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A Crise do Estado





José Luiz Quadros de Magalhães*





Este final de século apresenta sérios desafios para a humanidade. As questões mais do que nunca apresentam-se em nível global, e a solução dos graves problemas que ameaçam a estabilidade do planeta necessitam da construção de um novo modelo de Estado, de sociedade e de economia.



O mundo, no final do século, assistiu a queda do "socialismo real", nos seus modelos europeus, finalizando uma cruel guerra econômica, na qual os Estados Unidos aparecem como vencedores momentâneos, com a falsa declaração do fim das ideologias e com a expansão do modelo neoliberal, trazendo desemprego, e promovendo uma acumulação e movimentação de capital jamais vista.



A década de noventa assiste o início do fim do projeto neoliberal, com um retorno esmagador da proposta socialista democrática na Europa, que diz não a uma economia que não tenha uma finalidade social.



Fenômenos interessantes assaltam o mundo. De repente os alemães orientais, que promoveram uma revolução pacífica em nome da liberdade, percebem que esta também não existe do outro lado do muro. Recentes publicações na Alemanha unificada ressaltam aspectos impensáveis na época da guerra ideológica de informações entre leste e oeste europeus. Um livro de DANIELA DAHN ( Em Frente, em direção oeste, sem esquecer) traz para o debate algumas questões. A autora afirma que o principal capital dos alemães do leste é "justamente o papel secundário do dinheiro", sendo que no seu entendimento a antiga Alemanha Oriental (socialista, ou por alguns chamada de comunista), "desapareceu quando nós começávamos a gostar dela." O livro denuncia o tratamento desigual estabelecido pela lei e pela própria Constituição, entre os alemães do oeste e do leste. Em relação à aposentadoria, por exemplo, um soldado da WEHRMACHT, mesmo tendo pertencido a SS nazista, tem o direito a uma aposentadoria normal enquanto os funcionários da antiga RDA tem seus proventos reduzidos. As conclusões do livro são compartilhadas por grande parte dos alemães orientais. Setenta e cinco por cento dos OSSIS (alemães do leste), afirmam que os cidadãos na Alemanha unificada não são iguais perante a lei, sendo que estes se acham mais humanos que os alemães do oeste. Apenas trinta por cento dos OSSIS acham que a democracia no modelo atual, é o melhor regime.



Para comemorar o sétimo aniversário da unificação alemã, a Volksbuhne de Berlim preparou um espetáculo intitulado "A liberdade provoca pobreza" (Freiheit macht arm). Sobre o espetáculo explica Frank Castorf: "Eu acredito que estávamos finalmente mais livres no sistema do totalitarismo coletivo que na sociedade atual, onde a única coisa que se percebe é um individualismo que condena tudo que parece de perto ou de longe ao coletivo. Hoje eu diria que nos sentimos supérfluos e não livres".



O mundo hoje reage a expansão do fenômeno neoliberal. Entretanto as opções não são claras. O eleitorado inglês e francês recentemente disse não ao modelo de exclusão, e compete a esquerda, no poder em julho de 1997 em 12 dos 15 países da União européia, apresentar respostas a um Estado Social em crise, por ser construído em uma economia capitalista, hoje globalizada, excludente e concentrada. Há uma solução econômica regional ou local num mundo economicamente globalizado?



No terceiro mundo, no entanto, o neoliberalismo é imposto por novos autoritarismos. Do modelo peruano comandado por Fujimori, passando por Menen na Argentina, chegamos no modelo de autoritarismo extremamente sofisticado do governo Fernando Henrique Cardoso, travestido de uma capa de democracia, num regime autoritário que se sustenta na fragilidade do Congresso, e do tribunal supremo e no monopólio dos meios de comunicação social, trazendo um perigoso regime autoritário, pois sustenta-se em instituições que deveriam servir à democracia, fazendo a exclusão se expandir em níveis alarmantes.



Para melhor compreensão da atual realidade torna-se necessário entendermos alguns fenômenos contemporâneos, como a crise do Estado Social, o neoliberalismo e a globalização, para que desta forma, no exercício da cidadania, de maneira consciente, cada um possa mudar os rumos do seu destino, de sua comunidade, e assim, mudar a direção que o mundo vai tomando neste final de século.





* Mestre e Doutor em Direto pela UFMG. Professor do Unicentro Izabela Hendrix. Professor do mestrado e doutorado da UFMG, PUC-MG e UBM-RJ. Diretor do Centro de Estudos Estratégicos em Direito do Estado.





Disponível em http://www.cadireito.com.br/artigos.htm Acesso em 07 de jun. de 2006