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CLÉO E AS LOMBADAS AMBIENTAIS

Antônio Silveira Ribeiro dos Santos
Juiz de Direito em São Paulo e criador do programa ambiental ‘‘A última Arca de Noé’’


 


Foi com pesar que lemos no Correio Braziliense de 29.6.99 a notícia da morte da loba guará Cléo na BR-020 que corta a Estação Ecológica de Águas Emendadas. Segundo o noticiário ‘‘ela morreu atropelada por um dos veículos que passam chispando a mais de 100 km/h pelo local’’.

Isso faz-nos pensar na perda patrimonial que tivemos e insistir na utilização de uma fórmula simples de proteção aos animais que vivem em reservas cortadas por estradas, que é a construção de lombadas. Pois vejamos.

O Código Nacional de Trânsito (Lei nº 9.503, de 23/9/97) disciplina em seu art. 94 os redutores de velocidade nas vias, posteriormente regulamentados pela Resolução nº 39, de 21/5/98 do Cotran, que estabeleceu padrões e critérios de instalação. Esses redutores de velocidade compõem-se especialmente de sonorizadores e de ondulações transversais, estas últimas popularmente conhecidas por ‘‘lombadas’’, as quais já vêm sendo utilizadas em grande número por quase todas as cidades. Normalmente, esses redutores são colocados por iniciativa dos órgãos competentes, após estudos da malha viária, mas freqüentemente e em especial as ‘‘lombadas’’ são exibidas pela coletividade em locais perigosos aos pedestres, mediante manifestações populares, constituindo-se dessa forma em instrumentos importantes na política de trânsito.

Entretanto, no citado art. 94 foi proibido qualquer obstáculo à livre circulação e à segurança de veículos e pedestres, bem como determinado que caso não possam ser retirados devem ser devida e imediatamente sinalizados. O parágrafo único desse artigo diz que ‘‘é proibida a utilização das ondulações transversais (lombadas) e de sonorizadores como redutores de velocidade, salvo em casos especiais assim definidos pelo órgão ou entidade competente, nos padrões e critérios estabelecidos pelo Contran’’. A legislação abre exceção também aos casos especiais assim definidos pelo órgão ou entidade competente.

Por óbvio, esses instrumentos têm como finalidade principal a redução de velocidade de veículos para evitar acidentes que venham a causar danos às pessoas. Porém, por meio de uma interpretação mais ampla da legislação em questão, os atropelamentos de animais que ocorrem principalmente em estradas que atravessam parques, reservas florestais ou demais áreas florestadas podem ser considerados como acidentes abrangidos pela finalidade do Código de Trânsito, pois o fato de disciplinar o trânsito em relação ao homem não deve desconsiderar os eventuais danos ao meio ambiente pelo tráfego irregular, mesmo porque nesses tipos de acidentes os próprios ocupantes dos veículos podem vir a sofrer danos. Assim, pelas suas características especiais, o trânsito nesses locais deve ser regulamentado, autorizando-se a colocação de ‘‘lombadas’’, por se enquadrarem estas nos casos especiais excepcionados pela proibição geral.

Dessa forma, não vemos nenhum impedimento legal para a permissão, colocação e regulamentação de ‘‘lombadas’’ em estradas ou vias que cortam áreas florestadas ou de preservação ambiental, coibindo velocidades incompatíveis com as características locais, sob pena de prejudicarem a fauna e muitas vezes os próprios motoristas, como dito.

Portanto, por sua função principal de proteção à fauna, as ‘‘lombadas’’ poderiam ser denominadas ‘‘lombadas ambientais’’ e regulamentadas pelos órgãos competentes como casos especiais permitidos pelo citado artigo do Código de Trânsito, impedindo assim que acidentes fatais com animais raros, como Cléo, a guará, venham acontecer. Pensem nisso.
 


Retirado de www.neofito.com.br