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UMA ABORDAGEM DINÂMICA AOS CRIMES VIA INTERNET.
DIREITOS DIFUSOS, INSTRUMENTALIDADE E
ANTECIPAÇÃO PRÁTICA. PREVENÇÃO E
REPRESSÃO. INICIATIVAS NO
BRASIL E PRINCIPIOLOGIA.

Marcelo Baeta Miranda

 
 
                           INTRODUÇÃO: O EQUACIONAMENTO JURÍDICO

               A Internet, graças aos fatores ECONOMIA, VELOCIDADE e ANONIMATO, tem superado em
     preferência os demais meios de comunicação na esteira do fenômeno globalizante, expandindo-se vertiginosamente a
     cada dia, em todos os campos de utilização da vida moderna. A cada minuto, milhões de computadores interligam-se
     por meio das linhas telefônicas no mundo inteiro, fazendo circular bilhões e bilhões de informações que se traduzem em
     movimentação financeira, intercâmbio cultural e inter-relacionamento pessoal entre pessoas e instituições de todas as
     partes e das mais variadas culturas. Esta progressiva dependência, obviamente, está trazendo em seu rol uma série de
     reflexos no mundo jurídico, na medida em que vão surgindo questões ainda carentes de regulamentação que, de maneira
     poliédrica, tem desafiado doutrinadores dos variados campos das Ciências Humanas, que paradoxalmente vão buscar
     nos nichos tecnológicos respostas para muitas de suas dúvidas. Com efeito, é sumamente impossível dissociar tal
     aproximação, considerando-se até mesmo a característica das terminologias específicas de que se utilizam os usuários
     do computador, cujo jargão envolve freqüentemente procedimentos e tecnologias de ponta, essenciais para o pleno
     equacionamento de diversas questões a serem disciplinadas ou regulamentadas.

               Por outro lado, o ineditismo das circunstâncias em que ocorrem os contatos via Internet entre usuários na maior
     parte das vezes imersos no anonimato e que só se identificam formalmente em situações especificas, como também a
     diversidade dos locais em termos de distância física entre os que se conectam, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas,
     tem contribuído para tornar o tema complexo e controverso, do ponto de vista jurídico.

               Ora, como definir o que seja o "crime de Internet", ou o crime "via Internet"? Como amoldar as condutas
     delituosas que são eventualmente perpetradas entre computadores ou sistemas de processamento de dados ao direito
     vigente em diversas partes do mundo? Que espécie de infração temos quando o uso pacífico do computador é
     desvirtuado para, com o apoio da tecnologia causar dano a outras pessoas físicas ou jurídicas, seja pela apropriação de
     dados remotos ou por sua utilização para obter vantagens ilícitas? Como obter e consolidar provas que possam instruir
     inquéritos policiais ou processos judiciais em que fiquem bem definidos e apurados a localização do agente, sua plena
     identificação, os meios empregados, os objetivos, os resultados, efeitos dos resultados, bem como outros elementos
     indispensáveis à aplicação do Direito, tais como a questão da territorialidade e competência? Pode-se falar em crime,
     sem prévia cominação legal?

               Como se pode notar, embora nos encontremos em uma encruzilhada jurídica, pela dificuldade de delimitar o
     verdadeiro sentido e alcance das normas jurídicas eventualmente aplicáveis a esse vasto campo que se abre com a
     utilização da Internet, o fato é que as iniciativas individuais no sentido de coibir os comportamentos daninhos já se fazem
     sentir. Com efeito, a par do incipiente equacionamento legal do tema, as medidas preventivas e repressivas das
     distorções do uso socialmente saudável da Internet caminham independentes e já surtem efeitos. Por iniciativa de vários
     grupos, tais esforços servirão de base para que este direito difuso internacional, que hoje dissolve todas as barreiras
     tradicionais, possa se firmar amoldando-se, se não em leis, pelo menos em princípios.

               É perceptível que as sociedades e as instituições não têm ficado inertes a esse fenômeno, na medida em que criam
     constantemente mecanismos formais ou informais de proteção que em última análise configuram o desiderato jurídico de
     segurança, senão o desejado, ao menos o possível. O uso de programas de proteção individual ou de sistemas, a
     disseminação de senhas, os softwares anti-vírus , rastreadores e identificadores de tentativas de invasão eletrônica, entre
     outras providências, despontam como precursores de um disciplinamento que se auto-alimenta na exata medida da
     proliferação do uso, em virtude da necessidade de garantir a viabilidade permanente desse meio de comunicação.

               Esse verdadeiro sistema de freios e contrapesos, embora não satisfaça totalmente as necessidades de segurança
     total, o que consideramos impossível, tem servido como reação social em situações em que a vulnerabilidade poderia
     gerar efeitos nefastos à credibilidade de sistemas vitais para o equilíbrio social. Por outro lado, a tecnologia muitas vezes
     se apresenta como desafio para cérebros privilegiados e nem sempre criminosos do ponto de vista usual, o que em certa
     medida é saudável se vista como reação à dependência total a uma tecnologia dominante e manipuladora. Com efeito,
     muitos dos chamados "hackers" nada mais são que impulsionadores desta mesma segurança que procuram superar,
     servindo às vezes de "consultores" a empresas e governos. O mesmo já não ocorre com o sociopata anônimo, cujos
     atos beiram o terrorismo e se caracterizam pela sabotagem ou pelo ganho ilícito. Sem contar os que se utilizam da
     Internet como biblioteca do crime, difundindo práticas criminosas, na medida em que são disponibilizados, ao alcance de
     qualquer pessoa medianamente equipada, meios para a prática de ilícitos, por iniciativa de alguns e conivência de outros
     que pregam uma "liberdade total" na Web . As múltiplas fraudes, a veiculação de pornografia infantil, entre outros, tem
     merecido um combate constante por parte de vários governos, em virtude de acordos políticos firmados no cenário
     internacional, com total apoio da maioria dos que apostam na sedimentação do comércio eletrônico.

               Neste ponto, percebe-se a tendência a preferir providências saneadoras mais céleres do que os emperrados
     mecanismos burocráticos tradicionais.

               Cremos que este direito criminal em particular, de existência fática incontestável e que hoje atua de maneira
     costumeira, não admite soluções genéricas e simplistas, a ponto de ficar refém de normas estáticas. O sistema de
     codificação de normas e procedimentos se mostra impotente para atender o dinamismo que caracteriza o tema,
     cambiante por sua natureza tecnológica, a ponto de qualquer tentativa sistematizadora muitas vezes se tornar obsoleta e
     inócua em curto espaço de tempo. Nesse sentido, a necessidade de um direito também dinâmico, em nome da
     instrumentalidade da justiça, tem provado ser o meio mais eficaz de proporcionar respostas rápidas e contundentes. As
     iniciativas de alguns Juizes sintonizados com os novos tempos têm mostrado que a perspicácia, aliada à coragem e
     presença de espírito, preenchendo as lacunas legais em consonância com os princípios gerais do Direito e a analogia,
     seguindo de perto os novos costumes, têm sido estimulantes e pioneiras. Trata-se de uma verdadeira revolução de
     modo a libertar o Direito de fórmulas medievais e a lentidão de solicitações internacionais, como por exemplo as
     lentíssimas cartas rogatórias que só favorecem a impunidade ou viabilizam o injusto, e cuja possibilidade depende da
     existência de tratados prévios entre os países envolvidos.

               A exemplo dos Juizados Especiais, é preciso tratar o tema dos "computer crimes" ou os crimes de Internet com
     mais liberdade de re-ação, num direito semi-costumeiro, menos atrelado à burocracia e mais em sintonia com as
     "computer-crime unities" que cada vez mais ganham espaço nos meios policiais modernos.

               Advogar o contrário seria ser leviano, e dessa vez é o Direito que tem que se amoldar à realidade "virtual" que
     impregnou nossas vidas. Acostumado a ser instrumento de adaptação social, antecipado-se aos fatos, o Direito corre o
     risco de ser atropelado por um "futuro" que aí está, presente, dentro de nossas casas e ao alcance dos dedos, mentes e
     espíritos de nossos filhos. As Cortes de Crimes de Informática ou Juizados Especiais de Informática são a forma mais
     racional de atender esses direitos difusos, cujo foro de situação é o ar que nos envolve e que nos permeia, sem
     fronteiras físicas.
 
 

                                         DIREITOS DIFUSOS:

               Cabe aqui fazer uma breve digressão principiológica , numa tentativa de situar os direitos eventualmente advindos
     do uso do "cyber-espaço", considerando "a priori" que os Princípios Jurídicos, em comparação às Regras Jurídicas, se
     constituem na concreção jurídica das aspirações políticas de uma dada sociedade, manifestando-se como vetores
     ideológicos que irão nortear os rumos de interpretação de todas as Normas Jurídicas. Considerando ainda que as
     Regras advindas concretizam as linhas mestras traçadas pelos Princípios, implementando-os em nível normativo. Ao
     implementar um determinado desiderato social, proporcionam opções ideológicas aos intérpretes num dado momento
     histórico e numa dada dimensão dimensão social. O mosaico principiológico obtido se reveste de especial ênfase no que
     tange aos direitos fundamentais, surgidos como defesa pioneira do cidadão contra o absolutismo ou combativos de uma
     total centralização do Poder. As idéias de liberdade e de igualdade então surgidas, e que inspiraram tanto iluministas
     como inconfidentes, mostraram-se insuficientes, contudo, em seu objetivo de proporcionar bem estar e prosperidade
     social, se abandonadas à mera ordem natural das coisas. Ora, tal pretensão mostrou-se falaciosa, diante do
     enfrentamento do Poder Econômico, e cedo se percebeu que as soluções individuais eram insuficientes para resolver as
     questões sociais, o que tornou necessário ampliar o espaço de compreensão dos princípios basilares gerando os
     chamados direitos coletivos, trazendo em seu rol uma nova leva de direitos fundamentais, que considera a sociedade
     como um todo e não apenas as soluções individuais. E é nesse sentido, finalmente , que vislumbramos os direitos
     advindos do uso pacífico das infovias como mais um direito difuso, na medida em que, a exemplo da defesa do
     consumidor e do meio ambiente, também atingem um grupo indeterminado e indeterminável de pessoas. Considerando
     que a solução individual e a coletiva são insuficientes para resolver juridicamente esta questão, consideramos necessário
     desenvolver mecanismos adequados para operacionalizar sua prevenção e seu ressarcimento.

               Acrescente-se à questão dos interesses difusos advindos do uso da Internet, e de tecnologias similares ainda por
     surgir, o conceito de gerações futuras e surgirá uma nova compreensão dos direitos fundamentais. Passam a ser
     considerados também os direitos dos que ainda não nasceram. E a dimensão da pessoa humana, assim considerada. é
     projetada no futuro, nos tornado a todos responsáveis por tal legado de toda uma futura geração de pessoas humanas.
     O uso pacífico e em sintonia com o desenvolvimento humano em todos os seus campos deve assim nortear todos os
     esforços jurídicos, políticos e técnicos que se façam no fórum mundial das nações, consagrando-se como PRINCÍPIOS
     basilares do uso difuso da Internet. A Constituição Federal , em seu art. 225 espelha situação semelhante, referindo-se
     ao meio ambiente, ao proclamar que "todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
     comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de
     defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações". Razão pela qual lesões a tais Direitos devem ser mais
     enérgica e celeremente reprimidos.

               Esta, nos parece, tem sido a tendência mundial de abordagem do tema, em que os crimes perpetrados via
     Internet atingem direitos difusos, e os mecanismos de prevenção e repressão exigem plena instrumentalidade processual.
 
 

                                 A INTERNET E OS CRIMES DIGITAIS:

               É incontestável o fato de que o incremento tecnológico tem trazido inúmeros benefícios, em especial pela
     utilização dos computadores aliada ao desenvolvimento das comunicações mundiais, encontrando na Rede Internacional
     de Dados – Internet, um fomento sem precedentes na História à paixão humana pelo conhecimento, educação e cultura.
     Denominada pela mídia como Superestrada da Informação, a Internet nada mais é do que a interligação simultânea de
     computadores de todo o planeta, algo que os futuristas em seus mais exaltados exercícios de suposição jamais puderam
     imaginar. Contudo, homens como McLuhan visualizaram o mundo como uma Aldeia Global e Alvin Tofler, em
     "Powershift", já ressaltava que o acesso à informação sempre foi muito valorizado, constituindo verdadeira forma e fonte
     de poder, sendo seu controle verdadeiro patrimônio econômico, político e cultural.

               Entretanto, nem tudo são rosas nesse mundo digitalizado, e ao lado dos benefícios surgiram os crimes e os
     criminosos digitais, proliferando-se na mesma razão por todo o mundo, sendo que mesmo as mais otimistas previsões
     apontam para um epidêmico e exponencial crescimento. Tais crimes, também chamados de crimes digitais ou
     transnacionais, podem afetar dezenas de países, sem que o agressor sequer saia de sua casa, mesmo estando em outro
     extremo do planeta.

               Esta peculiaridade tem preocupado e chamado a atenção das polícias de todo o mundo, em especial no que diz
     respeito à materialidade e à coleta de evidências.

               Surge o dilema da territorialidade. Ora, se o computador está num determinado país e o crime é cometido em
     outro, como processar o autor, que nunca ingressou naquele país?

               Polícias do mundo inteiro, tais como o FBI, Scotland Yard e Real Polícia Montada do Canadá, já há alguns anos
     vêm formando os chamados "Cybercops", policiais especialmente treinados e, principalmente, equipados para combater
     esses delitos que se afiguram como o desafio criminal do próximo século. A tônica tem sido a maximização da
     cooperação entre os países, alertando para o potencial das perdas econômicas, ameaças à privacidade e outros valores
     fundamentais.

               O que mais tem atemorizado, desde os sociólogos até os profissionais de polícia é o crescimento em progressão
     geométrica do uso da Internet. Sua quase absoluta falta de controle e a forma totalmente dispersa de sua expansão, está
     criando espaços na rede exclusivamente para atividades criminosas, unindo os ideais ou interesses de uma minoria,
     excitando a motivação delitiva, tais como crimes de ódio, terrorismo e parafilias.

               Tal cenário leva a crer que os criminosos em breve ultrapassarão a capacidade dos organismos policiais em
     capturá-los, pois se prevalecem da forma revolucionária do espaço cibernético, parcamente provido de regras sociais
     ou éticas, um convite à imaginação dos criminosos, limitados somente por suas habilidades técnicas.
 
 

                                 OS CRIMES DE ALTA TECNOLOGIA:

               Poderíamos citar, a título ilustrativo, alguns crimes atualmente perpetrados com o uso de alta tecnologia: O
     estelionato em todas as suas formas, lavagem de dinheiro, os crimes do colarinho branco, furto, a modalidade conhecida
     por "salami slicing" (fatiamento de salame, em que o ladrão faz regularmente transferências eletrônicas de pequenas
     quantias de milhares de contas para a sua própria, muitas vezes camuflada por campanhas de arrecadação de donativos
     de modo a não despertar suspeitas), serviços subtraídos, o contrabando, a pornografia infantil, parafilia, invasões de
     privacidade, apologia de crimes, violações à propriedade intelectual ou industrial, violações à Lei do Software, pixações
     em sites oficiais do governo, vandalismo, sabotagem, dano, propagação de vírus de computador, a pirataria em geral,
     espionagem, tráfico de armas e drogas, lesões a direitos humanos (terrorismo, crimes de ódio, racismo, etc), destruição
     de informações, jogos ilegais, dentre inúmeros outros, apenas para explicitar a complexidade da matéria tratada.

               A experiência tem mostrado quão delicada é uma investigação de crimes por computador, seja pela falta de
     experiência policial, seja pela adoção de procedimentos desatualizados para a alta tecnologia empregada.

               Ora, temos hoje mais de 600 milhões de usuários de computador em todo o planeta e que, em mais de 190
     países, acessam a Internet e trocam dados, sons e imagens. Tudo isso, literalmente, através de elétrons que viajam por
     fios de cobre ou fibras óticas para toda parte, num átimo de segundo.

               Segundo levantamentos recentes, a comunidade internauta cresce à razão de 17.000 novos usuários a cada dia,
     sendo que a taxa de atividades criminosas cresce na mesma proporção. No entanto, as dificuldades de se medir a taxa
     de crimes específica de determinado país se explicam na medida em que não se considera a Internet como separada em
     condados ou países, e sim como uma só comunidade formada de pessoas de todos os países do mundo. Ademais, seria
     preciso separar os crimes cometidos por cidadãos de um determinado país apenas ou os crimes cometidos contra estes
     primeiros por cidadãos de países diversos.

               Diante da alta tecnologia as questões fundamentais que surgem, do ponto de vista da repressão e prevenção aos
     crimes de Internet são:

               Quando do cometimento do delito, como fazer a coleta de materialidade, provas e evidências? Como localizar o
     agente? Como verificar o resultado e avaliar seus efeitos? Como agir diante dos princípios da territorialidade e da
     soberania?

               Como aferir o dolo e a culpa, a co-autoria e a omissão? Como assimilar os efeitos da globalização de crimes com
     as leis existentes? Como adequar a conduta típica a nossa legislação positiva? Como formar policiais para combater os
     crimes digitais? Felizmente, algumas organizações como a WebPolice estão encontrando as respostas para essas
     questões, reunindo policiais e colaboradores de diversas partes do mundo, num esforço titânico e sem paralelos. Nesse
     cenário, curiosamente, o Brasil ocupa um honroso segundo lugar nas estatísticas de casos resolvidos, perdendo de
     pouco para a Austrália e seguido de perto pelo Reino Unido.

               Cabe ressaltar que a Internet é hoje 80% comercial, e as campanhas preventivas ou educativas são extremamente
     incipientes, além de não serem lucrativas. As iniciativas de combate aos crimes registrados tem se limitado a
     contra-ataques e ações de caráter repressivo ou de assistência a vítimas, sejam pessoas ou instituições.

               Diante do impacto da alta tecnologia, a perspectiva de alívio é dada pela constatação de que, em recente
     passado, tecnologias novas provocaram aflição- tais como quando da invenção do telefone, do fax e outros aparelhos
     que vieram a aumentar a qualidade de vida do cidadão- , mas que logo foram assimiladas.
 
 

                                             OS CRIMINOSOS DIGITAIS:

               Os delitos cometidos via Internet são também chamados de "special oportunity crimes", ou seja , crimes afetos à
     oportunidade. Em geral os criminosos são também de oportunidade e os delitos praticados por agentes que,
     freqüentemente, tem a sua ocupação profissional afeta à área de informática. O perfil do criminoso, baseado em
     pesquisa empírica, indica pessoas jovens, inteligentes acima da média, educados, com idade entre 15 e 32 anos, do
     sexo masculino, magros, caucasianos, audaciosos e aventureiros, movidos pelo desafio da superação do conhecimento,
     além do sentimento de anonimato, que bloqueia seus parâmetros de entendimento para avaliar sua conduta como ilegal,
     sempre alegando ignorância do crime e que agiram, simplesmente, por "brincadeira" . Ademais, tem preferência por
     ficção científica, música, xadrez, jogos de guerra e não gostam de esportes de impacto. As condutas do delinqüente
     típico de informática geralmente passam por três estágios: o desafio, o dinheiro extra e, por fim, os altos gastos e o
     comércio ilegal. Tal perfil, como se pode perceber, dificulta sobremaneira, especialmente em se tratando de menores
     inimputáveis, que se surpreenda o cyber-criminoso em flagrante ou mesmo que se suspeite dele. Imagine-se um
     estudante universitário por exemplo, que trabalhe num Departamento de Processamento de Dados de uma conceituada
     universidade ou ainda um jovem digitador em uma instituição financeira ou um banco, cometendo crimes contra seus
     empregadores e se terá uma dimensão alarmante da questão.
 
 

                                    CRIMES DIGITAIS NO BRASIL:

               A atuação policial em crimes de computador requer investigação especializada e ação efetiva. Há raríssimos
     policiais no Brasil preparados para combater esse tipo de crime, e geralmente estão lotados em seções cuja
     especialidade é diversa dos conhecimentos muitas vezes adquiridos por iniciativa própria e não por políticas internas
     (administrativas) de qualificação de pessoal. Os raros investimentos que são feitos na área de qualificação em termos
     digitais restringem-se a:

        1.de um lado, preparar pessoal apto a manusear dados eletronicamente, tais como arquivos e sistemas internos,
          transmissão eletrônica de dados, coleta de informações em bancos de dados internos, ou seja, restringem a
          atuação na área digital às Intranets e nas necessidades internas de compilação e consulta instantânea;
        2.de outro lado, qualificar servidores para atuar na elaboração de laudos periciais específicos, tais como a
          decodificação de senhas e/ou arquivos de computadores usados para cometer ilícitos ou relacionados a matéria
          probante relacionada a inquéritos ou processos em andamento, característica das áreas de criminalística.

               Percebe-se assim que as iniciativas na área pública relacionadas à informática restringem-se ao treinamento de
     servidores para serem digitadores, arquivistas, usuários de sistemas de dados de um lado, ou aptos a perfazerem
     "autópsias" eletrônicas. No que se refere ao combate a crimes perpetrados via Internet, malgrado as iniciativas de
     estudo e deliberação de cunho exclusivamente normativo, de intercâmbio cultural, ou de tímidas investidas oficiais na
     área de segurança e proteção, tão somente, não se percebe ousadas alterações estruturais ou de atribuição no campo
     específico dos crimes de Internet. Está faltando visão, planejamento, preparo e treinamento nessa área específica, na
     polícia brasileira, considerando-se as variáveis envolvidas.

               Paralelamente, empresas em diversos pontos do País, públicas e privadas, têm sido vítimas dos crimes de
     computadores, e a gravidade da questão é mascarada pela "síndrome da má reputação", que leva tais empresas a
     assumirem os prejuízos, encobrindo os delitos, temendo uma propaganda negativa ou um estímulo a outros delinqüentes
     do gênero. Consideram ainda que o grupo de criminosos digitais atuando no Brasil ainda é pequeno, restrito aos que
     dominam idiomas estrangeiros e detém tecnologia de "ponta" e habituados à área financeira.
 
 

                              A INVESTIGAÇÃO DOS CRIMES DIGITAIS:

               Mérito há de ser creditado à Polícia Civil de São Paulo, que já em 1995 deu o primeiro passo em harmonia com
     a vanguarda internacional da INVESTIGAÇÃO DIGITAL, ao ser a primeira instituição da América Latina a possuir
     página (Site) na Rede Internacional de Dados- Internet, com diversas informações sobre a atividade policial
     desenvolvida, orientações de auxílio ao cidadão, bem como campo para receber sugestões e denúncias, além de um
     arquivo com fotos digitalizadas dos criminosos mais procurados pela polícia, assim como fotos de crianças
     desaparecidas. Merece destaque o fato de que, nos últimos meses, através do DCS – Departamento de Comunicação
     Social, vem efetuando investigações de crimes de Internet com surpreendente sucesso (com o mero embasamento
     jurídico do art. 6º e incisos do CPP, com inúmeras decisões em inquéritos policiais, com significativa acolhida junto ao
     Ministério Público e Juiz Corregedor daquela capital). O Delegado Mauro Marcelo de Lima e Silva, pioneiro nessa
     área, é atualmente o coordenador brasileiro da WebPolice, única organização mundial de voluntários que reúne policiais
     de vários países especializados no combate aos crimes na Internet, e que diariamente recebe cerca de 1.500 denúncias
     só de vítimas de fraudes e que trabalha em sintonia com a Interpol e entidades como o United States Post Service
     (Correios), entre outros como organismos policiais, universidades e escolas estrangeiras de renome.

               A Polícia Federal, impulsionada pelo famoso caso "PC" e nas novas modalidades de evasão de divisas por meio
     do dinheiro digital (as contas CC5), criou já em 1996, no âmbito do Instituto Nacional de Criminalística, órgão central
     da Perícia Criminal Federal, o Setor de Apuração de Crimes no Computador, onde, desde então, esforços tem sido
     feitos no sentido de enfrentar criminosos digitais com pessoal qualificado em sintonia com as ações de rastreamento de
     criminosos levadas a cabo pela Interpol e pelas Delegacias Regionais de Repressão a Entorpecentes, considerando que
     para o narcotráfico a lavagem de dinheiro e transferência eletrônica de fundos é fator significativo
 
 

                                    PROPOSTAS E PERSPECTIVAS:

               Embora não estejam satisfatoriamente codificadas em Leis, dado o caráter tecnológico do tema, extremamente
     flexível, as condutas de crimes digitais, em especial os que utilizam a Internet, já estão sendo adequadas à legislação
     positiva existente, onde encontram guarida, ainda que incidental, variando a sua tipificação conforme o bem jurídico
     agredido. Mas não resta dúvida que o tema tem feito fervilhar as mentes dos doutrinadores, enquanto causa "dores de
     cabeça" a inúmeros operadores do Direito.

               Doutrinadores há que têm chamado tais condutas de "Direito Criminal da Informática", apoiados no fato de que
     as atuais normas incriminadoras datam de 1940, em que poderiam ser escritas ou datilografadas, situação que não mais
     se coaduna com a era digital.

               O crescimento exponencial da tecnologia e da Internet favorece o cybercriminoso, que facilmente tira proveito
     dos avanços científicos e do atraso do aparato oficial. Para adequar as ações policiais a esse novo desafio, torna-se
     imperativo que se crie uma cultura de formação de policiais visando o "policiamento futuro", ou seja, formar, adequar
     equipar e treinar os policiais. A palavra chave é antecipar, tanto no meio jurídico ligado à prevenção normativa ou à
     repressão criminal por meio dos organismos policiais brasileiros. Nesse sentido é urgente a implementação de unidades
     policiais especializadas em investigação e atos de polícia judiciária para o combate a crimes de alta tecnologia, que
     englobem tanto os crimes de computador como outros que surgirem na esteira do desenvolvimento tecnológico dos
     próximos anos. Cabe lembrar que a dependência brasileira ao computador é tamanha que o Departamento de
     Comércio Exterior do Ministério da Fazenda e o Banco Central têm suas atividades vinculadas à própria existência dos
     computadores e sistemas.

               O sistema de arrecadação de impostos da Receita Federal tem nos computadores e na Internet uma ferramenta
     indispensável, a exemplo de outros órgãos públicos.

               O efeito da Informática na vida do Estado e dos cidadãos exige que seus reflexos não nos deixem em situação
     vulnerável, sob risco de nos vermos envoltos num labirinto inexpugnável em que as infovias representam um desafio atual
     a ser desbravado, tal o poder de penetração e dependência que detém em confronto com nossa auto-determinação.
 
 

               O autor também cursou Eletrotécnica (CTU/UFJF) e Engenharia Elétrica (UFJF) em Juiz de Fora (MG),
                é membro Fundador e Assessor de Segurança Pública da INFOJUF- Feira Anual de Informática e
                     Telecomunicações de Juiz de Fora, foi idealizador do PROCON/JF e presidente da
                            Associação de Proteção ao Consumidor de Juiz de Fora (1986)
 

 

retirado de: http://www.jus.com.br/doutrina/crimenet.html