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PRESCRIÇÃO EM DIREITO DE AUTOR
 © by Leandro da Motta OliveiraAdvogado e Procurador da Universidade de Brasília


Dúvidas relacionadas ao instituto jurídico da prescrição mais uma vez são trazidas à lume com o advento da Lei 9.610/98, que trata dos direitos de autor e conexos. É que com o veto presidencial ao art. 111 do referido diploma legal, a disciplina, aparentemente, resulta sem norma que disponha sobre a perda do direito de ação quanto às ações civis. Ou, se a possui, esta, devido à lacuna legal gerada pelo veto do Chefe de Estado, pode ser objeto de distintas interpretações doutrinárias com prazos prescricionais discordantes (cinco, dez ou até mesmo vinte anos, art. 179 do Código Civil Brasileiro), apoiando casos concretos com o posicionamento doutrinário que se queira adotar, segundo os interesses que se tenha. A conseqüência é a insegurança jurídica.
 

À sanção ao atual texto legal, com o veto do art. 111, tem prevalecido o entendimento de que há uma omissão quanto ao prazo da prescrição da ação civil por ofensa a direitos patrimoniais de autor. Entretanto, o prazo qüinqüenal proposto pelo CCB para prescrição de ações cíveis que decorram da violação de direitos de autor não foi revogado pelos dois ordenamentos que se seguiram quanto à matéria, conforme se verá adiante.

I - HISTÓRICO JURÍDICO SOBRE O DIREITO AUTORAL NO BRASIL

Segundo o magistério do saudoso professor Carlos Alberto Bittar, "devido à natureza sui generis que possui, o direito autoral teve sua evolução de forma a justificar a regência específica que recebe nos diversos ordenamentos jurídicos do mundo atual ". Ou seja, por possuir natureza patrimonial e moral não pode se cingir a matéria relativa aos autores à categoria dos direito reais nem tampouco à dos direitos pessoais, constituindo nova modalidade de direito privado.

Assim, o direito autoral recebeu um tratamento especial do Direito com disciplinação própria, sendo retirado dos princípios e regras gerais estipulados no CCB para cair nas particularidades que o distingue dos demais direitos. A Lei 5.988/73 materializou o apelo dos doutrinadores imprimindo nova orientação dogmática à matéria. Aperfeiçoando a estrutura normativa e inovando quanto a aspectos importantes, conseguiu aquele diploma legal atualizar a disciplina.

Apesar disso não foi suficiente, após quase 25 anos de evolução tecnológica. A recente revisão feita pela Lei 9.610/98 veio em boa hora. Introduzindo inovações destinadas a ajustá-la às modernas tecnologias e tendências mais recentes dos direitos autorais, vem aperfeiçoar regras contidas na lei de 1973.

II - A MATÉRIA NO CCB

Note-se que o Código Civil, seguindo na esteira legal da Constituição de 1891 e da Lei 496, de 1º de agosto de 1898, foi o diploma legal que regulou a disciplina in totum sobre direito de autor até o advento da Lei 5.988/73, possuindo norma específica a respeito da prescrição aos direitos autorais, consubstanciada no art. 178, expresso nos seguintes termos:

Art. 178. Prescreve:

§ 10. Em 5 (cinco) anos:

VII - a ação civil por ofensa a direitos de autor; contado o prazo da data da contrafação;

Sofrendo a matéria relativa a direito de autor alteração com a Lei 5.988/73, o prazo prescricional continuou estipulado em cinco anos, de acordo com o art. 131. Observe-se que neste novo ordenamento, além de não haver alteração quanto ao prazo prescricional, que permaneceu em cinco anos, não houve menção também aos direitos morais que compõem, junto com os patrimoniais, o conjunto de direitos relativos ao autor.

Art. 131. Prescreve em cinco anos a ação civil por ofensa a direitos patrimoniais do autor ou conexos, contado o prazo da data em que se deu a violação.

Ora, uma lei é revogada por outra quando expressamente o declare, quando há entre as mesmas incompatibilidades ou, ainda, quando regule por inteiro a matéria de que tratava a anterior (art. 2º, § 1º, LICC). Com o advento da Lei 5.988/73, o artigo referente à prescrição do CCB não foi revogado por nenhum desses mandamentos.

A uma, porque a Lei 5.988/73 não apontou a revogação do disposto no CCB; a duas, porque não há incompatibilidade entre os prazos previstos nos dois diplomas legais, o que faria com que norma especial posterior ab-rogasse norma anterior; e, a três, porque não houve regulamentação por inteiro da disciplina, eis que o art. 131 referia-se somente aos direitos patrimoniais.

Portanto, não há que se falar em revogação do Código Civil quanto ao prazo prescricional dos direitos autorais.

Destarte, a nova lei de direito autoral, Lei 9.610/98, ao ter seu artigo 111 vetado pelo Presidente da República, com a justificativa de que o prazo prescricional de cinco anos deve ser contado da data em que se deu a violação, não da data do conhecimento da infração, restou silente quanto ao prazo prescricional por ofensa a direitos de autor.

Portanto, se se considerar que a Lei 5.988/73 revogou o artigo do Código Civil relativo à prescrição, realmente a disciplina autoral não possuirá referência quanto ao prazo prescricional desse direito.

Porém, ao se considerar que o prazo de um lustro estatuído pelo CCB não foi derrogado com o advento da Lei 5.988/73, não se encontra omissão legal.

Ademais, não se deve confundir que, in casu, ocorre repristinação da norma contida no CCB. Para que haja este instituto é necessário que haja a intenção expressa do legislador para a restauração da norma revogada (LICC, art. 2º, § 3º), o que não ocorre.

III – CONCLUSÃO

Ora, a prescrição relativa ao direito patrimonial com a Lei 5.988/73 era de cinco anos, não mencionando o prazo prescricional para os direitos morais, que portanto, continuava a ser de cinco anos por não estar contrário à legislação específica. Assim, não houve regulação total da matéria. Logo, a prescrição para violação dos direitos de autor deve continuar sendo os cinco anos, que se encontram ajustados no art. 178 do Código Civil Pátrio.

No magistério do mestre Carlos Maximiliano, tem-se como favorável a possibilidade de conciliar duas normas, caso não sejam incompatíveis, como é o caso, verbis:

"Pode ser promulgada nova lei, sobre o mesmo assunto, sem ficar tacitamente ab-rogada a anterior: ou a última restringe apenas o campo de aplicação da antiga; ou, ao contrário, dilata-o, estende-o a casos novos; é possível até transformar a determinação especial em regra geral. Em suma: a incompatibilidade implícita entre duas expressões de direito não se presume; na dúvida, se considerará uma norma conciliável com a outra. O jurisconsulto Paulo ensinara que - as leis posteriores se ligam às anteriores, se lhes não são contrárias; e esta última circunstância precisa ser provada com argumentos sólidos... "

Com profunda perspicácia quanto a matéria, assim se manifesta o escólio do ilustre professor Carlos Fernando Mathias de Souza, que sintetiza com maestria o tema assestando na mesma direção com argumentos robustos, verbis:

"Ora, a Lei 5.988/73 não revogou expressamente a disposição do Código Civil em comento (ao contrário, indica a revogação de outros artigos). De outra parte, seu art. 131 não é incompatível com o art. 178, § 10, VII do Código, ao contrário conservou o mesmo prazo prescricional de cinco anos, que deve ser contado a partir da contrafação. Finalmente, o dispositivo não regulou inteiramente a matéria, tanto que enquanto o Código Civil, de forma mais ampla, fala em ação civil por ofensa a direito do autor (morais e patrimoniais, é claro), a Lei 5.988/73 só tratou da ação civil referente aos direitos patrimoniais, isto é, uma parte dos direitos autorais ."
retirado de http://www.minc.gov.br