Resumo elaborado por: Mairê Luiza Zanini

Data de elaboração do resumo: 19/07/2001

Autora: Rosana Ribeiro da Silva

 

Contratos eletrônicos 

 

 


 

  1. INTRODUÇÃO

As sociedades não são entidades estáticas, evoluindo continuamente com o passar dos tempos, de forma que o direito, ao visar regular os hábitos e atividades sociais, deve necessariamente acompanhar esta evolução, alterando ou dando novas interpretações às regras jurídicas existentes em cada país.

Competindo ao Direito regular as relações entre os indivíduos, dando-lhes segurança e estabilidade nas relações jurídicas que estabelecem, também a ele compete a regulamentação das relações que se originam das facilidades proporcionadas pela Internet.

Um exemplo claro das mudanças levadas a efeito pela crescente utilização das facilidades e agilidade próprias da rede mundial de computadores, está na presente e crescente dispensabilidade dos documentos físicos que façam prova da consumação de um contrato. Mesmo a assinatura deste, até então levada a efeito pela rubrica de próprio punho dos contratantes, vem sendo substituída pela denominada assinatura digital.

Este novo campo que se abre para as relações transindividuais, contudo, traz consigo um problema já velho conhecido do Homem, o da segurança na transmissão de informações. Assim é que, atualmente, se vêm buscando dar segurança e fidedignidade às transações e transferência de informações via Internet.

Cabe ao Direito regular tais situações, visto que já se constituem numa realidade no dia a dia daqueles que se utilizam da Internet nas suas transações, seja através de uma releitura de suas regras, seja por meio da edição de novas normas que permitam lidar satisfatoriamente com esta nova realidade.


2. TEORIA DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS

Podemos definir contrato como uma espécie de negócio jurídico, de natureza bilateral ou plurilateral, dependente, para sua formação, do encontro da vontade das partes, que cria para ambas uma norma jurídica individual reguladora de interesses privados. Assim sendo, tem ele por fundamento a vontade humana, atuada conforme a ordem jurídica vigente, que lhe dá força criativa. É norma jurídica individual posto que estabelece direitos e obrigações, em regra, apenas entre os contratantes.

São, pois, dois os elementos componentes da noção de contrato: o estrutural, que requer a convergência de duas ou mais vontades contrapostas; e o funcional, que diz respeito à composição daqueles interesses contrapostos, contudo harmonizáveis, com o fito de constituir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial.

Por se constituir em um negócio jurídico, o contrato deve atender, para sua validade, aos requisitos subjetivos, objetivos e formais contidos no art. 82 do Código Civil, que são: agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei.

O acordo de vontades, indispensável para a formação da relação contratual, se expressa de um lado pela oferta e de outro pela aceitação. São esses dois os elementos indispensáveis para a formação dos contratos.

Quanto ao momento da conclusão contratual, este variará conforme se realize entre presentes ou entre ausentes. Entre presentes a questão não apresenta problemas, posto que as partes se vinculam no momento mesmo em que o oblato aceita a proposta, quando então há a união coincidente das vontades dos contratantes.

Caso o contrato se realize entre ausentes, haverá um intervalo de tempo, mais ou menos longo, entre a aceitação e o conhecimento dela pelo proponente.

O nosso Código Civil adotou, em seu art. 1086, a teoria da agnição na modalidade expedição, salvo três exceções, previstas no art. 1085 e incisos II e III, do próprio art. 1086, que adotam a teoria da recepção.

Havendo um momento em que efetivamente, ou por presunção, as vontades convergem, surgindo o contrato, claro está haver também um lugar determinado para se entender efetivada a sua celebração.

Apesar de o Código Civil haver adotado a teoria da expedição da aceitação, sob o ponto de vista do tempo do contrato, adotou, quanto ao lugar da celebração do mesmo, o da expedição da oferta.


  1. CONTRATOS ELETRÔNICOS

Neste item tentaremos correlacionar a teoria das obrigações contratuais, acima resumida, aos contratos eletrônicos, a fim de verificar a sua eficácia e validade, tendo em vista que, desde 1916, o contrato verbal é admitido como válido.

Como dito mais acima, contrato pode ser definido como a espécie de negócio jurídico, de natureza bilateral ou plurilateral, dependente, para sua formação, do encontro da vontade das partes, que cria para ambas uma norma jurídica individual reguladora de interesses privados.

Esta definição é perfeitamente aplicável aos contratos eletrônicos, posto que do seu conteúdo se depreende inexistir qualquer elemento incompatível com os mesmos. A natureza bilateral do negócio jurídico é perfeitamente identificável nos contratos eletrônicos, bem como a sua formação pressupõe o encontro da vontade emanada das partes contratantes, tal qual nos contratos em geral. Assim sendo, são eles perfeitamente aptos a produzirem os efeitos jurídicos inerentes aos contratos, fazendo lei entre as partes.

Estão presentes também nos contratos eletrônicos os elementos estrutural, que pressupõe a convergência de duas ou mais vontades; e funcional, pela composição dos interesses contraposto de ambas as partes, com o fim de constituir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial.

Não tendo encontrado qualquer incompatibilidade dos contratos eletrônicos em face dos requisitos de validade dos contratos em geral, passamos a estudar a aplicabilidade das fases de formação dos contratos aos contratos dito digitais.

Como acima referido, o acordo de vontades que permite a formação dos contratos é expresso pela oferta do policitante e pela aceitação dela por parte do oblato.

A oferta é a declaração de vontade que o ofertante dirige ao oblato, por meio da qual aquele manifesta a sua intenção de se vincular aos temos do contrato que propõe, caso haja a aceitação por parte deste último. Em regra a oferta é obrigatória para o policitante, salvo as exceções já tratadas no item anterior.

Nos contratos celebrados via Internet, a policitação, normalmente feitas nas home pages daquele que procede à oferta, pode e deve atender aos mesmos requisitos e surtir os mesmos efeitos imputáveis aos contratos em geral, dentre eles a da obrigatoriedade da oferta feita. Mesmo as hipóteses nas quais a oferta não é obrigatória (arts. 1080 e 1081, do CC) se aplicam integralmente aos contratos virtuais (vide item anterior), não havendo aí qualquer ressalva.

A questão não é diferente na aceitação, manifestação da vontade do oblato em aceitar a oferta feita, em todos os seus termos, pelo policitante, que nos contratos virtuais produz o mesmo efeito dos contratos em geral de dar-se por concluída a relação contratual. Normalmente, nos contratos eletrônicos, a aceitação se perfaz com a remessa do número do cartão de crédito do oblato, para transferência do valor da mercadoria que pretende adquirir para o policitante.

 

No que diz respeito ao momento da conclusão dos contratos, a sua variação conforme se realize entre presentes e ausentes não apresenta dificuldades no que concerne aos contratos virtuais. Tais contratos são realizados entre ausentes, posto não haver contato direito entre os contratantes, que se utilizam da Internet para contratar, não se aplicando assim a modalidade de realização entre presentes. No mais, se aplica tudo quanto acima foi dito sobre o tema, inclusive quanto à teoria da agnição, na modalidade expedição, e da cognição, esta última constituindo-se em exceção à regra geral.

Quanto à retratação da proposta feita ou da aceitação, no caso dos contratos virtuais a matéria torna-se mais melindrosa. Pela fórmula legal, a eficácia daquela depende de ser ela recebida antes ou conjuntamente à proposta ou aceitação. Isto não apresenta maiores problemas quando o meio empregado para a veiculação daquelas são os correios. Se remetemos nossa aceitação por carta comum, e se, depois, pretendemos nos retratar, bastaria apenas que enviássemos tal retratação por meio de um Sedex, que chegará ao proponente ao mesmo tempo, ou mesmo antes, da aceitação formulada.

No caso dos contratos via Internet, que normalmente são levados a efeito por E-mail, a remessa da proposta ou aceitação é quase que instantânea, o mesmo se dando com a retratação. Ora, se a eficácia da retratação depende de ser ela recebida concomitantemente à aceitação ou proposta, não importando a data da remessa de qualquer uma delas, surge-nos ainda uma indagação: deve-se entender por recebido o e-mail, que porta a proposta ou aceitação, no momento da recepção delas pelo provedor do contratante?, ou no momento que esta, do provedor, é descarregada no computador do usuário da rede?

Entendemos que a melhor solução seria a que entende por recebido o e-mail quando há a descarga do arquivo no computador daquele a quem é feita a proposta, ou que aguarda a aceitação, independentemente da data em que o arquivo é recebido pelo provedor de acesso. De mais a mais, é sabido que, comumente, o login com o provedor pode apresentar problemas, de forma que, por dias, o usuário pode vê-se impossibilitado de enviar ou receber e-mails, ou sequer conectar-se à rede.


4. SIGILO E FIDEDIGNIDADE DA PROPOSTA E DA ACEITAÇÃO

Para que as partes interessadas em contratar tenham certeza da identidade uma da outra, faz-se necessário o emprego de uma tecnologia ainda em desenvolvimento. Isto porque ambas as partes devem estar perfeitamente identificadas para que o contrato a ser levado a efeito produza os efeitos desejados por elas.

A tecnologia citada é denominada assinatura digital, que se constitui num conjunto de caracteres alfanuméricos, resultante de complexas operações matemáticas de criptografia, efetuadas por um computador sobre um documento eletrônico, à qual se dá o nome de "sistema assimétrico de encriptação de dados".

5. VALOR PROBANTE DOS DOCUMENTOS DIGITAIS EM JUÍZO:

Este trabalho não objetiva coligir dados acerca do valor probante dos documentos digitais em juízo. Contudo, faremos um breve comentário sobre o tema, tendo em vista estar ele intimamente vinculado ao conteúdo do mesmo.

No que concerne aos documentos eletrônicos, podem eles ser entendidos como representação material de uma dada manifestação do pensamento, fixada, contudo, em um suporte eletrônico. Em decorrência disto, fica dificultada uma interpretação ampliativa das normas processuais referentes aos documentos, posto que para elas, em sua maioria, documento é sinônimo obrigatório de escrito.

A validade e eficácia dos documentos eletrônicos como meio de prova em muito difere das dos documentos comuns, isto porque apresentam eles uma série de peculiaridades técnico-informáticas que lhe são próprias. Em sede de direito comparado, a saída encontrada foi a elaboração de normas específicas sobre o tema que atendessem àquelas peculiaridades. Nos Estados Unidos, p. ex., foi abandonada qualquer tentativa de utilização de processos interpretativos das normas vigentes, tendo vários estados elaborado legislação específica para a legitimação dos documentos eletrônicos.

Assim sendo, em nossa legislação, por faltarem normas específicas aplicáveis ao caso, os documentos eletrônicos podem ser admitidos como meio de prova com fundamento no art. 332, do CPC, que determina que "todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou defesa".

Contudo, o meio eletrônico é extremamente volátil, de forma que se faz necessário garantir a integridade e a procedência de um documento antes de lhe atribuir qualquer valor probante. Como acima já foi dito, isto pode ser obtido através do emprego de um par de chaves, componentes do sistema assimétrico de encriptação de dados, fornecido este por uma Autoridade Certificante.

6. CONCLUSÃO

A Internet é uma realidade que não pode ser negada, como também não podem ser negadas as facilidades que vem trazendo ao cotidiano das pessoa comuns. Se incumbe ao Direito regular os negócios jurídicos de uma forma geral, com mais razão deverá ele tratar dos contratos levados a efeito via Internet, com todas as peculiaridades que os envolve.

Muito trabalho e estudo deverá ser levado a efeito tanto pela legislação e quanto pela doutrina, posto que nem sempre será possível a aplicação analógica das normas ora existentes às peculiaridades apresentadas pelos contratos eletrônicos.

As modernas tecnologias de proteção ao comércio eletrônico dão certa estabilidade e confiabilidades às transações ocorridas no meio eletrônico. Contudo, ao mesmo tempo que tais tecnologias são desenvolvidas, contra medidas são adotadas por aqueles interessados em se aproveitar de um meio tão efêmero e volátil para obter vantagens indevidas.

Àqueles que pretendem se utilizar do universo virtual nas suas transações comerciais deve ser garantido um mínimo de segurança nas relações jurídicas que vierem a criar, cabendo ao Direito acompanhar a evolução da genialidade humana a fim possibilitar tal garantia.

 

 Link para o artigo da autora: http://buscalegis.ccj.ufsc.br/arquivos/Contratos_eletronicos.html