Questão interessante surge diante da não inclusão ou da inclusão insuficiente de recursos na lei orçamentária?

            Pensamos que a inclusão de recursos que para a realização de programas mediante sentença judicial no momento de elaboração orçamentária, sob pena de se invadir campo de atribuição destinado ao Poder Executivo.

            Opera-se na elaboração orçamentária a materialização do que a doutrina convencionou chamar de "escolhas trágicas", representando o conflito de interesses que envolve a formulação da lei orçamentária e que resulta no não atendimento ou na contemplação insuficiente de recursos para áreas prioritárias, o que vem caracterizar a tragicidade desse momento. Dada à impossibilidade de se atenderem a todos os fins escolhe-se, mediante uma decisão política, aqueles que serão contemplados.

            E, assim, esgotadas as tentativas e as possibilidades de garantir a "prioridade absoluta" no orçamento, consubstanciada na verificação de planejamento e financiamento preferencial das políticas públicas para a infância e a juventude, após a aprovação e sanção da lei orçamentária, não se pode incluir no orçamento créditos orçamentários mediante decisão judicial.

Pode-se, todavia, argumentar que não se estaria impedindo, em definitivo, a assunção de gastos públicos já que a possibilidade de abertura de crédito suplementar ou especial estaria aberta. Haveria, nesse caso, a necessidade de autorização do parlamento e a indicação dos recursos que fundamentariam a criação do crédito suplementar (art. 167, V).

            Há, ainda, a possibilidade de que, no curso do exercício financeiro, os recursos sejam transpostos, remanejados ou transferidos de uma categoria para outra ou de um órgão para outro, desde que existente a autorização legislativa (art. 167, VI), afastando-se a freqüente argumentação de inexistência de recursos públicos ou previsão orçamentária para a criação ou ampliação de programas governamentais. Realmente, ações e programas governamentais somente podem ser iniciados se previstos no orçamento, não significando, entretanto, que a autorização tenha que se dar exclusivamente no momento de aprovação do orçamento.

            O ideal é que os recursos já estejam previstos na lei orçamentária anual, evidenciando um planejamento prévio, elaborado em função de um diagnóstico que retrate a infância e a juventude, evitando-se ações no curso da execução do orçamento. Mas, como se salientou, estes podem ser autorizados no curso da execução orçamentária mediante::

            a)o remanejamento e a transposição de recursos mediante a autorização legislativa;

            b)a abertura de créditos suplementares também com prévia autorização do parlamento.

            A análise da prioridade absoluta não é apenas verificada na lei orçamentária anual, mas também, no plano plurianual e na lei de diretrizes orçamentárias. O raciocínio até aqui empregado vem acentuando o papel da lei orçamentária anual, todavia, observar a prioridade absoluta nas demais leis também é importante.

            O § 1º do artigo 165 da C.F. preceitua que o plano plurianual deve conter diretrizes, objetivos e metas da administração pública para as despesas de capital e para os programas de duração continuada. Isso significa que o mencionado plano deve conter os programas destinados à infância e à juventude que tenham duração por mais de um exercício financeiro bem como as despesas de capital.

            Do mesmo modo, devem estar contidas na lei de diretrizes orçamentárias as metas e prioridades da administração pública para a infância e a juventude bem como as despesas de capital (investimentos) para o exercício financeiro subseqüente. A LDO orienta a elaboração da lei orçamentária anual, devendo, portanto, prever as diretrizes das políticas públicas planejadas pelo setor público às crianças e aos adolescentes.

            Tratando-se da lei orçamentária anual, esta deve guardar compatibilidade com os objetivos e diretrizes previstos no plano plurianual e seria razoável que, sob a ótica do planejamento, se compatibilizasse, também, com as metas e diretrizes previstas na lei de diretrizes orçamentárias.

            A LOA deve conter também a previsão dos recursos necessários ao funcionamento do Conselho Tutelar, conforme redação do parágrafo único, artigo 134. O objetivo da norma é manifesto: evitar que a criação e o funcionamento do Conselho Tutelar cumpra mais finalidade formal do que material. Aquela seria representada pela criação do lê Conselho mediante lei. A finalidade material, por sua vez, estaria atendida quando o Conselho Tutelar tenha efetivamente condições de operacionalidade e funcionamento.


6. A Prioridade Absoluta na Execução Orçamentária

            Execução orçamentária é o processo pelo qual se efetua as aplicações das dotações orçamentárias consignadas a um órgão ou unidade orçamentários na realização de um programa de trabalho em conformidade com preceitos legais (ex: lei nº 4.320/64; Lei Complementar nº 101/2000) e na Constituição Federal. Destaca-se aí a execução da despesa orçamentária que "envolve a prática de um conjunto de atos formais, que se inicia com a colocação da dotação à disposição da unidade investida de autoridade para comprometê-la". (15)

            A questão proposta à análise não atine às classificações e aos requisitos que envolvem o processamento da despesa até a sua concretização, tais como, empenho, liquidação e pagamento da despesa. O que se pretende investigar, neste ponto, é a relação do princípio da prioridade absoluta ao atendimento de direitos de crianças e adolescentes e a fase de execução orçamentária, momento em que recursos são efetivamente destinados aos programas governamentais.

            No tópico anterior, comentou-se acerca da impossibilidade de inclusão de créditos orçamentários mediante decisão judicial na fase de elaboração orçamentária, sob pena de violação ao princípio da separação de poderes. A solução, então, seria a abertura de crédito suplementar ou especial ou a transposição, remanejamento ou transferência de recursos de uma categoria para outra ou de um órgão para outro, desde que existente a autorização legislativa.

            Observe-se que, tanto no caso de abertura de crédito suplementar, quanto na transposição, remanejamento ou transferência de recursos de uma categoria para outra, necessita-se autorização legislativa. O atendimento dos direitos à uma infância e juventude digna estaria condicionada à uma decisão política. As indagações que se colocam aí são: como garantir a prioridade absoluta, não existindo previsão de recursos na lei orçamentária anual, sem que ficar na dependência de autorização parlamentar para a abertura de crédito suplementar ou para o remanejamento de recursos? E, de outro modo, como garantir a prioridade absoluta, existindo recursos na lei orçamentária anual que, contudo, não são gastos? Sintetizando: há um meio de se executar o orçamento mediante uma decisão judicial, com ou sem prévia autorização legislativa, na fase de execução da despesa orçamentária, ou seja, a proteção judicial é possível para assegurar os direitos da criança não garantidos por recursos orçamentários?

            Para responder à essas indagações, analise-se dois argumentos que comumente embasam a posição que nega tal possibilidade, a saber, o princípio da separação de poderes e o princípio do equilíbrio econômico.

            Cláusula pétrea constitucional, o princípio da separação de poderes não pode ser objeto de proposta de emenda à constituição que o pretenda abolir (art. 60, §4º, III, CF). Três são os poderes estatais, previstos constitucionalmente e considerados supremo: Legislativo, Executivo e Judiciário, devendo atuar de forma independente e harmônica entre si (art. 2º, CF).

            Na medida em que o Estado não possui vontade própria, expressa-a por meio de órgãos que exprimem vontade exclusivamente humana., daí por que a divisão de poderes se justifica ao confiar cada uma das funções governamentais (legislativa, executiva e judiciária) a órgãos distintos. (16)

            A especialização funcional e a independência orgânica fundamentam o princípio da separação de poderes. O primeiro deles significa que cada órgão exerce precipuamente uma função a que é especializado; o segundo, que inexiste dependência ou subordinação entre os órgãos especializados (executivo, judiciário e legislativo). (17) Com a redação dada pela Constituição Federal de 1988, em seu artigo 2º (18), o princípio da separação de poderes deve ser compreendido a partir da idéia de colaboração de poderes.

            Um dos aspectos mencionados por José Afonso da Silva sobre esse tema interpreta o significado da independência dos poderes na liberdade a que cada órgão tem para organizar os seus respectivos serviços, observadas somente as disposições legais e constitucionais, "assim é que cabe ao Presidente da República prover e extinguir cargos públicos..." e "ao Chefe do Executivo incumbe a organização da Administração pública.. .". (19)

            A possibilidade de intervenção judicial no orçamento violaria o princípio da separação de poderes na medida em que o poder judiciário exerceria atribuição precípua do poder executivo, responsável pela organização da administração pública, invadindo a sua esfera de competência.

            De orientação liberal, o princípio do equilíbrio econômico pretende a compatibilização entre receitas e despesas públicas, evitando-se assim o desequilíbrio orçamentário, sobretudo, a existência de déficits. Sem dúvida, o fundamento deste princípio é a inesgotável "gana" governamental em agir de forma pouco racional e não planejada, podendo ser encarado como uma conquista da sociedade para evitar a sangria das finanças públicas.

            Não é encontrado expressamente na Constituição Federal, todavia, há dispositivos constitucionais que induzem o equilíbrio orçamentário, como já salientado em outra passagem. (20) A identificação do princípio do equilíbrio financeiro é evidenciada a parir da inferência de regras jurídicas. São exemplos: o início de programas ou projetos não incluídos na lei orçamentária anual (art. 167, I); a proibição de realização de despesas ou assunção de obrigações diretas que excedam os créditos orçamentários ou adicionais (art. 167, II); a proibição do Banco Central conceder empréstimos ao Tesouro (art. 164, §2º); a obrigatoriedade de depósito no Banco Central das disponibilidades de Caixa da União (art. 164, §3º); a transparência na concessão de incentivos e nas renúncias de receita (art. 165, §6º).

            Erigido a pedra fundamental das finanças públicas, o princípio do equilíbrio orçamentário (e os dispositivos que o informam acima referenciados) pode contribuir para a argumentação que rechaça a possibilidade de execução orçamentária para programas destinados à infância e à juventude mediante sentença judicial diante de posição do Executivo e do Legislativo que não inclua recursos ou inclua-os insuficientemente na lei orçamentária anual. Inserida numa ótica de racionalidade financeira do Estado, uma interpretação literal do princípio do equilíbrio financeiro conduz o intérprete à conclusão de impossibilidade de realização de programas e ações que assegurem a efetivação de direitos da infância e juventude.

            Tanto o princípio da separação de poderes, quanto o do equilíbrio econômico devem ser relacionados com o princípio da prioridade absoluta (art. 227, C.F.), através do método da ponderação, para que se verifique o alcance de ambos. A ponderação entre princípios somente é possível na medida em que estes se situam em um fase intermediária entre as regras e os valores jurídicos, pois, aquelas possuem maior grau de concretude e precisão que os princípios, enquanto os valores, por sua abstração, não são passíveis de inscrição no ordenamento jurídico. Situados em um grau hierarquicamente inferior aos valores, os princípios, diferem desses, por apresentarem maior concretude e, por isso, possuem capacidade de expressão, sistematização e confronto.

            Pretendendo a substituição do modelo fechado da subsunção, a técnica da ponderação de princípios significou verdadeiramente uma ponderação de interesses no processo de aplicação do direito, tendo sido a jurisprudência dos valores quem mais consistentemente trabalhou a temática com base em sugestivos julgados da Corte Constitucional da Alemanha. (21)

            Nesse sentido, "a ponderação de bens em cada caso é um método de complementação do direito, que visa a solucionar as colisões de normas", servindo-se o Tribunal Constitucional Alemão do método da ponderação de bens no caso particular ("Güterabwägung in Einzellfall") para determinar o alcance concreto dos direitos fundamentais (Grundrechte) ou princípios constitucionais (Verfassungsprinzipien) que colidam entre si nos casos particulares. (22)

            O método da ponderação deve ser empregado no presente caso para avaliar concretamente o alcance do princípio da prioridade absoluta em cotejo com os princípios dá separação de poderes e do equilíbrio financeiro, pois, se por um lado, não resta dúvida da plena existência, validade e eficácia de tais princípios sobre o ordenamento jurídico, por outro, é de se duvidar da prevalência quase absoluta dos princípios da separação dos poderes e do equilíbrio financeiro no mundo jurídico.

            Melhor explicando, a Constituição agrupa inúmeros sub-sistemas temáticos que informam valores, princípios e normas para cada área específica, a saber, tributária, família, financeira, econômica, penal, eleitoral, trabalhista. Daí o por quê não cabe dúvida de que os princípios da separação dos poderes e do equilíbrio financeiro existem, vigem e são eficazes juridicamente, cada qual em seu sub-sistema temático. Porém, como os fenômenos sociais não guardam classificação e efeitos em compartimentos, é possível que um mesmo fenômeno social tenha repercussão sobre dois ou mais sub-sistemas jurídicos, cada qual, lembre-se, com seus valores, princípios e regras bem definidos e compartimentados para a realização do mister regulatório de sua matéria.

            É diante de casos particulares que o método da ponderação determina o alcance concreto dos direitos fundamentais ou dos princípios constitucionais que colidam entre si. O caso particular aqui referido, a exigir a ponderação de interesses, é a possível preponderância dos princípios constitucionais da separação de poderes e equilíbrio orçamentário sobre o também princípio constitucional da prioridade absoluta às crianças e aos adolescentes. O resultado desse raciocínio resultaria na impossibilidade da autoridade judiciária determinar a realização de despesas públicas no curso da execução orçamentária.

            Contrariamente, o reconhecimento da preponderância do princípio da prioridade absoluta sobre o da separação de poderes e do equilíbrio financeiro culmina na possibilidade de concessão de provimento judicial que determine a realização de despesas públicas no curso da execução orçamentária para atender aos direitos de crianças e adolescentes.

            Entendemos que a segunda posição deve prevalecer. Na verdade, os direitos da criança e do adolescente são duplamente fundamentais. Primeiro, por serem essenciais a toda e qualquer pessoa humana. Segundo, por exigirem efetivação prioritária sob pena de – quando se queira ou possa implementá-los –, nunca mais realizá-los. São direitos que exigem imediata implementação diante da peculiar condição a que estão submetidos crianças e adolescentes.

            Os valores representados pelo princípio da prioridade absoluta impõe-se no jogo de princípios ante os princípios da separação de poderes e do equilíbrio orçamentário. Todavia, isso não significa, de modo algum, a opção por um governo de juízes (separação de poderes) ou a defesa do desequilíbrio das contas públicas. É escorado nesse raciocínio que entendemos ser plenamente possível a realização de programas e ações que implementem direitos de crianças e adolescentes, previstos ou não na lei orçamentária anual, por meio de provimento judicial.

            Há que se ter um remédio jurídico capaz de atender à omissão ou à insuficiência do gasto orçamentário efetuado pela administração pública com os direitos fundamentais, sob pena de submete-los às ideologias e conveniências políticas do governante em exercício. O meio adequado para ensejar a obrigação do Estado já na fase de execução, com ou sem previsão de recursos na peça orçamentária, parece ser a via da ação civil pública.

            Ao final deste tópico, destaque-se a obrigação do Poder Executivo em publicar relatório resumido da execução orçamentária até trinta dias após o encerramento de cada bimestre (art. 165, § 3º, CF). É fundamental que esse relatório seja elaborado tematicamente de modo a permitir o acompanhamento da execução orçamentária junto aos órgãos da administração pública mais diretamente.


7. Mandado de Injunção

            O artigo 5º, LXXI enuncia:

            "Conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício de direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania".

            A criação da garantia constitucional do mandado de injunção pelo constituinte de 1988 buscou atender ao reclamo generalizado para uma maior efetividade das normas constitucionais, (23) ao conferir-lhes "imediata aplicabilidade à norma constitucional portadora daqueles direitos e prerrogativas, inerte em virtude de ausência de regulamentação". (24)

            Nos regimes constitucionais anteriores, a existência de normas constitucionais sem regulamentação por inércia do legislador possibilitava o descrédito da própria Constituição já que ineficaz a norma. (25)

            A finalidade do mandado de injunção é atuar, assim, nos casos em que o direito exige regulamentação para que possa ser exercido. Os requisitos para que essa garantia possa ser exercida são: a) a falta de norma regulamentadora de um direito, liberdade ou prerrogativa; b) o nexo entre a falta de norma regulamentadora e o exercício do direito, liberdade ou prerrogativa.

            Diverge a doutrina acerca do alcance do mandado de injunção, se restrita aos direitos individuais ou se abrangendo os direitos sociais. Citando o professor Manoel Ferreira Filho que entende o mandado de injunção alcançando apenas os direitos individuais e políticos após ter considerado a expressão"inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania", Luís Roberto Barroso, (26) diversamente, ensina que ante a inexistência de cláusula restritiva, o mandado de injunção abrange todos os direitos constitucionais. A partir da perspectiva colacionada pelo professor Barroso, conclui-se que a restrição da garantia do mandado de injunção apenas aos direitos individuais e políticos é antes ideológica que científica. (27)

            A função do mandado de injunção é, concretamente, possibilitar o exercício de um direito (civil, político, econômico, social ou cultural), liberdade ou prerrogativa a uma pessoa ou grupo que estão impossibilitados de exercê-lo por ausência de uma norma regulamentadora. Através do juízo de eqüidade, isto é, da possibilidade do julgador legislar no caso concreto ante a existência de uma lacuna da lei, acaba o julgador desempenhando um papel que originariamente cabe ao legislador. (28)

            A importância do mandado de injunção em sede orçamentária é que "sendo uma das garantias processuais dos direitos fundamentais (art. 5º, IXXII, CF) pode dar lugar a alterações orçamentárias", surgindo daí a polêmica questão do judiciário ter "competência para remanejar verbas ou criar despesas para a proteção dos direitos". (29)

            Por certo, a regulamentação de um direito, proposta em sede de mandado de injunção, traria reflexos orçamentários, seja à ocasião da elaboração orçamento, seja à ocasião da execução orçamentária. No primeiro caso, "acerca de sua utilização ao tempo da elaboração não se assiste grande controvérsia" já que pode-se dispor, no orçamento brasileiro, "do instituto do precatório para assegurar o cumprimento das decisões judiciais, através da reserva prévia das dotações orçamentárias, na forma do art. 100 da Carta Vigente". (30)

            No cumprimento de uma decisão judicial em mandado de injunção com reflexos orçamentários, não há dúvida quanto à possibilidade de interferência judicial na elaboração orçamentária mediante o procedimento previsto no artigo 100 da Constituição Federal.

            A dúvida surge na atuação judicial no momento da execução orçamentária, já que em tal caso surge a dúvida se a decisão judicial não feriria o princípio da separação de poderes, já que a elaboração orçamentária é de responsabilidade do Poder Executivo, que deve fazê-lo sob o primado da legalidade financeira. (31)

            Comentando a questão no direito norte-americano, Ricardo Lobo Torres (32) manifesta que a maior parte da doutrina norte-americana, mesmo os defensores do administrative injunction (mandado de injunção), tem condenado as alterações judiciais do orçamento, alegando que a realocação de verbas pela via judicial (momento da execução orçamentária), fere os princípios da separação de poderes, do federalismo e da legalidade orçamentária embora se reconheça que as injunções afirmativas tiveram o mérito de antecipar inspiração às medidas do Legislativo "para o preenchimento das omissões normativas e as redefinições orçamentárias". (33)

            Todavia, a inovadora garantia restou inviabilizada diante de decisão do Supremo Tribunal Federal que conferiu ao mandado de injunção os mesmos efeitos da declaração de inconstitucionalidade por omissão, afastando-se a possibilidade da entrega direta do direito pelo judiciário, por meio de regulamentação ao caso concreto, em situações de omissão legislativa.

            O resultado disso é que os efeitos do mandado de injunção passam a ser o de cientificar o Poder Legislativo, que mantém-se inerte, para que adote as providências necessárias ao suprimento da omissão. Em se tratando de omissão atribuída a órgão administrativo, este deve sanear a omissão no prazo de 30 dias (art. 103, § 2º, CF).

            Afastou-se da melhor interpretação que se poderia dar a garantia constitucional do mandado de injunção: ser "um instrumento de tutela efetiva de direitos que, por não terem sido suficientes ou adequadamente regulamentados, careçam de um tratamento excepcional, qual seja: que o judiciário supra a falta de regulamentação, criando a norma para o caso concreto, com efeitos limitados às partes do processo". (34)

            Tal entendimento diverge daqueles que sustentam a posição de que "a utilização do mandado de injunção na concretização daqueles direitos colocaria em cheque o princípio da legalidade financeira, previsto no artigo 165, da CF". (35) Isto por que, inevitavelmente, a decisão judicial num caso concreto, objeto de mandado de injunção, repercutiria no orçamento já que o cumprimento da garantia exigiria recursos públicos, situação que, para parte da doutrina, abalaria a segurança e a legalidade orçamentárias.

            Concordamos com a posição em que o mandado de injunção não sirva ordenar ou recomendar a edição de uma norma, devendo, em tais casos, a substituição do órgão legislativo ou administrativo competentes para criar a norma pelo poder judiciário. Este criaria a regra necessária para os fins específicos do litígio que lhe cabe julgar. (36)


8. Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente

            Através de uma bem-sucedida e coordenada política de atendimento é que se pode esperar a efetivação dos direitos fundamentais da criança e do adolescente, derivando daí a sua importância. Sob certo ângulo, a política de atendimento é a própria concretização de direitos na medida em que os operacionaliza, seja através de ações que os promovam, seja através da proteção de direitos que podem ser violados.

            O Estatuto da Criança e do Adolescente concebeu uma política de atendimento direcionada à infância e à juventude composta por um conjunto de ações governamentais e não governamentais, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Previu linhas de ação (37) e diretrizes que, respectivamente, definem-lhe prioridades e a estruturam.

            Uma das diretrizes da política de atendimento voltada às crianças e aos adolescentes é a manutenção de fundos nacional, estaduais e municipais vinculados aos respectivos conselhos dos direitos da criança e do adolescente. (38)

            Assim, ao lado da municipalização do atendimento, da descentralização político-administrativa e da mobilização financeira, o legislador do ECA também concebeu fundos de manutenção de direitos, vistos como um instrumento para que a sociedade, através dos conselhos de direitos, defina ações e programas.

            A descentralização da administração financeira caracteriza os fundos especiais, definidos no artigo 71 da Lei 4.320/64, como aqueles que contém "o produto das receitas especificadas que por lei se vinculam à realização de determinados objetivos ou serviços, facultando a adoção de normas peculiares de aplicação".

            Advém daí que as características principais desse fundo são:

            a) as receitas do fundo são determinadas pela lei que as especifica. Isso significa que não se pode vincular determinadas receitas sem que haja previsão legal.

            Especificamente, em relação ao fundo da criança e do adolescente, tais receitas podem ser obtidas através de:

            a.1.) destinação orçamentária efetuada pelo Executivo ou emenda parlamentar.

            a.2.) doações de contribuintes que poderão ser deduzidas no imposto de renda e proventos de qualquer natureza à ocasião da declaração do imposto.

            As doações feitas aos Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente - nacional, estaduais e municipais-, devidamente comprovadas, devem obedecer os limites de 10% (dez por cento) da renda bruta para pessoa física e 5% da renda bruta para pessoa jurídica. O procedimento disciplinado no artigo 260 do ECA, supõe que os conselhos de direitos estejam estruturados para receber as doações dos contribuintes, dando-lhes comprovação da doação efetuada em conformidade à regulamentação estabelecida pelo Departamento da Receita Federal, do Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento. Tudo para que, quando da declaração do imposto sobre a renda, a doação realizada possa ser deduzida. Ressalve-se que as deduções efetuadas pelo contribuintes não se sujeitam a outros limites estabelecidos na legislação do imposto de renda, tampouco reduzem ou excluem outros benefícios ou abatimentos e deduções em vigor.

            a.3.) doação efetuada pelos contribuintes do imposto de renda acima dos limites previstos no artigo 260 do ECA ou por aqueles que não são contribuintes do imposto de renda pode ser vista como terceira modalidade de constituição das receitas do fundo de manutenção da criança e do adolescente. Tal modalidade de doação é possível, contudo, não há que se falar em dedução do quantum pago.

            a.4.) multas previstas nos artigos 213, 245-258, ECA. O artigo 214, ECA preceitua que "os valores das multas reverterão ao fundo gerido pelo Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente do respectivo município". Os valores de tais multas devem ser recolhidas até 30 (trinta) dias após o trânsito em julgado da decisão, sujeitas, após esse prazo, a execução efetuada pelo Ministério Público.

            A inexistência do Fundo de Direitos da Criança e do Adolescente não impede a arrecadação das multas que, contudo, deverão ser depositadas em estabelecimento oficial de crédito, em conta com correção monetária.

            b) a vinculação da receita do fundo à realização dos objetivos e serviços destinados pela lei. Isto significa que os recursos do fundo são vinculados, exclusivamente, aos programas e às ações voltadas às crianças e aos adolescentes, cabendo a definição dos gastos aos Conselhos Municipais, Estaduais e Nacional de Direitos que fixarão critérios de utilização, através de planos de aplicação das doações subsidiadas e de demais receitas, conforme redação do § 2º, do artigo 260 do ECA.

            c) a adoção, facultativamente, de normas peculiares de aplicação dos recursos do fundo. Um exemplo disso é a parte final do § 2º do artigo 260, onde se preceitua que um dos itens de despesa do fundo da criança é a aplicação percentual para o incentivo e o acolhimento de crianças e adolescentes, órfão ou abandonado sob a forma de guarda, na forma do disposto no art. 227, § 3º, III, da Constituição Federal.

            d) a fiscalização dos recursos do fundo estão submetidos ao controle interno e ao externo. No primeiro caso, cabe ao Ministério Público determinar em cada comarca a forma de fiscalização da aplicação dos recursos, por sua vez, cabe ao Tribunal de Contas a responsabilidade do controle externo das contas de fundo.

            e) criação em concordância com o artigo 167, IX, CF que proíbe a instituição de fundos de qualquer natureza sem prévia autorização legislativa. Tanto no plano nacional, quanto nos estaduais ou municipais, é imperativo que haja lei que crie o fundo.

            f) os beneficiários do fundo não têm a titularidade para exigir o pagamento dos recursos que o compõem. (39)

            g) os fundos da criança e do adolescente não se subordinam ao princípio da unidade de tesouraria (art. 56, Lei 4.320/64), isto é, os seus recursos podem ser mantidos fora da "caixa única do governo. A suspeita de que tais fundos pudessem ser prejudiciais à administração financeira, pela pulverização dos recursos que provocam e pela manutenção de contas bancárias à margem da caixa única, é afastada pela legalidade que envolve os objetivos específicos e relevantes das despesas do fundo da criança e do adolescente bem como da possibilidade de angariar receitas extraorçamentárias". (40)

            Devido à imensa possibilidade de captação de recursos vinculados às despesas direcionadas à infância e à juventude, seria razoável supor que tais fundos fossem criados e operacionalizados, rápida e entusiasticamente. Lamentavelmente, a criação e a operacionalização das possibilidades oferecidas pelo fundo não tem sido exploradas como se deveria. Talvez por desconhecimento de tais possibilidades, talvez ainda por existir um ranço no Poder Executivo em perceber negativamente a ação e o controle da sociedade civil sobre parcelas de poder que, originariamente, seriam suas atribuições.

            A atribuição para a elaboração da lei que institui os fundos é tanto do legislativo, quanto do executivo. Como o conteúdo do referido projeto não envolve o aumento de despesa para o Executivo, tal proposição pode ser apresentada tanto pelo chefe do Poder Executivo, quanto pelos parlamentares.

            É possível, todavia, que nenhum dos poderes apresente o projeto de criação dos fundos, fato que, sem dúvida, representaria perda de receita sobretudo nos planos estaduais e municipais onde aquela pode ser obtida mediante doações de pessoas físicas e jurídicas. Nesse caso, como não é possível que se obrigue o legislativo a fazer leis, a melhor alternativa seria a apresentação de um projeto de lei popular para a criação do fundo.

            Saliente-se que a omissão do Executivo, expressa na não propositura do projeto de lei de criação do fundo, somente se justificaria diante de um quadro de inexistência de violações aos direitos de crianças e adolescentes. Esta omissão do Poder Executivo deve ser remediada mediante a proposição de ação civil pública para a reparação dos danos que, provavelmente, poderiam ser evitados caso o fundo estivesse em pleno funcionamento.


9. Papel dos Órgãos de Defesa e Promoção dos Direitos da Infância e Juventude no Orçamento

            Os órgãos incumbidos da defesa e promoção dos direitos das crianças e dos adolescentes, tem atribuições explicitadas na lei nº 8.069/90.

            Assim, cabe ao Conselho Tutelar "assessorar o Poder Executivo local na elaboração da proposta orçamentária para planos e programas de atendimento dos direitos da criança e do adolescente" (Art. 136, IX,). Isso implica em dizer que, antes da elaboração da proposta orçamentária, o Conselho Tutelar deve ser consultado pelo poder executivo municipal (local) para que colabore com análises, sugestões e críticas aos planos e programas para a infância e a juventude.

            Isso inclui tanto a análise dos recursos previstos para os programas, quanto a própria necessidade de tais programas. Portanto, ainda que o chefe do poder executivo municipal não acate as propostas, sugestões e críticas dos membros do Conselho Tutelar (lembre-se que a decisão é política), o momento de assessoramento deve existir efetivamente, oferecendo as condições e as informações, no momento oportuno, para que os conselheiros tutelares possam exercer esta obrigação prevista no art. 136, IX, ECA.

            O Ministério Público desempenha papel de destaque para a defesa e promoção dos direitos de crianças e adolescentes. Estando a matéria dos direitos da criança e do adolescente na esfera dos interesses difusos, a lei nº 8.069/90 foi generosa nas atribuições do Ministério Público para a matéria, incluindo-se aí a questão orçamentária.

            Diante disso, o Ministério Público tem competência para promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos interesses individuais, difusos ou coletivos relacionados à infância e à adolescência, inclusive os definidos no art. 220, §3º inciso II, da Constituição Federal (art. 201, V, ECA). Em termos orçamentários, o inquérito civil pode ser instaurado para apurar a eventual incompatibilidade entre o volume de recursos orçamentários previstos para a área da infância e juventude e a exigência da demanda social a ser atendida.

            Se diante de indícios de incompatibilidade de recursos com as demandas a serem supridas, o Ministério Público não pode fazer incluir no projeto de lei orçamentária recursos financeiros, pode, contudo, ajuizar a ação civil pública. Essas ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos serão processadas junto à Justiça da Infância e Juventude conforme o artigo 148, IV, ECA.

            Além disso, como o Ministério Público deve zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias legais assegurados às crianças e adolescentes, promovendo as medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis (art. 201, VIII, ECA), o representante ministerial pode a) reduzir a termo as declarações do reclamante, instaurando o competente procedimento, sob sua presidência; b) entender-se diretamente com a pessoa ou autoridade reclamada, em dia, local e horário previamente notificados ou acertados; c) efetuar recomendações visando à melhoria dos serviços públicos e de relevância pública afetos à criança e ao adolescente, fixando prazo razoável para sua perfeita adequação (art. 201, §5º, a, b e c, ECA).


10. Conclusão.

            a) A relação entre direito orçamentário e direito da criança pode ser observada pela existência de dispositivos de cunho orçamentário no direito da criança e do adolescente. Além disso, as políticas públicas para a infância e a juventude exigem a interlocução orçamentária para que se efetivem prioritariamente;

            b) Decisões de cunho político definem os programas e as ações previstas no orçamento, vinculando-se às idéias e convicções políticas, filosóficas, dos governantes.

            c) O princípio da prioridade absoluta, previsto no artigo 227, CF se incorpora à temática orçamentária na medida em que esta se constitui em um instrumento imprescindível para que direitos possam ser concretizados por meio de políticas públicas. Logo, seja na elaboração orçamentária, seja na execução financeira, as decisões governamentais devem ter como pressupostos o conceito de prioridade absoluta à infância e juventude;

            d) O interesse e a mobilização da sociedade e a observância dos dispositivos orçamentários, legais e constitucionais, em conformidade com direito da criança "ativam" o orçamento considerado uma "quase-garantia". Não se confunda, contudo, com as garantias constitucionais previstas na Constituição Federal, tal como o Habeas Corpus e o Mandado de Segurança;

            e) A garantia constitucional do mandado de injunção que poderia ser utilizada tendo efeitos no campos orçamentário restou inviabilizada diante de decisão do Supremo Tribunal Federal que conferiu-lhe os mesmos efeitos da declaração de inconstitucionalidade por omissão, afastando-se a possibilidade da entrega direta do direito pelo judiciário, por meio de regulamentação ao caso concreto, em situações de omissão legislativa.

            f) O ECA previu fundos de manutenção dos direitos das crianças e dos adolescentes, vistos como um instrumento para que a sociedade, através dos conselhos de direitos, defina ações e programas.


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Notas

            01. São exemplos disso o art. 4º e o art. 260: "Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: (...); d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude".

            "Art. 260. Os contribuintes poderão deduzir do imposto devido, na declaração do Imposto sobre a Renda, o total das doações feitas aos Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente - nacional, estaduais ou municipais - devidamente comprovadas, obedecidos os limites estabelecidos em Decreto do Presidente da República. § 1º Revogado pela Lei n.º 9.532, de 10.12.1997; § 2º Os conselhos municipais, estaduais e nacional dos direitos da criança e do adolescente fixarão critérios de utilização, através de planos de aplicação das doações subsidiadas e demais receitas, aplicando necessariamente percentual para incentivo ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou adolescente, órfão ou abandonado, na forma do disposto no art. 227, § 3º, VI, da Constituição Federal; § 3º O Departamento da Receita Federal, do Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento, regulamentará a comprovação das doações feitas aos fundos, nos termos deste artigo; § 4º O Ministério Público determinará em cada comarca a forma de fiscalização da aplicação, pelo Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, dos incentivos fiscais referidos neste artigo".

            02. SILVA, José Afonso da. Op. cit., p. 192.

            03. SILVA, José Afonso da. Op. cit., p. 192.

            04. BRONZEADO, Valéria. Monitoramento da Garantia da Absoluta Prioridade. Retirado de www.direitoejustiça.com em 20 de maio de 2002.

            05. Lembre-se que a disciplina orçamentária é tratada basicamente nos arts. 70 a 75 e 165 a 169 da Constituição Federal, enquanto a disciplina legal é tratada na lei nº 4.320/64 e Lei Complementar nº 101/2000.

            06. BALEEIRO, Aliomar. Op. cit., pg.78.

            07. BALEEIRO, Aliomar. Op. cit., pg.78.

            08. Para se ter uma idéia das exceções constitucionais à liberdade de decisão política orçamentária destacam-se os artigos 158 e 212, CF:

            "Art. 158. Pertencem aos Municípios: I - o produto da arrecadação do imposto da União sobre renda e proventos de qualquer natureza, incidente na fonte, sobre rendimentos pagos, a qualquer título, por eles, suas autarquias e pelas fundações que instituírem e mantiverem; II - cinqüenta por cento do produto da arrecadação do imposto da União sobre a propriedade territorial rural, relativamente aos imóveis neles situados; III - cinqüenta por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre a propriedade de veículos automotores licenciados em seus territórios; IV - vinte e cinco por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação. Parágrafo único. As parcelas de receita pertencentes aos Municípios, mencionadas no inciso IV, serão creditadas conforme os seguintes critérios: I - três quartos, no mínimo, na proporção do valor adicionado nas operações relativas à circulação de mercadorias e nas prestações de serviços, realizadas em seus territórios; II - até um quarto, de acordo com o que dispuser lei estadual ou, no caso dos Territórios, lei federal.

            Art. 212. A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino".

            09. BALEEIRO, Aliomar. Op. cit., pg.78.

            10. Aqui não se está mencionando a figura do precatório previsto no artigo 100, CF.

            11. SILVA, José Afonso da. Op. cit., pg. 216. IN: PERELMAN, Charles. "De la justice", in Justice et raison, p. 26 (na tradução italiana, La giustizia, pp. 37 e 57).

            12. SILVA, José Afonso da. Op. cit., pg. 217.

            13. SILVA, José Afonso da. Op. cit., pg. 216. IN: PERELMAN, Charles. "Le principe de l´egalité en droit de la Republike Fédérale Allemande", pp. 15 e ss..Citado por JOS, p. 216.

            14. SILVA, José Afonso da. Op. cit., pg. 218. IN: FAGUNDES, Seabra. "O princípio constitucional da igualdade perante a lei e o Poder Legislativo", RT 235/3.

            15. SANCHES, Osvaldo Maldonado. Dicionário de Orçamento, Planejamento e Áreas Afins. 1ªedição. Brasília: Prisma, 1997, pg. 109.

            16. SILVA, José Afonso da. Op. cit., p. 111.

            17. SILVA, José Afonso da. Op. cit., p. 113.

            18. "Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o legislativo, o Executivo e o Judiciário".

            19. SILVA, José Afonso da. Op. cit., p. 114.

            20. Ver Capítulo III, item 4.1. Princípios Jurídicos Orçamentários.

            21. TORRES, Ricardo Lobo. "A Legitimação dos Direitos Humanos e os Princípios da Ponderação e da Razoabilidade", In: Legitimação dos Direitos Humanos. Ricardo Lobo Torres (org.) Rio de Janeiro: Renovar, 2002, pg. 423.

            22. TORRES, Ricardo Lobo. Op. cit., pg. 423. Saliente-se que o autor menciona Karl Larenz.

            23. BARROSO, Luis Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas: limites e possibilidades da Constituição brasileira. 6ª ed. atual. Rio de Janeiro: Renovar, 2002., pg. 247.

            24. SILVA, José Afonso da. Op. cit., pg. 449.

            25. BARROSO, Luis Roberto. Op. cit., pgs. 247-248.

            26. BARROSO, Luis Roberto. Op. cit., pg. 249.

            27. BARROSO, Luis Roberto. Op. cit., pgs. 249-250.

            28. JACINTHO, Jussara Maria Moreno. A Participação Popular e o Processo Orçamentário. São Paulo: Editora de Direito, 2000, p. 89.

            29. TORRES, Ricardo Lobo. Op. cit., pg. 249.

            30. JACINTHO, Jussara Maria Moreno. Op. cit., p. 90.

            31. JACINTHO, Jussara Maria Moreno. Op. cit., p. 90.

            32. TORRES, Ricardo Lobo. Op. cit., pg. 252.

            33. TORRES, Ricardo Lobo. Op. cit., pg. 252.

            34. BARROSO, Luis Roberto. Op. cit., pg. 252.

            35. JACINTHO, Jussara Maria Moreno. Op. cit., p. 92.

            36. BARROSO, Luis Roberto. Op. cit., pgs. 252.

            37. São exemplos de linha de ação da política de atendimento: políticas sociais básicas, políticas e programas de assistência social, em caráter supletivo, para aqueles que deles necessitem, serviços especiais de prevenção e atendimento médico e psicossocial às vítimas de negligência, maus-tratos, exploração, abuso, crueldade e opressão (art. 87,I, II e III, ECA).

            38. Outras diretrizes da política de atendimento é a municipalização do atendimento, criação de conselhos de direitos (art. 88, I e II, ECA).

            39. TORRES, Ricardo Lobo. Os Fundos Especiais. Retirado de www.direitoejustiça.com em 20 de maio de 2002.

            40. TORRES, Ricardo Lobo. Op. cit.,. Retirado de www.direitoejustiça.com em 20 de maio de 2002.

 

 

* Bacharel em Direito em Cuiabá (MT).

 

 

 

Disponível em: < http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4541 >. Acesso em: 14/11/06.