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Reforma Universitária e na Educação, Propriedade Intelectual, Software Livre e Participação Popular
 

Nos dias 27 e 28 de maio o Ministério da Educação realizou um dos colóquios ao qual o próprio planejou, e este no caso foi com as entidades da sociedade civil. A Central de Movimentos Populares foi convidada e esteve presente.

Por Everton Rodrigues

No dia 27 pela manhã foi a apresentado um equipamento que será utilizado nas 5 audiências públicas em cinco regiões do país, que a agenda é a seguinte:

.23 de junho Manaus (4 junho será instalado o comitê que organizará a audiência pública)

.13 de junho em Recife

.30 de julho em Porto Alegre (durante o Fórum Mundial de Educação)

.17 de agosto em São Paulo

.31 agosto em Campo Grande

Este equipamento denominado “palm” será utilizado para as entidades votarem se aceitam a proposta ou não, estas que serão apresentadas nas audiências, e vale questionar se o software que será usado é baseado numa tecnologia proprietária como a tecnologia que foi utilizada na página eletrônica da reforma universitária (veja o texto aqui ). Questionamos isso porque não se constrói soberania nacional com os enlatados dos países desenvolvidos, principalmente quando temos pessoas e empresas capazes de ajudar na construção da nossa soberania com uma tecnologia que não nos transforma em dependentes e sim que possamos também exportar tecnologia, mas para isso devemos investir.

Os temas do debate nos dois dias foram os seguintes: Missão da Universidade; Autonomia e Financiamento; Acesso e Permanência; Estrutura e Gestão; Conteúdos e Programas, e por fim Avaliação.

Bom, é necessário fazer aqui uma avaliação desse processo desde quando o tema “reforma universitária” surge na nossa pauta nacional, passando por algumas propostas do governo, e também desse seminário e evidentemente das perspectivas e das impressões que ficaram após o seminário.

É importante salientar que esse debate não surge para a sociedade e ainda não é fácil de compreender como um todo, até porque o governo não apresentou de uma forma clara tudo o que está pensando ou elaborando, limitando-se apenas a enviar projetos pontuais para o congresso nacional ou divulgar projetos de intenções.

Entendemos que esse tema é de bastante importância e deve ser debatido de forma bastante responsável, para que, de forma nenhuma apresentarmos uma proposta precipitada e sem antes debater com toda a sociedade civil organizada e com participação popular, que são os movimentos e entidades do movimento popular, sindicatos, associações de bairro, movimentos juvenis, governos municipais e estaduais, fundações, federações, etc...

A partir desse seminário é possível ter uma maior dimensão de como o governo está em relação a esse debate, mas vale também comentar um pouco sobre o próprio seminário.

A intenção do seminário foi boa, mas na prática para não cumpriu o que se esperava, embora tenha apresentado elementos para compreender a atual situação da reforma universitária... Foi um seminário bastante confuso: primeiro porque a dinâmica do seminário foi de uma forma como se todas(os) as(os) que estavam ali participando já conheciam o andar do debate. E isso não poderia ser possível. Primeiro porque os textos da pauta somente foram entregues no momento do credenciamento; Segundo porque os temas foram apresentados de forma fragmentada e durante o debate com as entidades (é preferível que seja apresentado tudo no começo da discussão de acordo com a programação e depois abre para o debate) e o que estava programado para dois turnos foi feito em um turno.

Hora, se a própria comunidade acadêmica não tem fácil compreensão desse debate, imagina os movimentos populares e sociais que não acompanham essa pauta e que somente agora tem essa possibilidade. A linguagem é um outro fator determinante para o sucesso desse debate, porque se os acadêmicos vierem com suas linguagens técnicas certamente não haverá êxito.

Antes de comentar as pautas do seminário vale frisar que qualquer reforma, e no caso a universitária não será exitosa sem a participação popular (eixo da CMP “Políticas Públicas com Participação Popular”) e sem uma mudança nos rumos da política econômica do nosso governo federal, e isso é muito importante porque não é somente o MEC que deve compreender isso, mas o conjunto do governo federal tem que entender isso. Dizer que não existe recurso financeiro é no mínimo ser simplista com o tema. O recurso existe e o problema é que está sendo aplicado em outras prioridades, que atingem as camadas sociais que não necessitam de apoio. Isso não é uma questão desse governo, mas de 500 anos de políticas para minorias. Mas agora elegemos Lula Presidente temos que enfrentar esse problema, porque senão, não teremos êxito nesse debate.

No debate sobre o “O Papel da Universidade” (veja o texto aqui ) que está sendo usado um texto base de Nelson Maculan Filho e que merece elogios e destaque de alguns pontos de muita importância e que temos que aprofundar no debate, que são: “...uma proposta concertada para o novo sistema de educação superior para o Brasil...”; “...Os desafios de um projeto democrático de desenvolvimento nacional exigem novos saberes, novas práticas, uma radical mudança na produção e na disponibilização do conhecimento...”; “...a solidariedade e a partilha dos saberes.”; “...respeito à formação socialista...”; “...Lugar de onde uma cultura de paz e de reconhecimento das diferenças deve ser constituída se tivermos a possibilidade de acessarmos a formidável rede de mobilidade acadêmica na produção de saberes e conhecimento que devem estar à serviço de uma formação que se mundializa solidariamente. Conhecer para transformar...”; “... reforma do pensamento ...”; “...compreensão dos direitos à diferença e à inclusão social...” Portanto, essas afirmações contidas no texto e diversas vezes reafirmadas no seminário são algo que vai contra o que representa a universidade hoje, e nos coloca numa tarefa grandiosa de modificar tudo isso. Essas afirmações hoje não acontecem, e devem acontecer. O conhecimento tem que ser desprivatizado e deve ser público e de livre acesso. Essa reforma que vamos fazer deve ser contra a propriedade intelectual e contra as patentes. É justo existir um proprietária(o) de uma idéia? As idéias são sempre nossas, e elas surgem individuais ou são sempre coletivas? Todas(os) somos influenciadas(os) umas(uns) pelas(os) outras(os)? Quem forma nossas idéias? São nossas famílias? Nossas(os) professoras(res)? Os livros que lemos? As músicas que escutamos? Os filmes que assistimos? Hoje o movimento pelo copyleft (esquerda autoral, um trocadilho aos direitos autorais), pela livre circulação da cultura e do saber ampliou-se muito além do universo dos desenvolvedores software livre. O conceito de copyleft (esquerda autoral) é aplicado na produção literária, científica, artística e jornalística. A ALCA já está nesse debate e temos que prever isso na nossa reforma, porque o rascunho do acordo da ALCA diz que quem trocar músicas com copyright (direitos autorais) pode ser punido com prisão e ameaça impor o prazo de 70 anos após morte do autor para que a coisa vire domínio público. Ou seja, do jeito que está, o acordo da ALCA junta o pior do DMCA (Digital Millenium Copyright Act, traduzido "lei de proteção de direitos de autor no milênio digital" nos EUA) com o que as corporações americanas não conseguiram aprovar por lá. (veja aqui - Carnaval, Samba e Software Livre - Veja tb Slashdot. (Publicado por china243)) Na seção 1202 da DMCA ((Digital Millenium Copyright Act, traduzido "lei de proteção de direitos de autor no milênio digital" nos EUA) que proibe acadêmicos ou investigadores de publicarem falhas descobertas nos esquemas de segurança ou procedimentos comercializados por empresas, mesmo que estas falhas detectadas provem funcionamento duvidoso. Portanto esse tema passa pela discussão do papel da universidade.

E ainda, falando de patentes, temos que pensar sobre a idéia do governo com o dinheiro público investir em pesquisa e o que acontece com esse conhecimento financiado pelo povo. Muitas vezes os próprios professores e empresas patenteiam. Isso também não é justo e temos que resolver isso. Sabemos que 90% do conhecimento é produzido na universidade pública, porque, somente o governo com o dinheiro do povo investe em pesquisa, e as universidades privadas não, porque, não vêem margem de lucro nisso, portanto, as privadas não possuem compromisso social e daí temos que questionar o programa universidade para todos, que pretende através das isenções tributárias comprar vagas dessas privadas e colocar os nossos jovens em algo que não tem nem controle público. Se vamos comprar essas vagas, pelo menos vamos antes ter possibilidade de intervenção política, porque afinal, é o nosso dinheiro que vai para lá. O dinheiro desses impostos não existem porque essas instituições não pagam, mas devemos fazer essas instituições pagarem seus impostos e estes devem ser aplicados na universidade pública. Estes 90% de produção do conhecimento é desenvolvido em 57 instituições públicas e as 1.610 universidades privadas produzem somente 10% do conhecimento no Brasil. E a informação não está errada... é isso mesmo temos 57 instituições públicas que são responsáveis pela produção de 90% do conhecimento enquanto que 1610 instituições privadas são responsáveis por produzir apenas 10% do conhecimento no país.

E sobre esse debate o movimento software livre tem uma contribuição a dar e deve ser ouvido pelo MEC, porque, possui uma experiência de desenvolver, compartilhar tecnologia e conhecimento produzido e de uma forma diferente das que são usadas na universidade, porque, utiliza a internet e possui com diretriz básica o compartilhamento do conhecimento.

O tema "A AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA ( veja o texto aqui ) que está sendo usado um texto base escrito por Benício V.Schmidt, e que também temos que discutir muito bem, e as idéias apresentadas, tais como: “... Neste sentido, tem sido largamente defendido que as universidades são sociedades corporativas que deveriam, sempre, estar asseguradas de um alto grau de autonomia, podendo tomar decisões necessárias às suas funções primordiais por meio de seus próprios procedimentos e sem o constrangimento de ações de autoridades externas...”; “... A autonomia universitária deveria ser absoluta em relação ao Estado e aos interesses econômicos organizados pelo mercado.”; “...A autonomia universitária deveria ser a combinação disso com a máxima representação corporativa interna, por meio de eleições de seus próprios dirigentes em sistema de representação universal (“um homem, um voto”)...”; “...Outra demanda formulada é que a autonomia deveria ser regulamentada por uma Lei Orgânica do Ensino Superior, que sucederia parcialmente a vigente LDB...”; “...Neste sentido, o pleno e desejado exercício da autonomia, deveria dispensar, como prejudicial e desvirtuadora, qualquer relação de prestação de serviços, consultorias e pesquisas, ensino e extensão ligados às obrigações que unem os destinos da universidade às obrigações maiores com o Estado Nacional Brasileiro...”

Fala-se muito em total autonomia da universidade em relação ao Estado, e isso, não é pouca coisa. Tudo bem, a autonomia em relação ao mercado, mas em relação ao governo isso é muito discutível, que inclusive passa pela discussão do papel do estado.

Não sou contrário a autonomia, mas existem níveis de autonomia, e isso precisa ser visto com atenção, porque, daqui a pouco as instituições de ensino público terão autonomia para vender espaços nas salas de aula para empresas anunciarem seus produtos... Imagem chegar numa sala de aula e ter de um lado do quadro a marca da coca-cola e de outro a marca do mc’donalds e da nike. No decorrer do debate surgiu uma idéia, e que é contrária ao texto apresentado, de criar um conselho estratégico em cada instituição de ensino superior, com participação interna e extrena, e uma das funções seria avaliar a importância da universidade para a sua região local. Seria construir uma espécie de OP na universidade. O controle público sobre essa autonomia é bastante necessário, assim, como o próprio nível dessa autonomia.

Estes foram os dois temas que forma mais tratados, já que, tivemos apenas um turno para a tarefa. Mas nas audiências regionais devemos tratar todos os temas, e para isso, a metodologia deverá ser melhorada para conseguirmos aprofundar o debate.

Por fim, é preciso que o movimento software livre contribua com esse debate, porque possui grande experiência na produção de conhecimento e no seu compartilhamento e, também as universidades que apóiam o software livre, já que, estas já entenderam a filosofia GNU/Linux.

 

Retirado de: http://portal.softwarelivre.org/news/2556