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Alencar
João Dall´Agnol
1 Introdução; 2 Considerações Preliminares; 3 A
Responsabilidade no Direito Ambiental; 4 A Responsabilidade Civil
no Direito Ambiental; 4.1.Risco Integral; 4.2 Risco
Assumido; 4.3 Risco Criado; 5 Responsabilidade Penal no
Meio Ambiente; 6 A Responsabilidade Ambiental da Pessoa Jurídica na
Esfera Penal; 7 Conclusão; 8 Fontes de Referências.
Este artigo
trata de um assunto de extrema relevância para o efetivo controle da depredação
ambiental, permitindo que sejam alcançadas as metas propostas como condição de
sobrevivência da espécie humana, ou seja, a preservação do meio ambiente e o
desenvolvimento econômico social, visando assim permitir a qualidade e a
continuação da vida a toda humanidade.
Entendemos que
somente com educação ambiental e comandos reguladores fortes se conseguirá
atingir tal objetivo. Necessita-se além da mudança de paradigma, uma legislação
que responsabilize os predadores do meio ambiente, especialmente as pessoas
jurídicas por serem estas os poluidores potenciais, atribuindo-lhes sanções
e penas que inibam a prática do delito ambiental, fazendo-se, em ultima
analise, uma melhor aplicabilidade da tão almejada justiça, garantindo um meio
ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações,
conforme reza a nossa magna carta.
This article deals with a relevant and extreme subject
for the effective control of depredation to the environment, allowing that the
goals are achieved and the proposals as condition to survival of human being
species, or either preservation of the environment and the social economics
development, thus aiming at to allow to quality and life continuation to all
humanity.
We only understand that with environmental education
and strong regulating commands we will reach such objective. We need a change
of paradigm, the laws that it makes Responsible all the predators of the
environment, especially the big companies for being these the potential
polluting agents, attributing penalties to it that obtain to inhibit the
practice of the environmental delict, becoming at the end, one better
applicability to reach justice, thus guaranteeing and balanced ecology
environment for the present and the future generation in according to the
Brazilian constitution.
É chegada à
era ambiental. O mundo todo se volta para uma questão de suma importância, ou
seja, a sobrevivência da própria espécie humana, pois sabedores que o meio
ambiente não tem capacidade de auto renovação como se pensava em séculos
passados, surge daí a idéia de preservação onde não mais se pode adotar uma
política extrativista considerando o meio ambiente como uma fonte inesgotável
de matéria prima.
O grito de
alerta já esta lançado, as pessoas começam a se conscientizar de que exercem um
papel fundamental para manter o equilíbrio entre a sobrevivência da espécie e
do meio ambiente. Os Estados começam a busca do tão falado desenvolvimento
sustentável, mas todavia não se consegue consenso para a grande questão ainda
sem resposta, que é como se poderia crescer e desenvolver sem depredar o meio
ambiente, dentro de uma concepção extremamente capitalista?
Nossos
antepassados se mostraram predadores natos, qualidade esta que nos legaram e
que até então a conservamos. As grandes industrias surgiram e trouxeram
com elas as metrópoles que contribuíram para a depredação do meio. A legislação
avançou e tentando frear, ainda que de forma ineficaz, a destruição. Surge
então à questão dos sujeitos de direitos e obrigações, as pessoas jurídicas
passam a protagonizar os grandes desastres conhecidos do homem na esfera
ambiental, sendo que muitas vezes passavam impunes pela lacuna da lei que não
as tipificara como destinatária da norma.
Pretendemos
aqui detectar o reconhecimento da pessoa jurídica como destinatária da norma
positivada, muito pouco debatida mas de importância, pois o legislador pátrio
de 1998 de forma simplista, limitou-se a enunciar a responsabilidade penal por danos
ao meio ambiente, cominando-lhes penas, sem lograr, contudo, instituí-la
completamente.
A estruturação
do presente trabalho pretende retratar a Responsabilidade Ambiental nas suas
formas variadas, atentando para a real possibilidade da aplicação de sanções e
da reparação do dano, como mecanismo regulador, vislumbrando assim, um controle
social na esfera ambiental.
2.
CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
Tem este
trabalho, o escopo de detectar as diversas formas possíveis de
Responsabilização no direito Ambiental. Sem desprezar outras searas,
concentraremos, todavia, os estudos nas esferas das Responsabilidades Civil e
Penal, antecipando o que se pretende diagnosticar, que é a necessidade de se
escrever um novo capitulo no Direito Pátrio.
O que nos move
neste estudo é o entendimento de que se faz necessário uma releitura urgente no
Direito Contemporâneo, seja nas esferas Civil, Constitucional e, especialmente
na Penal, para que se possa instrumentalizar a força coercitiva do direito
enquanto tutela do meio ambiente, atribuindo-lhe mecanismos de controle no
intuito de conter esta imensurável depredação praticada contra o meio ambiente,
que se não for afastada em tempo hábil, seguramente deixara seqüelas por várias
gerações, acabando talvez por erradicar a vida do planeta Terra.
Existem
possibilidades concretas de se frear esta destruição do meio, vês que, a prima
facie, após uma análise das legislações vigentes, dentre elas a Lei 9.605/88, e
principalmente pela leitura da Constituição Federal de 1988, que inovou em
muitos aspectos, se detectam a incorporação de normas como as insertas nos
arts. 173, § 5º e 225, §3º, que consagram a responsabilidade ambiental nosso
ordenamento positivado.
3.
A RESPONSABILIDADE NO DIREITO AMBIENTAL
Ao estudar a
origem da responsabilização, embora seja matéria controvertida, destaca-se que
etimologicamente, o termo responsabilidade deriva de responsável, que se
origina do latim responsus, particípio passado do verbo respondere,
que significava na época responder, afiançar, prometer e pagar.
A
responsabilidade surge como derivação de uma obrigação anterior, à qual o
responsável deixou de observar, é sem duvidas, noção peculiar a todas as
relações jurídicas, visando assegurar a observância de alguma obrigação nela existente,
ou porque se assumiu tal obrigação, seja em decorrência de um fato ou ato,
ocorrido ou praticado.
Em um
contexto geral a responsabilidade exprime a obrigação de responder por alguma
coisa, revelando o dever jurídico em que se coloca a pessoa, seja em virtude de
contrato, seja em face de fato ou omissão que lhe sejam imputáveis, para
satisfazer a prestação convencionada ou para suportar as sanções legalmente
previstas.
A
Responsabilidade Civil é a que se apura para que se possa exigir a reparação
civil, uma forma de sanção imposta ao agente ou responsável pelo ato ilícito. O
Código Civil Brasileiro impõe àquele que, por ação ou omissão, lesar direito de
outrem, fica-lhe obrigado a reparar o dano.
A
Responsabilidade Administrativa, a prima facie, é a que resulta da
infringência de norma da administração estabelecida em lei, regulamentos ou até
mesmo por força contratual, impondo um ônus ao contratado para com qualquer
órgão público. É independente das demais responsabilidades, e é pessoal, mas a sanção
nem sempre é de execução personalíssima, caso em que pode transmitir-se aos
sucessores do contratado, quer sejam pessoas físicas ou jurídicas, como ocorre
com as multas e encargos tributários.
A própria
administração é quem aplica as sanções pertinentes que vão de uma simples
advertência à multas, interdição de atividades, até a suspensão provisória do
trabalho, conforme o estatuto da classe, que desenvolve-se por meio de um
processo interno, facultando ao acusado defender-se.
Tanto no
Direito Civil como no Administrativo, a responsabilidade pode ser objetiva,
podendo até mesmo ser impessoal.
Diferentemente
se opera no Direito Penal devido ao bem indisponível que o regula, muitas vezes
de caráter irreparável, devendo assim ser a responsabilidade subjetiva,
personalíssima e atender aos ditames da teoria geral do delito. Será um sujeito
responsabilizado criminalmente quando sua conduta violar ou contribuir para
violação de um bem jurídico tutelado na esfera penal e ainda possuir culpabilidade.
Neste
sentido nos deparamos com os ensinamentos do mestre Noronha[1], onde nos diz que a responsabilidade penal:
"...é a obrigação que alguém tem de arcar com as conseqüências jurídicas
do crime. É o dever que tem a pessoa de prestar contas de seu ato. Ele depende
da imputabilidade do indivíduo, pois não pode sofrer as conseqüências do fato
criminoso (ser responsabilizado) senão o que tem a consciência de sua
antijuridicidade e quer executá-lo (ser imputável)."
Já Francisco
Muñoz Conde[2] menciona que as causas de extinção da
responsabilidade criminal diferenciam-se das causas de justificação e de
inculpabilidade, pois não afetam em nada a existência do delito, mas, sim, à
sua persecução no processo penal. Nosso Código Penal contempla as causas de
extinção de punibilidade no título VIII.
A
sociedade moderna, evoluiu rapidamente e notoriamente revelando conhecimentos
científicos, que em última análise, confere ao cidadão uma inigualável
qualidade de vida, reconhecendo-se todavia o esforço daqueles que dedicam as
suas vidas ao desempenho de atividades em todas as áreas.
Todavia,
passou-se a questionar, entretanto, que esse notável aprimoramento
técnico-científico, idealizado para facilitar o convívio do ser humano,
reflete-se em formas de concretização de fatos delituosos, pois se tratava o
meio ambiente como um ente isolado, com a função básica de fornecer matéria
prima ao desenvolvimento desenfreado sob um sistema capitalista.
Surge então o
que o professor Canotilho[3] já considerava no inicio da década de 90, o
direito de Quarta Geração, “São os direitos de quarta geração (...) que
abrangem as suas sucessivas sedimentações históricas ao longo do tempo,
perpassando os oradicionais direitos negativos, conquista da revolução liberal;
os direitos de participação política, emergentes da superação democrática do
Estado Liberal; os direitos positivos de natureza econômica, social e cultural
(direitos sociais), constituintes da concepção social do Estado; finalmente os
direitos de quarta geração, como o direito ao meio ambiente e a qualidade de
vida”.
Detecta-se no
Direito Ambiental, três esferas básicas de atuação, quais sejam: a preventiva,
a reparatória e a repressiva. A preventiva está voltada para o momento anterior
a consumação do dano, ou seja, o mero risco, atendendo ao objetivo fundamental
do direito ambiental. Importante aqui ressaltar que na prevenção ocorre ação
inibitória, enquanto que nas demais, a reparatória e a repressiva, se limitam a
tratar do dano já causado, que é quase sempre incerto, de difícil reparação e
custoso.
No que
concerne a reparação ambiental, uma vez ocorrido o dano, ressalta-se que ate
então funciona através das normas de responsabilidade civil.
A
questão toda gira em torno do fato que no direito ambiental brasileiro,
prevalece a regra da responsabilidade objetiva, que prescinde de culpa, ou
seja, para pleitear a reparação do dano, basta que o autor demonstre o nexo
causal entre a conduta do réu e a lesão ao meio ambiente a ser protegido.
Portanto, três são os pressupostos considerados para que a responsabilidade
ocorra: a ação ou omissão do réu; o evento danoso e a relação de causalidade.
4.
RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA NO DIREITO AMBIENTAL
Com as
transformações ocorridas pela revolução industrial e o início da civilização
moderna, houve a necessidade de adaptação do objeto da responsabilidade civil
das relações advindas das inovações tecnológicas e do saber científico, ou
seja, ampliou-se às pessoas passíveis de responsabilização e também aumentou as
possíveis vítimas do dano. Por isso, foi necessário que o alicerce teórico da
responsabilidade civil passasse da culpa a responsabilidade civil subjetiva,
para a idéia do risco das atividades, à responsabilidade civil objetiva.
Em outras palavras, é inegável que o
avanço tecnológico trouxe inúmeras inovações para a sociedade moderna, mas
trouxe atrelado o mal originado pelas indústrias totalmente alienadas e
despreocupadas com a questão ambiental, que colocaram em risco não só a vida
dos seres humanos, como a flora e a fauna, ou seja, a biota na sua totalidade.
As pessoas, ao longo dos anos, tomaram consciência dos danos ambientais que as
indústrias causavam ao lançarem resíduos sólidos, efluentes líquidos e emissões
gasosas no meio ambiente e começaram a se mobilizar, reivindicar e por último
protestar para que fossem tomadas medidas que as protegessem das seqüelas
provocadas pelas empresas.
Visando
atingir o princípio constitucional da igualdade, houve a objetivação da responsabilidade
civil, decorrendo dos reflexos sociais resultantes destas atividades que
motivaram a incorporação no ordenamento jurídico de legislações contemporâneas
para tratar desigualmente as pessoas e as vítimas desiguais, entre elas à
natureza.
No início do
século passado, quando o nosso antigo Código Civil de 1916 foi promulgado, o
Brasil era um país tipicamente agrário, colonial, sendo então desnecessária
previsão de uma responsabilização civil objetiva. No entanto, com as
instalações das indústrias em nosso país, inverteu-se a situação brasileira,
isto é, de um país agrário passou a ter grandes centros urbanos oriundos de
grandes parques industriais em alguns estados, formando em certos casos
verdadeiras metrópoles.
Assim,
houve uma mudança de vida, na medida em que determinados fatos ocorreram no
cotidiano das pessoas, estas constataram que não havia em nosso ordenamento
jurídico, previsão legal para tais acontecimentos, ficando portanto,
desamparadas, e pior que isso, causou na grande maioria uma sensação de
impunidade, pois os agentes causadores dos fatos restavam impunes.
Como
podemos observar, consolidando tal à assertiva, encontramos alguns exemplos de
situações onde a lei incorporou, no ordenamento jurídico, a responsabilidade
objetiva, independentemente de culpa, associada ao risco da atividade, senão
vejamos:
A edição
do Decreto 3.724/19 determinou a responsabilidade objetiva das empresas pelos
danos decorrentes de acidentes do trabalho.
O artigo
184, da Constituição Federal de 1946, determina a responsabilidade objetiva ao
Estado;
Os
artigos 554 e 555 do Código Civil de 1916[4], (nos mesmos termos, os artigos 1.277 e
1.280 do novo Código Civil de 2002)[5], que tratam dos direitos de vizinhança,
contemplaram a responsabilidade civil ambiental objetiva pelo uso nocivo da
propriedade. Ressalta-se que o problema é a interpretação do que seja vizinho
na perspectiva ambiental, na sua limitação geográfica, e de tratar
especificamente da integridade do ser humano como objeto do bem a ser tutelado,
não contemplando a natureza como primeiro objetivo;
O
Código Brasileiro da Aeronáutica, instituído pela Lei nº 7.565/86 dispõe sobre
a responsabilidade objetiva ligada ao risco da atividade;
No
Código do Consumidor, Lei nº 8.078/90, nos artigos 12 e 14, dispõe a
responsabilidade objetiva para o fornecedor e realizador de serviços nas
relações de consumo;
Na
lei antitruste, Lei nº 8.884/94 consta a responsabilidade objetiva por
infrações contra a ordem econômica;
A Lei nº 6.938/81 foi um marco na década de 80 para o Brasil, pois instituiu a
responsabilidade objetiva em matéria ambiental, fundamentalmente no artigo 14,
parágrafo 1º, da Lei 6938/81.
Este
dispositivo legal rompeu com o paradigma tradicional individualista, porque
objetivou a responsabilidade civil por danos ambientais, não mais empregando o
artigo 159 do Código Civil de 1916, que hoje, encontra-se revogado pela Lei
10.406/02, que inseriu o Novo Código Civil Brasileiro.
No dizer de Antônio Herman V. Benjamin[6]: “O Direito Ambiental Nacional, a partir da
Lei nº 6.938/81, passa a proteger o individual a partir do coletivo. Daí, sua
natureza essencialmente pública”.
Portanto, a exigência de reparação do poluidor à vítima do dano ambiental, restara
caracterizada pela atividade do agente e o nexo de causalidade com o dano
ambiental, não mais se exigindo a culpabilidade deste agente.
A
própria Constituição Federal de 1988 incorporou a responsabilidade objetiva
ambiental proclamada pela legislação ordinária ao mencionar no parágrafo 3º do
seu artigo 225, que as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio
ambiente sujeitarão os degradadores a reparar os danos causados, não fazendo
qualquer menção da existência de culpa na atuação do agente degradador.
Também,
o artigo 927, parágrafo único da Lei nº 10.406/02, (o novo Código Civil
Brasileiro) estabelece a obrigação de reparar o dano, independentemente de
culpa, fica obrigado de repará-lo em lei, ou quando a atividade normalmente
desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os
direitos de outrem.
Com a evolução
do Direito, não restou dúvida que o instituto da responsabilidade civil
modificou-se na sua finalidade, visto que anteriormente, somente priorizava a
restituição do status quo ante, ou seja, recuperar a situação que
existia antes do fato ocorrer. No entanto, é bom ter em mente que há casos que
não é possível este restabelecimento, pois, por exemplo, ocorrendo a morte não
é possível restabelecer a vida.
Outro exemplo,
que também se encaixa nesta situação é o ambiental, e por este motivo, na
atualidade, está inserido na finalidade do instituto da responsabilidade civil,
qual seja a prevenção dos danos ambientais. Nesta perspectiva, o sistema
judiciário contribui para efetivamente se restituir a situação que a vítima
tinha anteriormente ao dano causado, já que preceitua com eqüidade e compreende
a responsabilidade civil como um dado social, moral, preceituando assim com
equidade.
Faz-se
necessário, para um melhor entendimento, apresentar a classificação dos atos
sobre os quais incidem responsabilidade, que são: os atos ilícitos absolutos
provindos do dever jurídico originário, primário; os atos ilícitos relativos
provindos de relações jurídicas pré-existentes de natureza contratual; e os
atos jurídicos que emanam responsabilidade objetiva.
Cabe repetir
que a sociedade atual apresenta um avanço tecnológico e científico, como por
exemplo, na bioética, na farmacologia, na produção e etc., onde se apresentam
situações absolutamente imprevisíveis. É necessário que se encontre um
equilíbrio entre os direitos da livre iniciativa, de colocar novos produtos no
mercado, mas que por outro lado, não infrinja os direitos da coletividade, de
cada um como indivíduo referente a sua integridade física, moral e psíquica.
É neste
cenário que a responsabilidade civil objetiva deve ser introduzida, para
permitir que determinadas pessoas físicas ou jurídicas que criam um risco, um
mal-estar ou a possibilidade de um dano a outras pessoas da sociedade sejam
punidas.
Oportuno
salientar que através da aplicação da responsabilidade civil objetiva, há a
ampliação do rol dos responsáveis e das vítimas do dano, bem como a
concentração do enfoque na ocorrência de um dano normalmente injusto e a
inversão do ônus da prova, garantindo assim, a aplicação do princípio da
prevenção tão almejado pelo instituto da responsabilidade civil.
A preocupação
é que alguns estudiosos do direito entendem ainda, a responsabilidade civil de
modo diverso, isto é, preconizam a culpa como fundamento da responsabilidade
civil ou que o nexo de causalidade entre o dano e o agente causador deve estar
suficientemente caracterizado.
Contudo,
acredita-se que a inserção da responsabilidade civil objetiva no novo Código
Civil Brasileiro, fundamentalmente, no parágrafo único do artigo 927, que
ratificou a objetivação da responsabilidade civil, fará com que eles alterem
seu posicionamento com relação à culpa. Ainda que através das modificações, as
normas jurídicas é que atuarão de forma a proteger efetivamente o meio
ambiente.
Alguns
juristas ignoram as normas que aqui se aplicam, estas embasadas na relação
interindividual, ou seja, não contemplam a realidade da sociedade moderna, onde
o direito coletivo deve prevalecer sobre o individual. Também, nota-se que não
há utilização da hermenêutica baseada nos princípios constitucionais
contemporâneos, nos casos onde a lei deixa dúvidas ou onde não há previsão
legal, prejudicando um juízo de valor acurado.
Isto é o que
observa Paulo Bonavides[7], ao dizer que: “Culmina essa complexidade
com a presente época constitucional, como bem elucida Siqueira Castro, cujas
reflexões acerca da Constituição aberta e dos direitos fundamentais colhem de
cheio as surpreendentes mudanças de nosso tempo, as quais põem em risco ou
retardam a eficácia dos novíssimos direitos humanos que se devem positivar,
adjudicando-se-lhes a qualidade ou o grau de direitos fundamentais e
fazendo-os, por conseqüência, subir ao patamar constitucional, onde têm sede e
garantia”.
O
dano ambiental é de regra de natureza difusa, certamente por compreender a toda
uma coletividade de pessoas, não podendo determiná-las ou ainda atingir a
natureza sem definir os possíveis ecossistemas atingidos e conseqüências
determináveis. É desta forma, pela natureza difusa do dano ambiental, o
fundamento complementar da responsabilidade civil ambiental objetiva. Além do
risco proveniente da atividade, a característica difusa da natureza corrobora a
aplicação da responsabilidade objetiva em matéria ambiental.
Assim, havendo
uma atividade que cause dano difuso ambiental, necessária se faz a
responsabilização pelo risco ambiental proveniente desta atividade, não há de
perquirir se a atividade estava isenta de culpa ou se estava acobertada por
excludentes de força maior ou estado de necessidade.
Segundo a
Constituição Federal de 1988, para que se possa pleitear a reparação do dano
ambiental, o autor deve demonstrar o nexo causal entre a conduta do réu e a
lesão do meio ambiente protegido. Segundo tal concepção, há, a partir da
Carta Magna, a impossibilidade de alteração do regime da responsabilidade civil
objetiva quanto a dano ambiental, por qualquer lei infraconstitucional.
A tendência
doutrinaria é no sentido de não aceitar as clássicas excludentes da
responsabilidade civil, indicando cinco conseqüências da adoção da
responsabilidade civil, no tocante à questão ambiental, quais sejam: a)
irrelevância da intenção danosa (basta o prejuízo); b) irrelevância da
mensuração do subjetivismo; c) inversão do ônus da prova; d) irrelevância da
licitude da atividade; e) atenuação do relevo do nexo casual.
Quando houver
dano ao meio ambiente, surge a responsabilidade civil objetiva, aquela que
vige, independentemente da existência de culpa, sob a modalidade do risco
integral, que não admite qualquer excludente de responsabilidade.
Segundo Milaré[8], “a responsabilidade civil objetiva funda-se
num princípio de eqüidade, existente desde o Direito Romano: aquele que lucra
com uma atividade deve responder pelo risco ou pelas desvantagens dela
resultantes. Assumem o agente, destarte, todos os riscos de sua atividade,
pondo-se fim, à prática inadmissível da socialização do prejuízo e privatização
do lucro”.
Entretanto,
Paulo Affonso Leme Machado[9] afirma que “a responsabilidade objetiva
ambiental significa que quem danificar o meio ambiente tem o dever jurídico de
repará-lo. Presente, pois, o binômio dano-reparação. Não se pergunta a razão da
degradação para que haja o dever de reparar”.
Pelo sistema
adotado no Direito Ambiental Brasileiro não se discute, necessariamente, a
legalidade do ato.
É a
potencialidade de dano que o ato possa trazer aos bens ambientais que servirá
de fundamento para a responsabilização, desta forma, não exonera o poluidor ou
degradador a prova de que sua atividade é normal e lícita, de acordo com as
técnicas mais apuradas.
O que se leva
em conta, quanto à responsabilidade objetiva, é a doutrina da normalidade da
causa e anormalidade do resultado.
Portanto, não há que se falar em
vinculação do dano ambiental com a transgressão de normas administrativas, isto
é, não se elimina a responsabilidade, mesmo no caso de observância aos padrões
oficiais, mas com a ocorrência do dano em si, ou seja, mesmo que este não
derive de um ato ilícito, pode dizer que haverá dano.
4.1 Teoria
do risco integral
Pela teoria do
risco integral, uma vez que seja verificado o dano ambiental, o dever de
reparar independe da análise da subjetividade do agente, seja por falha humana
ou técnica, por obra do acaso ou força da natureza, deve o dano ser reparado,
respondendo o causador pelos prejuízos causados, podendo o empreendedor, quando
possível, ao se tratar de fato de terceiro, valer-se do direito de regresso,
contra o verdadeiro causador.
Milaré[10] afirma que “O interesse público, que é a
base do Direito Ambiental, encontra na responsabilidade civil objetiva uma
forma de convivência com a atividade particular voltada, normalmente, para o
lucro”.
Tem-se que, o
poluidor está assumindo todo o risco que sua atividade acarreta. O simples fato
de existir a referida atividade, somado à existência do nexo de causalidade
entre essa atividade e o dano, produz o dever de reparar.
4.2 Teoria
do risco assumido
Na concepção
do risco assumido, o empreendedor que obtém lucros através de atividades
causadoras de riscos à vida, à saúde ou ao meio ambiente, assume a
responsabilidade pelos danos ou encargos que são vinculados em um nexo causal
direto com tais riscos, independentemente de culpa, em caso de efetiva
ocorrência de fatos danosos, mas não assume os riscos que não lhe sejam
inerentes, ficando excluídos dos riscos assumidos, deste modo, o motivo de
força maior e o caso fortuito, por serem circunstâncias gerais desvinculadas do
nexo causal direto em relação às atividades exercidas ou aos riscos inerentes a
estas.
Constata-se,
portanto, que o caso fortuito e a força maior estão fora deste risco assumido,
haja vista não possuírem um nexo de causalidade atrelado especificamente ao
exercício da atividade empreendida, mas sim a circunstâncias imprevisíveis, que
se referem ao âmbito geral de qualquer tipo de atividade, de qualquer natureza,
razão pela qual estão fora do âmbito da responsabilidade objetiva, por não
corresponderem ao risco assumido especificamente pelas atividades do agente
responsável.
Fundamenta-se
no princípio de que o empreendedor assume os riscos de sua atividade e responde
por eles, porém, não responde por fatos imprevisíveis ou necessários, cujos
efeitos não se possa evitar ou impedir, como por exemplo, os danos ambientais
causados por um sinistro em seu empreendimento, em razão de um temporal ou
qualquer outro fenômeno da natureza.
No
entendimento desta teoria, uma vez que a responsabilidade sem culpa limita-se
aos danos decorrentes dos fatos que possuem um nexo causal ou um vínculo
necessário com as atividades exercidas por seu empreendimento.
Pois os riscos
assumidos seriam apenas os vinculados por um nexo de causalidade com este
empreendimento, excluindo-se os danos que sejam causados por tal empreendimento
em razão de circunstâncias alheias, imprevisíveis ou necessárias, que não
pudessem ser evitados ou impedidos pelo empreendedor e cuja ocorrência não tem
como causa determinante a sua atividade, mas seja motivada por circunstâncias
outras, de natureza diversa, que incidiram em seu empreendimento por circunstâncias
aleatórias.
As hipóteses
do caso fortuito e da força maior, assim, mesmo tratando-se de responsabilidade
objetiva, excluiriam a responsabilidade do agente, ficando assim com seus
efeitos equiparados aos casos de responsabilidade subjetiva.
4.3 Teoria
do risco criado
Nesta
concepção, a do risco criado, entende-se que o empreendedor responde por todos
os riscos de danos havidos em razão das atividades de seu empreendimento,
independente de culpa, entendendo-se como tais os decorrentes de quaisquer
fatos que, sem a sua existência, não teriam ocorrido, estabelecendo-se,
portanto, o nexo de causalidade no sentido de que quando as atividades de seu
empreendimento, ou o fato da localização de suas instalações físicas, de
qualquer forma, concorrerem para o evento causador do dano, responderá
civilmente por este.
A apuração do
nexo causal, deste modo, assenta-se na premissa do conditio sine qua non,
onde o empreendedor responde por todo o evento danoso que não tivesse
sido produzido sem a existência de seu empreendimento ou das atividades deste.
Responderá, pois, ainda que seu empreendimento ou atividade atue como concausa,
bastando que tenha concorrido, de qualquer forma, no nexo de causalidade de sua
produção, ainda esta seja derivada também de outras causas concomitantes.
Desta maneira, nas hipóteses de
caso fortuito ou força maior, permanecerá a responsabilidade objetiva do
empreendedor, pois, por exemplo, se uma tempestade ou qualquer outro fenômeno
imprevisto e inevitável causar uma explosão em seu estabelecimento empresarial,
expondo substâncias tóxicas ao meio ambiente, responderá mesmo assim, pelos
danos causados, visto que se inexistisse o seu empreendimento, a produzir e
armazenar substâncias tóxicas inexistiram também os danos causados.
Considerado
aqui esta simples existência de seu empreendimento, pois, atribui-se a este a
concausa na produção do evento danoso, criando o risco ou a possibilidade do
dano, que acabou acontecendo, mas que não teria ocorrido somente pela
incidência de tal fenômeno da natureza.
Sendo assim,
nesta concepção do nexo de causalidade como o evento danoso pode se estabelecer
como causa ou como concausa, com os mesmos efeitos jurídicos em ambas as
hipóteses, ou seja, a responsabilidade civil de quem com o seu estabelecimento
ou atividades, está vinculada a tal nexo causal do dano verificado criando,
portanto, o risco para que fosse produzido, seja como causa única, ou seja,
como concausa a qual sejam agregados outros fatores determinantes, mesmo que
sejam estes configurados como caso fortuito ou motivo de força maior.
Na tentativa
de melhor entender tal situação, pode se fazer o seguinte raciocínio,
procura-se eliminar a existência do empreendimento ou de suas atividades, se o resultado
danoso deixar de ocorrer, é porque existe o nexo causal entre tal
empreendimento (o risco criado por este) e o dano produzido, impondo-se a sua
responsabilidade objetiva.
Se, ao
contrário, eliminando-se tal existência, mesmo assim o resultado danoso
subsistir, é porque inexiste tal nexo de causalidade, inexistindo também, por
conseqüência, a responsabilidade objetiva.
No
entendimento desta teoria, a responsabilidade do empreendedor, que obtém lucro
com atividades potencialmente danosas precisa ser ampla, no sentido de abarcar
todos os riscos por ela criados, ainda que produzidos com a concorrência de
outras causas ou riscos que não lhe sejam inerentes.
Pois, não se
pode admitir que exercendo atividades geradoras de riscos de eventos danosos
para auferir benefícios econômicos, possa se eximir, ainda que parcialmente, da
responsabilidade por danos efetivos decorrentes de tais riscos que criou, mesmo
que o fato que lhe seja gerador tenha como concausa outros elementos,
configuradores de caso fortuito ou força maior, desde que estes, por si só, não
tenham produzido o resultado danoso independentemente do risco criado pelo
empreendedor, a partir do exercício de suas atividades e da criação da
estrutura física necessária para tal.
Em outras
palavras, para esta concepção a responsabilidade objetiva não pode ficar
vinculada à noção de risco assumido, que lhe restringe o âmbito de abrangência,
mas sim à noção de risco criado, segundo a qual toda a atividade que cria para
outrem um risco torna o seu autor responsável pelo dano para o qual concorra de
qualquer forma, ainda que não haja culpa de sua parte.
Há uma
tendência clara, no entanto, inclusive em nível internacional, no sentido de
que em matéria ambiental, a responsabilidade objetiva fundamenta-se na teoria
do risco criado, ou seja, decorre somente da criação de condições de risco.
Tal matéria no
Direito Ambiental Brasileiro mereceu referência especial. Com efeito,
estabelece o artigo 225, §3º, da Constituição Federal e no artigo 4º, inciso
VII, da Lei nº 6.938, de 31.08.81.
A
responsabilidade civil objetiva em matéria ambiental, pois no Direito
Brasileiro, possui assento na Carta Magna, que a recepcionou da legislação
infraconstitucional, conforme descreve Paulo de Bessa Antunes (apud Gomes) [11].
Há a aditar
que a parte final do § 3º do artigo 225 da Constituição Federal vigente
estabeleceu a responsabilidade civil objetiva em matéria ambiental.
A bem da
verdade, deve ser salientado que a responsabilidade objetiva já preexistia à
Carta Constitucional artigo 14, § 1º da Lei nº 6.938, de 31.08.81. [...] A
responsabilidade é um dos temas recorrentes do direito, e de fato se constitui
em verdadeira questão central para aqueles que pretendam tornar efetiva a
tutela constitucional do meio ambiente.
Desta forma, é
maciçamente dominante o entendimento no sentido de que este, seguindo uma
tendência em nível internacional, adotou a teoria do risco criado à responsabilidade
objetiva em matéria ambiental, mantendo-se a responsabilidade, portanto, de
acordo com esta teoria, nos termos antes aduzidos, mesmo quando sobre tal risco
incidem como concausa, o caso fortuito e o motivo de força maior, porque esta é
a teoria que mais se compatibiliza com os seus princípios constitucionais e com
seu sistema normativo, sob o fundamento de que nestes está contida
implicitamente a referida teoria do risco criado.
Na teoria do
risco criado, sendo o mesmo já anteriormente existente, o que inclusive já está
consagrado em norma internacional instituída pela União Européia, consoante
citação de Paulo Affonso Leme Machado.[12], ao fundamentar a abrangência da
responsabilidade objetiva também no Direito Ambiental Brasileiro.
A convenção
sobre responsabilidade civil dos danos resultantes de atividades perigosas para
o meio ambiente elaborada sob o patrocínio do Conselho da Europa, foi aberta
para a assinatura dos países integrantes em Laguno, aos 21 de junho de 1993.
Nos seus considerandos diz ser oportuno ‘estabelecer neste domínio um regime de
responsabilidade objetiva, levando em conta o princípio poluidor-pagador’.
O artigo 10,
tendo como rubrica a ‘causalidade’, diz: ‘Quando é apreciada a prova do liame
de causalidade ou, quadro de uma atividade perigosa definida no artigo 2º, §
1º, alínea ‘d’, entre esta atividade e o dano, o juiz terá devidamente em conta
o risco aumentado de provocar dano inerente à atividade perigosa’.
Importante
mencionar que a maior parte das obras de Direito Ambiental produzidas por
doutrinadores brasileiros, não fazem distinção entre as teorias do risco
assumido e do risco criado, referem-se genericamente apenas à responsabilidade
sem culpa como resultante da teoria do risco.
No entanto, ao
delimitarem o alcance de tal responsabilidade no direito nacional, identificam
claramente os seus fundamentos e extensão com os da teoria do risco criado,
evidenciando pois, mesmo assim, a opção do sistema jurídico ambiental de nosso
país por tal teoria, em detrimento, portanto, da concepção do risco assumido.
5.
RESPONSABILIDADE PENAL NO MEIO AMBIENTE
Devido às
preocupações levantadas, como conseqüências trazidas pelo progresso técnico e
industrial, a partir da década de 70, vários países deixaram a crença no
progresso ilimitado da ciência que impulsionou a ideologia positivista no
século XIX até os dias atuais. A proteção do meio ambiente passou a constituir
um problema fundamental no mundo contemporâneo.
A humanidade,
antes despreocupada com o meio ambiente, encontra-se hoje ante a ameaça
de sua extinção, pelo processo de autodestruição. Surge a necessidade de se
tomar medidas enérgicas para proteger a vida e sua qualidade contra aquele que
a ameaça, resolvendo o eventual conflito entre desenvolvimento econômico e
proteção do meio ambiente, rumo ao então desejado desenvolvimento sustentável.
A nova relação
que se estabeleceu entre o homem e a natureza, baseada no mútuo respeito e na
mútua dependência, com a predominância do interesse coletivo sobre o
individual, induziu a uma nova postura da sociedade para o meio ambiente, que
requer um novo enfoque dos problemas existentes e uma adequação da ordem
jurídica para as suas soluções, levando em consideração os novos valores
emergentes e a responsabilidade comum de sua defesa.
Como já
abordado neste estudo, a nossa Constituição, sedimentou ampla tutela ao meio
ambiente e a declaração de seus princípios fundamentais no seu art. 225, que
juntamente com a Lei 9.605/88, criaram mecanismos para que se assegurem a
preservação do meio ambiente, inclusive quanto aos seus recursos
naturais".
Consequentemente,
também se espera que o Direito Penal contribua, como parte integrante da ordem
jurídica, e como recurso extremo na proteção dos valores fundamentais da
sociedade, através das sanções que lhe são próprias, sendo a violação dos
mesmos intolerável e inevitável de outra forma.
O Direito
Penal agirá como recurso necessário de defesa social, garantidor da
coexistência pacífica entre os membros da coletividade, e instrumento de uma
política que atenda aos anseios sociais sem descurar os do desenvolvimento
econômico e as necessidades básicas da população. Nesse diapasão, se torna necessário
então realizar a compatibilização da Política Criminal com as diretrizes da
Política Ambiental, dotando-se a legislação penal de instrumentos e normas
adequadas à proteção dos valores ambientais, refazendo e redimensionando um
sistema que, além de apropriado às finalidades visadas, possa atender melhor
aos anseios e às exigências da nova ordem social.
Os recursos às
mais contundentes medidas de proteção, que pode proporcionar o ordenamento
jurídico, são plenamente justificáveis para a conservação e manutenção do meio
ambiente, pois se trata de um bem jurídico de especial transcendência cuja
proteção resulta essencial para a própria existência do ser humano e em geral
da vida, e que se encontra seriamente ameaçado. No entanto, a maior parte da
doutrina que admite a intervenção penal em matéria ambiental, matiza a postura
ressaltando o critério de última ratio do Direito Penal.
Os mais
relevantes aspectos de discussão doutrinária sobre o tema penal ambiental, relacionam-se
à identificação do bem jurídico protegido, a real necessidade de uma
intervenção penal nos problemas ecológicos, as novas técnicas legislativas
adotadas, lei penal em branco, a autonomia das sanções de ordem administrativa
em relação às de cunho penal, a possibilidade de se responsabilizar pessoas
jurídicas e a aplicação das penas alternativas.
No Estado
Democrático de Direito, o Direito Penal adequado, figura como um Direito Penal
de mínima intervenção, em que este só atuará a fim de proteger os bens
jurídicos fundamentais da sociedade, vez que sufocaria a convivência social se
não fosse limitada a sua intervenção. Nesta nova concepção do controle social
penal está a dignidade da pessoa humana, como centro da organização estatal,
que coloca o ser humano como fim último da organização social.
Ocorrem que,
principalmente a partir da década de 80, as relações sociais têm sofrido
grandes mudanças, caracterizadas, as grandes empresas transnacionais que
acabaram por deslocar, até certo ponto, o poder o qual passa a ter âmbito
mundial, não mais regional ou nacional.
Diante de tais
mudanças, ocorridas principalmente pelo incremento tecnológico, a globalização
e as relações econômicas em âmbito internacional, ocorreram transformações nos
fins da sociedade, a qual passa a organizar-se não mais em torno do indivíduo,
mas no sentido de atingir os fins do capitalismo mundial, uma sociedade assim
organizada ganha um tom organicista, onde o homem não é mais que um subsistema
do sistema social e este sim deve ser preservado, demandando que o Direito
Penal passe a assumir outras funções que não a de proteção de bens jurídicos
fundamentais.
Perde, com
isso, espaço o Direito Penal voltado à proteção de bens jurídicos, para ganhar
espaço um Direito Penal de máxima intervenção, destinado a produzir mudanças
estruturais necessárias. Conforme lição de Alberto Silva Franco[13], é o chamado Direito Penal Promocional, o
Direito Promocional assevera que por meio dessas infiltrações é posto em xeque
o caráter instrumental e garantístico da intervenção penal para atribuir-se ao
controle social penal ou uma função puramente promocional ou uma função
meramente simbólica. "Essa tomada de posição acarreta uma inflação de
figuras criminosas para efeito de evidenciar uma atitude acautelatória do
legislador diante das mudanças que se processam, com espantosa velocidade, em
nível de convivencialidade social. Esta indevida e antecipada intervenção penal
mostra-se de absoluta ineficácia, o que, a final, se traduz numa desmoralização
do próprio controle social penal".
O objetivo de
um Direito Penal Promocional seria o de aquietar a sociedade em geral, e certos
segmentos sociais em particular. O resultado, no entanto, não é sempre
satisfatório. A proteção do meio ambiente revela-se, atualmente, condição
essencial para a sobrevivência da própria espécie humana. A ordem
constitucional revela a proteção do meio ambiente como bem jurídico fundamental.
O Direito
Penal, no plano de um Estado Democrático de Direito, deve ser direcionado
preferencialmente para o combate dos crimes que impedem a realização dos
objetivos constitucionais do Estado., ou seja, no Estado Democrático de
Direito, instituído no art. 1o da CF/88, devem ser combatidos os
crimes que fomentam a injustiça social, o que significa afirmar que o direito
penal deve ser reforçado naquilo que diz respeito aos crimes que promovem e/ou
sustentam as desigualdades sociais". Nessa linha, estão os novos bens
jurídicos fundamentais, entre eles, o meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Conforme prega
Miranda Rodrigues[14], ao legislador "incumbe tentar encontrar
o justo equilíbrio entre o progresso econômico e social e o direito fundamental
à manutenção e restauração de um ambiente são. O que poderá fazer apelando
também à técnica e promovendo novos meios ou recursos que permitam o controlo
daquelas actividades que podem causar danos ou pôr em perigo aquele interesse
fundamental”.
6.
A RESPONSABILIDADE AMBIENTAL DA PESSOA JURÍDICA NA ESFERA PENAL
A grande
questão ainda não respondida de um todo é se responde ou não criminalmente a pessoa
jurídica, e talvez a maior problemática resida no que tange a como se aplicar
as penas privativas de liberdade no ente jurídico. Inúmeros e acirrados debates
tem-se travado ao longo das últimas décadas para verificar a possibilidade da
pessoa jurídica ser sujeito ativo no campo penal, onde basicamente duas
correntes antagônicas, e uma terceira via em formação, debatem a
responsabilidade penal das pessoas jurídicas, questão relevante para o direito
ambiental.
Aos que se
filiam ao sistema romano-germânico, que representam a esmagadora maioria, onde
vige o princípio societas delinquere non potest, segundo o qual, é
inadmissível a punibilidade penal dos entes coletivos, aplicando-se-lhes
somente a punibilidade administrativa ou civil. Por outro lado, nos países
anglo-saxões e naqueles que receberam suas influências, vige o princípio da common
law, que admite a responsabilidade penal da pessoa jurídica.
É bem verdade
que esta orientação começa a conquistar espaço entre os países que adotam o
sistema romano-germânico, como por exemplo, a Holanda e mais recentemente a
França e a Dinamarca. Essa tendência se fortaleceu depois da Primeira Guerra
Mundial em principio por duas razões: a primeira o Estado passou a ser mais
intervencionista, regulando a produção e distribuição de vários produtos e
serviços, e a segunda porque as empresas passaram a ser, em face do seu poderio
resultante da formação de gigantescos monopólios, se transformando nas
principais violadoras das normas estatais.
Existe
muita controvérsia na doutrina nacional sobre a questão no âmbito
constitucional. Alguns entendem que continua em vigor o princípio societas
delinquere non potest, não revogado, mas ratificado pela Carta de 1988.
Outros, ao contrário, sustentam que efetivamente a mais recente Constituição
Brasileira desejou inovar e se adequar à tendência universal no sentido de
responsabilizar penalmente a pessoa jurídica.
A Constituição
de 1988, sobre o tema, assim declara:
“A lei, sem
prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica,
estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a as punições compatíveis com
sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e
contra a economia popular" (art. 173, § 5o).
“As condutas e
atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores,
pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados” (art. 225, § 3o).
Como adeptos
da responsabilidade penal das pessoas jurídicas, podemos citar: Paulo Affonso
Leme Machado, Gilberto Passos de Freitas, Ivette Senise Ferreira, Sérgio
Salomão Shecaria, Antônio Evaristo de Morais Filho, Fausto Martin de Sanctis,
dentre outros ilustres.
Fausto Martin
de Sanctis[15], ao defender seu ponto de vista, expõe que: "O
legislador constitucional, atento às novas e complexas formas de manifestações
sociais, mormente no que toca à criminalidade praticada sob o escudo das
pessoas jurídicas, foi ao encontro da tendência universal de responsabilização
criminal. Previu, nos dispositivos citados, a responsabilidade penal dos entes
coletivos nos delitos praticados contra ordem econômica e financeira e contra a
economia popular, bem como contra o meio ambiente”.
Gilberto
Passos de Freitas[16], ao comentar o art. 225, § 3o,
afirma: "Diante desse dispositivo, tem-se que não há mais o que se
discutir a respeito da viabilidade de tal responsabilização”.
No dizer da
Professora Ivette Senise Ferreira[17], ‘designando como infratores ecológicos as
pessoas físicas ou jurídicas o legislador,... abriu caminho para um novo
posicionamento do Direito Penal do futuro, com a abolição do princípio ora
vigente o qual societas delinquere non potest’".
Além dos penalistas,
grande parte dos constitucionalistas, também, reconhece a responsabilidade da
empresa na Carta Política de 1988.
José Afonso da
Silva[18] defende que o disposto no art. 173, § 3o,
prevê a possibilidade de responsabilização das pessoas jurídicas,
independentemente de seus dirigentes, sujeitando-os às punições compatíveis com
sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica, tendo como um dos seus
princípios a defesa do meio ambiente.
Tanto para o
supracitado autor, ou como para Shecaria[19], os dois dispositivos da Carta Magna,
invocados no início deste capítulo têm entre si uma articulação orgânica, que
impedem possam ser examinados separadamente, por estarem no âmbito do mesmo
contexto.
No dizer da
Professora Ivette Senise Ferreira[20], ao comentar o art. 225, § 3o, afirma: “Diante
desse dispositivo, tem-se que não há mais o que se discutir a respeito da
viabilidade de tal responsabilização, designando como infratores ecológicos às
pessoas físicas ou jurídicas o legislador,...abriu caminho para um novo
posicionamento do direito penal do futuro, com a abolição do princípio ora
vigente o qual societas delinquere non potest’’.
Outros
doutrinadores, contrariamente, como adeptos da não responsabilização penal das
pessoas jurídicas, sustentam que desejou inovar a Constituição de 1988, e
adequou-se à tendência universal no sentido de responsabilizar penalmente a
pessoa jurídica, sendo que podemos destacar: René Ariel Dotti, Luiz Vicente
Cernicchiaro, Cezar Roberto Bitencourt, Antônio Claúdio Mariz de Oliveira ,
Luiz Regis Prado, José Carlos de Oliveira Robaldo, William Terra de Oliveira,
dentre vários.
Segundo o
entendimento predominante desta corrente doutrinária, a Constituição de forma
alguma consagrou a responsabilidade penal da pessoa jurídica. Alegado aqui está
à incapacidade de ação que o Direito Penal Contemporâneo estabelece, pois o
único sujeito com capacidade de ação é o indivíduo. Pode-se dizer, como ensina
Francisco de Assis Toledo[21] "que, no mundo social, só os seres
humanos são capazes de ouvir e de entender as normas, portanto, só eles podem
cometer crimes”.
A ação é o
comportamento voluntário conscientemente dirigido a um fim, compondo-se de um
comportamento exterior, de conteúdo psicológico, da antecipação mental do
resultado pretendido, da escolha dos meios e a consideração dos efeitos
necessários dirigido a um fim proposto.
Cezar Roberto
Bitencourt[22], em trabalho sobre o tema, lança a seguinte
indagação: "Como sustentar-se que a pessoa jurídica, um ente abstrato,
uma ficção normativa, destituída de sentidos e impulsos possa ter vontade e
consciência? Como poderia uma abstração jurídica ter ‘representação’ ou
‘antecipação mental’ das conseqüências de sua ‘ação’?." E
acrescenta: "... a conduta (ação ou omissão) é produto exclusivo do
homem”.
Já René Ariel
Dotti[23] destaca, com muita propriedade, que o conceito de ação como
atividade humana conscientemente dirigida a um fim vem sendo tranqüilamente
aceito pela doutrina brasileira, o que implica no poder de decisão pessoal
entre fazer ou não fazer alguma coisa, ou seja, num atributo inerente às
pessoas naturais’. Com efeito, a capacidade de ação e de culpabilidade exige a
presença de uma vontade, entendida como faculdade psíquica da pessoa
individual, que somente o ser humano pode ter”.
Assim,
ressalta a evidência de que a pessoa coletiva não possui consciência e vontade,
ou seja, não é capaz de ser sujeito ativo do delito, pois sem estes dois
elementos, consciência e vontade, é impossível falar-se, tecnicamente, em ação,
que é o primeiro elemento estrutural do crime, ao menos, que se pretenda
destruir o Direito Penal e partir, assumidamente, para a responsabilidade
objetiva.
Ainda nesse
sentido, afastando total responsabilização penal do ente coletivo, Luiz Regis
Prado[24], ao analisar o art. 225, § 3o, da
Constituição Federal, aduz que o dispositivo em tela refere-se, claramente, à conduta/atividade,
e em seqüência, à pessoas físicas ou jurídicas. Dessa forma,
vislumbra-se que o próprio legislador procurou fazer a devida distinção,
através da correlação significativa mencionada. E continua afirmando que "nada
obstante, mesmo que – ad argumentandum – o dizer constitucional fosse em outro
sentido – numa interpretação gramatical (a menos recomendada) diversa -,
não poderia ser aceito. Não há dúvida que a idéia deve prevalecer sobre o
invólucro verbal”.
Já
questionando a aplicação do Direito Penal personalíssimo, atribuindo a sanção a
quem cometeu o delito, sustenta José Carlos de Oliveira Robaldo[25], que a responsabilidade penal das pessoas
coletivas peca por dois motivos: primeiro porque fere o Direito Penal mínimo,
posto que está se atribuindo ao Direito Penal uma tarefa que não é sua; segundo
porque o Direito Penal se fundamenta na culpabilidade, cuja conduta, pedra
angular da teoria geral do delito, somente é atribuível ao homem.
Luiz Vicente
Cernicchiaro[26], por seu turno, entende que os arts. 173, §
5o e 225, § 3o, devem ser interpretados teleologicamente
e considerados dentre de um contexto sistêmico maior, sob pena de se perder a
congruência e visão de conjunto em relação a outros dispositivos
constitucionais. Para ele, ao menos dois princípios básicos do Direito Penal,
insertos na Constituição, seriam atingidos se houvesse a responsabilidade penal
da empresa, quais sejam, o princípio da culpabilidade e o da responsabilidade
pessoal; "haveria, pois, ofensa à idéia de que sem culpabilidade não
existe pena, dogma de segurança individual, garantido pelo sistema penal
brasileiro e haurido do Iluminismo; além disso, a pena passaria da pessoa do
condenado, atingindo terceiros que não houvessem praticado qualquer conduta
delituosa, ou que nem mesmo tivesse dado alguma contribuição nesse sentido”.
Sustentam
ainda que a capacidade de ação, de culpabilidade e de pena exige a presença de
uma vontade, entendida como faculdade psíquica da pessoa individual,
inexistente na pessoa jurídica, mero ente ao qual o direito atribui capacidade
para outros fins distintos dos penais. Não obstante, uma outra problemática
vertente situa-se na esfera processual, pois há uma enorme dificuldade em
investigar e individualizar as condutas nos crimes de autoria coletiva.
A argumentação
basilar é que seriam violados os princípios da Isonomia, porque a partir da
identificação da pessoa jurídica como autora responsável, os partícipes, ou
seja, os instigadores ou cúmplices, poderiam ser beneficiados com o relaxamento
dos trabalhos de investigação, e o Princípio da humanização das sanções, pois
quando a Constituição Federal trata da aplicação da pena refere-se sempre às
pessoas, ou seja, à conduta humana de cada pessoa.
Neste
diapasão, sustenta, René Ariel Dotti[27], In verbis:
"A se aceitar a esdrúxula proposta
da imputabilidade penal da pessoa jurídica, não poderia ela promover a ação de
ressarcimento contra o preposto causador do dano, posto ser a
co-responsável" pelo crime gerador do dever de indenizar. Faltar-lhe-ia
legitimidade, pois um réu não pode promover contra o co-réu a ação de reparação
de danos oriunda do fato típico, ilícito e culpável que ambos cometeram
.Corolário dessa conclusão é a regra do art. 270 do CPP: "O co-réu no
mesmo processo não poderá intervir como assistente do Ministério Público”.
Além do mais,
a pessoa jurídica não é intimidável pela certeza da aplicação de penas, e não
pode ser ressocializada através da sanção, reforçando a tese que a Carta Magna
de 1988 não adotou o princípio societas delinquere potest. Como a
pessoa coletiva não possui consciência e vontade – em sentido psicológico,
portanto não é capaz de ser sujeito ativo do delito, pois sem estes dois
elementos – consciência e vontade – é impossível se falar, tecnicamente, em
ação, que é o primeiro elemento estrutural do crime.
Ainda a Carta
Magna não dotou o ente moral de responsabilidade penal, ao contrário,
condicionou a sua responsabilidade à aplicação de sanções compatíveis com a sua
natureza.
É fato que
pela Carta Maior a responsabilidade penal continua a ser pessoal (art. 5o,
inciso XLX).
No entanto,
percebe-se que as duas correntes têm boa fundamentação, aos legalistas vai de
encontro ao sistema, mas resta claro que dentro da realidade jurídico-penal que
está instalada com a introdução de citados dispositivos legal, onde a inércia
legislativa mostra-se contrários ao molde criminal que está firmando-se neste
terceiro milênio, sendo pois, imperiosa a adequação da legislação penal,
estabelecendo um forte elo de ligação com a Carta Magna, buscando nesta
releitura, o fim de poder de dar ampla e irrestrita aplicabilidade à
responsabilidade penal da pessoa jurídica.
Concebendo ser
a lei do meio ambiente uma realidade e não um projeto em fase de discussão,
entende-se que o legislador ordinário nada mais fez do que concretizar o
imperativo constitucional em conforme uma demanda mundial de se proteger o meio
ambiente, sem desconsiderar, embora não concretizada, a necessidade de
intimidar ou responsabilizar o causador do dano, ainda que pessoa jurídica
fosse, para atender ao clamor e aos anseios da população que clama por justiça
e por proteção ao meio ambiente, bem comum da humanidade.
7.
CONCLUSÃO
Certamente é
tempo de se repensar o sistema penal tradicional, especialmente no que tange ao
Direito Ambiental, adaptando aos novos ditames da Carta Maior, como forma de
assegurar um futuro as próximas gerações que terão que conviver com o passivo
ambiental.
Já defendia o
mestre Rui Barbosa, através de seu célebre pensamento, onde eternizou que:
"Não
há, numa Constituição, cláusulas a que se deve atribuir meramente o valor
moral, de conselhos avisos ou lições. Todas têm força imperativa de regras,
ditadas pela soberania nacional ou popular aos seus órgãos. Cabe, pois, ao
legislador disciplinar a matéria”.
A pessoa
jurídica, criada para perseguir fins lícitos previamente idealizados pelos seus
membros pode, através de seus órgãos e seus dirigentes, no desempenho de seus
fins, lesar bens jurídicos penais, o que por si só merece atenção da ordem
jurídica penal nacional.
Andou bem o
legislador brasileiro, atento a esta problemática e consciente da inadequação
do sistema penal clássico para enfrentar determinadas espécies de criminalidade
e, sobretudo, responsabilizar os principais agentes de sua prática, não apenas
esculpiu os contornos jurídicos constitucionais da responsabilidade penal da
pessoa jurídica, como também conferiu-lhes a aplicabilidade, através da
instituição da Lei Ambiental n.º 9.605/98.
Este
diploma revolucionário e inovador no sistema penal brasileiro, merece aplausos
de todas as pessoas efetivamente preocupadas com a tutela do meio ambiente.
Necessário se faz, entretanto, algumas adaptações em seu texto, para torná-lo
mais eficaz e consentâneo com o princípio da legalidade, para atingir assim a
eficácia desejada.
A
responsabilidade penal das pessoas jurídicas deve ser entendida, a partir de
então, no âmbito de uma responsabilidade social. Faz-se necessário que a pessoa
jurídica na execução de suas tarefas, ainda que atue com fins e objetivos
distintos da dos seus agentes ou proprietários, seja penalizada, contudo a
sua responsabilidade não deve excluir a de seus dirigente, quando
for o caso.
Não se
pretende sufocar a dogmática penal que a reserva como ultima ratio,
suplantada pela Escola Clássica, onde somente seria possível ao homem ser sujeito
ativo de crime. Todavia, um posicionamento simplesmente contrário ao princípio
da societas delinquere non potest, incondicionado, não merece
consideração apesar da argumentação daqueles que são contrários à
responsabilização do ente coletivo, por conta de estar o sistema jurídico-penal
reclamando profundas mudanças com o intuito de ser adaptado e instrumentalizado
para a efetiva responsabilização nos moldes instituídos pela Lei Maior.
A realidade é
que em todo o mundo as legislações se preocupam com o fato de serem as pessoas
jurídicas um instrumento que facilita as atividades criminosas, por isso, devem
ser responsabilizadas não só civil e administrativamente, como também na esfera
penal. A doutrina internacional já vem avançando em ritmo acelerado, dentre ela
a inglesa, a holandesa e americana, estabelecendo que se é a pessoa jurídica
capaz de contratar, consequentemente tem também capacidade para criminosamente,
descumprir o contratado.
A pessoa
jurídica pelo seu aporte econômico é na maioria das vezes, mais nociva do que
todo contingente de pessoas físicas, e ainda assim pode facilmente acobertar a
prática de delitos. A resistência dos partidários da tese contrária está nos
clássicos conceitos de ação, culpabilidade e capacidade de pena, que se mostra
ultrapassada para os dias atuais, na medida em que está centrada na idéia
retributiva da pena, assim traduzida como sofrimento e tormento;
A tese
sustentada de que a pessoa jurídica não é capaz de pena é facilmente derrubada,
ante o fato de que não se mostra razoável, em pleno terceiro milênio, manter-se
a mesma concepção teórico-penal. O sistema penal vigente, por intermédio das
penas alternativas, possibilita a punição da pessoa jurídica, a exemplo das
penas alternativas, como as de multa, e até se possa condená-la em privativa de
liberdade, substituindo então por uma obrigação pecuniária.
Portanto, é
preciso assimilar que não mais tem o Direito Penal a finalidade de fazer
justiça, compensando-se a culpa com a pena. Em hipótese alguma pode o Direito
Penal de um Estado Democrático, se vincular as finalidades teológicas, deve sim
se destinar a fazer funcionar a sociedade, e vendo sob este prisma, pouco
importa que o violador da norma seja uma pessoa física ou jurídica, há que
promover um equilíbrio na balança, freando a depredação ambiental ora em
andamento.
8. FONTES DE
REFERÊNCIAS
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___.Crime ambiental: responsabilidade penal da pessoa jurídica? Boletim
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Disponível em: < http://www.advogado.adv.br/artigos/2005/alencarjoaodallagnol/responsabilidadeambiental.htm
>. Acesso em: 25/09/06.