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Noções de Direito Autoral ao amparo da lei N.10.695 de 1º de Julho de 2003

 

Leonardo Mota Costa Rodrigues

Advogado. Especialista em Direito Público pela Universidade Salvador (UNIFACS) – Bahia.

Residente à rua Humberto de Campos, n.º 233, Apto. 604, Graça, Salvador – Bahia.

Telefones: 71-247-0394, 81-88217928 e 81-34125344

 

 

SUMÁRIO: I. INTRODUÇÃO 1. O tema proposto e sua importância II– ELEMENTOS ESTRUTURAIS DO DIREITO DE AUTOR 1. Disciplina legal no plano internacional e nacional 2. Natureza do direito de autor: princípios e teorias 3. Direitos morais e patrimoniais 4. Limitação no tempo 5. Direitos conexos 6. Sanções III -CONCLUSÕES 1. Síntese sobre a sistematização dos Direitos de Autor e os que lhe são conexos na obra musical.

 

I – INTRODUÇÃO

 

1.    O tema proposto e sua importância

 

Os Direitos de autor e conexos surgiram de forma precária em decorrência da invenção de Gutemberg, “a imprensa”, no século XV. Chegamos ao ponto atual de estarmos inseridos em uma aldeia global, ligados por laços cirbenéticos, fundando uma cultura de massa e economia globalizada. A cada momento somos bombardeados com uma infinidade de informações, vindas de todos os locais do mundo.

Necessário se fez, a proteção dos Direitos Autorais nacionais em vista da circulação internacional de sua obra, assim como, o inverso também foi necessário. Estas circunstâncias propiciaram uma internacionalização dos Direitos Autorais – Convenção de Berna de 1896 e até hoje em vigor.

A lei de Direitos Autorais trata da proteção das obras musicais, como criação do intelecto humano, ainda mais, que no início do terceiro milênio ocorre a “ascensão do mercado musical e de entretenimento do Brasil, que atingiu sua melhor marca histórica, ficando em sexto lugar no mundo”.

A obra musical é à parte que mais nos interessa no campo dos Direitos Autorais, por ser a mais difundida e popular das criações intelectuais, e, por outro lado, por exigir processos mais complexos de elaboração e comunicação ao público, por conseqüência, mais interessantes as relações travadas no âmbito do Direito.

No capítulo Elementos estruturais do direito de autor, mostraremos o caminho percorrido pelos Direitos Autorais, desde o seu surgimento, com a imprensa, até as últimas convenções e tratados internacionais e no âmbito nacional até a Lei n.º 9.610 de 1998. Qual a natureza dos direitos autorais e as tergiversações dos jus-autoralistas sobre a possibilidade da disponibilidade dos direitos morais e patrimoniais.

Inquirirá-se quando uma obra musical cai no domínio público.

O que são direitos conexos ao de autor e quais os direitos e deveres dos seus titulares.

As sanções por violações dos direitos autorais.

No segundo capítulo caracterização de obra musical, conceituamos obra musical, qual seu elemento indelével e distintivo das demais obras intelectuais, que a torna protegível pela legislação autoral.

Quais a espécies de obras musicais, objeto do exame por meio desta monografia e seus criadores, produtores, usuários ou qualquer interessado que intervenha nos seus circulo de criação e circulação. Questões relativas aos legitimados a defender os direitos autorais.

Criação de remuneração devida pela execução de obra musical. Autorização de utilização.

As novas formas de inserção da obra musical em suporte, o corpus mecanicus, nas novas tecnologias. Questões polêmicas sobre o uso da obra musical nos novos meios de comunicação (Internet, satélite) Já existem formas de proteger os direitos autorais ligados a circulação de obras musicais, por estes meios?

No capítulo contratos relacionados às obras musicais, trataremos dos contratos de direito autoral, princípios da teoria geral dos contratos aplicáveis aos mesmos as suas cláusulas específicas.

Trataremos dos contratos de direito autoral em espécie, mostrando seus requisitos necessários e limitativos da autonomia da vontade, assim como a cláusulas que se deve atender para que se mantenha o equilíbrio entre os contratantes.

A monografia é fundada na análise da doutrina legislação e jurisprudência pátria e comparada, quanto a esta última, lembramos que alguns julgados referem-se a Lei 5.988/73, porém plenamente aplicado a sistema da Lei 9.610/98.

 

I I– ELEMENTOS ESTRUTURAIS DO DIREITO DE AUTOR

 

1. Disciplina legal no plano internacional e nacional

 

Inicialmente dirigido apenas aos editores de obras literárias, porém, com o advento do Iluminismo, Renascimento e Revolução Francesa, foram estabelecidos os Direitos Autorais, com a estrutura que ainda hoje apresentam, para acolher novos produtos do espírito humano, atingindo, mesmo, as obras musicais e seus autores, [1] acompanhando o desenvolvimento da tecnologia da comunicação, porque os Direitos Autorais são os instrumentos que protegem a matéria-prima da comunicação social. O seu mais importante instituto se situa, exatamente, na regulamentação da circulação das obras intelectuais, tanto do ponto de vista das prerrogativas não patrimoniais, como patrimoniais.

O ser humano como animal político, social ou sociável, torna inevitável e até mesmo inerente o contato com seu semelhante e graças à tecnologia das comunicações, levou-se ao reconhecimento de que a proteção dos direitos dos autores das obras intelectuais haveria de alcançar dimensões internacionais, porque a obra do espírito humano, sendo todo o seu conteúdo das comunicações sociais, tem inexorável vocação para difusão universal. Portanto, os Direitos Autorais, para atingir mais eficazmente seus objetivos, haveria de ser também internacionalizado, especialmente para estabelecer proteção eqüitativa entre os autores dos diversos países, a despeito das divergências das suas legislações nacionais. E aí surgiram as convenções internacionais, sendo pioneira a já centenária Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas, de 9 de setembro de 1896, da qual o Brasil faz parte desde 18.1.1954, quando o Decreto n.º 34.954 promulgou o Decreto Legislativo n.º 59, de 19.11.1951, que a havia aprovado, conforme texto revisto em Bruxelas, em 26.6.1948. A Convenção de Berna, como é mais conhecida, faz parte, assim, do direito positivo brasileiro, sendo que, atualmente, o texto aplicável é o Ato de Paris, de 1971 (última revisão da Convenção de Berna), cujo texto foi aprovado pelo Decreto Legislativo n.º 94, de 4.12.1974 e promulgado pelo Decreto n.º 75.699, de 6.5.1975.

No Brasil os Direitos Autorais atingiram o nível constitucional com a Carta Magna de 1891, conforme o § 26, do art. 72 da Constituição Federal, nos seguintes termos: Aos autores de obras literárias e artísticas é garantido o direito exclusivo de reproduzi-las pela imprensa ou por qualquer outro processo mecânico. Os herdeiros dos autores gozarão desse direito pelo tempo que a lei determinar. Essa Lei foi publicada cinco ano após, sob o n.º 496, em 1º de agosto de 1896. Comentando, a referida Lei, entende Eduardo J. Vieira Manso:

Graças aos esforços de Medeiros de Albuquerque foi retrógrada em vários aspectos, em relação ao direito autoral europeu, principalmente porque exigia o registro da obra, como condição de sua protegibilidade, e conferia sua proteção apenas por 50 anos contados da primeira publicação. [2]

A Lei Medeiros de Albuquerque vigeu até o advento do Código Civil, em janeiro de 1917. A perda de sua autonomia legislativa atrasou o desenvolvimento científico dos Direitos Autorais, no Brasil. Haja vista, mesmo com o advento da Lei de Direitos Autorais n.º 5.988, de 14 de dezembro de 1973, a jurisprudência continuou aplicando os preceitos do Código Civil, somente com a atualização dada pela Lei n.º 9.610 de 19 de fevereiro de 1998, houve a completa desvinculação com as normas do Direito Civil, pois esta Lei veio ao encontro de inadiável modernização, fruto da vertiginosa corrida tecnológica das suas últimas décadas, e aprecia corretamente os novos e plúrimos problemas derivados das eras digital e da informática neste final de milênio. [3] A interpretação que deve prevalecer é a de que se aplica como Lei básica, sobre Direitos Autorais, a n.º 9.610/98, respeitadas as disposições com ela conciliáveis. [4]

 

2. Natureza do direito de autor: princípios e teorias

 

O Direito Autoral é um ramo do direito privado que regula as relações jurídicas que podem ocorrer entre o autor de uma obra intelectual e outras pessoas interessadas em tirar proveito dela. Uma obra intelectual pode despertar duas ordens de interesses, em geral: interesses culturais, simplesmente, e interesses econômicos. A obra intelectual tem como finalidade principal atender a um interesse cultural seja de ordem estética, seja de ordem técnica, didática, científica, religiosa e outras dessa natureza. No entanto, ao atender a essa finalidade, opera-se, também, uma atividade econômica, mediante a exploração comercial da obra, distribuídos por dois grupos de processos, a saber, os de representação e os de reprodução da obra, como, por exemplo, para as músicas, os direitos de fixação gráfica, de gravação, de inserção em fita, de inserção em filme, de execução e outras. [5]

Como essa exploração econômica da obra intelectual foi o elemento que, preponderantemente, despertou a preocupação dos legisladores a respeito da regulamentação do Direito Autoral, e como a obra nasce em razão de uma produção intelectual de seu autor, existindo, assim, naturalmente, no seu patrimônio, sua classificação, nas primeiras leis que o proclamaram, foi como “propriedade” ou direito real, eis que seu objeto era uma coisa, posto que incorpórea, imaterial.

No entanto, essa coisa criada pelo intelecto, pelo espírito ou engenho humano não é da mesma natureza que as demais coisas que ao Direito interessam, como objetos de direito da propriedade. [6] A partir de especulações filosóficas, nasceu uma preocupação cada vez mais clara, não com o aspecto imaterial da obra intelectual (abstração feita do seu veículo de comunicação, como é o disco), mas com referência ao fato de ser ela “intelectual e, assim, não ter implicação alguma com a matéria, mas simplesmente, com a forma de expressão, o que decorreria, diretamente, da própria personalidade do autor, como se fosse verdadeira emanação dela.

A partir daí, o Direito Autoral inclinou-se para proteger a própria obra, muito mais do que seu autor, para resguardar a atividade estritamente pessoal deste, motivo por que houve inúmeras manifestações doutrinárias, qualificando esse direito como um novo Direito da Personalidade, equiparável ao direito sobre a própria imagem, ao direito à honra, ao nome e aos demais atributos da personalidade.

Entretanto, devido à diversidade de elementos estruturais e fatores intrínsecos ao Direito Autoral é que vem sendo considerado como um direito sui generis.

São direitos de cunho intelectual, que realizam a defesa dos vínculos, tanto pessoais, quanto patrimoniais, do autor com sua obra, de índole especial, própria, ou sui generis, a justificar a regência específica que recebem nos ordenamentos jurídicos do mundo atual. [7]

Atualmente, o Direito Autoral participa de uma nova categoria de Direito, classificado segundo seu objeto, que é da mesma natureza que o de muitos outros direitos congêneres: o Direito Autoral é um Direito Intelectual, porque seu objeto é um bem intelectual, da mesma maneira que são bens intelectuais a invenção, a marca entre outros. O Direito Intelectual é o gênero do qual são espécies os Direitos Autorais e o Direito Industrial:

Tendo a mesma natureza o mesmo objeto, i.e., criação intelectual, e o mesmo fundamento filosófico, além de possuírem acentuada afinidade econômico-jurídica e apresentarem inúmeros pontos de contato, esses direitos formam uma disciplina jurídica autônoma, cuja unidade doutrinária e científica repousa na identidade dos princípios que regem seus diversos institutos. [8]

Devido a este seu caráter peculiar de Direito Intelectual, um todo indiviso de direitos patrimoniais e direitos pessoais, bem como, ao seu aspecto imaterialidade, é que vem a jurisprudência pátria decidindo não ser cabível a proteção dos Direitos Autorais por meio de interdito proibitório, dada a sua impossibilidade do exercício da posse sobre coisas incorpóreas, tanto que, já existe Súmula do Superior Tribunal de Justiça a respeito:

Súmula n.º 228 do STJ: É inadmissível o interdito proibitório para a proteção do direito autoral.

 

3.    Direitos morais e patrimoniais

 

Há duas classes de direitos autorais, reconhecidos pela doutrina em geral há muito tempo, mas que foram incluídos na legislação brasileira apenas com o advento da Lei n.º 5.988, em 1973, e recepcionadas pela Lei de Direitos Autorais, Lei n.º 9.610/98: os direitos morais e os direitos patrimoniais. [9]

Por direito moral, entende-se o feixe de prerrogativas que tendem, primordialmente, a defender a personalidade do autor e à própria obra em si mesma. Aponta Eduardo Manso que há até quem diga que o direito moral é um direito da personalidade, equiparando-o ao direito à identidade civil, ao direito à imagem, à honra, etc. [10] . Chama-se moral, porque, de regra, ele é irredutível a um valor patrimonial. Por isso é que se diz, e a lei confirma, os direitos morais são inalienáveis, assim como também são irrenunciáveis.

Por direitos patrimoniais, ao contrário, entende-se o conjunto de prerrogativas que permitem ao seu titular a utilização econômica da obra intelectual. Mediante o exercício de um direito patrimonial, o titular pode tirar dela algum proveito econômico, de conformidade com sua natureza e com a modalidade de sua exploração comercial.

Em espécie, são estes alguns dos direitos morais, que, todavia não se esgotam nesta relação meramente exemplificativa, parte dos quais tipificados no art. 24 da lei n.º 9.610/98:

a) O direito à paternidade, ou seja, o direito de ser reconhecido como autor da obra intelectual, implicando o direito de ter seu nome ligado à obra e aos exemplares em que venha a ser reproduzida, salvo a manifestação expressa do desejo de que ela seja publicada anonimamente, ou sob pseudônimo;

b) O direito de conservar a obra inédita, faculdade que, do ponto de vista positivo, implica o direito de publicar a obra, que, dado seu caráter nitidamente econômico, é um dos direitos patrimoniais;

c) O direito de definir a forma final da obra, o que envolve o direito de manter essa forma assim definida, impedindo qualquer alteração prejudicial a ela;

d) O direito ao renome autoral, ou seja, o direito de defender-se contra qualquer ato que possa prejudicar sua reputação ou sua honra, como produtor intelectual;

e) O direito de modificação da obra, em qualquer tempo, desde que respeitados os direitos adquiridos por seus co-contratantes;

f) O direito de publicar sua obra anonimamente, ou sob pseudônimo, ou qualquer sinal convencional, sem que isso implique a obrigação de manter-se anônimo ou ocultado por outros nomes definitivamente, porque poderá dar-se a conhecer em qualquer oportunidade, também respeitando direitos adquiridos;

g) O direito de arrependimento, ou direito de retrato, que autoriza o autor a retirar sua obra de circulação, bem como o de suspender-lhe qualquer forma de utilização já iniciada ou simplesmente autorizada, desde que responda pelos danos que essa decisão causar a terceiros.

Os direitos patrimoniais são o de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica. A utilização econômica da obra intelectual depende do estado da técnica, porque é o desenvolvimento tecnológico que possibilita as mais variadas modalidades de sua exploração econômica, cujo ponto de partida foi o aprimoramento da imprensa.

Nenhuma modalidade de utilização das obras intelectuais pode ser explorada sem autorização do autor, ou dos seus sucessores. Nisso consiste, basicamente, o seu direito patrimonial. Sempre que uma nova invenção possibilite a comunicação pública da obra intelectual, seja mediante a fabricação de novos exemplares, seja mediante sua apresentação direta, essa faculdade de utilizá-la competirá, exclusivamente, ao autor, ou aos seus sucessores, enquanto a obra não cair no domínio público.

 

Limitação no tempo

 

A obra intelectual, conquanto deva ser o resultado de uma atividade pessoal de seu autor, como condição de sua proteção pelo Direito, pois nisso consiste sua originalidade, não é, em verdade, fruto de uma atuação exclusivamente individual. Ela é sempre produto do autor em função do seu meio social.

Ora, se o autor de uma obra intelectual retira da própria sociedade a matéria-prima de sua criação, que não passa de uma transformação devida ao seu talento pessoal, nada mais natural que a exploração econômica desse bem lhe seja reservada apenas por um certo período de tempo, a fim de que, expirado esse prazo, os proveitos da mesma exploração possam reverter em benefício daquele fundo comum que o municiou.

Por isso é que em todos os países que legislaram sobre Direitos Autorais a exclusividade que se confere aos autores das obras intelectuais tem duração limitada no tempo, variando essa duração de país para país. Bom lembrar que apenas os direitos patrimoniais caem em domínio público, já os morais são inalienáveis e eternos.

No Brasil, os direitos patrimoniais do autor duram por toda sua vida e perduram por 70 (setenta) anos, nas mãos dos herdeiros e sucessores [11] contados do dia 1º de janeiro do ano subseqüente ao da morte do autor.

Se a obra for em colaboração, ou em co-autoria, como diz a Lei de Direitos Autorais, e não for divisível, ou seja, não puder ser utilizada separadamente das demais partes (como, no caso da letra ser de um autor e a música de outro), o prazo da proteção contar-se-á da morte do último dos co-autores. E se algum dos co-autores falecer sem deixar herdeiro que o suceda no direito autoral, sua parte será acrescida à dos demais.

A proteção dos direitos autorais relativos às obras publicadas depois da morte do autor (obras póstumas, conforme definição do inciso VII, alínea e, do art. 5.º, da Lei n.º 9.610/98) será contada da mesma maneira que seria se a obra tivesse sido publicada em vida do autor. Logo, se a publicação for feita por um parente do autor, que encontre a obra, muitos anos depois da morte daquele, não sendo vivo nenhum dos seus herdeiros para direitos autorais, aquela obra cairá desde essa primeira publicação no domínio público.

Opina Eduardo Manso:

Isso, sem dúvida, não tem nenhum sentido, nem justificação jurídica, e comete enorme injustiça para com aquele parente zeloso que, no mínimo, teve o trabalho de conservar a obra e dá-la a lume. Seria mais justo que nesse particular o Brasil aderisse ao critério das demais nações, que contam o prazo da proteção das obras póstumas da data de sua primeira publicação, em favor daquele que a tenha providenciado, mesmo que não seja parente do autor. A legislação autoral tem como primeiro e mais indispensável objetivo o favorecimento da cultura, que não será atingido com normas como esta, que até favorece a fraude: aquele sobrinho, do exemplo acima, poderá publicar a obra do tio, como se fosse seu, para não cair desde logo no domínio público. [12]

As obras anônimas e as pseudônimas geram direitos exclusivos por 70 anos, contados da primeira publicação e tais direitos são administrados por quem tenha sido o responsável por essa publicação inicial. Se, porém, antes de vencido este prazo, o autor se der a conhecer publicamente como o criador daquelas obras antes publicadas anônimas ou pseudonimamente, o prazo de proteção será contado de acordo com a regra geral. A revelação do nome daquele, não altera o estado de obra anônima ou pseudônima.

A Lei n.º 9.610/98 omitiu, porém, o prazo de duração da exclusividade sobre as obras coletivas, que, nem por isso, geram direitos perpétuos. A obra coletiva é de autoria e da titularidade original da pessoa que a organiza e explora em seu nome, o que permite ser ela originalmente atribuída à autoria e à titularidade de uma pessoa jurídica. Portanto, o marco do início do prazo de decadência do direito autoral, para que cesse a proteção e a obra caia no domínio público, não pode ser a morte do autor, já que o autor da obra coletiva, sendo pessoa jurídica, não morre, exatamente. Os atos que põem fim à existência de uma pessoa jurídica não podem corresponder à morte da pessoa natural, mesmo porque uma pessoa jurídica pode desaparecer sem que sua atividade empresarial desapareça, e o seu patrimônio pode, simplesmente, ser transferido de uma para outra pessoa.

O que justifica a qualificação de uma pessoa jurídica como autora da obra coletiva é justamente o fato de não ser possível atribuir-se à autoria de tal obra a uma ou algumas das pessoas naturais determinadas que efetivamente a criaram. Por isso, rigorosamente, quanto à autoria de fato, a obra coletiva é sempre anônima, já que não ostenta o nome dos seus reais autores. Nada mais natural, portanto, que esse mesmo fato, que beneficia a pessoa jurídica com a qualidade de autor da obra coletiva, também seja utilizado para permitir uma interpretação compreensiva da regra definidora do prazo de proteção das obras anônimas para, entre estas, considerar aquela.

Portanto, a proteção dos direitos autorais sobre a obra coletiva, por revelar uma especial anonímia, conta-se, como no caso das obras anônimas, da primeira publicação e perdura por 70 anos desde então.

Terminado o prazo de proteção, ou seja, expirado o prazo durante o qual o país oferece exclusividade para a utilização econômica das obras intelectuais protegidas pelo Direito Autoral, estas caem no domínio público. Isso significa, concretamente, que se opera a decadência, ou caducidade, daquela exclusividade. Todos os que quiserem poderão, livremente, explorar aquelas obras intelectuais, sem nenhuma necessidade de autorização dos que tinham sido, até então, os titulares do direito exclusivo de utilizá-las economicamente.

No Brasil, segundo a atual Lei de Direitos Autorais, há quatro circunstâncias em que uma obra intelectual, suscetível de ser protegida pelo Direito Autoral, não é mais geradora dos direitos exclusivos de utilização econômica:

I - quando decorreu o prazo de proteção, 70 anos, contados da morte do autor;

II - quando o autor falece, sem deixar herdeiro nem sucessor de outra espécie, porque o Estado, no Brasil, não herda direitos autorais, como herda outros bens, no caso de herança vacante não reclamada dentro de cinco anos da abertura da sucessão;

III - quando se tratar de obra folclórica, ou que não tenha autor conhecido e seja transmitida pela tradição oral;

IV - quando a obra tenha como país de origem, isto é, de sua primeira publicação, um que não participe de tratado ou convenção internacional de que o Brasil faça parte, ou se não conferir, aos autores da obras publicadas no Brasil pela primeira vez, o mesmo tratamento que dispensa aos autores sob sua jurisdição. [13]

 

Direitos conexos

 

No Brasil, o art. 1.º da Lei n.º 9.610/98 considera como “direitos autorais” não apenas os direitos subjetivos dos autores, mas também os direitos que lhes são conexos. Estes são os direitos dos artistas intérpretes (cantores), executantes (músicos), dos produtores de fonogramas e videofonogramas, dos organismos de radiodifusão [14] . Compreendem as pessoas que representam, recitam, declamam obras intelectuais, nos termos da Convenção de Roma e no plano empresarial, basicamente, as realizações de irradiações, emissões, fixações e produção de discos e de fitas.

Entende-se que, na conexão, há criações de espírito sobre outras já existentes, materializadas, ou mesmo fixadas, por meio de formas novas próprias, em que aqueles ganham vidas autônomas e personalizadas, seja pelo trabalho de arte, seja pela coordenação e pela direção da criação.

Já Nehemias Gueiros Jr. entende que:

 Pelo entendimento jurídico brasileiro predominante, o direito do intérprete/executante é exclusivo, novo, e pode ser invocado até mesmo contra o autor da obra original. A nova roupagem que o intérprete/executante dá à obra primígena é protegida e garante a ele o seu quinhão de remuneração quando comercialmente comunicada ao público [15] .

Conclui Bittar que:

 “Nas estruturas dos direitos conexos, como decorrentes de direitos anteriores de autor – pois incidem sobre criações existentes e comunicadas, ao menos, ao interessado -, há que se atender, de início, para a necessidade de autorização autoral para a nova forma, sempre que realizada a utilização econômica, assim, a empresa deve ter a autorização do autor para irradiação, sempre com respeito à textura e a integridade da criação original.”·

As jurisprudências de nossos Tribunais vêm aceitando a possibilidade do compositor permitir (ou ceder), o uso de suas criações (composições), por intérpretes ou executantes, para que estes possam criar as suas próprias obras (porém derivadas):

Compositor que permite que outro escreva combinações ou variações sobre os motivos de sua obra musical. Restrições nessa autorização. (RT – 91/292)

Composição musical. Reprodução do trabalho. Autorização pelo compositor, porém sem supressão do nome do autor do texto poético. (RT – 105/586)

Outra particularidade dos direitos conexos refere-se à sua duração, estabelecendo a Lei de Direitos Autorais que é de 70 (setenta) anos o prazo de proteção, contado de primeiro de janeiro do ano subseqüente à fixação, para os fonogramas; à transmissão, para as emissões das empresas de radiodifusão; e à realização de espetáculos, para os demais casos.

 

6. Sanções

 

É possível sistematizar as violações possíveis de direito autoral em três tipos: primeiro, as que ofendem o direito moral do autor ser considerado o criador da obra intelectual, ou seja, as violações ao direito à paternidade; depois as que atingem a estrutura da obra, em si mesma, como são o plágio [16] e a reprodução fraudulenta [17] , e, por último, as que afrontam o direito de utilização econômica da obra.

No primeiro grupo de violações, podem ocorrer as seguintes espécies: omissão do nome do autor na publicação da obra; alteração desse nome, ou sua usurpação.

No segundo grupo, a ofensa é dirigida à integridade da obra intelectual e pode consistir em sua modificação ou alteração não autorizadas, como, por exemplo, na sua redução a resumos, a adaptação para outra modalidade de utilização.

No terceiro grupo, a violação ocorre com o ato da publicação desautorizada da obra, fora dos casos em que a própria lei a permite independentemente de autorização do titular do respectivo direito (casos de citação, ou de cópia para uso pessoal, ou informação jornalística, etc.) [18] , sendo a mais grave violação desta espécie a que consiste no rompimento do inédito, desautorizadamente.

Para punir essas violações aos direitos autorais, o sistema de direito positivo brasileiro contempla três classes de sanções: administrativas, penais e civis.

Sanções administrativas são aquelas que se aplicam através de atos das autoridades administrativas, sem interferência dos órgãos que integram o Poder Judiciário. Atua nesse sentido, por exemplo, o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição – ECAD.

Sanções penais são aquelas que se aplicam, depois de um processo jurisdicional regularmente conduzido por juiz competente, em que tenha sido garantido o amplo direito de defesa do réu, mediante a execução de sentença criminal transitada em julgado. Recentemente veio a lume a Lei n.º 10.695 de 01 de julho de 2003, aumentando a pena do Artigo 184, modificando seus parágrafos e acrescentando § 4º ao mesmo dispositivo do Código Penal Brasileiro.

Sanções civis são aquelas que decorrem de uma sentença pronunciada por juiz cível, em processo regularmente desenvolvido no juízo cível, depois de transitada em julgado.

 

VI – CONCLUSÕES

 

1. Síntese sobre Direitos Autorais

 

A lei n.º 9.610/98 é boa, pois atualiza, protege as obras musicais, nos modernos meios de comunicação e novas tecnologias.

A regulamentação autoral está permanentemente sendo atualizada, inclusive pela OMPI, por meio de seus dois últimos tratados.

Quanto à natureza chegou-se a uma conclusão de que os direitos autorais não podem ser considerados nem exclusivamente direitos reais, nem direitos personalíssimos, mas sim a união indissolúvel dos dois, formando um direito chamado pelos doutrinadores de sui generis, espécie de Direito Intelectual, assim como o Direito Industrial.

  A Lei n.º 9.610/98 aumentou o prazo para a obra cair no domínio público – para 70 anos, retribuindo este privilégio aos criadores, pelo seu labor intelectual, porém assegurando o direito da coletividade de ter acesso a obra musical sem necessitar remunerar o seu criador, depois desses 70 anos.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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_____________ Direito de Autor. Rio de Janeiro: Forense, 1987, p.538.

COSTA NETTO, José Carlos. Os direitos de autor e os que lhes são conexos na obra musical. Dissertação de mestrado da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo: não publicada, 1985.

DINIZ, Maria Helena. Tratado teórico e prático dos contratos. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.

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GANDELMAN, Henrique. De Gutemberg à Internet. Direito autoral na era digital. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 1997.

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GUEIROS JÚNIOR, Nehemias. O direito autoral no show business. A música. Rio de Janeiro: Gryfhus, 1999. 610 p.

MANSO, Eduardo J. Vieira. O que é Direito Autoral. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1992, 96 p.

MORAES, Walter. Artistas, intérpretes e executantes. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1976.

PEREIRA DOS SANTOS, Manoel Joaquim. Direito de Autor na obra jornalística gráfica. São Paulo: RT, 1981.

 

OLÍVO, Luís Carlos Cancellier de. Direito e Internet: a regulamentação do ciberespaço, 2. ed. Florianópolis: UFSC, 1999. 170 p.

 

Direito Autoral. SÉRIE JURISPRUDÊNCIA. 2. ed. Rio de Janeiro: Esplanada, 1997.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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[1] GUEIROS JÚNIOR, Nehemias. O direito autoral no show business: A música. Rio de Janeiro:   Gryphus, 1999, 636 p. p. 29.

[2] MANSO, Eduardo J. Vieira. O que é direito autoral. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1992. 92 p. (qual a página?)

[3] GUEIROS JÚNIOR, Nehemias. Ibidem, p. 32.

[4] Súmulas 63 e 228 do STJ, que dizem respectivamente: Ë inadmissível o interdito proibitório para a proteção do direito autoral; Portaria n.º 205/97 do Ministério da Cultura, que aprova o regulamento do programa de apoio ao Circo, Música e Edição de livro; Lei de n.º 4.944/66, que regula as atividades de artistas e intérpretes; dentre outras normas.

[5] BITTAR, Carlos Alberto. Direito de autor. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1992. 176 p. (saber o número da página)

[6] MANSO Eduardo J. Vieira. Ibidem, p. 39.

[7]   BITTAR, Carlos Alberto. ibidem, p. 91.

[8] CERQUEIRA, João da Gama. Tratado da propriedade industrial. Rio de Janeiro: Forense, 1946, p. 103.

[9] O Superior Tribunal de Justiça vem incorporando a necessidade de defesa dos Direitos Autorais: “Direito Autoral. O autor de obra intelectual é titular de direitos morais e patrimoniais. Depende de autorização qualquer forma de utilização de sua obra. Ocorrendo ofensa a ambos os direitos, cumulam-se as indenizações. Caso em que se reconheceu, também, a cessão de direitos patrimoniais. Recurso Especial, por isso, conhecido e provido, em parte.” (STJ, Resp. n.º 13.575- SP, Rel. Min. Nilson Naves, DJ 31/8/92)

[10] MANSO, Eduardo J. Vieira. Ibidem, p. 52.

[11] Prazo de 70 anos dado pela Lei de Direitos Autorais, Lei n.º 9.610/98, como forma de integração das legislações mundiais, promovida pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual.

[12] MANSO, Eduardo J. Vieira. Ibidem, p.73

[13] MANSO, Eduardo J. Vieira. Op. Cit. p. 82.

[14] Regulados em nosso país pela Lei n.º 4.944, de 5 de maio de 1966.

[15] GUEIROS JÚNIOR, Nehemias. Ibidem, p. 54.

[16] A prova pericial, da maior importância para a formação do convencimento do Julgador, mor das vezes não versado na matéria de que se trata, como no caso de plágio musical, por prudência e sabedoria do legislador, impõe a observância de regras dispostas na lei adjetiva. Assim, se a prova produzida, de natureza técnica, é fragorosamente robusta, a conclusão, que proclama comprovado o plágio, apresenta-se com fundamento judiciosa, de incensurável certeza para condenar os réus solidariamente – cantores e gravadora – ao pagamento de danos morais, perdas e danos, pena pecuniária para o caso de continuarem a violação da obra e honorários advocatícios. (TJRJ, Ap. Cív. 6.517/93, Rel. Des. Itamar Barbalho, j. 21.9.94)

[17] O plágio e contrafação são duas figuras tão correlatas que não é possível cuidar de uma sem se referir à outra. Enquanto que a contrafação indica tanto o aproveitamento econômico ilícito, escancarado, como a reprodução fraudulenta da obra alheia tal qual, sem preocupação de esconder a paternidade dela, cuidando apenas de retirar os proventos econômicos que de direito caberiam ao autor, o plágio é mais sutil: apresenta o trabalho alheio como próprio, mediante aproveitamento disfarçado, mascarado, diluído, oblíquo, de frases de idéias, personagens, situações, roteiros e demais elementos da criação alheias. (TJRJ, Ap. Cív. 612/91, rel. Des. Carpena Amorim, j. 2.12.94)

[18] A lei não proíbe meras transcrições ou citações de obras alheias, uma vez que não afetam economicamente o autor e fazem com que sua obra seja difundida e valorizada, desde que haja, obviamente, indicação da origem e do nome do autor, devendo Ter, ainda, a obra que as inclui caráter científico, didático ou religioso. (TJSP, Ap. Cív. 178.064-1/0, Rel. Villa da Costa, j. 24.11.92)

 

Fonte:http://www.apriori.com.br/artigos/prelo/205121725.htm