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Termo de Ajustamento de Conduta e o Estatuto da Criança e do Adolescente
 

  Rosângela M. A. Zagaglia
Ano de 1997






          Resumo:
          A autora examina o termo de ajustamento de conduta previsto na Lei 8069/90, situando-o à luz da atual
          tendência do direito em privilegiar os direitos difusos e coletivos e o processo coletivo em detrimento dos
          direitos subjetivos e individuais. Discorrendo sobre o tema,  oferece importantes esclarecimentos à cerca
          da sua natureza jurídica tanto no enfoque processual, como no material; informando ainda sobre o seu
          procedimento, sobre a posssibilidade de oposição de embargos, sobre a legitimidade para tomar dos
          interessados o compromisso e sobre os procedimentos básicos para a exigência de uma pretensão
          executória.
 
 

       1- Natureza Jurídica do Termo de Ajuste de Conduta
 

   Atualmente a supremacia do direito subjetivo e individual vem cedendo espaço ao reconhecimento de que interesses difusos
   e coletivos, merecendo, cada vez mais a proteção do direito positivo de diversas nações. Nesse sentido, como bem
   preceitua o Prof. JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA: "A utilização da técnica do processo coletivo qual instrumento de proteção de interesses transindividuais vem adquirindo realce no moderno Processo Civil Pátrio".

   Assim é que, a ação popular, a ação civil pública e o mandado de segurança coletivo hoje se apresentam como
   instrumentos processuais típicos para a tutela desses interesses.

   Importa-nos aqui a ação civil pública, porquanto é nesse tipo de processo que é previsto o termo de ajustamento de
   conduta. Esta ação foi introduzida no Direito Brasileiro através da lei nº 7347/85. No bojo do procedimento prevê, o referido diploma legal, a possibilidade de o réu comprometer-se a ajustar seu comportamento social àquilo que a lei prevê e cuja inobservância vem a ser exatamente um dos elementos que compõem a causae petendi da ação civil pública.

   O legislador, porém, foi além desta possibilidade. Firme no propósito de que interessa à coletividade que os preceitos que
   tutelam os interesses difusos ou coletivos devem ser atendidos, sendo de pouca valia sanção ou punição com que se
   possa pungir o infrator, possibilitou ao termo de ajustamento de conduta pré-existir à dedução da pretensão em juízo,
   exatamente visando a evitar que isto acontecesse.

   De outra forma, constatada a conduta em desconformidade com a lei quando se trate de interesse difuso ou coletivo ou
   mesmo transindividual homogêneo, abrem-se ao apontado infrator duas opções:
   a) insurge-se contra a imputação e se lhe asseguram todos os meios democráticos da ampla defesa e do contraditório; ou
   b) reconhece a infração e compromete-se a ajustar-se à conduta exigida pela norma legal.

   A peculiaridade está em que isto pode ocorrer durante o curso do procedimento jurisdicional, quando então o processo será
   suspenso, bem como em procedimento meramente administrativo anterior à instauração da atividade jurisdicional, cuja
   conseqüência será a inexigibilidade da pretensão, enquanto vigente o prazo do termo de ajustamento.

    Feitas estas considerações, cumpre fixar a natureza jurídica do termo de ajustamento de conduta. Diversos podem ser os
    enfoques.

   Do ponto de vista do direito material, pode-se entendê-lo como uma declaração unilateral de vontade, como defendem
   alguns. Todavia, embora a manifestação de vontade do infrator seja requisito si ne qua non, o termo é muito mais do que
   isto. Na verdade, a figura da declaração unilateral de vontade adequa-se à teoria geral das obrigações, típica do direito
   privado, e está prevista para aquelas hipóteses em que, em tese, o declarante não estaria, a priori, sob o jugo de uma
   norma legal (preceito e sanção), obrigado a emiti-la. Porém, o faz ou como fruto de tratativas contratuais ou como ato de
   mera liberalidade, mas jamais como compromisso de ajustamento de conduta legalmente imposta.

   Ainda sob o enfoque do direito material, mas em sede de direito público, pode-se aventar a possibilidade de enquadrar o
   termo de ajustamento como uma atividade administrativa típica. E esta nos parece a melhor solução. Advirta-se que isso
   tanto vale para o termo de ajustamento levado a efeito antes da instauração da ação civil pública, onde é indiscutível a
   atividade administrativa exclusiva, como no termo ajustado após a instauração da ação civil pública, que não perde sua
   característica exclusivamente administrativa, a não ser quando levado ao processo e homologado pelo órgão jurisdicional,
   momento em que assume a condição de negócio jurídico processual.

   Já sob o enfoque do direito processual, igualmente dois são os aspectos pelos quais podemos investigar a natureza jurídica
   do termo de ajustamento de conduta:
   a) o primeiro deles não traz maiores dificuldades, porquanto será, como já dissemos anteriormente, negócio jurídico
   processual, desde que já tramitando o processo;
   b) o segundo é o que diz respeito ao termo ajustado preventivamente. Neste caso, a figura se assemelha a de um
   reconhecimento pré-processual do pedido.

   É de se notar que as conseqüências processuais serão diversas num ou noutro caso, porquanto, se já ajuizada a ação,
   uma vez descumprido o termo, o juiz lavrará sentença que se constituirá num título executivo judicial de obrigação de fazer
   ou de não fazer, mas que só se concretizará através do respectivo processo de execução.

   Já no termo previamente constituído, seu descumprimento apenas reforçará os fundamentos de fato e de direito - art. 282, III do CPC, em que se funda o pedido, mas não dispensará o processo de cognição da ação civil pública.

    Estas as considerações sobre a natureza jurídica do termo de ajustamento de conduta no direito positivo brasileiro.

    2- O Termo de Ajustamento de Conduta no Estatuto da Criança e do Adolescente - Peculiaridades
 

   O ECA - Lei nº 8069/90 - é reconhecidamente dos diplomas legais mais avançados. Por isto mesmo que incorporou várias
   tendências modernas e multidisciplinares no trato dessa questão social da mais alta relevância, senão a mais importante
   em qualquer país.

   Na regulamentação jurídica e mais especificamente no que diz respeito ao Direito Processual, essas inovações são
   marcantes. Muitas delas, logo a seguir, foram incorporadas ao próprio Código de Processo Civil, na revisão que sofreu no
   final de 1994, como por exemplo a possibilidade de retratação na apelação, ainda que, neste caso, adstrita à hipótese de
   sentença que extingue o processo sem julgamento do mérito por inépcia da inicial, art. 296 e parágrafo único do CPC.

    Em sede de defesa dos interesses difusos e coletivos, também se constatam arrojadas inovações.

   Aqui, vamos apenas abordar o termo de ajustamento de conduta que, como vimos anteriormente, é um mecanismo de
   proteção aos interesses difusos e coletivos.

   O art. 211 atribuiu eficácia executiva ao termo de ajustamento de conduta. Esta é uma inovação peculiaríssima, pois que na
   própria lei que cuida da ACP não tem ele tal atributo.

   Em pura técnica jurídica, o que inclui o Direito Processual, eficácia é a capacidade, possibilidade, ou força que tem
   determinado ato jurídico de produzir os efeitos a que se destina. Nesse passo, quando a lei 8069/90 atribui eficácia
   executiva ao termo de ajustamento de conduta, está inovando no sentido de que o resultado do referido procedimento
   administrativo tem a força de um título executivo como outro qualquer. Isto é fora de dúvida e é a pura expressão da norma.
   Como conseqüência, tem-se que fica dispensada a fase cognitiva, típica do processo de conhecimento, o que, como vimos,
   não ocorre com o termo de ajustamento de conduta de um modo geral.

   É preciso deixar claro que esta eficácia executiva, como não poderia deixar de ser, decorre do poder imperativo da lei. Em
   outras palavras, o termo de ajustamento de conduta em procedimento que vise a tutelar interesses difusos e coletivos de
   crianças e adolescentes desfruta, por si só, de eficácia executiva, simplesmente porque a lei assim o determina, art. 211
   do ECA.

   Ainda sob o enfoque processual e como decorrência dessa eficácia executiva, surge a legitimação para o exercício de uma
   pretensão igualmente executiva quando descumprido, pelo infrator, o termo de ajustamento, o que significa o poder de
   exigir-se em juízo a tutela satisfativa, através do processo de execução de obrigação de fazer ou de não fazer, conforme a
   hipótese em concreto.

   O Direito Processual Geral estabelece dois procedimentos básicos para a exigência de uma pretensão executória, a saber:
   aquele cuja pretensão se funda num título executivo judicial e aquele em que a pretensão se funda num título extrajudicial.

    Chega-se, então, no momento de se identificar se essa eficácia executiva do art. 211 do ECA refere uma ou outra hipótese.

   Em nosso entendimento, cuida-se de título executivo extrajudicial, porquanto o tipo não se enquadraria em nenhuma das
   hipóteses do art. 584 do CPC, eis que não se trata de sentença condenatória proferida em processo civil, nem de sentença
   penal condenatória transitada em julgado, nem de homologação de laudo arbitral, de conciliação ou de transação, nem de
   sentença estrangeira homologada pelo Supremo Tribunal Federal ou de formal ou certidão de partilha. Portanto, pela
   exegese da exclusão e considerando-se a característica numerus clausus dos títulos executivos, não se trata, à toda a
   evidência, de título executivo judicial.

    Resta, pois, para análise, ainda sob o enfoque numerus clausus, classificá-lo entre os títulos executivos extrajudiciais.

   A matéria está disciplinada no art. 585 do CPC, que enumera os documentos considerados títulos executivos
   extrajudiciais.

   Faz-se necessária esta rápida digressão, uma vez que aparentemente a hipótese poderia se enquadrar tanto no inciso II
   como no inciso VII do referido artigo.

   Parece-nos óbvio que não se trata no tipo descrito no inciso II do art. 585 do CPC, porque esse dispositivo alude a
   documentos que se refiram à transação. Ora, nos termos do art. 1025 do Código Civil, a transação supõe uma relação
   jurídica incerta e a eliminação desta incerteza mediante concessões recíprocas, desde que disponível o interesse em jogo.

    Tratando-se de termo de ajustamento da conduta, a lei não pode cogitar de concessões recíprocas.

   Ademais, tratando-se de interesse difuso ou coletivo de criança ou de adolescente, não se pode cogitar de disponibilidade
   do interesse em jogo. Mais uma vez, pelo critério da exclusão, afasta-se o enquadramento no inciso II do art. 585 do CPC.

   A base legal, nos termos da Teoria Geral do Processo, estará no inciso VII do art. 585, que estabelece a possibilidade da
   criação, pelo legislador, de outros títulos executivos não previstos no CPC, desde que por disposição expressa de lei se lhe
   atribua força executiva. Ora, outra coisa não fez o legislador do ECA no art. 211 in fine. Portanto, trata-se de título executivo extrajudicial.

   Aqui cabe uma advertência: as referências acima dizem respeito ao termo de ajustamento de conduta anterior à
   instauração da atividade jurisdicional; quanto ao termo ajustado no curso de procedimento jurisdicional, como já visto, não
   será o caso de título executivo nem judicial nem extrajudicial, pois que cumprido ou não cumprido, o procedimento só se
   extinguirá por uma sentença, ato do juiz, tipicamente decisório, nos termos do art. 162, I, do CPC.

   Todavia, entender-se a eficácia executiva prevista no art. 211 do ECA como extrajudicial nos remete a outra questão
   controvertida, qual seja: a possibilidade de título executivo extrajudicial em obrigação de fazer ou de não fazer.

   A teoria geral do processo procura explicar a eficácia executiva atribuída a certos documentos pela circunstância do
   acertamento. O devedor, antecipadamente, manifesta sua vontade em aceitar a sujeição que se lhe impõe previamente.
   Para tanto, a lei prevê formalidades essenciais a esses documentos, visando a assegurar um mínimo de garantia a essa
   sujeição que coloca o solvens numa posição inferior no processo de execução; daí a inexigência de cognição prévia, típica
   do processo de conhecimento, para a execução fundada em titulo executivo extrajudicial.

    Importante frizar que o art. 211 encontra-se no capítulo VII do ECA, que dispõe sobre a proteção judicial dos interesses
   individuais, difusos ou coletivos.

    De certa forma, reacentua no Direito Brasileiro a teoria do acertamento.

    O que se deve entender por acertamento ?

    A norma jurídica prevê duas condutas:
    - uma, destinada aos interessados, é o preceito;
    - outra, destinada à atividade estatal a ser desenvolvida caso desatendido o preceito.

   Nesta atividade o Estado substitui o comportamento não prestado pelo titular do interesse subordinado. (COCCIO, "La
   teoria egológica y el concepto juridico de libertad" ).

   A aplicação da norma ao caso concreto contém o acertamento e este se dá tanto quanto à conduta estabelecida no
   preceito, como naquela prevista na sanção.

   No título executivo extrajudicial, tanto o preceito como a sanção são acertados previamente pelas partes e é isto que
   justifica e explica a dispensa do processo de cognição.

   Normalmente, o acertamento incumbe ao Estado, que o fará através de um processo de conhecimento com todas as
   garantias. Entretanto, no título executivo extrajudicial encontra-se uma rara, senão a única exceção a essa principiologia.

   Portanto, pode-se concluir que inexiste fundamento para título executivo sem a certeza. O acertamento é que lhe dá este
   atributo. Vale citar CAMPOS, 1978, p. 17 nos seguintes termos:

   "Se a codificação acolhe o título extrajudicial, inovando, admite um acertamento realizado à margem da atuação do
   judiciário, sujeito a posterior controle, porém suficiente, dadas certas condições, a servir de suporte a um processo de
   execução". (grifo do autor)

   Não obstante, se a teoria do acertamento soluciona o problema da eficácia executiva atribuída ao termo de ajustamento,
   prevista no art. 211 do ECA, não resolve a questão da execução de obrigação de fazer ou de não fazer fundada em título
   executivo extrajudicial.

   Com efeito, sempre se resistiu a idéia de execução de fazer ou não fazer que não se fundasse em sentença judicial. Isto
   remonta aos próprios ideais burgueses que inspiram toda a ideologia da Revolução Francesa sintetizada na célebre
   bandeira do egalité, fraternité, et liberté.

   Por óbvio, essa liberdade, sob a ótica burguesa, transpôs-se para o direito positivo na proteção exagerada da intangibilidade
   da vontade humana, cujo exemplo mais significativo é o do art. 1142 do Código Civil Francês, segundo o qual:
   "Toute obligation de faire, ou de ne pas faire, se resout en dommages et intérêts, en cas d'inexecution de la part débiteur".

    Descumpridas as obrigações de fazer ou de não fazer, a questão resolver-se-ia por perdas e danos.

   Esta verdade, antes inabalável, foi cedendo espaço diante da construção doutrinária processual, notadamente de
   CHIOVENDA e CALAMANDREI.

   Embora o atual CPC, na versão original, previsse ações cognitivas, inclusive com preceito cominatório para as pretensões
   de fazer e de não fazer, além do exemplo clássico da ação de adjudicação compulsória, o fato é que, até as alterações
   promovidas recentemente, não se admitia no direito pátrio, este tipo de execução fundada em titulo executivo extrajudicial.

   Atualmente, o CPC admite a execução de fazer ou de não fazer, mesmo que por título executivo extrajudicial. Veja-se, o
   art. 645----- o qual deverá ser analisado com o art. 585, II c/c 632 in fini, todos do Código de Processo Civil.

   De se notar, porém, que o que hoje é regra geral já era previsto excepcionalmente no art. 211 do ECA, ainda que restrito às
   hipóteses de termo de ajustamento de conduta. Aliás, isto não é novidade absoluta no nosso direito, basta ver que o § 1º do
   art. 831 da Consolidação das Leis do Trabalho, CLT, de 1944, c/c o enunciado 259 do Tribunal Superior do Trabalho, de
   longa data, já estabelecia que o termo de conciliação tem eficácia de decisão irrecorrível, só sendo atacável por ação
   rescisória.

   Cuidando-se de termo de ajustamento de conduta, não se pode olvidar que, se de um lado estão os órgãos públicos
   responsáveis pela defesa dos interesses difusos e coletivos, do outro está o jurisdicionado. Portanto, se a lei permite que
   este ajuste sua conduta ao preceito legal, há de lhe ser conferido prazo compatível para que possa cumprir o que se lhe
   exige.

   Nesse ponto, a legislação é omissa, ficando ao prudente arbítrio da autoridade competente fixar prazo compatível. Até
   porque, se não houver esta compatibilidade, frustrada estará a própria motivação do termo de ajustamento de conduta.
   Portanto, o prazo é requisito de existência jurídica do termo, e sua compatibilidade com a conduta exigida é requisito de
   validade.

      3- Da Legitimidade no Termo de Ajustamento de Conduta
 

   Em pura técnica processual, legitimidade é uma das condições genéricas para o exercício legítimo do direito de agir, vale
   dizer: uma das condições da ação. Ou, como magistralmente definiu BUZAID: é a pertinência subjetiva para a demanda,
   seja para propô-la, seja para sofrê-la.

   O art. 211 do ECA dispõe que os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de
   ajustamento de sua conduta às exigências legais, o qual terá eficácia de título executivo extrajudicial.

    Esses órgãos públicos legitimados são os previstos no art. 210, I e II ou seja:
    - Ministério Público
    - a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal.

   Repare-se, todavia, que embora o termo de ajustamento de conduta tenha sua origem na ação civil pública, o art. 210 do
   ECA não restringiu esta legitimação apenas à ação civil pública. Conferiu-a a todas as ações cíveis, inclusive à ação civil
   pública, fundadas em interesses coletivos ou difusos.

   É inegável que a redação não foi das mais felizes, uma vez que o mecanismo próprio para defesa de interesses coletivos e
   difusos é a ação civil pública. Todavia, o art. 212 estabelece que para a defesa dos direitos protegidos pelo ECA são
   admissíveis todas as espécies de ações pertinentes. Portanto, o ECA não restringiu esta questão apenas à pretensão
   dedutível pela ação civil pública: ao revés, estendeu-a a toda e qualquer ação civil pertinente.

   Por conseguinte, quando o art. 211 fala em órgãos públicos legitimados, não está se referindo àqueles legitimados para a
   ação civil pública.

   Embora, prima facie, não haja maiores conseqüências práticas na distinção, uma vez que esses órgãos públicos são
   também os legitimados concorrentes para a ação civil pública, isto não significa, absolutamente, que o termo de
   ajustamento de conduta previsto no art. 211 do ECA só possa existir em preparação ou incidentalmente à ação civil pública,
   mas apenas que somente os órgãos públicos legitimados (art. 210, I e II. ) podem tomá-lo do interessado, qualquer que seja
   a ação que, em tese, poderiam propor.

   Situação peculiar é a do Ministério Público, porque, a um só tempo, é legitimado concorrente e custos legis em qualquer
   ação fundada no ECA.

   Ao lado disto, cabe observar que o termo de ajustamento de conduta prévio que, como se viu, é negócio jurídico
   pré-processual, tem como um dos seus principais efeitos jurídicos tornar inexigível o exercício da pretensão enquanto não
   expirado o prazo e verificado o acertamento da conduta exigida ao jurisdicionado. O que significa que, tomado o termo,
   enquanto corre o prazo, impossível é a propositura de qualquer ação.

   Disto decorrem duas situações pré-processuais peculiaríssimas:
   a) a compatibilidade do prazo concedido, bem como a inexistência de arbitrariedade, ilegalidade, abuso ou de desvio de
   poder; e
   b) a necessidade, sob pena de nulidade, da interveniência do Ministério Público na tomada do termo de ajustamento,
   quando este não for o próprio órgão público tomador.

    Nessa segunda hipótese, todavia, o Ministério Público não deve funcionar apenas como uma espécie de ente protetor dos
    interesses difusos ou coletivos da criança ou do adolescente; cabe-lhe, também, em seu mister, oficiar na regularidade da
    exigência que se faz ao jurisdicionado, para evitar os descritérios que possam ocorrer e como tal apontados na alínea a
    anteriormente tratada.

   Além disto, é imperiosa a intervenção do M.P. porquanto o próprio termo de ajustamento de conduta, se inadequado, pode,
   na verdade, estar servindo para evitar que se exija do jurisdicionado, via ação judicial própria, a conduta posta em lei. A
   atuação do M.P., no caso, serve também, como se vê, para evitar fraude ou simulação na tomada do termo.

               4- Dos Embargos
 

    Pelo até aqui exposto, fixa-se o entendimento de que, nos propósitos do ECA, o termo de ajustamento de conduta é título
    executivo, de obrigação de fazer ou de não fazer, extrajudicial, conforme o art. 211.

   Entretanto, cabe uma observação muito importante. É que, à primeira vista, a execução fundada em título extrajudicial
   coloca o titular do interesse numa posição pré-processual vantajosa, eis que, como se viu, dispensado o processo de
   cognição para o acertamento, enquanto a execução fundada em título judicial dependerá sempre de sentença proferida em
   processo de conhecimento prévio.

   Essa primeira facilidade, porém, num segundo momento, pode não parecer tão pragmática. Isto porque, em toda e qualquer
   execução há sempre a possibilidade da defesa em sentido lato, via oposição de embargos, como ação individual autônoma.

   E, aí, chama-se atenção para o seguinte:
   - se a execução é fundada em título judicial, a matéria possível de ser alegada em embargos é aquela restrita as hipóteses
   do art. 741 do CPC;
   - se, porém, a execução se funda em título executivo extrajudicial, os embargos têm previsão legal no art. 736 do CPC,
   sede em que é lícito ao executado deduzir nos embargos toda matéria de defesa que poderia argüir no processo de
   conhecimento.

   Essa questão torna-se ainda mais preocupante, na medida em que, se tratando de execução de obrigação de fazer ou de
   não fazer, não há, em princípio, que se cogitar de garantia patrimonial do juízo para a propositura dos embargos.

    Portanto, há que se analisar e interpretar com muito cuidado a opção do legislador em atribuir eficácia de título executivo
    extrajudicial ao termo de ajustamento de conduta previsto no ECA.

    Referências Bibliográficas
 

    - BERMUDES, Sérgio; A Reforma do Código do Processo Civil, Observações às Leis 8951, 8952, 8953 e 8954, de
    13/12/1994; Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1995.

    - CAMPOS, Ronaldo Cunha; Execução Fiscal e Embargos do Devedor; Rio de Janeiro, 1978.

    - CARNEIRO, Paulo César Pinheiro; A proteção dos direitos difusos através do compromisso de ajustamento de
    conduta previsto na lei que disciplina a ação civil pública; in Revista da Faculdade de Direito da UERJ, nº1, v. 1, Rio de
    Janeiro, 1993.

    - DINAMARCO, Cândido Rangel; A Reforma do Código de Processo Civil , São Paulo: Malheiros, 1995.

    - LIEBMAN, Enrico Tullio; Processo de Execução; com notas de atualização do Prof. Joaquim Munhoz de Mello, São
    Paulo: Saraiva, 1980.

    - MILARÉ, Édis (Coord.)  Ação Civil Pública: Lei nº. 7347/85: Reminiscências e Reflexões Após Dez Anos de Aplicação.
    São Paulo; Editora Revista dos Tribunais, 1995.

    - MOREIRA, José Carlos Barbosa, in "Os novos rumos do Processo Civil Brasileiro", in Revista de Direito da
    Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro n º 47, pp 12/13, 1994.

    - REIS, Friede; Comentário à Reforma do Direito Processual Civil Brasileiro; Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995.

    - Termo de Ajustamento e o Estatuto da Criança e do Adolescente; ROSÂNGELA M. A . ZAGAGLIA
    PROFª DA FACULDADE DE DIREITO E DO CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO ESPECIAL DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE DA UERJ. DEFENSORA PÚBLICA-RJ ANO DE 1997
 
 

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