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Execução imediata da cassação de registro de diploma
por ilícito eleitoral
Ney Moura Teles*
O Tribunal Superior Eleitoral firmou
jurisprudência no sentido de que a decisão que cassa o registro ou o diploma de
candidato, em investigação judicial eleitoral julgada procedente, por violação
ao preceito do art. 41-A da Lei 9.504/97, têm aplicação imediata.
O fundamento desse entendimento pode ser sintetizado a partir desse trecho do
voto do Ministro BARROS MONTEIRO, proferido no julgamento do Recurso Especial
Eleitoral nº 19.644/SE, de 3 de dezembro de 2002,
publicado no DJ de 14.2.2003:
“Na hipótese prevista no indigitado art. 41-A da
Lei nº 9.504/97, o escopo do legislador é o de afastar imediatamente da disputa
aquele que no curso da campanha eleitoral incidiu no tipo “captação ilegal de
sufrágio”. Nesse sentido o voto proferido pelo Sr.
Ministro Fernando Neves na MC nº 944/MT, in verbis:
“Como observei no precedente já citado (MC nº 970), as alterações da Lei nº
9.504, de 1997, entre as quais consta a introdução do art. 41-A, vieram ao
encontro da vontade da sociedade de ver rapidamente apurados e punidos os
ilícitos eleitorais. Neste caso, o interesse a prevalecer é o de afastar
imediatamente da disputa aquele que, no curso da campanha eleitoral, tenha
incidido no tipo captação de sufrágio, vedada por lei. Por
isso, o legislador, diferentemente de quando tratou das declarações de
inelegibilidade, não condicionou ao trânsito em julgado os efeitos da decisão
que cassa diploma por transgressão ao referido art. 41-A”.
O tema fora, pela vez primeira, abordado no julgamento da MC nº 970, quando o
Ministro Fernando Neves assim construiu o novo pensamento jurisprudencial:
“Pedi vista dos autos para refletir sobre a aplicabilidade do citado art. 15
quando não há declaração de inelegibilidade, mas perda do registro por infringência
ao art. 41-A da Lei nº 9.504, de 1997.
Este dispositivo trata da cassação de registro de candidatura ou do diploma e
foi acrescido à lei eleitoral pela Lei nº 9.840, de 18.9.99, razão pela qual
teve incidência somente no pleito de 2000. Desse modo, pouquíssimas vezes esta
Corte teve oportunidade de analisar a matéria, não o tendo feito, pelo que pude
apurar, sobre a questão relativa à aplicação do art. 15 da LC nº 64/90.”
............
“Após meditar sobre o tema, concluí que, se não há declaração de
inelegibilidade, a eficácia da decisão proferida pela Justiça Eleitoral não
está condicionada ao seu trânsito
Com efeito. A regra contida no referido art. 15 é clara: transitada em julgado
a decisão que declarar a inelegibilidade do candidato, ser-lhe-á negado
registro, ou cancelado, se já tiver sido feito, ou declarado nulo o diploma, se
já expedido.”
...........
“No registro de candidatura, como dito, o fim perseguido é a demonstração da
presença das condições de elegibilidade e a ausência de inelegibilidade, para
que se dê o candidato como apto a participar do pleito.
Nessa situação, o legislador expressamente determinou que se aguarde a
existência de decisão definitiva........”
..............
A representação com base no art. 41-A, no entanto, tem, como objeto, não mais a
aferição das condições para o deferimento do registro, mas apurar condutas
ilegais praticadas pelo já candidato durante sua campanha eleitoral.”
..........
Observo que as alterações da Lei nº 9.507, entre as quais consta a introdução
do art. 41-A, vieram ao encontro da vontade da sociedade de ver rapidamente
apurados e punidos os ilícitos eleitorais, razão pela qual a corrupção, que
constitui crime previsto no art. 299 do CE, passou a ser também causa da perda
do registro da candidatura ou do diploma, sem que o legislador condicionasse os
efeitos da decisão proferida na representação ao seu trânsito em julgado.” (DJ
de 15.10.01)
Com esse raciocínio sedimentou-se o novo entendimento da Corte Superior (RESPE
19.552/MS, Sálvio de Figueiredo Teixeira; AgInst 3.042/MS, Sepúlveda Pertence;
RESPE 19.587/GO, Fernando Neves; AgRegRecl 142/PA, Ellen Gracie; AgRegRecl
143/PA, Ellen Gracie; RESPE 19.566/MG, Sálvio de Figueiredo Teixeira; MC
994/MT, Fernando Neves; AgRegMC 970/GO, Waldemar Zveiter; RESPE 19.644/SE,
Barros Monteiro)
A indagação que se faz, agora, é a seguinte:
- a decisão de cassação do registro ou do diploma, por
infringência à uma das normas dos incisos I, II, III, IV e VI do art. 73 da Lei
9.504/97, terá aplicação imediata, incidindo, para ela, também a regra geral do
art. 257 do Código Eleitoral?
- ou somente produzirá efeito após o seu trânsito em julgado?
O Tribunal Superior Eleitoral ainda não enfrentou essa questão específica.
O voto do Ministro Fernando Neves, no AgRgMC nº 970,
que orientou a interpretação comentada, partiu da necessidade de separar duas
situações:
(1) decisões que julgam o pedido de registro de candidatura, versando sobre
condições de elegibilidade e causas de inelegibilidade; das
(2) decisões que julgam fatos praticados por candidato já registrado, durante a
campanha eleitoral.
As primeiras só produzirão efeitos após o trânsito em julgado, por força da
norma expressa do art. 15 da LC 64/90. As segundas, devem
ter aplicação imediata.
A essa conclusão chegou o eminente Ministro Fernando Neves ao interpretar a
vontade da Lei nº 9.840/99, que introduziu alterações na Lei 9.504/97, dentre
elas a norma do art. 41-A. Segundo o Ministro, o fim da lei foi o de atender a
vontade da sociedade de ver punidos rapidamente os ilícitos eleitorais, não
tendo condicionado ao trânsito em julgado os efeitos das decisões que cassarem
registro ou diploma.
Vejamos agora, como a Lei 9.507/97 sancionava as chamadas condutas vedadas a
agentes públicos, definidas no seu art. 73.
Dispunha o § 5º do art. 73 da Lei 9.507:
“No caso de descumprimento do inciso VI do caput, sem prejuízo do disposto no
parágrafo anterior, o agente público responsável, caso seja candidato, ficará
sujeito à cassação do registro.”
O parágrafo anterior, 4º, assim dispõe:
“O descumprimento do disposto neste artigo acarretará a suspensão imediata da
conduta vedada, quando for o caso, e sujeitará os responsáveis a multa no valor
de 5.000 (cinco mil) a 100.000 (cem mil) UFIR.”
Assim, no sistema original da Lei 9.507/97, às condutas vedadas aos agentes
públicas, definidas no art. 73, eram aplicadas as seguintes sanções:
a) suspensão imediata da conduta vedada, quando fosse possível;
b) multa, de
c) cassação do registro apenas de candidato que fosse agente público e
responsável pela conduta descrita no inciso VI do caput do art 73: “nos 3 (três
meses que antecedem o pleito: a) realizar transferência voluntária...; b)
...autorizar publicidade institucional...; c) fazer pronunciamento em cadeia de
rádio e televisão...;”.
Como visto, a vontade original da Lei 9.504/97 era a de, em relação às condutas
vedadas a agentes públicos, suspendê-las imediatamente, quando possível, e
punir com multa os responsáveis.
] Somente punia candidatos que violassem o preceito do
art. VI, cujas vedações somente se aplicavam aos agentes públicos das esferas
administrativas cujos cargos estivessem em disputa na eleição, conforme
determina o § 3º do mesmo artigo. Candidatos beneficiados por outras condutas
vedadas no mesmo artigo não sofriam nenhuma sanção.
Ora, a mesma Lei nº 9.840/97, que introduziu o art. 41-A, alterou a norma
sancionatória do § 5º do art. 73, dando-lhe a seguinte redação:
“Nos casos de descumprimento do disposto nos incisos I, II, III, IV e VI do
caput, sem prejuízo do disposto no parágrafo anterior, o candidato beneficiado,
agente público ou não, ficará sujeito à cassação do registro ou do diploma.”
A mudança foi, como visto, profunda e radical. O sistema sancionatório das
condutas vedadas é outro, e mais rigoroso.
São as seguintes as sanções:
a) para todas as condutas vedadas, suspensão imediata, quando for o caso, e
multa para os responsáveis;
b) para as condutas vedadas definidas nos incisos I, II, III, IV e VI do art.
73, além da multa, a cassação do registro ou do diploma do candidato
beneficiado, agente público ou não.
A partir de então qualquer candidato que vier a ser beneficiado por uma das
condutas vedadas nos incisos I, II, III, IV e VI do art. 73, terá seu registro
cassado, ou o diploma, se já tiver sido expedido, além de sofrer a imposição da
multa.
Veio a nova lei, como bem salientou o Ministro Fernando Neves, atender ao
desejo da sociedade de ver rapidamente punidos os ilícitos eleitorais, não
somente os praticados por candidatos, mas também aqueles realizados por agentes
públicos em seu benefício.
De notar ainda que para ter seu registro ou diploma cassado, a lei não exige
que o candidato seja o autor ou partícipe da conduta vedada, como, aliás, o
próprio Tribunal Superior Eleitoral já reconheceu, no julgamento do RESPE
19.462, relatado pelo Ministro Sepúlveda Pertence, de cujo voto se extrai:
“Por outro lado, a sanção de cassação do registro alcança o candidato
beneficiado pelo ilícito, ainda quando não lhe seja imputável a autoria do
fato; é a situação, no caso, do vice-prefeito eleito.”
Também quando alterou o § 5º do art.
Exatamente porque, na mesma linha do pensamento do Ministro Fernando Neves, não
veio cuidar de causas de inelegibilidade ou de condições de elegibilidade. Veio
cuidar sim de condutas ilícitas realizadas, no curso da campanha eleitoral, em
benefício de candidaturas, que sejam tendentes a afetar a igualdade de
oportunidades entre os que disputam o pleito eleitoral.
A Lei 9.840, na verdade, veio introduzir, na legislação eleitoral, um vigoroso
conjunto de tipos de ilícitos eleitorais, com sanções rigorosas e de aplicação
imediata, exatamente para atender à vontade da sociedade, que pugna pela
rapidez na punição dos responsáveis, principalmente dos candidatos.
O sistema original da Lei 9.507 era ineficaz, praticamente inócuo, porque
limitava-se à aplicação de multas pecuniárias, o que tornava os pleitos
eleitorais ainda mais privilegiadores dos detentores do poder econômico e de
autoridade. Bastava pagar a multa e tudo ficava resolvido.
A nova lei aproveitou os tipos descritos nos incisos I, II, III, IV e VI do
art. 73, e criou um novo, o do art. 41-A, mas a todos sancionou com as mesmas
conseqüências jurídicas: multa e cassação do registro ou do diploma. Nenhum
deles sancionou com inelegibilidade. E não cominou a inelegibilidade exatamente
porque, tratando-se de uma pena que ataca um direito fundamental,
personalíssimo, não poderia ser executada rapidamente, antes do trânsito em
julgado, servindo, portanto, apenas como empecilho à aplicação imediata das
outras sanções. Por isso , não condicionou os efeitos
da decisão de cassação ao trânsito em julgado.
Os primeiros, do art. 73, são tipos de ilícitos eleitorais que têm como
sujeitos ativos agentes públicos, mas a sanção recai também para o candidato
que vier a ser beneficiado, ainda quando não se lhe possa imputar a prática da
conduta.
O tipo do art. 41-A, incidirá “quando o candidato praticar, participar ou mesmo
anuir explicitamente às condutas abusivas e ilícitas capituladas naquele
artigo” como já decidiu também o Tribunal Superior Eleitoral no RESPE
19.566/MG, relator o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira.
Ora, se o Tribunal Superior Eleitoral já consolidou o entendimento de que a
decisão que cassar o registro ou o diploma, pela conduta vedada pelo art. 41-A,
terá aplicação imediata, qual a razão para que também não se aplique
imediatamente a decisão de cassação por violação dos incisos I, II, III, IV e
VI do art. 73?
Qual a razão para se afastar a incidência da norma do art. 257 do Código
Eleitoral– os recursos eleitorais não terão efeito suspensivo – nas cassações
por violação do art. 73, se tais violações também constituem ilícitos
eleitorais praticados no curso da campanha eleitoral?
Que diferença substancial haveria entre o tipo do art. 41-A e os tipos dos incisos
I, II, III, IV e VI do art. 73, capaz de justificar a aplicação imediata da
cassação por violação ao primeiro tipo, e não quando a violação tiver sido aos
tipos do art. 73?
Estaria a diferença em que o tipo do art. 41-A tem como sujeito ativo o próprio
candidato, ao passo que nos demais o sujeito ativo é um agente público?
Não, porque a captação de sufrágio vedada pode ter como sujeito ativo o próprio
candidato, mas, como já entendeu o T.S.E., pode ser seu sujeito ativo também
qualquer pessoa, bastando que aquele tenha anuído à conduta do seu executor.
Logo, não é exigência do art. 41-A que a captação seja feita exclusiva e
diretamente pelo candidato.
Em todos os tipos, o fim da lei é o de coibir a sua prática, por sua gravidade,
sancionando não só os seus autores, mas principalmente os candidatos que dela
se beneficiarem. Porque se assim não fosse, as normas seriam inócuas
para os destinatários do ilícito, os que dele se beneficiam.
Além disso, é possível ver, no § 5º do art.
É de ver ainda que todos esses ilícitos são de gravidade acentuada, e se se
compará-los com base nesse parâmetro, a conclusão a que se pode chegar é que os
descritos nos incisos do art. 73 são de muito maior lesividade que o do art. 41-A.
A uma, porque além de tenderem a afetar a igualdade de oportunidades entre os
candidatos – o que não ocorre quando há uma única captação vedada de sufrágio -
, beneficiando uns, em detrimento de outros, realizam-se com a utilização de
recursos públicos, o que não acontece na violação do art. 41-A. O ilícito do
art. 73 agride não só a consciência do eleitor mas também o patrimônio público.
Ataca, pois, dois bens jurídicos importantíssimos. É, pois, um tipo de ilícito
complexo, e, por isso, mais grave.
Por isso mesmo é que o § 4º do art. 73 comina multa de
De conseqüência, se se buscar na gravidade da lesão ao bem jurídico a diferença
entre o tipo do art. 41-A e os do art. 73, estes são, sensivelmente mais
graves, daí que, por isso, mais razão há para também aplicar imediatamente a
cassação do registro ou do diploma.
Não há, portanto, qualquer razão juridicamente relevante para dar tratamento
diferente nas diversas hipóteses de cassação de registro ou do diploma,
decorrentes de ilícitos cometidos na campanha eleitoral.
A regra geral do art. 257 do Código Eleitoral não pode ser afastada, sem norma
expressa, para umas decisões que reconhecem a prática de determinados ilícitos
eleitorais no curso da campanha, e incidir para outras.
Como se viu, o T.S.E. entendeu que só têm efeito suspensivo os recursos
interpostos de decisões que declarem inelegibilidade. Decidiu também que quando
o decisum cassar o registro e, ao mesmo tempo, declarar o candidato inelegível,
apenas quanto a esse ponto se exigirá o trânsito em julgado para a efetivação
da sentença. E assim entendeu porque existe norma expressa, a do art. 15 da Lei
Complementar 64/90, exigindo o trânsito
A interpretação teleológica das normas introduzidas pela Lei 9.840 – que se
harmonizam com a regra geral do art. 257 do Código Eleitoral - leva, por isso,
à mesma conclusão a que chegou a Corte Superior: a execução imediata das
cassações de registro ou de diploma também quando por violação a preceitos do
art. 73 da Lei 9.507. Atende-se, assim, a vontade da sociedade de ver rapidamente
apurados e punidos os ilícitos eleitorais. Todos eles. Não apenas os do art.
41-A.
Quanto ao art. 216 do Código Eleitoral: “Enquanto o Tribunal Superior não
decidir o recurso interposto contra a expedição do diploma, poderá o diplomado
exercer o mandato em toda a sua plenitude”, é óbvio que está tacitamente
revogado pela Lei 9.840/99, por sua absoluta incompatibilidade, nos termos do §
1º do art. 2º da Lei de Introdução ao Código Civil.
Com efeito, no regime do Código Eleitoral de 1965, que perdurou até o advento
da Lei 9.840/99 o único instrumento utilizado para a cassação do diploma era o
recurso de que trata o art. 262 do Código Eleitoral. Sem a interposição do
recurso, o diploma nunca poderia ser cassado. Esse sistema privilegiava o resultado
formal das votações, daí que se exigia a decisão final do Tribunal Superior
Eleitoral. Com a Lei 9.840/99, privilegia-se a lisura
dos pleitos eleitorais, a licitude dos comportamentos dos agentes públicos e
candidatos nele envolvidos, a consciência e a liberdade do eleitor. A cassação
do diploma pode se dar em investigação judicial eleitoral, pelo rito da Lei
Complementar 64/90 e, também, em simples representação pelo rito sumário do
art. 96 da Lei 9.504/97, por violação do art. 73. O fim agora é a punição
rápida dos ilícitos eleitorais, como é da pacificada jurisprudência do T.S.E.
Condicionar a execução da sentença ao exame do recurso pela Corte Superior, é
absolutamente incompatível com o fim colimado pela nova lei. Daí que outra
conclusão não há senão a de que o art. 216 do Código Eleitoral está revogado.
Em conclusão: os recursos das decisões da justiça eleitoral não têm efeito
suspensivo, a não ser no único caso previsto no art. 15 da Lei Complementar
64/90, quando a decisão declarar a inelegibilidade de candidato.
Disponível na Internet: http://www.mundojuridico.adv.br.
Acesso no dia 27/07/06 Acesso em 27 de julho de 2006.