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A ANA, a
mulher e a gestão dos recursos hídricos brasileiros
Nida Coimbra
Em relação aos recursos hídricos, no Brasil, a criação da
Agência Nacional de Águas - ANA que, coincidentemente, tem um nome feminino,
enche-nos de esperanças no sentido de que este fato não seja apenas uma mera
coincidência.
Reconhecendo o importante papel que a mulher
desempenha na qualidade de vida e na saúde das futuras gerações, em 1992, a
Conferência sobre Água e Meio Ambiente em Dublin, aprovou 4 princípios gerais.
Dentre eles destacamos o PRINCÍPIO nº3 que tem sido motivo de polêmica em
muitos encontros pela pouca compreensão que ainda existe sobre a importância do
papel da mulher na gestão dos recursos naturais, diz ele: "A MULHER
DESEMPENHA UM PAPEL FUNDAMENTAL NO ABASTECIMENTO, NA GESTÃO E NA PROTEÇÃO DA
ÁGUA".
Aos urbanos parece um conceito de difícil assimilação, mas
observemos a questão mais claramente sob o aspecto rural. Há algum tempo
assisti uma reportagem na televisão que muito me marcou. Uma entrevistada,
senhora simples do interior nordestino, característica zona de seca e
desertificação, mostrava ao repórter o poço onde havia encontrado um filete de
água em sua propriedade. Em emocionada alegria e simplicidade relatava que na
situação de penúria em que se encontrava, estava prestes a abandonar a terra;
sua família estava se desagregando, seu marido estava prestes a abandoná-la e
aquele poço veio a mudar a sua vida. Ela dizia: "com esta água eu tenho
agora a minha liberdade, porque não tenho que caminhar quilômetros de distância
para buscar água para minha família, não mais necessito obedecer aqueles que
manipulam na região o fornecimento de água, através de açudes particulares.
Agora posso, inclusive, escolher em quem vou votar. Meu marido decidiu ficar
porque assim temos futuro, podemos plantar, irrigar a minha horta. Tenho também
mais tempo para a minha família, para meus filhos. E saúde também, porque na
minha terra, posso cuidar para que esta água não se suje."
Esse exemplo caracteriza muito bem o papel da mulher como primeira
gestora dos recursos naturais. Nas regiões mais pobres, mulheres e crianças
dedicam várias horas cada dia a recolher e transportar água potável e lenha,
tempo e energia que poderiam dedicar à educação, ao desenvolvimento da
comunidade e à estruturação de boas relações familiares. Exemplificamos com a
água por ser ela o recurso natural mais crítico e mais suscetível de impor
limites ao desenvolvimento humano em muitas partes do mundo. É indispensável
para o abastecimento humano; para a desedentação de animais; para a produção de
alimentos seja sob forma de precipitação ou de irrigação; para a indústria e
produção de energia..... A água é uma necessidade vital e tanto a sua má
qualidade quanto a sua pouca disponibilidade torna-se um fator responsável pela
saúde e bem estar das pessoas. O padrão de vida de uma população está
diretamente relacionado não só à qualidade de água disponível em termos de
contaminação química e de matéria orgânica, como também à quantidade deste
recurso e ao grau de educação da população, refletido nos seus hábitos de
higiene.
Entretanto, não é só na questão do gerenciamento da água para as
necessidades de sua família que torna-se vital o papel da mulher. Sua
importância evidencia-se também na conservação da energia e dos recursos
naturais quando ela determina, por exemplo, a justa quantidade de lenha que vai
queimar para cozinhar, ou sabe a quantidade de querosene que deve colocar em um
recipiente para ferver aquele alimento específico, ou produzir luz por um tempo
determinado. Neste momento, mesmo nas regiões mais remotas, ela está
desempenhando o importante papel de gestora, consumidora, conservadora e
educadora do meio ambiente e assumindo uma posição vital no processo econômico
ao lidar com a economia doméstica e com os hábitos de sua família.
A mulher, como primeira gestora dos recursos naturais torna-se uma
multiplicadora de comportamentos conservacionistas, porque, na administração de
sua casa, seu exemplo transmite aos futuros homens e mulheres que o uso
parcimonioso de hoje é a garantia da sustentabilidade de amanhã. Por essa razão
são tão importantes as discussões sobre gênero e os decorrentes investimentos
feitos na educação, saúde e na melhoria da qualidade de vida das mulheres.
Reforçando essas constatações, vamos encontrar na AGENDA 21,
firmada pelos países presentes na Conferência das Nações Unidas sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento - UNCED/92 ou a Rio/92, no seu Capítulo 24 ( Ação
Mundial pela Mulher, com vistas a um Desenvolvimento Sustentável e Eqüitativo),
uma série de compromissos assumidos pelos países signatários, com a meta de
conseguir avanços até o presente ano de 2000 na valorização e reconhecimento da
participação feminina. Entre outros, foram consensados e propostos aos Governos
os seguinte objetivos :
..................................................
Implementar as Estratégias Prospectivas de Nairóbi para o Progresso
da Mulher, particularmente em relação à participação da mulher no manejo
nacional dos ecossistemos e no controle da degradação ambiental:
Aumentar a proporção de mulheres nos postos de decisão,
planejamento, assessoria técnica, manejo e divulgação no campo do meio ambiente
e desenvolvimento;
Considerar a possibilidade de desenvolver e divulgar até o ano de
2000 uma estratégia de mudanças necessárias para eliminar os obstáculos
constitucionais, jurídicos, administrativos, culturais, comportamentais,
sociais e econômicos à plena participação da mulher no desenvolvimento sustentável
e na vida pública;
.......................................................................................................................................................
Ao analisarmos os avanços conseguidos desde então, verificamos, com
pesar, o grande atraso em que nos encontramos ao chegarmos no ano 2000 frente a
esses compromissos assumidos na RIO/92, isto sem falarmos no retrocesso de
alguns países do Oriente Médio quanto à situação de suas mulheres.
Em relação aos recursos hídricos, no Brasil, a recente criação da
Agência Nacional de Águas - ANA que, coincidentemente, tem um nome feminino,
enche-nos de esperanças no sentido de que este fato não seja apenas uma mera
coincidência, mas que ela venha também como uma ANA DAS ÁGUAS gerir, com
intuição e sabedoria, os diversos interesses sobre as águas que são o bem mais
precioso para a sobrevivência da humanidade no próximo milênio.
Já lhe demos o nome de ANA, espero que possamos fazer bem mais do
que isto
Retirado de: www.direito.com.br