APRENDER A FAZER-SE PRESENTE
A capacidade de fazer-se presente, de forma construtiva,
na realidade
do educando não é, como muitos preferem
pensar, um dom, uma
característica pessoal intransferível
de certos indivíduos, algo de
profundo e incomunicável. Ao contrário,
esta é uma aptidão que
pode ser aprendida, desde que haja, da parte de
quem se propõe a
aprender, disposição interior, abertura,
sensibilidade e compromisso
para tanto. Efetivamente, a presença
não é alguma coisa que se
possa apreender apenas ao nível da pura exterioridade.
Tarefa de alto nível de exigência, essa aprendizagem
requer a
implicação inteira do educador no
ato de educar. Sem esse
envolvimento, o seu estar-junto-do-educando não
passará de um rito
despido de significação mais profunda,
reduzindo-se à mera
obrigação funcional ou a uma fornia
qualquer de tolerância e
condescendência, de modo a coexistir mais
ou menos pacificamente
com os impasses e dificuldades do dia a dia dos
jovens, sem
empenhar-se, de forma realmente efetiva, numa ação
que se
pretenda eficaz.
Por outro lado, é importante salientar que,
situado no polo
direcionador da relação, não
pode o educador a ela entregar-se de
uma forma ilimitada, irrestrita, incondicional e
irrefletida, como
algumas vezes costuma ocorrer. Essa maneira
extrema de
testemunhar solidariedade e compromisso, freqüentemente,
costuma
redundar em conseqüências imprevisíveis
e danosas, seja para o
educador, seja para o educando.
Prática em sua essência limitada, como
afirma Paulo Freire, a
educação só é eficaz
na medida em que reconhece e respeita seus
limites e exercita suas possibilidades.
No caso da relação educador-educando,
esta maneira de entender e
agir implica a adoção de uma estrita
disciplina de contenção e
despojamento, que corresponde, no plano conceitual,
a uma dialética
proximidade-distanciamento.
Pela proximidade o educador se acerca ao máximo
do educando,
procurando identificar-se com a sua problemática
de forma calorosa,
empática e significativa, buscando uma relação
realmente de
qualidade.
Pelo distanciamento, o educador se afasta no plano
da crítica,
buscando, a partir do ponto de vista da totalidade
do processo,
perceber o modo como seus atos se encadeiam na concatenação
dos
acontecimentos que configuram o desenrolar da ação
educativa.
Esta é uma postura que exige de quem educa
uma clara noção do
processo e uma ágil inteligência do
instante, implicando a
necessidade de combinar de forma sensata uma boa
dose de senso
prático com uma apreciável veia teórica.
Diante das manifestações inquietantes do
educando - impulsos
agressivos, revoltas, inibições, intolerância
a qualquer tipo de norma,
apatia, cinismo, alheamento e indiferença
- deve o educador situar-se
num ângulo que lhe permita ver, além
dos aspectos negativos, o
pedido de auxilio de alguém que, de forma
confusa, se procura e se
experimenta em face de um mundo, a seus olhos, cada
vez mais
hostil e ininteligível.
Há que estar atento, porém,
para o uso que, por parte do educando,
pode ser feito, dos "bons sentimentos e das boas
intenções de um
educador insuficientemente familiarizado com situações
deste tipo ou
que se deixou levar demais pelas emoções,
pela dimensão afetiva da
relação. O "jogo" que se estabelece
nesses casos - manipulação,
chantagem afetiva, apego desmesurado, dependência
descabida -
pode por a perder todo o processo se o educador
não se mostrar
capaz de evitar e, quando isto não for possível,
impedir que estas
tendências ganhem corpo na relação.
Fazer-se presença construtiva na vida
de um adolescente em
dificuldade pessoal e social é pois, a primeira
e a mais primordial das
tarefas de um educador que aspire assumir um papel
realmente
emancipador na existência de seus educandos.
Esta, vale salientar, é aptidão
que apenas em parte pode ser
aprendida de forma conceitual. "Saber de experiências
feito", a
presença é uma habilidade que se adquire
fundamentalmente pelo
exercício cotidiano do trabalho social e
educativo. Entretanto, sem
uma base conceitual sólida e articulada,
fica muito mais difícil para o
educador proceder à leitura, à organização
e à apropriação e
domínio plenos do seu aprendizado prático.
CAMINHO DE EMANCIPAÇÃO
Diante de adolescentes com sérios problemas
de conduta, os
educadores seguem, de um modo geral, um dos seguintes
enfoques
básicos:
1.AMPUTAÇÃO, através de abordagens
correcionais e repressivas,
daqueles aspectos da personalidade do educando considerados
nocivos a ele próprio e à sociedade;
2.REPOSIÇÃO, através de práticas
assistencialistas, quanto aos
aspectos materiais, e paternalistas, no que se refere
ao lado
emocional, do que lhe foi sonegado nas fases anteriores
de sua
existência;
3.AQUISIÇÃO, pelo próprio educando,
através de uma abordagem
auto-compreensiva, orientada para a valorização
e fortalecimento dos
aspectos positivos de sua personalidade, do auto-conceito,
da
auto-estima e da auto-confiança necessários
à superação das suas
dificuldades.
O primeiro enfoque (amputação), historicamente,
mostrou-se capaz de
produzir dois tipos de pessoas: os rebeldes e os
submissos. Os
rebeldes adotam um padrão de conduta violentamente
reativo no seu
relacionamento consigo mesmo e com os outros, o
que, geralmente,
os leva a se inviabilizarem como pessoas e como
cidadãos. Já os
submissos se despersonalizam , tornam-se frágeis,
vulneráveis,
inseguros, afeitos a serem manipulados e totalmente
incapazes de
assumirem o próprio destino.
O segundo enfoque (reposição) baseado
nas privações e carências
encontráveis na vida desses jovens, procura
vê-los pelo ângulo do
que eles não são, do que eles não
trazem, do que eles não têm, do
que eles não são capazes. A
tentativa de suprir de forma mecânica,
via programas institucionais, essas carências,
tem resultado
geralmente na produção de grande número
de jovens dependentes,
propensos a se tornarem recorrentes crônicos
de aparato assistencial
do Estado ou das organizações não-governamentais.
O terceiro enfoque (aquisição)
procura partir do que o adolescente é,
do que ele sabe, do que ele se mostra capaz e, a
partir dessa base,
busca criar espaços estruturados a partir
dos quais o educando possa
ir empreendendo, ele próprio, a construção
do seu ser em termos
pessoais e sociais. Esta linha de atuação
está presente, em maior ou
menor medida, nas poucas experiências bem
sucedidas no Brasil
voltadas para adolescentes com problemas mais sérios.
Por esta via,
muitos jovens têm recobrado a confiança
em si mesmos e se
descoberto capazes de lutar e progredir juntamente
com os outros.
Trata-se, como se vê, de uma proposta de educação
emancipadora.
A Pedagogia da Presença, enquanto teoria
que implica os fins e os
meios desta modalidade de ação educativa,
se propõe a viabilizar
este paradigma emancipador, através de uma
correta articulação do
seu ferramental teórico com propostas concretas
de organização das
atividades práticas.
A orientação básica desta pedagogia é
resgatar o que há de positivo
na conduta dos jovens em dificuldade, sem rotulá-los
nem
classificá-los em categorias baseadas apenas
nas suas deficiências.
Sem ignorar as exigências e necessidades
da ordem social, o
educador somente não aceita a perspectiva
de que sua função venha
a ser apenas adaptar o jovem a isso que aí
está. Ele vai mais longe.
Ele quer abrir espaços que permitam ao adolescente
tomar-se fonte
de iniciativa, de liberdade e de compromisso consigo
mesmo e com
os outros, integrando de forma positiva as manifestações
desencontradas de seu querer-ser.
AO ENCONTRO DE SI MESMO
Aquisições utilitárias,
como aprendizado de um trabalho rentável,
socialmente útil e boas maneiras, que tomem
o educando um cidadão
produtivo e bem aceito, são preocupações
das quais nenhum
educador sério poderá abrir mão.
Tais aquisições viabilizam o jovem
no mundo em que ele é chamado a viver.
Porém, o educador, que se dirige ao
educando na perspectiva da
pedagogia da presença, verá que uma
outra ordem de exigências
antecede e dá suporte a estas preocupações.
Ele já observou que
muitos deste jovens vivem "amarrados por dentro",
encerrados em um
universo tenso, reduzido e espesso. Eles freqüentemente
anulam
iniciativas e esforços realizados em seu
favor. Agem como se os
problemas que tentamos resolver com eles não
fossem realmente os
seus verdadeiros problemas.
Onde poderemos situar a raiz deste desencontro?
Do ponto de vista
da Pedagogia da Presença, esta desarticulação
entre necessidades e
ofertas vem do fato de que, enquanto os educadores
oferecem aos
adolescentes meios para moderar-se e viabilizar-se,
eles buscam
prioritariamente as vias que lhes permitirão
encontrar-se.
Explorar a sua situação, compreendê-la
e agir de forma construtiva
em relação a ela, a partir de confrontos
progressivamente maduros
com a sua realidade, é tarefa que, na ordem
de importância,
antecede a todas as demais. Sua realização
é que permite ao
educando superar o isolamento e a solidão.
Vista a situação por este
ângulo, os aspectos sociais subordinam-se
à perspectiva do
equacionamento da problemática pessoal do
jovem a quem
dirigirmos nosso trabalho.
A Pedagogia da Presença é parte
de um esforço coletivo na direção
de um conceito e de uma prática menos irreais
e mais humanos de
educação de adolescentes em dificuldades.
Contribuir para o resgate da parcela mais
degradada, em termos
pessoais e sociais, de nossa juventude é,
sem dúvida alguma -
embora apenas um número reduzido de pessoas
realmente acredite
nisto - uma das grandes tarefas do nosso tempo.
O ADULTO NO MUNDO DOS ADOLESCENTES
A presença dos adultos no mundo dos jovens
em dificuldade pessoal
e social não deve ser, como é corrente
entre nós, intervencionista e
limitada. O estar-junto-do-educando é
um ato que envolve
consentimento, reciprocidade e respeito mútuo.
O adolescente espera do educador algo mais do que
um serviço
eficiente, em que as tarefas claramente definidas,
se integrem num
conjunto coordenado, tecnicamente preparado.
As tarefas que o
educador executa, na divisão de trabalho
da equipe, representam
apenas o seu campo de ação, mas não
a principal razão da sua
presença junto ao educando. Esta razão
maior será sempre a
libertação do jovem, uma exigência
que se situa sempre além de
todas as rotinas, embora não deixe de passar
por elas.
É por esta transcendência dos aspectos
rotineiros do programa
sócio-educativo que o adolescente percebe
que, mesmo feita de
privações e sofrimentos, a vida é
alguma coisa pela qual vale a pena
lutar, e que é preciso reconciliar-se com
ela a partir do encontro com
outras vidas.
É através de pequenos nadas que aquele
educando arredio manifesta
um desejo de aproximação. Um outro
ocupa um tempo considerável
do educador com um problema insignificante. Esta
é a sua maneira
de exprimir a confiança que começa
a nascer-lhe em relação àquele
adulto. Não é um conselho o que ele
procura agora, mas
reciprocidade, simpatia, amizade. O momento
da orientação virá
depois. Um "bom dia", um "vai com Deus", um
"boa noite", um
sorriso, um olhar cúmplice do educando são
sinais velados que
indicam ao educador o avanço do seu trabalho.
Em cada incidente, em cada circunstância,
a tarefa essencial e
permanente do educador será sempre comunicar
ao jovem elementos
capazes de demitir-lhe compreender-se e aceitar-se
e compreender e
aceitar os demais. Assim, de maneira quase imperceptível,
ele vai
ultrapassando os obstáculos que se interpõem
ao seu querer-ser. A
sua segurança cresce, à medida em
que ele vai se sentindo capaz de
definir para si mesmo o caminho a seguir e o comportamento
a
adotar para a realização daquilo que
pretende.
A esta altura, o educador começa a tomar
consciência de que não
existe nenhum método ou técnica inteiramente
eficaz e satisfatório,
capaz de ser aplicado com sucesso a todos os casos.
As dificuldades
a serem enfrentadas parecem não ter fronteiras
muito precisas. Às
vezes elas esbarram no regulamento e estruturação
do programa
sócio-educativo, outras vezes elas entram
em colisão com o sistema
político-institucional e a legislação
vigente; há também aquelas
dificuldades cuja superação põem
em causa a própria maneira como
está estruturada nossa sociedade.
Por vezes o educador se interroga sobre o sentido de seus
esforços.
Sente que, para que uma solução orgânica
e conseqüente para o
conjunto desses jovens fosse encontrada, seria necessário
reanimar
milhares de consciências adormecidas, sensibilizar
a sociedade no
seu todo e chamar à responsabilidade os que
têm nas mãos o poder
de decidir para que se pudesse romper, de forma
radical, com a
incompetência, a organização
irracional, o interesse mal formulado e
a legislação inadequada.
Este tipo de questionamento leva o educador a perceber
que a sua
atuação não é apenas
trabalho, ela é, também e fundamentalmente,
luta. A Pedagogia da Presença implica
de forma ampla a sua
existência. Ela convoca para a ação
a pessoa humana, o educador e
o cidadão. E é nesta última
condição, que cabe ao educador
empenhar-se também no sentido daquelas mudanças
amplas e
profundas, tendo como horizonte de seus esforços
a história de seu
povo.
A consciência do educador abre-se, deste modo,
a um amplo espectro
de problemas. Além de ter uma compreensão
das grandes questões
da sociedade, ele deve ser basicamente capaz de
compreender,
aceitar e lidar com comportamentos que expressam
aquilo que há de
íntimo e oculto na vida de um jovem em situação
de dificuldade
pessoal e social. Este jovem, seu educando,
é destinatário e credor
daquilo de melhor que, em cada momento do seu relacionamento,
ele for capaz de transmitir-lhe.
CONHECER O PROCESSO
A pedagogia moderna, em todas as suas modalidades,
começa por
uma abertura e integração dos dados
que lhe chegam através da
psicologia, da sociologia, da antropologia, da psicologia
social, das
ciências médicas e do direito.
Já passou o tempo em que se podia
negar a importância de uma boa cultura científica
para atuar neste
domínio.
É falso que a prática por si só
confira ao educador os elementos
necessários ao pleno domínio do seu
ofício. Sem a teoria, a prática
será sempre limitada. Quem negligencia
o estudo, quando possui
meios de realizá-lo, é um pretensioso
ou um inconsciente da
importância real do seu trabalho. Afirmar
isto, no entanto, não
implica negar que Só a experiência
é capaz de integrar e de validar
aquilo que foi estudado, na medida em que tudo passa
pelo crivo da
eficácia na ação.
Mais importante do que cabeças cheias
de informações, é a aquisição
pelo educador de atitudes e habilidades que favoreçam
e viabilizem
sua atuação junto ao educando.
A atitude científica diante de um adolescente em dificuldade
não é
caracterizar o seu problema ou inadaptação
e rotulá-lo desta ou
daquela maneira: deficiente, epilético, hiperativo,
infrator,
irresidente, abandonado, carente etc. Estes
são aspectos
encontráveis em milhares de outras pessoas.
Há que captar o
específico, o aspecto individualizado daquele
caso. Um problema,
por mais grave que seja, nunca é o todo de
um ser humano. Haverá
sempre, além da dificuldade específica,
outras dimensões a serem
trabalhadas.
É uma obrigação do educador
adquirir uma informação correta sobre
os diversos tipos de dificuldades que afetam os
jovens e, quando
sentir que é necessário, deve encaminhá-los
para tratamentos
específicos nos âmbitos da medicina,
da psicologia ou até mesmo da
psiquiatria.
Nenhuma providência deste tipo, no entanto, o liberará
do dever de
tentar uma aproximação mais concreta
com o adolescente, afim de
ver nele o que há de mais pessoal e que não
é o seu problema, antes,
poderá ser a base sobre a qual se assenta
a busca de uma solução
para suas dificuldades.
Neste momento é preciso compreender o educando
considerado em
si mesmo, e não em relação
às normas e padrões que tenha,
porventura, transgredido. Situá-lo
numa história singular, única, que
é a sua, para, então, retirá-lo
do rótulo, da categoria que ameaçava
aprisioná-lo.
A observação atenta e metódica
dos comportamentos que lhe são
próprios tentará conhecer, entre os
ganhos e perdas de sua vida,
aquilo a que o educando dá mais importância,
atenção, valor. Enfim,
será necessário descobrir nesse adolescente
aptidões e capacidade
que apenas um balanço criterioso e sensível
permitirá despertar e
desenvolver. Só assim, ele encontrará
o caminho para si mesmo e
para os outros. E este é o sentido
e o objetivo maior da presença
construtiva e emancipadora do educador na vida do
educando.
Existir, para o adolescente, não é
um problema metafísico, é dispor
de alguns bens materiais e não-materiais
essenciais. O primeiro
deles é ter valor para alguém, ser
acompanhado, aceito, estimado
num universo que lhe é particular, onde possa
desenvolver as
capacidades ainda não, ou insuficientemente,
manifestas de sua
pessoa.
O pão, mesmo abundante, é amargo para
quem o come na solidão ou
no anonimato coletivo de um atendimento massivo
e embrutecedor.
O preceito evangélico "Nem só de pão
vive o homem" assume aqui
um valor humano de relevância e concretude
irrefutáveis, é através
de presenças humanas solidárias e
atentas ao seu redor, que o
adolescente em dificuldade recebe a prova, para
si mesmo, do seu
valor e da sua unidade.
A consciência de estar no mundo já
é, então, consciência, de
aceitação, de acolhimento, de pertinência,
de integração, de
aconchego. Viver, assim, é estar junto.
Os laços que se desenvolvem Só são
verdadeiros, contribuindo
construtivamente para o existir, quando são
fruto de um dar e de um
receber, de um liberar e de um restringir acolhidos
livremente.
ADOLESCÊNCIA
E SOLIDÃO
Na origem das condições que encaminham
numerosos jovens para a
associalização e a delinqüência
encontramos um sentimento de
abandono, de (des)vinculação, de (des)encontro,
de solidão, de
isolamento, de (in)comunicabilidade.
Cada adolescente em dificuldade, à sua maneira,
tenta (I) dissimular,
(II) compensar, (III) protestar. As manifestações
variam, mas estas três
fases do processo são possíveis de
serem detectadas pelo observador
atento. Vejamos:
-a primeira fase visa reter a presença que
escapa. É caracterizada por
exigências cabíveis e descabíveis,
tentativas de selar compromissos
de toda sorte, esforços de aproximação,
apelos, ofertas discretas ou
desajeitadas, que testemunham uma profunda inquietação;
-a segunda, quando a perda parece consumada, o adolescente em
dificuldade alimenta-se dos sentimentos engendrados
pela
privação:ruminações
obscuras, rejeição do meio, dissimulações
presentes na edificação de um universo
fechado, base de uma
segurança enganadora onde são elaborados
simulacros e
compensações de todo tipo;
-a terceira fase é o momento em que o jovem procura outras
presenças, indo ao encontro dos que, de preferência,
são vítimas do
mesmo sofrimento, da mesma solidão.
Encontra-os sempre
aglutinados, enfeudados, trancados num grupo fechado
e isolado dos
demais. Movido por impulsos que emergem de
sua natureza
profunda, o jovem lança-se à procura
dos bens perdidos, uma busca
desorientada, errática, que ignora as leis
e convenções morais que já
pouco ou nada lhe dizem. A transgressão
da lei, contudo, aciona os
mecanismos de controle e defesa social, cujas reações
(apreensão,
maltrato, segregação) vêem somar-se
ao sofrimento de um passado
cujos tormentos, longe de serem resolvidos, apossam-se
do seu
presente e o infernizam cada vez mais.
Quando se chega a este ponto, temos a prova de que
a vida foi
perturbada, não em planos superficiais, mas
profundos. É então que
geralmente o educador é chamado, a intervir.
Ele sabe que é neste
momento que, da sua capacidade de fazer-se presente
na vida do
educando, dependerá tudo o mais.
A palavra presença, embora não seja
de uso freqüente no domínio da
pedagogia, apresenta um conteúdo relacional
que faz dela a mais
exigente das realidades. Após inteirar-se
do passado e das condições
de vida e luta pela sobrevivência de numerosos
adolescentes em
dificuldade, é possível constatar
que a maioria não vivenciou (ignora)
ou vivenciou de forma muito precária o continente
estável e fiel de
um afeto cotidiano, ou seja, não teve acesso
aos bens da presença.
Está longe de sua experiência a consciência
de que sua vida tem
valor para alguém, faz alguém feliz.
O educador, orientado pela consciência dessa
realidade, lerá a
peripécia pessoal e social do adolescente
em dificuldade com outros
olhos. Descobrirá, sob os impulsos
anárquicos e contraditórios que
parecem caracterizá-lo, uma imensa vontade
de ser aceito, de viver e
de se libertar. As dificuldades de uma vida
assim ameaçadas
reclamam a urgente necessidade de uma Pedagogia
da Presença.
MUITO
ALÉM DA ADAPTAÇÃO
Os programas sócio-educativos dirigidos a
jovens em situação de
especial dificuldade ainda não sabem, em
sua grande maioria, tirar
proveito pleno das possibilidades da presença,
embora alguns lhe
concedam um certo valor, considerando-a como um
recurso a mais no
enfrentamento dos casos que comportam maior desafio.
São raríssimas as situações
em que a perspectiva da presença é
chamada a intervir como o primeiro elemento da dinâmica
do
atendimento.
A norma geral é a adoção de
uma conduta meramente repositiva das
necessidades e carências materiais e não-materiais
do educando.
Este caminho, estamos cada vez mais conscientes,
é uma segura
maneira de perder de vista o objetivo fundamental
do processo
educativo.
Sobre a palavra socialização pesa,
hoje, um grave equívoco.
Geralmente entende-se por este termo uma perfeita
identidade entre
os hábitos de uma pessoa e as leis e normas
que presidem o
funcionamento da sociedade. Uma adesão
prática à sua dinâmica,
uma submissão ao seu ritmo, uma incorporação
plena de seus
valores. Uma adaptação total,
enfim.
O comportamento ajustado, nesta visão, é
a única coisa que
realmente importa. Daí se deduz que
o essencial foi conseguido
quando o jovem já se mostra capaz de atuar
no ambiente em que é
chamado a viver sem causar nenhum dano apreciável
ao corpo
social.
Nesta perspectiva, como se percebe, a sociedade
impõe-se como a
primeira e a principal favorecida. O educando,
considerado em si
mesmo, é de certo modo indiferente se o objetivo
principal foi
alcançado: a cessação dos atos
delituosos e das condutas
perturbadoras da convivência coletiva.
Espera-se do jovem em dificuldade que ele se integre
no corpo social
como elemento produtivo e ordeiro, sem suscitar
qualquer forma de
reprovação do meio. A esta altura,
então, diz-se que o educando foi
"socializado". Na perspectiva de uma pedagogia
crítica, no entanto,
esta não é a verdadeira socialização,
a qual situa muito além desta
adesão rudimentar à ordem estabelecida.
Segundo o enfoque da
Pedagogia da Presença, está socializado
o jovem que dá importância
a cada membro da sua comunidade e a todos os homens,
respeitando-os na sua pessoa, nos seus direitos,
nos seus bens. Ele
agirá assim, não apenas por uma lei
promulgada ou por medo de
sanções, mas por uma ética
pessoal que determina o outro como
valor em relação a si próprio.
Este jovem saberá, então, aceitar
o peso inevitável que as outras
pessoas do seu mundo farão recair sobre si.
Moderará seus impulsos
de sensibilidade e de orgulho, será capaz
de julgar os aspectos
positivos e negativos da sociedade de que é
membro. Reconhecerá
os desvios que desfiguram a convivência coletiva
e se empenhará,
apesar das dificuldades, na realização
de seus legítimos interesses
pessoais e sociais.
Ele terá ainda a liberdade (o direito) de
exprimir, quando isto
corresponder à sua vontade e ao seu entendimento,
a indignação
salutar que induz à denúncia e ao
combate da injustiça e da
opressão, que povoam a vida dos homens numa
sociedade como a
nossa. A verdadeira socialização,
portanto, não é uma aceitação
dócil, um compromisso sem exigências,
ou uma assimilação sem
grandeza. Ela é uma possibilidade humana
que se desenvolve na
direção da pessoa equilibrada e do
cidadão pleno.
É certo que a socialização, entendida
como uma adaptação prática à
vida social, é sempre algo desejável
e francamente necessário, mas,
os seus fundamentos serão sempre frágeis
se ela não for capaz de
ultrapassar este conceito e de abrir-se para a pessoa
do educando em
toda a sua complexidade, e inteireza.
A CONTRADIÇÃO ENTRE A MISSÃO
E OS MEIOS
Quando somente tentamos repor para o adolescente
em dificuldade
os bens materiais e não-materiais de que
estava privado - casa,
comida, roupa, remédio, ensino formal, profissionalização,
esporte,
lazer e atividades culturais - estamos incidindo
apenas na superfície
do problema, sem alcançar as dimensões
mais profundas e mais
determinantes de sua atitude básica diante
da vida.
A intervenção específica
do educador, no que se refere aos impasses
e dificuldades existenciais do educando, baseia-se
numa relação
pessoal positiva que o leve a encontrar o caminho
que o retorne a si
mesmo e aos outros.
De início, é freqüente
que o educador depare com a porta fechada ou
aberta apenas para os contactos estereotipados e
formais das pessoas
que não tem nada a dizer uma à outra
Será necessário ultrapassar os
contactos superficiais e efêmeros e as intervenções
técnicas
puramente objetivas. Só a presença
poderá romper seu isolamento
profundo sem violar seu universo pessoal.
O sistema de atendimento,
entretanto, não foi pensado nem estruturado
para satisfazer esta
ordem de exigências. A evolução
histérica da educação dos jovens
em dificuldade em nosso país, nesta perspectiva,
ilustra bem este
descaminho:
-Numa primeira etapa o atendimento caracterizou-se
por uma
desconfiança "a priori" em face do educando
e as intervenções do
tipo correcional-repressivo prevaleceram durante
muito tempo. O
SAM (Serviço de Assistência ao Menor),
ligado ao Ministério da
Justiça, foi sucedido pela FUNABEM (Fundação
Nacional do Bem-estar
do Menor), que passou a adotar um novo enfoque.
Essas práticas,
contudo, ainda não se encontram ultrapassadas
quanto se pensa.
Seus reflexos prolongaram-se no tempo e acabaram
por minar os
esforços de modernização, terminando
por sobrepor-se a eles,
principalmente no que se refere aos adolescentes
a quem se atribua a
autoria de ato infracional;
-Na segunda etapa desta evolução,
a visão do adolescente em
dificuldade como elemento hostil e ameaçador
(enfoque
criminológico da periculosidade) foi substituída
pelo enfoque da
privação, da carência.
A adoção dessa perspectiva levou à
implantação das equipes interdisciplinares
e da ampliação e
diversificação do espectro de atendimento,
que passou a cobrir um
número maior de necessidades dos destinatários
dos programas
sócio-educativos para adolescentes em dificuldades,
melhorando as
condições técnicas e materiais
das unidades de atendimento. A
verdade, porém, é que este modelo
nunca chegou a vigir de forma
completa. As pessoas, os prédios e
a cultura organizacional do
passado fizeram dele uma realidade superposta às
maneiras de
entender e agir herdadas da fase correcional repressiva;
-A terceira etapa desta conturbada e sofrida trajetória
vê o atual
sistema como uma massa falida em todos os níveis
e aspectos. O
panorama legal revelou-se inadequado e propiciador
de situações as
mais desumanas e arbitrárias. O ordenamento
político-institucional
da área mostrou-se, nos últimos vinte
e cinco anos, parte do "entulho
autoritário" que a sociedade brasileira hoje
se vê chamada a
desmontar, no esforço de saneamento e de
reconstrução democrática
da vida nacional. E, no que se refere àquilo
que mais imediatamente
nos diz respeito neste momento, as formas de atenção
direta ao
adolescente em dificuldade com problemas de conduta,
assumiram
contornos de ineficácia e de degradação
tão evidentes que o seu
descrédito perante os destinatários
e a sociedade como um todo
tomou-se uma realidade praticamente impossível
de ser revertida sem
a desconstrução total do sistema.
Por tudo isto sustentarmos que um ataque orgânico
e conseqüente a
esta questão passa por um sistemático
esforço de transformação
profunda do quadro atual. Este esforço
deve desdobrar-se em três
frentes básicas de atuação:
a) Mudanças profundas no panorama legal;
b) Um corajoso e amplo reordenamento institucional;
c) Uma efetiva melhoria das formas de atenção direta
aos
adolescentes em dificuldade.
Esta Pedagogia da Presença é parte
do esforço que se vem
desenvolvendo na terceira frente. Contudo,
ela só poderá produzir
respostas mais efetivas e plenas na medida em que
ocorrem
mudanças mais amplas. Mesmo assim,
não poderemos cruzar os
braços. Faz-se necessário, como
diz Paulo Freire "fazer hoje o
possível de hoje, para fazer amanhã
o impossível de hoje".
RECIPROCIDADE: A DIMENSÃO ESSENCIAL
DA
PRESENÇA
Mesmo reconhecendo e explicitando as imensas dificuldades
que se
manifestam na moldura legal e político-institucional
da educação de
jovens em dificuldade pessoal e social no Brasil
de nossos dias, não
podemos deixar de reafirmar aqui, como temos feito
em praticamente
todos os tópicos, a exigência essencial
de que relação
educador-educando seja uma relação
significativa, uma relação de
qualidade. Sem isto, todos os recursos investidos
e os esforços
desenvolvidos, ou não alcançarão
resultado, ou atingirão apenas,
como geralmente tem ocorrido entre nós, resultados
inexpressivos,
precários e frágeis.
A verdade da relação educador-educando,
do ponto de vista da
Pedagogia da Presença, baseia-se na reciprocidade.
A reciprocidade
entendida como a interação na qual
duas presenças se revelam
mutuamente, aceitando-se e comunicando uma à
outra, uma nova
consistência, um novo conteúdo, uma
nova força. Sem que para isso
a originalidade inerente a cada uma seja minimamente
posta em
causa.
A reciprocidade é quase sempre o fator que
explica aqueles sucessos
que surgem inesperadamente, quando todas as esperanças
razoáveis
já foram por terra. Atrás desses
resultados, aparece sempre uma
pessoa-chave, que conseguiu manter com o jovem em
dificuldade
uma relação pessoal que se mostrou
capaz de restituir-lhe um valor
no qual ele próprio já não
acreditava. Alguém compreendeu e
acolheu suas vivências, sentimentos e aspirações,
filtrou-os a partir de
sua própria experiência e comunicou-lhe
com clareza, a
solidariedade e a força para agir.
Muitos pretendem ver nos educadores que conseguem
isso
individualidades raras, pessoas excepcionais, dotadas
de dons muito
especiais e, por isso mesmo, inimitáveis.
É mais realista, entretanto,
encará-las como pessoas comuns nas quais
certas qualidades não
excepcionais se encontram favoravelmente conjugadas
e
suficientemente desenvolvidas.
Atribuir os resultados excepcionais a seres excepcionais,
a seres
privilegiados é, no fundo, demitir-se da
possibilidade de obter de si
mesmo e de outros desempenho semelhante.
A presença aberta e solidária do educador
junto ao educando será
efetiva e estará em conformidade com o papel
que dela se espera, na
medida em que de si nasça a reciprocidade
que vem da sua
aceitação inicial por parte do educando:
dos convites - claramente
expressos ou não - que ele emite na direção
do educador, assim
como da ampliação e do aprofundamento
do contato e das respostas
que, ao longo do processo, o jovem for emitindo.
Só a reciprocidade
garante o valor da presença e respeita a
liberdade do outro.
O próprio educador se modifica no curso dessa
relação. Já não põe
em prática idéias preconcebidas.
Tenta controlar e criticar os meios
de que se utiliza. Entra num ciclo de invenção
e de vida, buscando
alcançar em cada educando o que ele tem de
único e de essencial. A
sua ação ganha em profundidade.
Os conhecimentos que adquiriu
são uma luz que ilumina a leitura incessante
que ele faz do conjunto
do que acontece à sua volta. Sua capacidade
de entendimento
aumentou e suas intervenções práticas
se tornaram mais tranqüilas e
seguras.
O âmago da relação entre duas
pessoas, onde uma se inclina para a
outra, onde uma ocupa o seu espaço na vida
da outra, constitui um
tipo de reciprocidade.
Outro tipo de reciprocidade é operado pela
própria pessoa na sua
relação consigo mesma. Trata-se
da aquisição do auto-domínio,
através das suas virtualidades físicas,
intelectuais e afetivas. O
educando é constantemente chamado a ultrapassar-se
a si próprio.
De início, esta experiência é
vivida sem uma adesão específica,
depois, ela se torna uma fonte de gratificação.
Esta conquista implica
no amor a si mesmo. A conseqüência
é uma interioridade, fruto de
esforços orientados para o que nele nasce
e o transforma sem que a
sua identidade se perca.
O terceiro tipo de reciprocidade liga-se de forma
estreita às duas
primeiras. É o momento em que o educando
sente-se chamado a
fundir seu dinamismo de base em atitudes socializadas,
adaptadas às
conveniências de contextos humanos mais amplos
(família, escola,
comunidade, trabalho), mas que guardam correspondência
com seu
próprio movimento de auto-edificação.
A simpatia é a resultante mais
elevada dessa dimensão da reciprocidade.
A simpatia de um grupo
humano representa, para quem é por ela contemplado,
o sinal de que
o valor que lhe é próprio foi reconhecido.
É uma forma de
homenagem prestada pessoa. Quando esta dimensão
não existe ou
foi excluída da vida de alguém, provoca
sempre uma amarga
decepção. É difícil
para alguém suportar uma indiferença pela qual
lhe façam sentir que a sua vida não
representa nada.
É extremamente importante para o adolescente em
dificuldade que
essa simpatia, unia vez desencadeada, tenha continuidade.
Ele
contribuirá também à sua maneira
para que isto ocorra, ao mesmo
tempo emerge de si mesmo e vai se libertando de
suas duvidas.
Considerar os adolescentes em dificuldade como universos
fechados
e justapostos, negligenciando os laços que
os organizam corno
pessoas, seria como conceber o meio social na base
de simples
relações de coexistência que
bastaria moderar, ou seja, fazer da vida
social um agregado de solidões.
A RELAÇÃO
EDUCADOR-EDUCANDO:
ALGUNS OBSTÁCULOS DE BASE
Quando se considera a importância da presença
do educador para o
adolescente em dificuldade, tornamo-nos sensíveis
a certas
deficiências das pessoas e instituições,
sobre as quais vale a pena
chamar a atenção:
a)O trabalho educativo preocupado apenas em readaptar
o
adolescente em dificuldade tende sempre a ignorar
o estado de
solidão e abandono a que ele foi relegado
antes de a sociedade
preocupar-se com ele pela manifestação
de condutas não aceitas.
Insistir de forma continuada e renitente em chamar
a atenção do
jovem para a gravidade social dos seus atos é
um expediente que,
além de inútil, frequentemente contribui
para o fracasso da ação
educativa. O educando centraliza-se todo no
mal de que sofre e
procura prioritariamente qualquer coisa que possa
trazer-lhe um
pouco de alívio e satisfação.
b)Algumas vezes O jovem em dificuldade apercebe-se de
que não
ocupa um lugar importante nas preocupações
de seu educador. Que
possibilidade teria de comunicar-lhe o que lhe está
atormentando?
Quando esta situação se prolonga,
o que ocorre é o afastamento e a
incompatibilidade entre o educador e o educando,
gerando uma
barreira difícil de transpor.
c)As intervenções disciplinares mal
conduzidas constituem outro
problema da maior gravidade. Há erros
que não implicam uma
sanção. Quando a utilidade da
sanção é evidente, ela deve ser
levada a efeito de tal modo que os sentimentos íntimos
do atingido
não sejam lesados. As sanções,
que surgem do desejo de dominar o
rebelde ou de servir de exemplo para os demais,
são particularmente
condenáveis. O educador deve ser exigente.
Não deve nunca,
porém, colocar a exigência antes da
compreensão.
d)A administração de alguns programas
sócío-educativos oficiais é
outra fonte de problemas muito graves. O atendimento
burocrático ao
adolescente em dificuldade faz com que ele se sinta
como um papel,
tramitando de repartição em repartição,
de forma impessoal e
descuidada. Este comportamento reforça
o caráter abstrato da
relação educativa e destrói
no jovem qualquer esperança de atenção,
de solicitude, de acolhimento qual ele pudesse ter
sido portador ao
chegar ali.
e)Certas concepções da sua função
impedem o educador de assumir
o papel fundamental que dele se espera na vida do
educando:
ajudá-lo a encontrar-se a si mesmo e aos
outros. Qualquer idéia
demasiado abstrata e formal de seu papel tende a
desmoronar-se
diante dos fatos do dia a dia. A prática
está a exigir a todo instante
iniciativas enriquecidas e aperfeiçoadas
por fatores os mais
imprevisíveis.
Quando o educador está alerta para estes
problemas, ele se previne
contra estas formas de alienação que
ameaçam o seu esforço junto
ao jovem em dificuldade.
A resistência por parte do educador a certas
maneiras de entender e
agir, entranhadas na rotina institucional, é
frequentemente salutar ao
processo educativo. Nascida, às vezes,
apenas da intuição de que
não é por aí o caminho, essa
resistência interior pressiona no sentido
da criatividade, da invenção e da
mudança de qualidade do processo.
A AUTORIDADE NA PEDAGOGIA DA PRESENÇA
O adolescente em dificuldade inclina-se para aqueles
relacionamentos que não lhe peçam
contas daquilo que ele é, não
mostram ressentimento por aquilo que parece ser
e nem lhe tentam
impor aquilo que ele deveria ser. Ele aspira
a uma relação
verdadeiramente humana e não uma forma de
coexistência com um
grupo de pessoas e com um regulamento.
Infelizmente, é esta segunda hipótese a
que se materializa com mais
freqüência no trabalho daqueles programas
dirigidos aos jovens mais
difíceis. Os educadores, através
de recompensas e sanções,
conseguem evitar certas manifestações
consideradas negativas da
parte da maioria dos educandos atendidos.
Este verniz, no entanto,
cai facilmente quando a equipe não consegue
produzir e alimentar,
nos contactos pessoais e na ambiência que
resulta do conjunto das
relações, um nível de calor
humano capaz de propiciar um clima
favorável à aceitação
e ao acolhimento mútuos.
Muitos educadores entendem que, encaradas desta
maneira, as
relações se tomam, de fato, um convite
ao abandono das regras de
convivência na comunidade educativa.
Esta dúvida não tem razão de
existir. Na verdade, essa introdução
da reciprocidade nas relações
educador-educando é que se torna o fator
capaz de levar o jovem a
integrar normas e autoridade, revestindo a relação
educativa de seu
verdadeiro significado.
O educador deve criar no cotidiano do trabalho dirigido
ao jovem em
dificuldade, oportunidades concretas, acontecimentos
estruturadores
que evidenciem a importância das normas e
limites para o bem de
cada um e de todos. SÓ assim, o jovem
começa a comprometer-se
consigo e com os outros. É deste compromisso
que nascem as
vivências generosas e o calor humano, bases
do dinamismo capaz de
enriquecer e de transformar sua vida.
Os acontecimentos estruturadores são aquelas
atividades que se
mostram capazes de, na seqüência de uma
preparação psicológica
concreta, levar o educando a assumir compromissos
desinteressados
e renúncias consentidas no bem de interesses
e objetivos que não são
mais estritamente seus, mas de outra pessoa ou do
grupo onde ele se
insere.
Esta libertação não ocorre de maneira
súbita, rápida e irreversível. O
processo, além de lento, de um modo geral,
comporta idas e vindas,
podendo, em certos casos, persistir por muito tempo,
variando
naturalmente de um jovem para outro.
Essa invenção pelo educador de situações
concretas, através das
quais o adolescente em dificuldade parte ao encontro
e à descoberta
dos outros, levam-no a adquirir a solidez necessária
para tolerar as
frustrações e buscar as gratificações,
realidades sempre entrelaçadas
na unidade dinâmica da vida.
É para a construção e direcionamento
destas oportunidades
educativas que o educador é chamado a assumir-se
na dimensão da
autoridade. Uma autoridade que só tem
sentido na medida em que
se coloca a serviço da emancipação
do educando.
O seu papel não é, de forma alguma,
distanciar o educador do
adolescente, impondo-lhe uma atitude receosa, submissa
e
reverencial. Ao contrário, a autoridade
do educador é chamada não
só a delimitar a conduta do educando, naquilo
em que ela tem de
ameaçador, para si e para os outros, como
também de impulsioná-lo
na direção de outras fornias de convivência
consigo mesmo e com as
demais pessoas.
Não podemos ter ilusões. Muitos
educandos consideram os
educadores representantes da sociedade que eles,
consciente ou
inconscientemente, responsabilizam pelo seu sofrimento.
Para esses,
todas as outras violências que sofreram têm
seqüência por intermédio
do educador que empenha em levá-lo a aceitar
algumas regras
básicas de convivência. Regras
de um mundo que ele ainda não
reconhece como seu.
A única maneira de enfrentar essa dura realidade
é assegurar aos
educandos o direito de participar na elaboração,
discussão e revisão
das normas, de maneira que elas tenham neles próprios
a sua origem
e a sua finalidade. Tentar impor-lhes normas
"de fora e do alto",
pretendendo com elas orientar seus passos,
será sempre uma atitude recebida com
indiferença ou hostilidade. É como
tentar fazer a felicidade das
pessoas contra sua vontade.
Muitas vezes, o educador é enganado
pelas suas intenções mais
corretas. Facilmente conferimos a estas intenções
um valor próprio,
independente das situações e dos condicionamentos,
no seio dos
quais elas devem se expressar. Por isso, um
realismo sadio haverá
sempre de levar o educador a procurar, primeiramente
em si mesmo
a causa das suas dificuldades, antes de atribuí-Ias
à instituição, às leis
e, em última análise, à própria
estrutura da sociedade. Pois é certo
que, em todos estes níveis, as causas existem
e serão encontradas.
A verdadeira autoridade nasce menos do conhecimento
que se tem
do educando e de suas dificuldades, que da capacidade
do educador
de (re)conhecê-lo e aceitá-lo.
Quem conquistou esta autoridade nascida do (re)conhecimento
pode
e deve agir com firmeza sempre que julgue necessário.
O seu sim e o
seu não são emitidos com franqueza
e solidez. O educando conhece
e reconhece o quanto aquele educador já trabalhou
e agiu no seu
interesse e. no de seus companheiros.
O educador, que assim entende e pratica a autoridade,
liberta-se do
medo e da incerteza. Não se empenha
por prestígio ou
popularidade. Ele está, agora, liberto
de si próprio, encara o
educando de frente e lhe transmite o melhor de si
mesmo. O
educando saberá, de algum modo, perceber
que, para lá dos limites e
das restrições, alguma coisa de bom,
de essencial para seu
crescimento lhe está sendo passado por aquele
adulto significativo
que ele tem diante de si.
A SELEÇÃO E O PERFIL BÁSICO
DO EDUCADOR
Quem se proponha a assumir esta modalidade de trabalho
educativo
junto a adolescentes em dificuldade deverá,
no exame médico,
apresentar, além de solidez, nos aspectos
físico e nervoso, uma certa
capacidade de resistência à fadiga,
bem como, de autodomínio dos
impulsos. Estas são qualidades extremamente
necessárias,
pré-requisitos mesmo para se prosseguir no
processo de seleção.
À medida em que a escolha sai do campo
físico e passa a outra
ordem de qualidades as coisas tomam-se mais complexas.
Alguns
aspectos objetivos são facilmente detectáveis
como deficiências
intelectuais e excessos de caráter incompatíveis
com o trabalho,
agressividade ou timidez excessivas. Há
aspectos, no entanto, que
são normalmente incompatíveis com
os processos convencionais de
entrevistas, testes e exames. Faz-se necessário,
então, dispor de
tempo para avaliar de forma mais criteriosa certas
qualidades e
aptidões. Isto implica, naturalmente,
num segundo nível de decisão
que deverá ter uma orientação
basicamente operacional, um estágio
probatório efetuado junto aos próprios
jovens.
Nesta fase, três características devem
ser observadas com todo
cuidado. Sua ausência ou definição
pouco nítida deve ser
considerada motivo suficiente para não recomendar
a efetivação de
uma pessoa no trabalho direto com os jovens em dificuldade.
A primeira dessas características é
uma inclinação sadia pelo
conhecimento dos aspectos da vida do adolescente
que testemunham
as suas dificuldades e o seu potencial para superá-los.
Esta aptidão
básica, de forma nenhuma é intelectual:
ela implica simpatia,
compromisso, solidariedade, ou seja, capacidade
de relacionamento
positivo com qualquer tipo de jovem, independente
do que ele tenha
feito ou do que aparente ser.
A segunda dessas aptidões reside na
capacidade de auto-análise. A
função exige muito mesmo neste aspecto.
É a partir de uma
consciência perspicaz de si que é possível
ao educador perceber
corretamente que parte de sua personalidade ele
está projetando em
qualquer ação. Sem esta abertura
para a interioridade, a propensão
do educador é atribuir tudo o que acontece
de negativo ao próprio
educando e às suas condições
de trabalho, eximindo-se de colocar-se
a si mesmo como parte dos problemas. Esta
capacidade de
auto-crítica à luz da ação
condiciona uma honestidade intelectual e
unia certa humildade, sem as quais proliferam os
álibis de unia
consciência propensa a se tomar cada vez mais
elástica, mais frouxa,
mais acomodada.
Quanto à terceira disposição,
ela está condicionada pelas duas
primeiras, presidindo, de fato, o seu exercício.
Trata-se da abertura,
da capacidade de deixar penetrar sua vida pela vida
dos outros, de
modo a captar seus apelos e responder a suas dificuldades
e
impasses.
Sem a pretensão de comentar esta qualidade,
diremos apenas que
ela é essencial. Sem essa disposição
interior, a aceitação não se
materializa e a reciprocidade toma-se um objetivo
inatingível.
Tais aptidões devem ser consideradas em profundidade,
para evitar
as aparências enganosas e fraudulentas com
que podem
manifestar-se, por exemplo, numa entrevista ou exame
escrito. A
presença destas qualidades equilibra e mesmo
releva outras
limitações e insuficiências
apresentadas pela pessoa que se propõe a
atuar nesta área. Por isso consideramos
que é somente no estágio de
seleção que é possível
aferí-las com mais segurança e critério.
Geralmente os perfis exigidos dos educadores constituem
uma
acumulação abstrata de todas qualidades
humanas: físicas,
intelectuais, psicológicas e morais.
Hoje, já se percebe que a
natureza não gera este tipo de fenômeno,
e que as ciências do
homem não acumularam ainda recursos suficientes
para produzi-los
em quantidade. Melhor, portanto, basear a
escolha de pessoas para o
trabalho em critérios seletivos fundamentais,
aplicáveis a pessoas
comuns, admitindo sempre uma inevitável margem
de erro e de
incerteza com a qual teremos de aprender a conviver
sem angústias e
tensões descabidas.
O primeiro instrumento deve ser a entrevista ou outras
formas de
contactos despojados de qualquer tecnicismo, favoráveis
à expressão
pessoal de quem se candidata ao trabalho.
O outro instrumento fundamental é o estágio,
o qual, sem excluir
outras formas como testes e exames, nos parece o
elemento decisivo
de um processo de seleção. Ele
deve ter duração suficiente para que,
realmente, se possa perceber a qualidade do desempenho
dos
educadores no "corpo a corpo" com os educandos e
suas
dificuldades. Uma preocupação
necessária nesta fase do processo é
não expor excessivamente os jovens à
inexperiência e aos
experimentalismos dos estagiários e de seus
supervisares. Tal erro
pode ter conseqüências as mais lamentáveis.
O estágio, além de seleção,
é também e primordialmente capacitação
para o trabalho. O estagiário é
levado a ver e compreender, a avariar
e a avaliar-se, a descobrir as implicações
essenciais de seu trabalho a
partir dos contactos que nutriu e das situações
que foi levado a
vivenciar. O processo de escolha é
mútuo e recíproco: o trabalho
seleciona a pessoa e a pessoa assume o trabalho
como uma parte de
si mesma.
LIBERDADE E EDUCAÇÃO
O primeiro erro, quando tratarmos a questão
da liberdade, é ignorar
os condicionamentos psicológicos e sociais
ou subestimar a sua
importância. O erro inverso é
negar a possibilidade de o homen ser
livre, por já estar determinado, tanto em
termos pessoais como
sociais.
A ciência não nos impõe
nenhuma destas conclusões. Somos nós
mesmos que, freqüentemente, polarizamos estas
visões, fazendo-as
assumir formas opostas, abstratas, extremadas.
Esta
incompatibilidade não existe na realidade
concreta. Trata-se de algo
idealizado e formal. Na vida, as coisas estão
emaranhadas e não é
possível separá-las e enquadrá-las
em nossos esquemas mentais.
Os condicionamentos informam os comportamentos
humanos de
modo tão evidente, que parece desnecessário
exigir provas. A
liberdade, por outro lado, é a conquista
existencial e social básica.
Ela passa necessariamente pela experiência,
pela vivência concreta e
intransferível do ato libertador. Ela
exige compromisso consigo
mesmo e com os .outros, e a disposição
de correr riscos e assumir
responsabilidades.
A liberdade confunde-se com à aventura
humana. Assusta-nos
sempre um pouco. Começa no momento
em que aceitamos, para
alcançar algum objetivo que julgamos relevante,
arriscar a segurança
biológica, o equilíbrio psíquico
e o bem-estar econômico e social nos
quais s os alicerces da nossa vida.
Os condicionamentos que informam nossa existência
independem de
nós para atuar. Não temos que
travar qualquer combate para que
eles exerçam sobre nós a sua força.
Já a experiência da liberdade só
é possível através de unia
ativa colaboração da vontade. A liberdade
visa conquistar sempre alguma coisa. para além
do que somos e do
que possuímos. Ela é uma conquista
contínua e sempre comportará
escolhas, incertezas e riscos.
A questão da liberdade na atividade
educativa junto adolescentes em
dificuldade é das que mais requerem do educador
clareza e
equilíbrio. Os jovens identificam na
liberdade um direito que
antecede a tudo mais. Para conquistá-lo
ou alargar suas fronteiras,
são às vezes, capazes de iniciativas
que nos parecem as mais
despropositadas. Caberá ao educador
procurar ajudá-los no sentido
de imprimir uma direção construtiva
a esse irreprimível impulso.
Quando, no entanto, o educando está
perdido de si mesmo, esta
procura toma-se a procura de sua própria
identidade. Os
fundamentos de sua personalidade se encontram abalados.
Na sua
vida há um vazio de calor e de presenças
humanas, um vazio
insuportável que ele precisa preencher de
alguma forma.
O papel do educador será facilitar-lhe
o acesso a esses bens perdidos,
através do confronto com a sua realidade,
os limites que ela lhe
impõe e as possibilidades que ela comporta.
É a parar da
compreensão deste quadro e da descoberta
de que é possível agir
diante dele e modificá-lo que o adolescente
em dificuldade
vivenciará a experiência intransferível
de sentir-se autor de sua vida,
de sentir-se livre em face de si mesmo e da circunstância
em que foi
chamado a existir.
Quando tiver efetuado esta conquista, o jovem
irá usá-la como a base
sobre a qual construirá a sua vida.
Agora, já de acordo consigo
mesmo e com os outros. Ele a usará
ainda como a sua resposta às
exigências que o convidam a ultrapassar-se
e aos obstáculos que
encontra diante de si.
A tarefa do educador é fazer tudo o
que esteja ao seu alcance para
que, enfim,, o educando descubra e comece a trilhar
o seu caminho.
Assim percebida, a liberdade é muito mais
do que a não-restrição.
Mais do que condição, ela é,
acima de tudo, o produto de um
processo educativo freqüentemente laborioso
e difícil.
A SERVIÇO DO DESENVOLVIMENTO PESSOAL
E
SOCIAL
A presença, como vimos, é uma exigência
constante para o
desenvolvimento da personalidade e a inserção
social de todo ser
humano. Do início ao fim, a vida de cada
um de nós se traduz num
desejo constante de presença. Quando
estes vínculos não existem,
ou são demasiado frágeis e se rompem,
todo o dinamismo se esvai. A
vida torna-se absurda e vazia de senado e a conduta
se deteriora e
degrada cada vez mais.
As manifestações delinqüentes
dos jovens assumem formas
inquietantes às quais o Estado e a sociedade
procuram responder
com os mecanismos caducos do alerta, da repressão,
da segregação,
e, no Brasil, até mesmo do extermínio.
Esta maneira de relacionar-se
com o problema ignora, em todas as etapas de seu
desenrolar-se, um
das necessidades mais prementes e íntimas
do ser humano em todas
as épocas: a necessidade de encontrar-se
a si mesmo para, então,
encontrar os demais.
A compreensão deste fato implica um novo
caminho para a educação
dos jovens em dificuldade. Um caminho que
parte do
reconhecimento de que, nesta modalidade de ação
educativa, o que
varia é apenas o momento, o tipo de intervenção
e a receptividade do
educando. No educando de que estamos tratando,
existem as
mesmas possibilidades que em qualquer outro; ele
passou, contudo,
pela massacrante experiência da privação
e da brutalidade, fazendo
com que sua vida entrasse por um caminho de agitação
e incerteza.
Uma educação verdadeiramente positiva
é a que tenta devolver ao
educando o caminho de sua libertação.
Não basta, portanto, apenas preparar um futuro
adulto para inserir-se
de forma produtiva e útil na sociedade. É
preciso mais. É preciso
encontrar e desenvolver nele o quanto possível
aquilo de bom que
ele trouxe consigo ao nascer. Só assim,
o jovem não será por nós
reduzido às suas deficiências e aos
seus atos contra a moral e as leis.
Diante de jovens seriamente perturbados, um educador,
atuando na
linha da pedagogia da presença, pode ser
um apoio de relevância
decisiva. Ao aceitar assumir a função
educativa em toda sua
extensão o educador percebe claramente a
singularidade do seu
lugar e do seu papel na sociedade. Ele visualiza,
como poucos, os
fatores de origem social que abalam e às
vezes destroem os
fundamentos da vida pessoal da infância e
da juventude das camadas
mais pobres da população.
Mas a luta por democracia e justiça social
não deve, de maneira
alguma, desviá-lo da necessidade de compreender
e de aceitar o ser
humano, para além das realidades que emergem
da sua inserção na
sociedade.
Ao exercer sua função específica,
guiado por uma consciência
transformadora e crítica da realidade, o
educador reconhecerá que os
dois pólos de sua atividade: o desenvolvimento
pessoal e o
desenvolvimento social do adolescente em dificuldade
são duas faces
da mesma moeda. Ele sabe, mais do que ninguém,
que a presença
do jovem em si próprio é a condição
de sua presença nos outros em
todos os espaços onde se processa a sua socialização:
família, escola,
comunidade, trabalho e outros.
Mais do que responder às exigências
e temores deste tempo de crise,
o educador orientará sua atuação
para as necessidades humanas e
materiais dos adolescentes. Sua ação
cotidiano manifesta-se ao nível
da pessoa do educando. Alguém cujas
circunstâncias de vida estão
sempre a mostrar-lhe que, enquanto cidadão,
são muitos os motivos
que o impelem a juntar-se aos que se empenham na
mudança da
sociedade, para que ela possa tomar-se um lugar
capaz de permitir a
todo jovem encontrar-se a si mesmo e aos outros;
e a olhar o futuro
sem medo.
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