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Relação tormentosa
Veja os problemas mais comuns entre marcas e domínios
Thiago Pédico Saragiotto*
Tradicionalmente, as empresas sempre
se preocuparam em registrar suas marcas perante o INPI. O rápido
desenvolvimento da Internet, porém, sobretudo em seu aspecto comercial,
trouxe à tona nova preocupação: a necessidade de se
registrar o domínio a ser utilizado na rede.
A legislação brasileira ainda não regulamentou de
modo satisfatório a exata relação entre os registros
de marca e domínio, de forma que reina atualmente certa celeuma
quanto à matéria.
Antes de adentrarmos o cerne da questão que nos propomos trabalhar,
cumpre façamos algumas breves explanações, que certamente
contribuirão para a elucidação do assunto.
Do INPI e o registro de marcas
O Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), criado em 1970,
é uma Autarquia vinculada ao Ministério da Indústria,
do Comércio e do Turismo. Tem por finalidade principal, segundo
a Lei 9.279/96 (Lei de Propriedade Industrial), executar, no âmbito
nacional, as normas que regulam a propriedade industrial, manifestando-se
ainda quanto à conveniência de assinatura, ratificação
e denúncia de convenções, tratados, convênios
e acordos sobre propriedade industrial.
O INPI veio também somar às suas atividades regulares, além
da concessão de marcas e patentes, a incumbência de averbação
dos contratos de transferência de tecnologia, contratos de franquia
empresarial, registro de programas de computador, registro de desenho industrial
e de indicações geográficas.
Marca
Marca, segundo a lei brasileira e conforme destacado no próprio
site do INPI, é todo sinal distintivo, visualmente perceptível,
que identifica e distingue produtos e serviços de outros análogos,
de procedência diversa, bem com certifica a conformidade dos mesmos
com determinadas normas ou especificações técnicas.
A marca registrada garante ao seu titular a propriedade e o uso exclusivo
em todo o território nacional, por dez anos (prorrogáveis
por igual período), estando protegida somente na classe em que estiver
registrada (exceção feita à chamada Marca de Alto
Renome, que tem proteção assegurada em todas as classes).
Da Fapesp e o registro de domínio
A Portaria Interministerial MC/MCT nº 147 criou o Comitê Gestor
Internet do Brasil, que delegou à FAPESP (Fundação
de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) as funções
de registro de nomes de domínio.
O Comitê Gestor Internet do Brasil fornece informações
e serviços necessários para o registro de nomes de domínio
e a atribuição de endereços IP (Internet Protocol).
As regras de funcionamento do registro dos nomes de domínio foram
estabelecidas na Resolução n.º 001/98, promulgada pelo
Comitê em 15 de abril de 1998. O princípio fundamental desta
Resolução pode ser encontrado em seu artigo 1º, que
concede o direito ao nome de domínio àquele que primeiro
o requerer.
Domínio
Através do nome de domínio, pode-se localizar e identificar
conjuntos de computadores na Internet. O nome de domínio, no Brasil,
constitui-se dos seguintes elementos:
* www...(world wide web) - rede mundial de computadores;
* nome - domínio de 2º nível - identifica a pessoa;
* .com - domínio de 1º nível - identifica a destinação
da entidade;
* .br - identifica o país.
Os domínios de primeiro nível atualmente existentes no Brasil
são divididos em três categorias:
* Para instituições (exemplos: .org - organizações
não-governamentais, .net - de telecomunicação, .gov
- órgãos governamentais);
* Para profissionais liberais (exemplos: .adv - advogados, .arq - arquitetos);
* Pessoas físicas (.nom).
Qualquer pessoa física ou jurídica (legalmente estabelecida
no Brasil, e que possua um contato em território nacional) tem o
direito de registrar um domínio. Lembramos ademais que uma instituição
poderá registrar no máximo dez nomes de domínio, utilizando
um único CNPJ.
Dos conflitos: Marca x Domínio
Ao se registrar um nome de domínio, não é necessário
fazer qualquer prova quanto à titularidade da expressão que
se deseja empregar. Este fato tem gerado inúmeros conflitos entre
o nome de domínio e a marca registrada, na medida em que indivíduos
(com ou sem má-fé) registram domínios com o mesmo
nome de marcas detidas por terceiros.
Isto não ocorre somente quanto à marca, mas também
com relação ao nome empresarial, nome civil, títulos
e personagens de obras, e muitos outros, que são registrados como
domínios por terceiros não titulares de quaisquer direitos
sobre os nomes que utilizam. Os problemas mais comuns, entretanto, surgem
realmente no campo "Marca x Domínio".
Como a questão ainda não se encontra totalmente examinada
e resolvida no Brasil, aconselhamos que se proceda sempre ao registro da
marca e do nome de domínio em todos os casos.
Não obstante, quanto aos conflitos que ocorrerem, nossa opinião,
baseada na legislação nacional, na parca jurisprudência
existente e em manifestações de grandes juristas, é
a de que a marca deve ser protegida.
Parece-nos, assim, que o registro de nome de domínio idêntico
ou bastante similar ao de marca registrada e já divulgada no mercado
constitui violação ao direito de propriedade da marca, podendo-se
inclusive cogitar de crime de reprodução não autorizada,
tudo conforme os artigos 129 e 189 da Lei de Propriedade Industrial. Nesses
casos, entendemos deva prevalecer o direito do titular da marca atingida
em detrimento do registro de domínio efetivado.
Da mesma forma, goza de exclusividade (constitucionalmente garantida) o
nome empresarial, devendo receber proteção.
Lembramos, finalmente, que a Constituição Federal também
protege o nome civil das pessoas, bem como os títulos e personagens
de obras (direitos autorais).
Em todos esses casos, consideramos legalmente correto que somente os titulares
dos direitos mencionados possam registrar o nome de domínio respectivo.
Infelizmente, contudo, ainda não é o que acontece, restando
aos prejudicados buscarem a Justiça, como nos casos abaixo expostos,
exemplificativamente:
Questão Globo - Terceiros registraram os domínios globoesporte.com.br
e jornalnacional.com.br. Houve sentença cancelando os domínios,
em vista das marcas registradas da emissora.
Questão Ayrton Senna - Terceiros registraram o domínio ayrtonsenna.com.br.
Acórdão ordenou a transferência do domínio para
a Ayrton Senna Promoções e Empreendimentos.
Cumpre lembrar, finalmente, que o inverso do acima exposto também
deve valer: nomes de domínio notoriamente conhecidos não
devem ser registrados por terceiros como marcas ou nomes de empresas.
A problemática dos subnomes
Outro problema que se coloca diz respeito à necessidade ou não
de registro de nomes originados de outros já registrados (ex.: kpkflores,
oriundo da marca fictícia kpk).
Entendemos que referidos nomes devem ser igualmente registrados, como medida
preventiva.
O fato de ter a propriedade da marca que dá origem ao novo nome
poderia conferir, em certos casos, legitimidade ao titular para se opor
ao registro de marcas semelhantes, nos mesmos setores de atuação
atingidos pela 'marca-mãe'. O registro dos 'subnomes' pelo próprio
titular do nome, contudo, evitaria o surgimento de eventuais celeumas.
Com relação aos nomes de domínio, aconselhamos que
sejam registrados os 'subnomes' como sendo domínios de 2º nível
(ex.: www.kpkflores.com.br), ainda que a intenção seja a
de utilizá-los somente como diretórios (ex.: www.kpk.com.br/kpkflores).
Isto para se evitar que terceiros promovam o registro desses 'subnomes'
e passem a utilizá-los.
Cientes da complexidade que envolve os temas abordados, esperamos ter contribuído
para lançá-los em discussão, visto que ainda estão
a merecer debates mais amplos e melhores soluções legais.
Revista Consultor Jurídico, 23 de março de 2001.
Retirado de: www.direitoemdebate.cjb.net