A evolução tecnológica propiciou um
refinamento na produção de equipamentos. Em relação aos aparelhos de som o
avanço foi substancial, permitindo uma reprodução com maior precisão, aguçando
a audição de todos que curtem uma música de qualidade, esclarecendo que
qualidade aqui tem um sentindo bem amplo, abrangendo a pluralidade de
sentimentos e admirações.
O uso adequado desses equipamentos
sonoros é o desejado numa sociedade plural, contudo, nem sempre é esta a regra.
A sociedade moderna vem sofrendo com a forma, agressiva, incômoda e
principalmente desrespeitosa, que alguns cidadãos fazem dos aparelhos sonoros.
Interessante registrar que esse não é um
problema só das grandes cidades, as pequenas aglomerações urbanas também sofrem
com o abuso injustificado desses equipamentos sonoros. Antigamente, esses
abusos ocorriam esporadicamente, mais especificamente nos finais de semana,
porém, hoje, inexiste hora específica, a qualquer momento do dia você pode ser
agredido pelo avassalador equipamento sonoro, que sem pedir licença adentra em
seus tímpanos. A qualquer momento do dia todos estão expostos a esse abuso
amplificado.
O problema da poluição sonora ganha
contornos de problema público que deve merecer uma atenção mais rigorosa dos
órgãos públicos, em virtude das graves conseqüências que ocasionam para o
conjunto da sociedade. Em alguns países o problema da poluição sonora já
integra a política de saúde pública em razão do índice alto de surdez,
principalmente juvenil.
No Brasil as demandas oriundas de
conflitos por uso de equipamentos sonoros vem crescendo assustadoramente e o
Poder Judiciário tem efetivado a prestação jurisdicional para restabelecer o
equilíbrio rompido. Porém, essa prestação jurisidicional atinge parcela pequena
dos problemas existentes, as demandas são maiores, os conflitos aumentam e às
vezes descambam para as agressões físicas, engrossando as estatísticas da
violência no país.
A primeira observação diz respeito a
responsabilidade penal da perturbação do sossego alheio. A Lei das
Contravenções Penais no art. 42 tipifica a conduta de atentar contra o sossego
de outrem. Então inicialmente fica esclarecido que existe no ordenamento penal
brasileiro uma repressão a conduta de perturbar o descanso alheio. Levando de
imediato o observador a entender que o abuso com equipamentos reprodutores de
som também é um caso de polícia.
Todavia, o interesse aqui é também levar
o leitor a perceber que as responsabilidades estão integradas e não só a
polícia tem responsabilidade com esse problema. O município, no sistema
constitucional brasileiro, foi guindado a condição de ente federativo, dotado
de autonomia e com receita própria. Os serviços locais são de responsabilidade
da municipalidade, que deve exercer o controle com o respectivo poder de
polícia. As atividades exercidas dentro do território municipal são de
competência dessa entidade federativa.
Assim, por exemplo, quando um determinado
cidadão quer comercializar refrigerantes e bebidas, ele recorre ao município
para tentar conseguir o licenciamento necessário para funcionamento, após
obedecer todos os trâmites legais estabelecidos na legislação local.
Muitos municípios brasileiros colocam
exigências específicas para o licenciamento de estabelecimentos comerciais que
farão uso de equipamentos sonoros, geralmente ocorre a necessidade de uma
licença ambiental para uso dos referidos aparelhos, como condição sine qua
non para utilizá-los. Dessa forma, o comerciante que não possuir a referida
licença não poderá utilizar equipamento sonoro em seu estabelecimento
comercial. Observe que essa licença difere da licença de funcionamento, esta é
específica, justamente para que o Órgão Público exerça o poder de polícia,
evitando que a população seja surpreendida com atividades poluidoras e
geradoras de conflitos.
Infelizmente, no contexto geral os
municípios no Brasil não exercem a contento esse controle e a população está
submetida a dezenas de agressões sonoras, tais como: bares, carros de som,
mini-trios, trios elétricos, sambões, batucadas e tantas outras manifestações
agressivas e perturbadoras da tranqüilidade pública.
Os municípios brasileiros precisam
adequar a estrutura administrativa para o controle dessas atividades, pois a
inexistência de órgão local investido em competências específicas para
fiscalização, facilita a proliferação de atividades dessa ordem, danosas para o
convívio social e geradores de centenas de problemas. Os conflitos aumentam com
a aproximação de um pleito eleitoral, oportunidade em que muitos candidatos
também utilizarão desses equipamentos sonoros, potencializando dessa forma a
poluição sonora nos municípios.
A responsabilidade recai sobre duas
esferas: a polícia e os municípios. De forma integrada devem coibir os abusos.
Cabe esclarecer, que é necessário um aperfeiçoamento da força pública,
municipal ou estadual, vinculada ao combate desse tipo de abuso, pois sem uma
atuação conjunta a eficácia desejada não será alcançada.
Também merece registro o esforço que o
Ministério Público vem fazendo para regulamentação dessa situação nos
municípios e efetivação do poder de polícia. O meio ambiente equilibrado, está
assegurado na Constituição de 1988 como um direito fundamental de todo cidadão
e os Poderes Públicos devem velar pela sua implementação.
Por último, é preciso registrar, que o
abuso no uso de equipamentos sonoros é uma falta de educação, aumentando dessa
forma a responsabilidade dos pais na educação de seus filhos para a convivência
social. Viver em sociedade, significa compartilhar, cada cidadão contribui para
o bem coletivo, ninguém impõe a outrem uma forma de viver, todos devem repartir
o mesmo espaço, de maneira harmoniosa e civilizada.
Revista Consultor Jurídico, 24 de maio
de 2004
Retirado de: http://conjur.uol.com.br/textos/27464/