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DISCURSO SOBRE O DIREITO DO MENOR.

José de Farias Tavares

    Professor de Direito do Menor da Universidade do Estado da Paraíba
                 Promotor de Justiça do Estado da Paraíba




 Sabe-se que a Constituição obriga os Poderes Públicos a respeitarem os direitos que ela assegura a todos, mesmo contra o Poder Oficial, se for o caso. Para garantia disso investe o Ministério Público de atribuições próprias ao seu mistér em defesa desses direitos e interesses, sejam em conflitos com pessoas ou entidades particulares, seja contra o Poder Público, como explica MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO em sua obra COMENTÁRIOS À CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA - Volume 3 - Edição Saraiva - São Paulo, 1992, pag. 47. O Estatuto da Criança e do Adolescente consubstanciado na Lei nº 8.069, de 13 de Julho de 1990 situa-se na linha da relevância institucional do Ministério Público no pertinente à matéria por ele regulada, como diploma consectário das normas constitucionais de proteção à infância e à adolescência brasileiras. Ao longo do Estatuto vê-se a ordem de grandeza da responsabilidade institucional da PROCURATURA na aplicação dessa lei especial. A Lei Orgânica Nacional do Ministério Público - Lei nº 8.625, de 12.2.1993 diz no seu art. 2º que o MP de cada Estado federado terá sua organização sob a forma da Lei Complementar própria, com normas específicas, atribuições e estatuto seus. O Estatuto da Criança e do Adolescente regulamenta o texto constitucional no que se refere à proteção que deve ser dada à população infanto-juvenil (CF, art. 227, especialmente). E em sintonia com o mandamento constitucional adota a doutrina da proteção integral (art. 1º) aos seus estinatários. Define no seu

primeiro artigo a filosofia adotada em todo o seu contexto hamonizando as regras com a sintonia do art. 6º. Coerentemente faz essencial à sua aplicação e eficaz aplicação a presença atuante do Ministério Público na dinâmica das atividade judiciais ou extrajudiciais, e mesmo nas de caráter administrativo. O Promotor de Justiça ou Curador quando propugna pela aplicação correta das normas estatutárias em favor da criança e do adolescente, está, em última análise, promovendo o interesse público primário, interesse social, buscando o bem-comum, no dizer norma-guia:

" Fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum." (Lei de Introdução ao Código Civil, art. 5º).

E o Estatuto, art. 6º: " Na interpretação desta lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, às exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento."

Daí: " Este é o dispositivo-eixo pelo qual se há de mover o Estatuto." (TAVARES - José de Farias - in COMENTÁRIOS AO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - Ed. Forense - Rio, 1992, pag. 16)

Tal espírito presidirá sempre a atuação da PROCURATURA na imensa área de interesse da infância e da juventude que a Nação brasileira lhe confia. Com esse zelo terá sempre em vista o futuro do nosso país como Estado Democrático com bem estar geral assegurado pela preservação dos recursos humanos e da inteligência dos homens de amanhã. A atuação do Ministério Público nessa proteção especial não se restringe às atividades do Curador da Infância e da Juventude, ou do titular da Promotoria da Justiça no Juízo especializado, com atribuições constantes da Lei Orgânica que o rege. Expressiva é a advertência de HUGO NIGRO MAZZILLI:

" Ademais, cumpre deixar claro, posto óbvio, não é apenas o Promotor de Justiça da Infância e da Juventude o único órgão do Ministério Público que zela direitos e interesses ligados à proteção dos menores. O Promotor criminal, o curador de família, o curador de incapazes, o Procurador de Justiça

enfim, toda a Instituição, na forma e nos limites da lei local de organização do Ministério Público, está investida na proteção da infância e da juventude." (in - REVISTA DE INFORMAÇÃO LEGISLATIVA - Senado Federal - nº 114, pag. 176 - Brasília, 1992).

As atribuições do Ministério Público em defesa dos direitos e interesses da criança e do adolescente estão previstas de forma expressa ou tácita, direta ou indireta, nas mais diversas lei vigentes no País. A Lei Orgânica em cada Unidade da Federação cataloga as incumbências, embora deixando implícito que outras poderão exsurgir dos casos concretos. Até mesmo o elenco do art. 201 do ECA não exaure o assunto. Ao longo do texto estatutário se vê a imperiosa necessidade da presença ministerial ativa e vigilante. Algumas referências, entretanto, mesmo breves, darão idéia da vastidão da matéria. Dentre os direitos fundamentais da criança e do adolescente a proteção contra maus tratos de que fala expressamente o art. 13 do ECA, avulta de interesse por parte do Ministério Público, por motivos óbvios. Obrigações de qualquer pessoa que disso tomar conhecimento, cabe especialmente MP.. a iniciativa de fazer cessar o mal. A respeito:

" O silêncio poderá ser caracterizado como crime de omissão de socorro (art. 135 do Código Penal) ou outro tipo mais grave, conforme o caso. Poderá a pessoa omissa ser tida como conivente, sujeita às mesmas penas dos autores do crime, prevista nos arts. 232 e 233 do Estatuto." (TAVARES - in - COMENTÁRIOS...op. cit. pag. 20).

Como maus tratos podem ser enquadrados casos de violação da liberdade, do respeito e da dignidade das pessoas humanas em fase de desenvolvimento, tal como asseguram os arts. 15 e 18 do diploma legal. A desatenção ao preceito do art. 56, I, por parte dos dirigentes de estabelecimentos de ensino exigirá a intervenção do MP, logo chegue ao seu conhecimento o fato, por qualquer que seja a outra via. O afastamento do agressor em ocorrências de maus tratos, e bem assim, opressão ou abuso sexual, da moradia da criança e do adolescente, é assunto do Promotor de Justiça ou Curador. A presença de pessoas toxicômanos ou narcotraficantes na convivência familiar e comunitária (ECA, art. 19) é nociva às crianças e aos adolescentes, pelo que é legítima a intervenção do Ministério Público. O desempenho do pátrio poder-dever e a suspensão ou perda desse status (ECA, arts. 22 e 24) é objeto das preocupações ministeriais. A colocação em família substituta (ECA, arts. 28 e seguintes) terá o acompanhamento de representante do Ministério Público, expressa nos autos, seja de pedido de guarda, de tutela ou de adoção, observando-se rigorosamente os ditames estatutários, pois: " Família substituta é aquela que passa a desempenhar as funções da família consanguínea, como já visto no art. 25. E que só excepcionalmente (art. 19) poderá suprir a falta da originária, para assegurar a convivência saudável." (TAVARES - José de Farias - op. cit. pag. 30).

Acrescente-se que somente quando se evidencia o proveito para a criança ou adolescente, é que se permitirá a colocação em uma família substituta, pois o que se tem em vista é a proteção do acolhido, nunca as pretensões dos guardiães, tutores ou adotantes, já que eles não tem direito a exigir, e sim, proteção a oferecer. O Cadastro previsto no art. 50 do ECA destina-se a relacionar nomes de crianças e adolescentes que necessitam de uma família que substitua a sua originária, por não ter esta cumprido o dever constitucional que lhe cabia em primeiro lugar. Esse cadastro deve ser elaborado em cada Comarca pelo Juizado da Infância e da Juventude, com a participação do Promotor de Justiça local. Há comarcas que, em razão da densidade populacional e sua complexidade urbana e ainda pela movimentação forense, se desdobram em vários foros chamados pelo Estatuto foros regionais, todos localizados na sua área territorial. Exemplo, a Comarca da Capital de São Paulo, que, como comarca é uma só unidade territorial de jurisdição, porém, com as funções jurisdicionais distribuídas em subunidades designados como Foros Regionais em vários bairros daquela cidade, contendo cada subunidade uma ou mais Varas da Infância e da Juventude que reúne, ou reúnem, em um Cadastro as informações que espelham a situação em cada localidade, dos pretendentes a adotantes e dos pretendidos menores carentes de colocação em família substituta. Contraproducente seria, ao revés, a concentração de tais informações e demais atribuições sobre adoção, mesmo internacional, em uma única mão, em um único juizado. Tornar-se-ia mais difícil a observação que deve ser exercitada diretamente no habitat da pessoa em estudo, pelos encarregados da solução - Juiz, Promotor, pessoal de apoio da equipe interprofissional prevista no Estatuto. Com a presença física no lugar de origem da criança do adolescente poder-se-á acompanhar mais de perto a interação entre as partes e assim avaliar melhor o proveito revelado na convivência com as famílias interessadas, no ambiente comunitário. Pelo que serão melhores as condições de verificação, caso-a-caso, conveniência social e humana da adoção em processamento, e não simples aferição da legalidade estritamente formal. Atendendo-se os preceitos do Estatuto da Criança e do Adolescente nos arts. 6º e 43. Que o Promotor de Justiça da Infância e da Juventude em cada lugar redobre cuidados na vigilância sobre tal tipo de adoção - a internacional - em face da gravidade do ato, e em razão da polêmica que se estabeleceu sobre isso. E o cuidado especial do Promotor de Justiça

local nesse assunto, talvez seja o maior encargo do Ministério Público que ele ali representa. Providências como exigir a tradução para nossa língua oficial que a Constituição (CF, art. 13) declara ser o português, e o visto consular atestando a vigência atual de texto da legislação estrangeira trazida aos autos, bem como o atestado de idoneidade da pretensão e dos pretendentes alienígenas, são providências aparentemente simples, porém de muita significação, e que podem ajudar a detectar pleitos espúrios. A verificação da legalidade da saída de criança ou adolescente adotado no Brasil por casais estrangeiros residentes no Exterior, somente permitida após trânsito em julgado da sentença de adoção (ECA, art. 51, § 4º), e o precedente estágio de convivência (ECA, art. 46, § 2º), exigem cuidados do Ministério Público. Tenha-se em conta que a sistemática estatutária tende a facilitar o processamento da adoção, tendência essa que coroa a longa evolução desse instituto na história do nosso direito, aspecto que não se pode aqui analisar detidamente. A facilitação, porém, jamais poderá ser entendida como permissiva no sentido de afrouxar-se a atenção sobre a conveniência do ato de adotar um filho alheio como próprio, situação que se torna irreversível (ECA, art. 48), e é isto o que constitui gravidade maior. Quando se trata da chamada adoção internacional aumenta o risco pois o adotando sai do âmbito da jurisdição brasileira numa viagem sem volta. O que não deve ser tomado como xenofobia, que não se coaduna com os foros da civilização hodierna. Há casos, sabe-se, benéficos nesse cenário, porém há controvérsias ponderáveis sobre o destino desses brasileiros adotados por estrangeiros no Exterior. E o destino dessas pessoas, incapazes de discernimento pleno, interessa sobremaneira ao Ministério Público, guardião por excelência do interesse social e individual indisponível. Decisão sobre a polêmica chama a atenção: " O Estatuto da Criança e do Adolescente não faz discriminação entre brasileiros e estrangeiros. O que a lei quer é que se dê supremacia à criança e ao adolescente, seu bem-estar, seus direitos, dignidade, convivência familiar, etc. e, estando brasileiros e estrangeiros nas mesmas condições, sendo ambos convenientes à criança e ao adolescente, deve-se preferir o brasileiro ao estrangeiro. Se, porém, as condições oferecidas pelo casal estrangeiro forem melhores e trouxerem vantagens ao menor, a medida excepcional deve ser aplicada." (TJ-MG-Ac. 4ª, Câm. Civ. pub. 05.l2.l992 - Al - 22.528/4 - Relator: Desemb. Alves de Melo).

Os fenômenos escolares da evasão e da repetência (ECA, art. 56) autorizam o Ministério Público intervir nas escolas para apurar as causas de tão danosas ocorrências que prejudicam a formação educacional dos alunos menores. A educação é o caminho único para a redenção de qualquer povo, e não pode ser descurada por quem tenha qualquer parcela de responsabilidade pública ante o destino do nosso povo. A ausência constante da escola, a desídia, muitas vezes dos pais ou

responsáveis que não matriculam as crianças e ou adolescentes em estabelecimentos de ensino ao seu alcance, são manifestações do mau proceder no exercício do pátrio poder-dever que a eles incumbe e que deles o Ministério Público deve exigir, sob os ônus da suspensão ou perda do pátrio poder-dever e cominação de penas pelo abandono intelectual. A responsabilização da autoridade administrativa - Governador do Estado ou Prefeito do Município, como prevista § 2º do art. 208 da Constituição Federal, é tarefa do Ministério Público, atentando-se para o disposto no art. 211 combinado com art. 30, VI, da Carta que incumbe prioritariamente aos municípios o ensino fundamental. E o ECA regulamenta a norma superior no art. 54 quando repete o preceito da obrigatoriedade e gratuidade do ensino fundamental. Responsabilidade administrativa, portanto. A oferta de vagas nas escolas do 1º grau deve ser precedida de Censo Escolar e Chamada Escolar, para verificação das carências comunitárias. Uma tarefa para Curador da Infância e da Juventude junto aos poderes executivos municipais, e da Procuradoria Geral de Justiça junto ao Governo do Estado. A lacuna da lei na conceituação de oferta irregular de ensino, implica em maior trabalho de detectação por parte do Ministério Público. Há que se corrigir a falha legislativa. O trabalho do menor deve ser fiscalizado pelo representante local do Ministério Público, obviamente, para coibir-se abusos. O que a ordem jurídica quer é que o trabalho que dignifica o homem, não seja exercitado de maneira que prejudique a pessoa em desenvolvimento, sob qualquer forma, inclusive, quanto ao tempo a ser dedicado ao estudo regular apropriado à faixa etária 14/18 anos. Claro que a atuação ministerial não deve constituir estorvo ao desenvolvimento profissional do menor nem desestímulo à integração da força jovem ao mercado de trabalho. A aprendizagem que a lei prevê para os menores de 14 anos, deve ser ministrada através dos órgãos convencionais, em regra, desde que seja o candidato já adolescente, pois não é permitida à criança (CF, art. 7º, XXXIII e 227, I). Quanto a esta última faixa etária (ECA, art. 2º, menor de 12 anos) bom é observar que nos nossos costumes o ensino prático é ministrado de pais a filhos, através de gerações, em regime familiar, de maneira assistemática, preparando mão de obra desde cedo para composição de renda familiar como meio de sobrevivência na economia informal. Pode ser considerada tal atividade como pedagógica, se for essa a natureza do caso concreto. A vedação constitucional - estatutária não pode ser levada às últimas conseqüências pela interpretação restritiva, já que o trabalho e o aprendizado são fundamentais a realização da pessoa humana, e como tais, não se deve restringir a inteligência da norma constitucional-legal, ao sabor do intérprete, o que seria anti-social. Observe-se, a respeito, o que dispõe o Estatuto, dentre outras regras, as dos arts. 60 usque 69. Quanto à política de atendimento à população infanto-juvenil a participação do Ministério Público local é imprescindível, sejam as entidades atendentes particulares ou serviço público (ECA, arts. 86 e seguintes). Pode e deve a PROCURATURA da Infância e da Juventude interferir velando pelo bom desempenho do atendimento. Averiguar as condições de funcionamento, reclamar providências

corretivas, instaurar inquéritos civis públicos, formalizar representações administrativas e judiciais para intervenção na administração de tais entidades e até de interdição se necessária. As medidas de proteção à criança e ao adolescente (ECA, arts. 98 e seguintes) exigem a presença constante do Ministério Público, seja através da Curadoria, seja da Promotoria de Justiça. Quando o ato praticado por criança é de natureza do ato dito infracional em relação ao adolescente, as medidas a tomar não serão as correspondentes (medidas sócio-educativas), porém, medidas de proteção que o MP deve providenciar, nos termos do Estatuto e nos limites de suas atribuições. O ato infracional imputado a adolescente e como tal previsto no Estatuto, arts. 103 e seguintes, implica em uma série de providências a serem tomadas pela Promotoria de Justiça junto à Vara ou o Juizado da Infância e da Juventude. O ponto nevrálgico do problema social da segurança pública que tanto sacode a sociedade brasileira atualmente é o procedimento da Justiça Pública quando das freqüentes ocorrências registradas em nossas ruas promovidas por agentes inimputáveis. Constata-se já uma intolerância coletiva ou difusa em nossos meios sociais, e a voz comum, como que calcanhar de Aquiles, está na inimputabilidade aos 18 anos de idade. Verdade, esquecem os críticos alvoroçados, que essa inimputabilidade não é inovação do malsinado Estatuto da Criança e do Adolescente, porém já há mais de meio século constando do nosso Código Penal, ultimamente ganhou categoria constitucional, pois a Carta Magna de 1988, após amplo debate público nacional largamente difundido, consagrou o principio, sem impugnação significativa da sociedade brasileira que a isso aquiesceu. A realidade, entretanto, é que hoje os brasileiros se manifestam por todos os meios, inconformados com essa política. Considerado o clamor público, pode o MP atender em parte a expectativa comunitária, requerendo medidas sócio-educativas que amenizem o problema, como, em casos de violência incontornável, o recolhimento desses jovens a casas de internação apropriadas para a sua reeducação, e conseqüente reabsorção pelo meio social, quando recolocado em liberdade. Deve o Ministério Público exercer intensa vigilância no encaminhamento do problema em juízo e fora dele. Exigir que se cumpra a lei evitando-se acima de tudo, a promiscuidade com deliquentes adultos no ambiente deletério das prisões, pois os cárceres não podem ser utilizados para contenção desses menores. Os cuidados que o policiamento deve ter para não violentar a pessoa em fase de desenvolvimento são supervisionados pela Promotoria de Justiça. A tramitação do procedimento judicial deve ser acompanhada pelo MP e a execução das medidas aferida constantemente pelo órgão ministerial local. A Curadoria da Infância e da Juventude aí tem de se desdobrar em atividade educadora e fiscalizadora do cumprimento da lei nos momentos cruciais da curatela social. A remissão (ECA, art. 126/129 e outros) é uma inovação como figura do nosso Direito: " Prerrogativa da Promotoria da Infância e da Juventude que lhe permite abster-se da provocação do juízo se entender benéfico poupar-se o adolescente de uma medida judicial. Antes de formalizar o petitório da representação o Ministério Público pode recusar-se a faze-lo, se motivos tiver para a fundamentada abstenção, dentro dos princípios de unidade, indivisibilidade e independência funcional." (TAVARES - José de Farias - in - COMENTÁRIOS AO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, ibidem - pag. 109).

" Essa figura nova na processualística brasileira - remissão que se introduz no nosso direito processual positivo nos termos especialíssimos deste Estatuto, merecerá estudos da doutrina, por não se confundir com outros da legislação vigente. O perdão judicial previsto em alguns pontos do Código Penal e a renúncia admissível em ações penais de iniciativa privada são institutos diferentes do que ora se inaugura."

" A remissão estatutária por parte do Ministério Público, ou seja a abstenção de iniciativa processual, essa novidade, não se pode confundir também com a extinção da punibilidade ou da não aplicação de pena que o Código Penal prevê, em hipóteses, como por exemplo, do seu art. 242, parágrafo único, in fine." (TAVARES - op. cit. pags. 110/111) A criação, instalação e funcionamento dos Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente, bem como dos Conselhos Tutelares, será objeto de preocupação do Ministério Público, evidentemente. Participação direta, inafastável, como condição de regularidade. Só aí, um conjunto imenso de atuação do MP como órgão do interesse social, hoje instituição por excelência, da vida comunitária. O acesso à Justiça (141/142 do Estatuto) é garantia constitucional que o Ministério tem de facilitar aos interessados na solução de problemas da infância e da juventude, tornando-se, em primeiro plano, o Curador e o Promotor de Justiça abertos, ao diálogo adequada à criança e/ou ao adolescente que os procure, ou, aos que, não o procurando, sejam por eles procurados onde estiverem. Nos procedimentos judiciais em geral o MP atua como fiscal da lei e/ou como parte interessada. Exercerá o direito de ação legitimado que é, segundo o Código de Processo Civil, a rts. 81 e 82 e demais disposiçõs legais pertinentes aos

interesses coletivos, difusos, transindividuais, ou individuais indisponíveis, e ainda, dos hipossuficientes, promovendo, discutindo em juízo apropriado, as questões sobre o pátrio poder-dever, tutela, guarda, e demais hipóteses que afetem o universo de interesses das crianças e dos adolescentes, na área cível e na infracional, similar da penal do mundo dos imputáveis. Em caso de flagrante de ato infracional, diz o art. 172 do Estatuto, que o adolescente, encaminhado imediatamente, pelo detentor, à Polícia, esta o levará logo ao representante do Ministério Público. A este competirá apresentar o agente ao Juiz, ou conceder-lhe de logo a remissão, se cabível, como forma de exclusão do processo de que fala o art. 126 do Estatuto. Ainda, na hipótese de flagrância de ato infracional, o Promotor de Justiça tem de observar que (ECA, atr. 174) a autoridade policial poderá liberar de plano o adolescente se os pais ou responsáveis comparecerem e assinarem termo de responsabilidade de sua apresentação direta ao representante do Ministério Público. E, noutro sentido, se o caso de natureza grave e a comoção da comunidade recomenda, a apresentação pelo policial será diretamente ao Juiz da Infância e da Juventude, que poderá determinar a internação, similar ao que se denominaria de prisão preventiva para os imputáveis. Será uma internação provisória (ver arts. l06, l07, ll1 VI, 121 a 125 e 148 do Estatuto). Se a autoridade policial não proceder a liberação que for devida (ECA, art. 175) deverá apresentar o adolescente ao representante do Ministério Público, e a este caberá requerer o que for de direito, ao Juiz competente, ou se for o caso, ouvirá diretamente o menor apresentado para firmar seu entendimento sobre a possibilidade de remissão prévia como a de que fala o art. 126 do Estatuto, ou outras providências legais para o correto tratamento judicial do caso (ECA, atrs. 179/180). Se o Juiz discordar da homologação requerida pelo MP do arquivamento, ainda assim o Ministério Público dará a última palavra, pois os autos irão ao Procurador Geral de Justiça. Este é que terá de oferecer a representação diretamente, ou designar outro membro do Ministério Público para apresenta-la, ou simplesmente ratificará o ato de arquivamento ou o de remissão do Promotor de Justiça da Comarca de origem. E o assunto estará, nesta ultima hipótese, encerrado (ECA, art. 181). Se o entendimento do representante do Ministério Público for de não promover o arquivamento ou de não conceder a remissão prévia, oferecerá a representação, peça similar da denúncia nas ações penais públicas. Penalidades administrativas por infração às normas do Estatuto da Criança e do Adolescente podem ser provocadas pelo Ministério Público (ECA, arts. 194 e seguintes), ou, se a pedido de outrem, sobre elas opinar como fiscal da lei, cabendo-lhe ainda promover a execução de multas a serem recolhidas em favor do Fundo Municipal gerido pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente. Nos recursos procedimentais (ECA, art. 198/199), já por ter o Estatuto adotado o sistema do Código de Processo Civil (ver o art. 152), e por aplicação analógica, a legislação processual penal quando da matéria correlata - ato infracional - já por permitir a reforma da decisão de primeiro grau pelo próprio juiz

prolator em juízo de retratação, tem o Ministério Público legitimação para requerer a subida dos autos à instância superior, se entender que o reexame no juízo ad quem será benéfico para a criança ou adolescente. As funções da PROCURATURA da Infância e da Juventude serão, no amplo sentido exercidas nos termos da Lei Orgânica do Ministério Público Estadual, como estabelece o Estatuto no seu art. 200, no que repete mandamento constitucional e regra da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, como visto. Do extenso rol de atribuições conferidas no art. 201 do Estatuto, além de outras ao longo do seu texto, afora o ofício geral de que é institucionalmente incumbido em procedimentos judiciais em que não pode deixar de funcionar, sob pena de nulidade dos feitos (ECA, arts. 202, 204), Código de Processo Civil, art. 82, I e leis outras pertinentes, vê-se a amplitude da atividade ministerial em favor da criança e do adolescente. Medidas extrajudiciais, ou de Curadoria administrativa como ante os Conselhos de Direitos da criança e do adolescente e Conselhos Tutelares, interferência nos estabelecimentos escolares e hospitalares, em agências de atendimento à população infanto-juvenil, orientação da opinião pública local sobre o sentido da legislação protetora de que se trata, também são misteres do Ministério Público. A legitimação concorrente para promover ação civil pública em defesa de direitos e interesses coletivos ou difusos de crianças e adolescentes, e direito e interesses individuais indisponíveis de qualquer deles, o inquérito civil público, são tantas outras incumbências ministeriais. A ação civil pública tem cabimento na defesa de interesses coletivos ou difusos, por serem transindividuais, porém, os interesses individuais indiponíveis de qualquer uma criança ou de adolescente isoladamente, por estarem inseridos no contexto do interesse social, constitui em objeto da ação civil pública (ECA, art. 201), afastados da regra geral do Código de Processo Civil art. 6º. A propósito: " Examinando os principais direitos ligados à proteção da infância e da juventude, enumerados pelo art. 227, caput, da Constituição, vemos que a indisponibilidade é sua nota predominante, o que torna o Ministério Público naturalmente legitimado à sua defesa." (HUGO NIGRO MAZZILLI - in - A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUÍZO - 7ª Edição Saraiva - São Paulo, 1995, pag. 528 segs.)

Assim, o MP terá sempre legitimatio ad causam para promover ações previstas no Estatuto, tais como as elencadas no art. 208, dentre outras, pois o parágrafo único desse artigo constitui um norma residual, ou seja, norma de encerramento ou ainda de extensão, como conceituam os hermeneutas. Bem assim em casos previstos no arts. 77 a 82 do ECA, proibições que visam a preservação da integridade física ou moral da criança e do adolescente. Ação de responsabilidade civil por danos materiais e morais sofridos por pessoa menor de 18 anos de idade são também incumbência do Ministério Público em socorro daquela vitima cujo representante tenha negligenciado, ou no caso de inexistir pai, tutor ou guardião em exercício do munus próprio. Sobre dano moral, muito se discutiu a respeito da inaplicabilidade da obrigação de indenizar sob argumento de inadequação da condição do menor à sensibilidade da dor moral. Absurdo que teve muitas adeptos. Hoje a Constituição espancou dúvidas sobre a reparabilidade do dano moral, e a doutrina proclama que a criança e o adolescente podem ser vitimadas pelo malefício de ordem puramente moral, dano esse que deve ser reparado. Veja-se sobre a matéria, ROBERTO SENISE LISBOA - in REVISTA DE INFORMAÇÃO LEGISLATIVA - Senado Federal - nº 118 - Brasília, abr/jun/93, pags. 451, seguintes. Nos crimes praticados por imputáveis contra crianças e adolescentes tipificados no Estatuto (arts. 228 usque 244) as ações penais correspondentes serão de natureza pública incondicionada, portanto, privativas do Ministério Público. Seja o representante do MP junto à Justiça da Infância a da Juventude, se a lei de organização Judiciária permitir, seja o Promotor de Justiça Criminal. O Promotor de Justiça Penal age em nome da sociedade em geral na ação penal pública, seja a vítima pessoa maior ou de menor idade civil, é verdade. Age, entretanto, em defesa do bem jurídico lesado que lhe cabe velar, primordialmente, quando propugna pela exarcebação cominada no Código Penal art. 61, II, h. Ou pela aplicação desse Código nas hipóteses dos arts. 123, 124, 125, 126, 133, 134, 135, 136, 140, 159, 213, 214, 215, 216, 217, 218, 220, 224, 225, 227, 230, 242, 243, 244, 245, 246, 247, 248, 249, e de outros dispositivos da legislação punitiva. Matéria inteiramente nova em nosso sistema jurídico foi introduzida pela Constituição Federal vigente, em seu art. 14 § 1º, II, c, facultando o alistamento eleitoral e o voto aos menores de 18 maiores de 16 anos de idade. Criou o direito político de exercício da soberania popular para os que ela própria, no art. 228 proclamou inimputáveis. Uma incongruência, evidentemente, pois o adolescente teve estabelecida sua capacidade eleitoral ativa, e ao mesmo tempo reconhecida constitucionalmente a sua irresponsabilidade penal. Assim, embora possam tais eleitores escolher livremente os seus mandatários para os cargos legislativos ou executivos do seu País, de Vereador a Presidente da República, não responderão por atos que pratiquem em detrimento da mesma ordem eleitoral, qualquer que seja o mal cometido. Situação paradoxal que exige atenção maior da PROCURATURA. De fato, desde o alistamento cabe o incentivo e a orientação para a inserção do contingente juvenil nos quadros do eleitorado local dentro das normas legais, ensinando-lhes, pedagogicamente mesmo, como proceder corretamente segundo a legislação, evitando o desvirtuamento da chamada cívica dessa larga faixa da nossa população à participação na vida democrática da sociedade civil. Implica isso em desdobramento da vigilância do Promotor de Justiça Eleitoral em face das possibilidades de abusos de adultos inescrupulosos que procurem se locupletar da inexperiência, e até da inimputabilidade

do menor, para ferir a lei e a ordem. Até mesmo o cuidado permanente, para que no azáfama dos trabalhos forenses, tais eleitores não sejam equivocadamente designados para composição de mesas receptoras de votos ou de apuração, mesmo na condição de fiscais ou delegados de partido. O que, aliás, poderá redundar em anulação de eleições, com prejuízo público de muita gravidade.
 

Estraido de http://www.datavenia.inf.br/frame-artig.html