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Competência legislativa e administrativa, áreas de preservação permanente e reserva legal
Giuliano Deboni
1. Meio Ambiente, proteção e desenvolvimento
Desde o início da civilização, o ser humano polui o planeta. É difícil imaginar
alguma atividade humana da qual não resulte alguma forma de poluição. Somente
na segunda metade do século anterior, a consciência preservacionista despertou
e o meio ambiente ganhou espaço nos meios de comunicação e no seio da
comunidade, contribuindo para inibir o mau uso dos recursos naturais, que se
soube serem limitados.
O
idealismo de alguns cidadãos cresceu, ampliou-se e incorporou-se à cultura dos
mais variados povos. Tanto é assim que a maioria dos países possui leis - a de
alguns, é verdade, mais rígidas - disciplinadoras de impactos ambientais
relacionados às atividades produtivas ou não.
Assim,
transcorridas três décadas da Conferência de Estocolmo e disseminada a mensagem
preservacionista, o grande desafio continua sendo o de conciliar a crescente
demanda de alimento e de bens da vida do homem com a conservação dos elementos
naturais do planeta.
A
partir deste momento, surge a idéia de desenvolvimento sustentado, ou
sustentável (não vem ao caso, mas a doutrina diverge quanto à nomenclatura)
como forma de compatibilizar o desenvolvimento econômico e social (inevitáveis)
com as necessidades humanas e a preservação do planeta.
Entretanto,
no que diz respeito às florestas brasileiras, embora a proteção legislativa
tenha sido implementada relativamente tarde, iniciou praticamente no despertar
da antes referida consciência preservacionista, mais especificamente, com a
edição do Código Florestal - Lei 4.771 de 15.09.1965. Ou seja, não obstante
tenha iniciado antes mesmo da vigência da Lei da Política Nacional do Meio
Ambiente (Lei 6.938/81), concretizou-se posteriormente às reais necessidades,
visto que o cultivo desenfreado de florestas e as suas grandes derrubadas
iniciaram quando as matas naturais foram sendo consumidas em diferentes usos ou
quando foram destruídas na busca de áreas agricultáveis.
Referido
Código sofreu, como se era de esperar, várias modificações, buscando adequar-se
à evolução social e em prol da premente proteção das florestas. Aliado a isso,
muitos Estados e Municípios têm contribuído na rigidez da legislação e da
fiscalização, esta, é bem verdade, ainda deficitária. Soma-se a isto a edição
da Lei 9.605/98, conhecida como Lei dos Crimes Ambientais, muito embora não se
restrinja apenas à esfera penal, mas também à administrativa.
Como
prova dos resultados, mesmo que ainda distantes do ideal, cita-se o caso do Rio
Grande do Sul, onde foi feito o primeiro inventário florestal em âmbito
estadual no Brasil e constatou-se que houve um significativo aumento na
cobertura florestal. Os dados relativos ao ano de 2001, coletados junto ao
DEFAP (Departamento de Florestas e Áreas Protegidas), órgão da Secretaria
Estadual do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul (SEMA), informam que o
território gaúcho conta com 17,53% de florestas nativas (florestas naturais)
contra 5,62% em 1981, e 0,97% de florestas plantadas, contra 0,62% em 1981.
Esses
percentuais referem-se à utilização do uso da terra e seu feliz acréscimo
decorre do abandono do uso da áreas mais difíceis de serem cultivadas, do maior
rigor da legislação e em virtude da crescente conscientização dos proprietários
sobre a importância das florestas para a continuidade das espécies.
O
presente estudo que restringe-se à questão legal, nem de perto tem a pretensão
de enfocar todas as discussões que envolvem a legislação florestal - que são
muitas - mas apenas de fazer algumas considerações necessárias à compreensão da
questão que envolve a competência para legislar e fiscalizar sobre florestas e
explicações sobre as Áreas de Preservação Permanente e a Reserva
Legal.
2. Competência legislativa e administrativa em matéria florestal
A
Constituição Federal de 1988, em matéria ambiental, foi extremamente provedora,
estando, inclusive, em sintonia com os diplomas internacionais que versam sobre
a matéria. Enaltece, em seu texto, o princípio da proteção ambiental, em prol
das gerações presentes e futuras.
Dentro
deste contexto, a Carta Constitucional trata da competência em matéria
ambiental, que deve ser estudada no âmbito legislativo e administrativo
(fiscalização). Prevê, no inciso VI, do artigo 24, abaixo transcrito, que a
competência para legislar sobre florestas é concorrente entre a União, os
Estados e o Distrito Federal:
"Art.
24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar
concorrentemente sobre:
(...)
VI
- florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e
dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;
§1.°
No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-à a
estabelecer normas gerais.
§2.
° A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a
competência suplementar dos Estados.
§3°
Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência
plena, para atender a suas peculiaridades.
§4°
A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei
estadual, no que lhe for contrário." (grifou-se)
Não
obstante referido artigo não mencione os municípios, é possível a estes
legislar sobre a flora local e sobre as áreas verdes, por expressa disposição
dos incisos I e lI, do artigo 30, da Constituição Federal, que assim dispõem:
Art.
30. Compete aos Municípios:
I
- legislar sobre assuntos de interesse local;
II
- suplementar a legislação federal e estadual no que couber;
(..)."
(grifou-se)
Desta
forma, conforme preceitua Paulo Affonso Leme Machado: "a declaração de
que uma determinada árvore fique imune ao corte tanto pode ser elaborada pela
União como pelos Estados e Municípios. É de se atentar que o art. 7° do Código
Floretal preceitua ‘mediante ato do Poder Público´´. Deixou em aberto qual o
Poder Público, interpreta-se, pois, que as mencionadas pessoas de Direito
Público são igualmente competentes" (1).
Assim,
o referido autor chega à conclusão de que "a Constituição Federal
deixou claro que o tema ‘florestas’ é de competência concorrente da União e dos
Estados (art. 24, VI). Continua válida a possibilidade de o Município legislar
sobre a flora local e notadamente sobre as áreas verdes (art. 30, I e II, da
CF)".
No
mesmo sentido o entendimento de Edis Milaré, após fazer referência à
competência administrativa (executiva), adiante trabalhada: "E no art.
24, VI, prevê a competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito
Federal para legislar sobre florestas. Aos Municípios, nessa matéria, cabe
suplementar a legislação federal e a estadual no que couber, conforme dispõe o
art. 30, II" (2). (grifou-se)
Ainda
sobre esta questão, Paulo Affonso Leme Machado, em sua obra Estudos de Direito
Ambiental, ensina que:
"O
‘interesse local´´ não precisa incidir ou compreender necessariamente todo o
território do município, mas uma localidade ou várias localidades de que se
compõe um município. Foi feliz a expressão usada pela Constituição Federal de
1988. Portanto, podem ser objeto de legislação municipal aquilo que seja da
conveniência de um quarteirão, de um bairro, de um subdistrito ou de um
distrito". (3) (grifou-se)
Ademais,
o interesse local não é caracterizado pela exclusividade do interesse,
mas sim pela sua predominância. E como refere o Professor Paulo Affonso, na
última obra citada, "a União e os Estados também irão legislar com base
em seus interesses - interesse nacional ou federal e interesse estadual -
inobstante a divisão de competência entre esses dois entes não tenha
expressamente mencionado o termo interesse" (4).
O
que não cabe ao Município, dentro do interesse local, é extrapolar seus
limites espaciais. Tanto é assim que a Constituição não faz qualquer limitação
acerca de assuntos e situações, a não ser a geográfica. Ademais, desde 1891 já
era conferida aos Municípios, constitucionalmente, uma competência privativa,
só que com a expressão "peculiar interesse".
À
União é assegurada a prerrogativa de produção de normas gerais, deixando aos
demais entes da federação a competência suplementar. Ou seja, cabe à legislação
federal abarcar princípios e regras de condução da questão ambiental do País,
que deve ser especificada pelos Estados, Distrito Federal e Municípios – estes
quando referir-se à área de interesse local. Deve a União evitar, assim,
o estabelecimento de regras casuísticas, específicas ou exemplificativas, para
não exceder ao limite da principiologia.
Obviamente,
por uma questão de especificação de competência, quando, por exemplo, lei
estadual e lei federal (esta apresenta linhas gerais) legislarem sobre o mesmo
tema, aquela, automaticamente, terá sua eficácia suspensa, no que lhe for
contrária, conforme preceitua o §4°, do artigo 24, antes referido e assinalado.
Nesse sentido a doutrina de Luis Carlos Silva de Moraes ao mencionar que "a
lei dispõe sobre hipóteses. Tornando-se fatos, terão repercussão em todos os
ramos do Direito mencionados. Havendo lei federal sobre normas gerais, lei estadual
tem sua eficácia suspensa, no que lhe for contrária" (5).
Manoel
Gonçalves, mencionando as normas gerais, a legislação complementar e a
supletiva, explica:
"Salienta-se
que, nesse campo de competências concorrentes, a Constituição estabelece a
repartição vertical, dando à União o poder de fixar normas gerais, cabendo
aos Estados a legislação complementar, sem excluir, todavia a legislação
supletiva. Esclarece o texto que inexistência de lei federal confere
competência plena aos Estados, e, quando de sua superveniência, a lei estadual
perderá eficácia naquilo que lhe contrário (§§ 1 °, 2 °, 3° e 4° do art. 24). "
(6) (grifou-se)
Para
rechaçar qualquer dúvida acerca da plena possibilidade de o Município legislar
em matéria ambiental, mesmo não havendo menção no artigo 24 da Constituição
Federal, importante trazer à colação os ensinamentos de Édis Milaré, Celso
Ribeiro Bastos e Vladimir Passos de Freitas, respectivamente:
Édis
Milaré
"Observe-se
que esse artigo não explicita a competência legislativa do Município, o que tem
levado à conclusão precipitada de que ele não tem competência normativa em
matéria ambiental.
Levado
ao pé da letra tal entendimento, chegar-se-ia ao absurdo de sustentar também
que ele não tem competência para legislar sobre urbanismo, por ser matéria de
competência concorrente incluída no art. 24. É evidente o disparate! Se a
Constituição conferiu-lhe poder para "proteger o meio ambiente e combater
a poluição em qualquer de suas formas" - competência administrativa -, é
óbvio que para cumprir tal missão há que poder legislar sobre a matéria. Acrescente-se,
ademais, que a Constituição Federal, entre inúmeras competências conferidas aos
Municípios, entregou-lhes a de, em seu território, legislar supletivamente à
União e aos Estados sobre proteção do meio ambiente.
A
propósito, lembre-se também que os Municípios, segundo o regime
constitucional de 1988, passaram a integrar a federação como entes autônomos
(arts. 1° e 18), o que importa dizer que o Estado brasileiro não é aquela
estrutura hierárquica em que o Município ocupa o último degrau. Ao contrário,
significa que Estados, Municípios e Distrito Federal são sujeitos ativos da
União, isto é, são os atores do pacto federativo." (7) (grifou-se)
Celso
Ribeiro Bastos
"Cumpre
reiterar, por fim, que no âmbito de sua competência constitucional o
Município exerce a função de legislar sem submissão hierárquica, sendo
inconstitucionais a lei estadual e a lei federal que, desbordando dos limites
das respectivas competências, invadirem o campo da competência municipal".
(8) (grifou-se)
Vladimir
Passos de Freitas
"Pode,
da mesma forma, legislar sobre assuntos de interesse local, como dispõe o inc. I
do art. 30 acima citado. Há situações a este respeito que não despertam
qualquer dúvida. Por exemplo, uma lei que estabeleça normas sobre o plantio,
preservação e poda de árvores é de interesse eminentemente local. É que
muitos problemas e dúvidas surgem sobre este assunto. Não só entre particulares
como entre Prefeituras e órgãos do Estado membro." (9)
A
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça
corroboram esse entendimento:
"Recurso
- Via ‘fax’ - Validade. O simples fato de o original do recurso haver sido
protocolado após o prazo referente a interposição não o prejudica, no que
utilizado o moderno meio de transmissão que é o ‘fax´´. Implica relega-lo a
inutilidade o empréstimo de valia condicionada a entrada do original, no
protocolo, dentro do prazo pertinente ao recurso.
Meio
Ambiente - Disciplina Normativa - União - Estados. À União cabe baixar as
normas - gerais sobre a defesa e a proteção da saúde, a abranger às relativas
ao meio ambiente. A autuação dos Estados mostra-se válida no que não as
contrariam."
(10) (grifou-se)
"Constitucional.
Meio Ambiente. Legislação Municipal Supletiva. Possibilidade.
Atribuindo,
a constituição federal, a competência comum à União, aos Estados e aos
Municípios para proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de
suas formas, cabe, aos Municípios, legislar supletivamente sobre a proteção
ambiental, na esfera do interesse estritamente local.
A
Legislação municipal, contudo, deve se constringir a atender às características
próprias do território em que as questões ambientais, por suas
particularidades, não contém com o disciplinamento consignado na lei federal ou
estadual. A legislação supletiva, como é cediço, não pode ineficacizar os
efeitos da lei que pretende suplementar.
Uma
vez autorizada pela União a produção e deferido o registro do produto perante o
ministério competente é defeso aos municípios vedar, nos respectivos
territórios, o uso e o armazenamento de substâncias aacrotóxicas, extrapolando
o poder suplementar, em desobediência a lei federal.
A
proibição de uso e armazenamento por decreto e em todo o Município constitui
desafeição à lei federal e ao princípio da livre iniciativa campo em que as
limitações administrativas hão de corresponder às justas exigências do
interesse público que as motiva sem o aniquilamento das atividades reguladas.
Recurso
conhecido e improvido. Decisão indiscrepante." (11) (grifou-se)
No
que diz respeito à competência administrativa, ou executiva - proteção das
florestas - consubstanciada no Poder de Polícia, a Constituição Federal dispõe,
em seu artigo 23, inciso VII, abaixo transcrito, que esta é de competência
comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Frisa-se,
desde já, que a competência administrativa não suscita tantos conflitos se
comparada com a legislativa:
"Art.
23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios:
(...)
VII
- preservar as florestas, a fauna e a flora;
Parágrafo
único. Lei complementar fixará normas para a cooperação entre a União e os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do
desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional." (grifou-se)
A
doutrina de Edis Milaré compartilha deste entendimento ao referir que "a
Constituição da República de 1988, em seu art. 23, VII, estabelece que a
preservação das florestas e da flora é de competência comum da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios" (12).
O
parágrafo único do artigo 23 é completamente desnecessário, tendo em vista que
a fixação de normas para a cooperação entre os entes federados não precisa
dar-se via lei complementar. Um convênio é instrumento suficientemente hábil à
atuação conjunta na preservação de florestas.
É
o caso, por exemplo, do Convênio assinado em 20 de dezembro de 1999, entre a
FEPAM (Fundação Estadual de Proteção Ambiental) e o Município de Porto Alegre
(RS) - com a interveniência da SMAM (Secretaria Municipal de Meio Ambiente) -
delegando a este a competência para o licenciamento e fiscalização ambiental em
Porto Alegre.
3. Área de preservação permanente
As
áreas de preservação permanente e as reservas legais são formas
de proteção jurídica especial das florestas nacionais. Ambas foram instituídas
pelo Código Florestal brasileiro. Os artigos 2° (sua redação original foi
alterada pela Lei n° 7.803/89) e 3°, criaram as denominadas áreas de
preservação permanente.
Estas
áreas, conforme doutrina de Edis Milaré "consistem em uma faixa de
preservação de vegetação estabelecida em razão da topografia ou do relevo,
geralmente ao longo dos cursos d´´água, nascentes, reservatórios e em topos e
encostas de morros, destinadas à manutenção da qualidade do solo, das águas e
também para funcionar como ‘corredores de fauna’" (13).
A
Lei n° 7.754, de 14.04.1989, considera de preservação permanente as florestas e
demais formas de vegetação natural existentes nas nascentes dos rios.
Esse
o conteúdo dos mencionados artigos 2° e 3° da Lei 4.771/65 (Código Florestal),
indispensáveis à compreensão do tema:
"Art.
2°. Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta
lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:
a)
ao longo dos rios ou de qualquer curso d´´água desde o seu nível mais alto em
faixa marginal cuja largura mínima seja:
1
- de 30 m (trinta metros) para os cursos d´´água de menos de 10 m (dez metros)
de largura;
2
- de 50 m (cinqüenta metros) para os cursos d´´água que tenham de 10 (dez) a 50
m (cinqüenta metros) de largura;
3
- de 100 m (cem metros) para os cursos d´´água que tenham de 50 (cinqüenta) a
200 m (duzentos metros) de largura;
4
- de 200 m (duzentos metros) para os cursos d´´água que tenham de 200
(duzentos) a 600 m (seiscentos metros);
5
- de 500 m (quinhentos metros) para os cursos d´´água que tenham largura
superior a 600 m (seiscentos metros) de largura;
b)
ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d´´água naturais ou artificiais;
c)
nas nascentes, ainda que intermitentes e nos chamados `olhos d´´água´´,
qualquer que seja a sua situação topográfica, num raio mínimo de 50 m
(cinqüenta metros) de largura;
d)
no topo dos morros, montes, montanhas e serras;
e)
nas encostas ou partes destas com declividade superior a 45°, equivalente a
100% na linha de maior declive;
f)
nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;
g)
nas bordas dos tabuleiros ou chapadas, a partir da linha de ruptura do relevo,
em faixa nunca inferior a 100 m (cem metros) em projeções horizontais;
h)
em altitude superior a 1.800 m (mil e oitocentos metros), qualquer que seja a
vegetação.
Parágrafo
único. No caso de áreas urbanas, assim entendidas as compreendidas nos
perímetros urbanos definidos por lei municipal e nas regiões metropolitanas e
aglomerações urbanas, em todo o território abrangido, observar-se-á o disposto
nos respectivos planos diretores e leis de uso do solo, respeitados os
princípios e limite a que se refere este artigo." (grifou-se)
"Art.
3°. Consideram-se, ainda, de preservação permanente, quando assim declarados
por ato do poder público, as florestas e demais formas de vegetação
natural destinadas:
a)
a atenuar a erosão das terras;
b)
a fixaras dunas;
c)
a formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias;
d)
a auxiliar a defesa do território nacional, a critério das autoridades
militares;
e)
a proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico ou histórico;
f
)a asilar exemplares da fauna ou flora ameaçadas de extinção;
g)
a manter o ambiente necessário à vida das populações silvícolas;
h)
a assegurar condições de bem-estar público.
§1°
A supressão total ou parcial de florestas e demais formas de vegetação
permanente de que trata esta Lei, devidamente caracterizada em procedimento
administrativo próprio e com prévia autorização do órgão federal de meio
ambiente, somente será admitida quando necessária à execução de obras, planos,
atividades ou projetos de utilidade pública ou interesse social, sem prejuízo
do licenciamento a ser procedido pelo órgão ambiental competente.
§2°
Por ocasião da análise do licenciamento, o órgão licenciador indicará as
medidas de compensação ambiental que deverão ser adotadas pelo empreendedor
sempre que possível
§3°
As florestas que integram o património indígena ficam sujeitas ao regime de
preservação permanente (letra g) pelo só efeito desta Lei." (grifou-se)
"Art.
3°-A. A exploração dos recursos florestais em terras indígenas somente poderá
ser realizada pelas comunidades indígenas em regime de manejo florestal
sustentável, para atender a sua subsistência, respeitados os arts. 2° e 3°
deste Código."
O
código Florestal conceitua área de preservação permanente (APP), em seu artigo
1°, §2°, inciso III, como sendo a "área protegida nos termos dos arts. 2
e 3 desta Lei, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de
preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a
biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o
bem estar das populações humanas".
Em
virtude da proteção jurídica conferida pelo Código Florestal, conforme acima
disposto, toda e qualquer interferência nestas áreas (APPs) - construções de
casas, estradas etc - deverá ser nulificada. Isto pode ocorrer tanto pelo Poder
Público como pelos cidadãos, estes fazendo uso da Ação Popular.
Paulo
Affonso Leme Machado refere que, "nem o princípio da autonomia
municipal possibilita ao Município autorizar obras públicas ou privadas
nas áreas destinadas a florestas de preservação permanente, pois estaria
derrogando e invadindo a competência da União, que estabeleceu normas
gerais" (14)(grifou-se)
Entretanto,
Patrícia Azevedo da Silveira, com a qual se concorda, entende que se houvesse a
interferência do município nestas áreas "não haveria a pecha da
inconstitucionalidade, respeitando-se a autonomia de todos os entes da
federação em seus respectivos campos de atuação" (15). Obviamente,
a referida autora não está tratando de construções e interferências drásticas
nestas áreas, mas sim de que questões referentes ao manejo florestal racional.
Utiliza
como argumento o fato de que o critério para a definição da metragem, baseado
na largura do corpo d´´água é incompleto, pois funda-se no aspecto jurídico,
quando, em realidade e até para que não se deprede o que se busca preservar,
tem que se basear na técnica, mediante análise morfológica, pluviométrica etc.
Assim,
o preenchimento do conceito de área de preservação permanente é do
âmbito do interesse local, oriundo de uma aferição técnica, sendo, por
conseguinte, de competência, também, do município, para restringir, quando
necessário, a possibilidade de depredação. O município pode, por exemplo,
certificar, tecnicamente, que em prol da preservação daquela área é necessário
ampliar-se o limite métrico estabelecido pelo Código Florestal como Área de
Preservação Permanente.
É
que a legislação federal estabelece, no artigo 2°, por exemplo, um limite
mínimo do que é considerado área de preservação permanente, a uma certa
distância do corpo d´´água. Mas esta determinação, ou melhor, a adequação deste
limite deve corresponder aos Municípios, por ser de interesse local. E é deles
a tarefa de fazer uma análise técnica apurada para verificar se é ou não
necessário aumentar este limite.
O
artigo 18 do Código Florestal preleciona que "nas terras de propriedade
privada, onde seja necessário o florestamento ou o reflorestamento de
preservação permanente, o Poder Público Federal poderá fazê-lo sem
desapropriá-las, se não o fizer o proprietário". O parágrafo 1° refere
que se "tais áreas estiverem sendo utilizadas com culturas, de seu
valor deverá ser indenizado o proprietário" e o 2° que "as
áreas assim utilizadas pelo Poder Público Federal ficam isentas de tributação".
Da
leitura do artigo acima, bem como do §2° do artigo 16 (proibição de corte raso
nas áreas de Reserva Legal), constata-se que a legislação não quer
apenas preservar as florestas, mas sim amplia-Ias. E no caso de inércia do
proprietário, o Poder Público poderá fazê-lo para criar um padrão ecológico
desejado.
Quanto
à obrigatoriedade ou não da Administração em plantar a floresta ou reflorestar,
a doutrina, acompanhada do Professor Paulo Affonso Leme Machado, tem entendido
que as florestas compreendidas no artigo 2° do Código Florestal são
imperativas, enquanto as do artigo 3° dependem de motivação, mediante a análise
da conveniência e da oportunidade de florestar e reflorestar. É que as daquele
foram criadas ex vi legis, enquanto que as deste o foram por uma decisão
discricionária da Administração.
As
florestas de preservação permanente não podem ser manejadas de forma a sofrerem
cortes rasos. Para alguns isso significa que essas florestas deixaram de ter
finalidade econômica. Outros entendem que é um investimento assecuratório do
bem-estar psíquico, espiritual e físico, não só do proprietário como da sociedade
como um todo.
O
Código não exaure a discussão sobre a possibilidade de as florestas de
preservação permanente serem florestas de rendimento. Entretanto, o § único do
artigo 5° não deixa dúvidas sobre a proibição de qualquer tipo de exploração
nos parques nacionais, estaduais e municipais.
Não
obstante esta expressa proibição, o Código Florestal, de maneira racional, em
seu artigo 4°, pondera que a supressão de vegetação nestas áreas (APPs) poderá
ser autorizada pelo órgão estadual competente, nos casos de utilidade pública
ou de interesse social. Eis o conteúdo do mencionado artigo:
Art.
4° A supressão de vegetação em área de preservação permanente somente poderá
ser autorizada em caso de utilidade pública ou de interesse social, devidamente
caracterizados e motivados em procedimento administrativo próprio, quando
inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto.
§1°
A supressão de que trata o ´´caput´´ deste artigo dependerá de autorização
do órgão ambiental estadual competente, com anuência prévia, quando couber,
do órgão federal ou municipal de meio ambiente, ressalvado o disposto no §2°
deste artigo.
§2°
A supressão de vegetação em área de preservação permanente situada em área
urbana dependerá de autorização do órgão ambiental competente, desde que o
município possua conselho de meio ambiente com caráter deliberativo e plano
diretor, mediante anuência prévia do órgão ambiental estadual competente
fundamentada em parecer técnico.
§3°
O órgão ambiental competente poderá autorizar a supressão eventual e de baixo
impacto ambiental, assim definido em regulamento, da vegetação em área de
preservação permanente.
§4°
O órgão ambiental competente indicará previamente à emissão da autorização para
a supressão de vegetação em área de preservação permanente, as medidas
mitigadoras e compensatórias que deverão ser adotadas pelo empreendedor.
§5°
A supressão de vegetação nativa protetora de nascentes, ou de dunas e mangues,
de que tratam, respectivamente, as alíneas ´´c´´ e Y do art. 2° deste Código,
somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública.
§6°
Na implantação de reservatório artificial é obrigatória a desapropriação ou
aquisição, pelo empreendedor, das áreas de preservação permanente criadas no
seu entorno, cujos parâmetros e regime de uso serão definidos por resolução do
CONAMA.
§°7
É permitido o acesso de pessoas e animais às áreas de preservação permanente,
para obtenção de água, desde que não exija a supressão e não comprometa a
regeneração e a manutenção a longo prazo da vegetação nativa" (grifou-se)
Como
o §1°, do artigo 3° do Código prevê que, em se tratando de florestas de
preservação permanente, o licenciamento da atividade compete à esfera federal,
importante que seja feita uma análise em conjunto entre esse artigos.
Da
leitura destes dois artigos extrai-se que o interessado deve iniciar o
procedimento de licenciamento na esfera estadual, sendo que este órgão
verificará quem é competente, dando continuidade no licenciamento ou remetendo
o processo para outra esfera, que poderá ser a municipal.
Assim
pronunciou-se Luís Carlos da Silva Moraes:
"Agora,
com a atual redação do art. 4°, §2°, desse código, as atividades florestais
poderão ser licenciadas pelo município, caso esse tenha plano diretor (art.
182, §1°, CF/88) e órgão similar ao Conselho Nacional de Meio Ambiente (Dec.
99.274/91) e a área ser licenciada esteja no perímetro urbano." (16)
Quando
se tratar, portanto, de área pertencente à zona rural, ou o órgão estadual se
dá por competente ou será remetido, nos termos do §1°, art. 3°, para a esfera
federal.
Quanto
aos crimes ambientais relacionados às áreas de preservação permanente pode-se
dizer, sinteticamente, até para não haver fuga ao propósito do tema, que a Lei
9.605/98 tipificou alguns comportamentos que não constavam nas contravenções do
artigo 26 do Código Florestal e modificou as penas dos que já estavam
previstos. Prevê, ainda, multas por infrações administrativas, nos artigos 38,
39 e 40, cuja redação foi repetida nos artigos 25, 26 e 30 do Decreto 3.179, de
21.09.1999.
4. Reserva Legal
Abordadas
as principais questões relativas à competência em matéria ambiental,
direcionada ao âmbito florestal, e às áreas de preservação permanente, oportuno
traçar alguns comentários sobre a Reserva Legal, que, assim como as
APPs, são formas de proteção jurídica especial das florestas nacionais.
A
Constituição Federal, em seu artigo 225 impõe ao Poder Público e à coletividade
o dever de defender e preservar o meio ambiente para as gerações presentes e
futuras. Nesse sentido, incumbe àquele - conforme previsão do inciso III, do
§1º - a definição de espaços territoriais a serem protegidos.
A
Reserva Legal, que, dentro deste contesto de proteção, consiste na
destinação de uma porção contínua de cada propriedade rural para preservação da
vegetação e do solo, está prevista nos artigos 16 e 44 do Código Florestal. Referidos
artigos, que, embora sejam extensos, mas devido a sua importância para a
compreensão do tópico, abaixo seguem transcritos, referem que as florestas de
domínio privado podem ser exploradas, mas com a conservação de um determinado
percentual.
"Art.
16. As florestas e outras formas de vegetação nativa, ressalvadas as
situadas em área de preservação permanente, assim como aquelas não sujeitas ao
regime de utilização limitada ou objeto de legislação específica, são
suscetíveis de supressão, desde que sejam mantidas, a título de reserva legal,
no mínimo:
I
– oitenta por cento, na propriedade rural situada em área de floresta
localizada na Amazônia Legal;
II
– trinta e cinco por cento, na propriedade rural situada em área de
cerrado localizada na Amazônia Legal, sendo no mínimo vinte por cento na
propriedade e quinze por cento na forma de compensação em outra área, desde que
esteja localizada na mesma microbacia, e seja averbada nos termos do §7º deste
artigo;
III
– vinte por cento, na propriedade rural situada em área de floresta ou
outras formas de vegetação nativa localizada nas demais regiões do País; e
IV
– vinte por cento, na propriedade rural em área de campos gerais
localizada em qualquer região do País;
§1º
O percentual de reserva legal na propriedade situada em área de floresta e
cerrado será definido considerando separadamente os índices contidos nos
incisos I e II deste artigo.
§2º
A vegetação da reserva legal não pode ser suprimida, podendo apenas ser
utilizada sob regime de manejo florestal sustentável, de acordo com princípios
e critérios técnicos estabelecidos no regulamento, ressalvadas as hipóteses
previstas no §3º deste artigo, sem prejuízo das demais legislações específicas.
(...)
§6º
Será admitido, pelo órgão ambiental competente, o cômputo das áreas relativas à
vegetação nativa existente em área de preservação permanente no cálculo do
percentual de reserva legal, desde que não implique em conversão de novas áreas
para o uso alternativo do solo, e quando a soma da vegetação nativa em área de
preservação permanente e reserva legal esceder a:
I
– oitenta por cento da propriedade rural localizada na Amazônia Legal;
II
– cinqüenta por cento da propriedade rural localizada nas demais regiões do
País; e
III
– vinte e cinco por cento da pequena propriedade definida pelas alíneas ‘b’ e
‘c’ do inciso I do §2º do art. 1º.
§7º
O regime de uso da área de preservação permanente não se altera na hipótese
prevista no parágrafo anterior.
§8º
A área de reserva legal deve ser averbada à margem da inscrição de matrícula do
imóvel, no registro de imóveis competente, sendo vedada a alteração de sua
destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, de desmembramento ou
de retificação de área, com as exceções previstas neste Código.
§9º
A averbação da reserva legal da pequena propriedade ou posse rural familiar é
gratuita, devendo o Poder Público prestar apoio técnico e jurídico, quando
necessário.
§10.
Na posse, a reserva legal é assegurada por Termo de Ajustamento de Conduta,
firmado pelo possuidor com o órgão ambiental estadual ou federal competente,
com força de título executivo e contendo, no mínimo, a localização da reserva
legal, as suas características ecológicas básicas e a proibição de supressão de
sua vegetação, aplicando-se, no que couber, as mesmas disposições previstas
neste Código para a propriedade rural.
§11.
Poderá ser instituída reserva legal em regime de condomínio entre mais de uma
propriedade, respeitado o percentual legal em relação a cada imóvel, mediante
aprovação do órgão ambiental estadual competente e as devidas averbações
referentes a todos os imóveis envolvidos." (grifou-se)
Art.
44. O proprietário ou possuidor de imóvel rural com área de floresta nativa,
natural, primitiva ou regenerada ou outra forma de vegetação nativa em extensão
inferior ao estabelecido nos incisos I, II, III e IV do art. 16, ressalvado o
disposto nos seus §§5º e 6º, deve adotar as seguintes alternativas, isoladas ou
conjuntamente:
I
– recompor a reserva legal de sua propriedade mediante o plantio, a cada três
anos, de no mínimo 1/10 da área total necessária à sua complementação, com
espécies nativas, de acordo com critérios estabelecidos pelo órgão ambiental
competente;
II-
conduzir as regeneração natural da reserva legal; e
III
– compensar a reserva legal por outra área equivalente em importância ecológica
e extensão, desde que pertença ao mesmo ecossistema e esteja localizada na
mesma microbacia, conforme critérios estabelecidos em regulamento.
(...)
§4º
Na impossibilidade de compensação da reserva legal dentro da mesma mcro-bacia
hidrográfica, deve o órgão ambiental estadual competente aplicar o critério de
maior proximidade possível entre a propriedade desprovida de reserva legal e a
área escolhida para compensação, desde que na mesma bacia hidrográfica e no
mesmo Estado, atendido, quando houver, o respectivo Plano de Bacia
Hidrográfica, e respeitadas as demais condicionantes estabelecidas no inciso
III.
§5º
A compensação de que trata o inciso III deste artigo deverá ser submetida à
aprovação pelo órgão ambiental estadual competente, e pode ser implementada
mediante o arrendamento da área sob regime de servidão florestal ou reserva
legal, ou aquisição de cotas de que trata o art. 44-B.
(...)"
Portanto,
em floresta localizada na Amazônia Legal, 80% (oitenta por cento) será
destinada à Reserva Legal. Já nas demais regiões do País, as florestas privadas
podem ser exploradas, desde que haja a conservação de 20% (vinte por cento) da
cobertura arbórea.
Veja-se
que as áreas de preservação permanente diferem das áreas de Reserva
Legal no que concerne à dominialidade, pois enquanto aquelas incidem sobre
o domínio público e privado, estas, apenas sobre o privado.
Assim,
no restante da propriedade particular é permitida a exploração e supressão da
floresta, mediante prévia autorização do IBAMA ou órgão estadual competente –
no RS, por exemplo, é o DEFAP (Departamento de Florestas e Áreas Protegidas) e
em SP é o DEPRN (Departamento Estadual de Proteção de Recursos Naturais) -
desde que não estejam enquadradas como áreas de preservação permanente ou em
outro regime de proteção legalmente estabelecido.
Como
as normas relativas à Reserva Legal florestal foram instituídas pela
União Federal, apresentam caráter geral. Cabe, portanto, aos demais entes da
federação (aos municípios também, se for assunto de interesse local),
apenas torna-las mais severas, mas não abranda-las, sob pena de afastar-se do
objeto principal: a preservação do meio ambiente.
A
área tida como de Reserva Legal não poderá ser suprimida, mas apenas ser
utilizada sob o regime de manejo florestal sustentável, sempre, obviamente, com
autorização da autoridade competente e sob sua fiscalização.
Não
há obrigatoriedade de a área a ser destacada como de Reserva Legal ser
composta apenas de floresta de porte, podendo abranger área degradada. Esse
entendimento é corroborado pelo magistrado Antônio Silveira Ribeiro dos Santos,
que assim refere:
"A
Reserva Legal não deve ser obrigatoriamente apenas área de floresta de porte
como pode parecer a princípio, mas também pode abranger área degradada. É o que
se depreende do disposto na Lei federal nº 8.171/91, que dispõe sobre a
política agrária, quando obriga a recomposição da reserva pelo proprietário
rural (...)." (17)
Uma
das características peculiares deste instituto de preservação das florestas é a
inalterabilidade da sua destinação, da sua finalidade. A exceção fica por conta
da superveniência de lei federal. Ou seja, o Poder Executivo não poderá alterar
o percentual disposto às reservas, bem como as demais exigências legais que a
caracterizam.
A
área de domínio privado a ser estabelecida como de reserva legal será de
escolha do órgão encarregado – Poder Público – que se utilizará do seu Poder
Discricionário para tanto, o que não significa dizer que deverá faze-la
abstraindo-se de certos limites, sob pena de ser arbitrário.
Em
virtude da interpretação dos artigos 16, §4º, e 44, §7º, do Código Florestal,
na prática são computadas no cálculo do percentual da área a ser destinada como
de Reserva Legal as áreas de preservação permanente. Isso
representa um profundo retrocesso na preservação ambiental, pois não obstante
estas áreas sejam distintas quanto à função ecológica - conforme estatuído nos
incisos II e III do artigo 1º do Código Florestal – visam assegurar uma maior
biodiversidade biológica, motivo pelo qual aconselha-se, inclusive, que sejam
delimitadas em áreas distintas e contíguas para uma melhor interação dos
elementos naturais que a compõe.
A
Reserva Legal, conforme previsto no §8º, do artigo 16, do Código Florestal,
deve ser averbada à matrícula do imóvel, no cartório competente. Referida
averbação pode ser provocada por qualquer pessoa, nos termos do artigo 217 da
Lei de Registros Públicos (Lei 6.015, de 31.12.1973). Para tanto, basta o
pagamento das respectivas despesas e do fornecimento de elementos fáticos e
documentais. Isso porque as florestas são "bens de interesse comum a todos
os habitantes do País" (artigo 1º do Código Florestal) e "todos têm
direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado" (caput do artigo
225 da Constituição Federal).
Conforme
disposto no inciso III, do artigo 44, também do Código Florestal, acima
transcrito, poderá adotar como medida alternativa a compensação da Reserva
Legal por outra área equivalente em importância ecológica e extensão, desde
que pertença ao mesmo ecossistema e esteja localizado na mesma micro-bacia. Por
exceção a este inciso, o §4º, do mesmo artigo, admite a compensação da Reserva
Legal por outras áreas localizadas além dos limites da propriedade, "desde
que pertençam aos mesmos ecossistemas, estejam localizadas dentro do mesmo
Estado e sejam de importância ecológica igual ou superior à da área compensada"
(18).
A
compensação deverá, sempre, ser submetida à aprovação do órgão ambiental estadual
competente (§5º, do artigo 44, do Código Florestal).
5. Conclusão
No
âmbito florestal, a competência para legislar é concorrente entre a União, os
Estados, o Distrito Federal e, também, os Municípios, mesmo este não constando
no caput do artigo 24 da Constituição Federal de 1988. Isso, embora
suscite discussões, ocorre porque o artigo 30 da Carta Magna dispõe que estes
podem legislar sobre assuntos de interesse local e também que lhes compete
suplementar a legislação federal e a estadual no que couber.
Para
fiscalizar as florestas, a competência não gera conflitos, pois o caput
do artigo 23 não deixa margem a dúvidas ao mencionar todos os entes da
federação.
As
Áreas de Preservação Permanente (APPs) e as destinadas à Reserva Legal (RL) são
formas de proteção jurídica especial das florestas nacionais. Assim, não podem
sofrer interferência, exploração, a não ser que o órgão estadual competente
autorize e fiscalize, e desde que se tratem de casos de utilidade pública ou de
interesse social.
As
áreas de Reserva Legal admitem, ainda, o manejo florestal sustentável, também,
obviamente, mediante autorização da autoridade competente e sob sua
fiscalização.
Em
síntese, as Áreas de Preservação Permanente e as de Reserva Legal – visam à
proteção jurídica das florestas brasileiras - diferem entre si, basicamente, no
que diz respeito à dominialidade, pois aquelas incidem sobre o domínio público
e privado e estas apenas sobre o privado, já que a propriedade particular é a
única que poderá, mediante autorização, ser objeto de exploração.
BIBLIOGRAFIA
BASTOS,
Celso Ribeiro. Comentários à Constituição do Brasil. Volume 3-Tomo II.
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Disponível em: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=6718.
Acesso em: 16.maio.2005.