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Leticia Wüst Frères*
UNIVERSIDADE
FEDERAL DE SANTA CATARINA
CENTRO
DE CIÊNCIAS JURÍDICAS
FACULDADE
DE DIREITO
CURSO
DE GRADUAÇÃO EM DIREITO
DISCIPLINA:
Informática Jurídica
PROFESSOR:
Dr. Aires José Rover
ALUNA: Leticia Wüst Frères
DATA: 17 de agosto de 2006
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A INTELIGÊNCIA DA COMPLEXIDADE
Edgar Morin sociólogo,
formado em Direito, História e Geografia se adentrou na Filosofia, na
Sociologia e na Epistemologia, é considerado um dos principais pensadores sobre
complexidade, e trouxe importantes contribuições sobre este tema em sua obra A
inteligência da complexidade, publicada no final da década de 90.
A referida obra é desenvolvida em cinco capítulos.
No primeiro capítulo, Ciência e consciência da complexidade, Edgar Morin se
remete à Rabelais ao tratar da ciência, que a considera pedagógica por
excelência, e que realmente se resume a Ciência com consciência, que diz: “Ciência
sem consciência é somente a ruína da alma” (Morin, 2000, p. 27). Ainda, Edgar
Morin completa dizendo que, mesmo “na Renascença, quando nasce a ciência
moderna, antes mesmo que ela tenha a sua autonomia e seu grande
desenvolvimento, a sociedade sabe que a ciência tem sempre qualquer coisa a ver
com a consciência, no sentido ético e moral do termo. O puro saber operacional
é somente a ruína da alma.” (Morin, 2000, p. 27)
Morin quer dizer que não basta, mesmo numa ciência
moderna, termos um simples conhecimento operacional, de técnica apenas, mas
sim, um conhecimento específico e profundo e que se exija um conhecimento
mais com consciência com mais aprofundamento e com mais humanismo, e não apenas
e só apenas um conhecimento para se operar tal coisa, mas sim um tipo de
conhecimento como diz Descates, quando determina dois tipos de
conhecimentos, onde de um lado tem-se o problema do sujeito, do homem que
reflete sobre si mesmo. De outro lado, Descartes propõe o problema dos objetos
que se encontram no espaço e que este, da extensão do espaço, é justamente o
problema oferecido ao conhecimento científico.
Mas Morin ainda nos faz perguntar, o que é a cultura
humanista? E nos responde com a seguinte afirmação, “é a cultura que
continuamos a aprender nos colégios, marcada com os nomes como Montaigne,
Voltaire, Rousseau, Diderot... E qual é o conveniente dessa cultura? É
efetivamente interrogar-se sobre o homem, a sociedade, o destino, a vida, a
morte, o outro lado. É uma cultura que se fundamenta sobre um número de
conhecimentos ou informações limitadas.” (Morin, 2000, p. 29).
A nova cultura científica se fundamenta cada vez
mais em uma enorme quantidade de informações e de conhecimentos e que nenhum
espírito humano poderia nem conseguiria armazenar, diz ainda Morin que, é
impossível ter uma visão sobre o homem, a sociedade, o universo acumulando esse
material, tanto é que, este material está compartimentado, visto que para isto
é necessário entrar nos conceitos e no conhecimento especializado, matemático,
necessário à compreensão de tal ou qual formulação. Um conhecimento que não se
pode discutir e não se pode refletir, daí uma situação cultural nova.
Para tanto, é interessante quando nos deparamos em
uma situação de cultura nova, e que nos faz pensar, será que isso quer dizer
uma situação de especialista, porém, o “dilema dos especialistas” é que, se
eles não podem ter uma idéia geral sobre suas especialidades, proíbem-se a si
mesmos de ter idéias gerais sobre outros assuntos (Morin, 2000, p.30).
Mas Morin nos faz pensar no princípio da
simplificação, que se estamos num universo aparentemente de multiplicidade, de
diversidade e de “caos”, esse caos aparente se dissolve quando descobrimos as
leis simples que o governam. E nos traz um exemplo muito próximo que é o de
Newtom, da descoberta da gravitação, um princípio gravitacional, que nos
permite compreender os fenômenos como a queda de um objeto, e porque da
impossibilidade de queda da lua e do movimento das marés. Mas este princípio
não nos explica por que o objeto é o objeto, por exemplo, por que a lua é a lua
e como é formado os mares. Mas que para isso, existe um código genético que nos
explica a linguagem dos objetos e das formas aparentes e um sistema comum que
faz organização de todos os seres vivos, por mais diferentes que sejam as suas
formas, da mesma maneira que falamos uma linguagem e que com esta linguagem
sustentamos um discurso e que o outro tenha um discurso com a mesma linguagem,
mas sustenta um discurso contraditório, mas fica claro que os elementos de base
é que fecundaram o progresso e o conhecimento. Desse modo, que se fez descobrir
a molécula, depois o átomo, depois a partícula. E quando nos deparamos com algo
duvidoso sobre algum destes elementos, buscamos a pesquisa e os princípios que
os norteiam. (Morin, 2000)
Outra questão interessante que Morin nos trás ainda
e que nos faz perguntar sobre o conhecimento científico, é sobre a ciência na
sociedade, e qual é o seu poder, qual é a reação entre a ciência, a
técnica, a sociedade e a política, por exemplo?
Muitos cientistas, afirma Morin, os separam,
deixando de fazê-los comunicar-se, “na ciência reina um espírito crítico,
a técnica, diferentemente, é neutra, mas os políticos, afirmam os cientistas
prisioneiros de um pensamento disjuntivo, os homens políticos, são maus, e com
isso eles fazem mau uso das boas coisas que nós cientistas produzimos”. (Morin,
2000)
A complexidade proposta por Edgar Morin se refere a
um conjunto de eventos, especialmente aos ligados à área científica, que
ocorreram no final do século XIX e que foram sendo debatidos, combatidos e
assimilados no decorrer do século XX.
Primeiramente, tem-se a revelação de que existem
fenômenos que não se consegue explicar. O próprio ser humano é um deles, o
universo também, a vida e a morte, o amor, o ódio (a reaproximação da filosofia
e da ciência). Depois, descobre-se que o mundo pode ser um sistema, um
ecossistema, e que suas partes (fragmentos) não estão nem podem ser vistas e
estudadas sem a compreensão e aceitação do todo onde figuram. Claro que não se
pode explicar de maneira lógica as relações e inter-relações deste todo e de
suas partes e vice-versa. É por isso que se chama pensamento complexo, pois
parece não haver uma lógica para estas relações aparentemente sistêmicas, é o
que Morin denomina a "ordem dentro da desordem" ou a "certeza da
incerteza", e é justamente por este motivo que se chama complexidade. (Morin,
2000)
Pode ser que a maneira como era vista a ciência dita
clássica ou moderna (para quem aceita o pós-moderno como período vigente), via
o homem e o universo, compreendendo aqui todos os eventos naturais e,
supostamente, não naturais que ocorriam à sua volta, era quase única, quer
dizer, que acreditava em um mundo mecânico, em um ser humano mecânico e em uma
relação mecânica entre ser humano e o mundo, e que tudo isso poderia ser
explicado (Moles, 1971; Price, 1976). A ciência nova surge para dizer não, o
ser humano não é mecânico, também vive de incertezas e de desordem; o mundo
funciona por meio de um conglomerado caótico (Prigogine, 2002; 1996) e que onde
a mente humana não pode concebê-lo com exatidão em suas estruturas, pois podem
não ser fixas, talvez sejam mutantes, imprevisíveis e auto-organizáveis, ou
seja, em um sistema aparentemente caótico, o mundo se auto-regula e se
auto-organiza (Morin, 2000).
Seguindo ao livro, no capítulo 3, sobre a
Universalidade, incerteza, educação e complexidade: in Diáologos com Edgar
Morin, destaca-se um ítem muito interessante, o 3.2, da Complexidade,
consciência do incerto, que é um diáologo com François Ewald e Edgar Morin,
onde F. Ewald pergunta a E. Morin: Como o Senhor encontrou a noção do
incerto tão presente em sua obra?
Morin responde de uma forma muito bem humorada,
dizendo: “Talvez eu tivesse desde o início uma predisposição pessoal. A fórmula
de Niels Bohr, “O contra´rio de uma verdade profunda”, corresponde à minha
forma de espírito. Sou tentado pelas minhas idéias opostas que parecem se
excluir. Minha vida não é guiada por uma certeza originária, senão por aquela
de lutar corpo a corpo com a incerteza. É preciso dizer também que não sou
herdeiro de uma cultura que me teria dado uma crença absoluta sobre a qual eu
teria podido assentar as minhas idéias. Talvez existam razões biográficas. Tive
de afrontar o problema do risco, aos dezenove anos, em 1941, sob a Ocupação: de
um lado, eu sentia que era preciso arriscar minha vida e entrar e entrar para a
Resistência; de outro, tinha medo de arriscar a minha vida. Tive de
exercer o ofício de militante clandestino e um afrontamento com o incerto
e com o risco. Foi ai que escrevi meu primeiro livro, O homem e a morte, partindo
da idéia de que é precisamente porque não sabemos nada sobre a morte, e que não
podemos falar com propriedade, que é interessante conhecer as atitudes dos seres,
das culturas, das religiões e das filosofias diante deste problema
profundamente incerto. Como conseqüência, quando fiz meus estudos de sociologia
concreta, sobre aquela sobre a comuna de Plozevet, eu sabia que não existia
metodologia certa e que eu tinha que construir uma estratégia aleatória. Quando
estudei os fenômenos eruptivos, como o Maio de 68, aquilo que me motivou foi a
surpresa, o esperado do acontecimento, a ausência de chaves explicativas a
priori: era preciso tentar compreender um fenômeno que o nosso espírito não
tivesse previsto. Como conseqüência, no final dos anos 1968 e 1970, trabalhando
sobre os princípios do conhecimento científico moderno, que desintegrou a visão
da ciência clássica, aquela de um mundo mecânico, determinista, ordenado para
fazer aparecer por todos os lados a desordem, o acaso, a agitação térmica, as
colisões, as obstruções, o imprevisível. (...) Mais abertamente, estou
persuadido de que conhecer ou pensar não consiste em construir sistemas sobre
bases certas e sim de dialogar com a incerteza. (...) Nosso mundo é um mundo
onde existem a imprevisibilidade e a desordem , o incerto. No Método,
tentei o trabalho de um pensamento que sabe que nunca poderá fugir da
negociação com a incerteza, que é um ingrediente da complexidade. (Morin, 2000)
Quando, em Para sair do século XX, quis olhar
o mundo atual e tive a consciência de que estamos, de agora em diante, na Noite
e no nevoeiro, e que o futuro do mundo não pode ser predito, que o conjunto
das inter e das retroações nos foge. (Morin, 2000)
A humanidade conviveu sempre com a incerteza. Para
as sociedades históricas, a guerra necessita de uma estratégia, ou seja, uma
conduta na incerteza. O mundo da política é um mundo de incerteza. Talvez se
pode mascarar a incerteza, desenvolvendo-se concepções deterministas planas,
que só queriam ver na história uma espécie de máquina econômica guiada pelas
leis; pretende-se apagar as batalhas, os reis, os golpes de Estado, dizendo que
se tratava apenas do superficial das coisas. Sempre reagi contra isso, não para
negar determinações ou deterministas, mas para mostrar que toda a história deve
ser concebida em virtude de um coquetel de ordem, de desordem e de
desorganização, sempre flutuante, incerto e variável. (Morin, 2000)
Desse modo, fui levado a formular os princípios de
uma ecologia da ação: onde toda ação entra num jogo de interações que faz com
que ela escape muito rapidamente da intenção da vontade dos seus autores. Se
bem que a eficácia de uma ação pode ser forte no seu início, e ela só pode
diminuir com o tempo, e ninguém pode prever as últimas conseqüências. É ao
mesmo tempo ingênuo e maniqueísta acreditar que basta ter boas intenções para
que a ação se realize. Não é preciso rejeitar, mas interrogar novamente com
ceticismo a idéia da mão invisível ou das armadilhas da razão. Os atores acreditam
seguir seus interesses egoístas ou suas idéias altruístas, mas, apesar de tudo,
através das inter-retroações, aquilo que se faz transcende seu egoísmo ou foge
do seu altruísmo.
A teoria dos jogos de Von Neumann já revela a
complexidade: se queremos minimizar seus riscos, minimizamos suas chances; se
queremos maximizar suas chances, maximizamos os riscos igualmente. Os jogadores
devem imaginar a estratégia um do outro, isso é claro num jogo entre dois
jogadores supostamente racionais. Ora os jogos são para vários, e os jogadores
não são racionais. De certa forma, é “essa consciência que alimentou minha
reflexão: que não se pode evitar o risco.” (Morin, 2000, p. 162-164)
Morin explica com este diálogo, suas intenções
quanto a nos deixar claro sua idéia de como se dá um estudo sobre os mais
diversos meios e fundamentos importantes do conhecimento e ao conhecimento da
sua complexidade, sua formulação até chegar a uma reflexão sobre os princípios,
os meios e as fórmulas de que buscou para nos fazer entender e entrar um pouco
no vasto caminho com que ele percorreu para se chegar a esta conclusão de que
nos é colocada neste diálogo. Entre muitos outros que ele tem com F. Ewald,
ainda também com Hubert Reeves e Monique-Kuhn e com Jacques Ardoino, onde com
cada um deste ele focaliza a explicação sobre a complexidade em áreas do
conhecimento que os caberá no decorrer dos diálogos, como sobre O homem e o
universo, o homem e a ciência e sobre a Educação e complexidade,
respectivamente. (Morin, 2000)
Ainda, não descontinuando a obra de Edgar Morin, ele
nos trás ao conhecimento sobre o pensamento complexo, um pensamento que pensa.
Ele nos mostra que a existência de um paradigma da complexidade que é o “pensar
a complexidade”que para tanto necessitamos de uma reforma no nosso modo de
pensar pois, o pensamento científico clássico (edificado sob uma teoria feita
por três pilares: a ordem, a separabilidade e a razão) encontra-se hoje em dia
abalado pelo desenvolvimento, especial o das ciências que é a fundadora do
mesmo.Este pensamento científico clássico, que Morin assim o chama, foi abalado
pelo desenvolvimento contemporâneo pois, onde um mundo que a ordem não é
absoluta, onde a separabilidade é limitada e ainda onde, a lógica e a razão
comporta buracos, Morin faz a seguinte pergunta, como conduzir então a ciência?
Morin nos oferece três teorias e as explica de
maneira bem profunda e sistemática nas páginas 201 e 202, classificando-as em:
teoria da informação, a cibernética e a dos sistemas. Onde a primeira é a
ferramenta para o tratamento da incerteza, da surpresa e do inesperado. A
segunda, uma teoria onde a idéia de retroação, introduzida por Norbert Weiner,
rompe o princípio da causalidade linear e introduz a de um círculo causal. Assim
sendo, a causa age sobre o efeito e o efeito sobre a causa, como se fosse um
termostato que regula o movimento da caldeira como no sistema de aquecimento. E
a terceira teoria proposta por Morin é a dos sistemas, que é a de que a
qualidade nasce de um todo e que podem retroagir para as partes. Com estas
teorias, o autor pretende nos introduzir que num universo dos fenômenos
organizados, a organização é feita com e contra a desordem. (Morin, 2000)
O que talvez Morin queira esclarecer por meio destas
três teorias é que a informação, como a própria ciência da informação a
entende, esteja presente em quase todas as fases da auto-organização de mundo
proposta pelo autor e justamente naquilo em que a ciência da informação talvez
não conceba tal ocorrência, ou seja, no ruído da mensagem entre emissor e
receptor através de um canal, "não apenas da desordem, mas a partir do
ruído" (Morin, 2000)
É possível que a intenção de Edgar Morin, ao longo
de sua obra, quando expõe o pensamento complexo, seja justamente a de alertar
para a própria existência da complexidade, contrapondo-se ao convencionalismo
científico. Neste sentido, infere-se que muitas coisas podem ter sido decididas
e feitas por convenção.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
Tomar-se-á como reflexão conclusiva e possível
exemplificação o próprio ruído que, no processo informacional, pode ser
caracterizado como uma "anomalia" na transmissão de informações.
Trata-se de um fator prejudicial na percepção da informação pelo indivíduo ao
qual se deseja transmitir algo.
Parece que, quando ocorre certo tipo de evento
caracterizado como ruído, a informação se fragmenta, e parte destes fragmentos
pode perder seu sentido, provocando desordem em um processo supostamente
ordenado. Não querendo entrar na discussão sobre a questão de existir ou não
ruído em todo o processo informacional, parte-se do pressuposto utilizado por
Morin (2000) sobre ordem e desordem, por meio do qual o ruído também pode ser
uma informação dentro de outra informação, ou seja, a informação da informação.
Sendo o ruído uma possível desordem, isto quer dizer que ele possui uma ordem
(ordem a partir do ruído) e, dessa maneira, o ruído também pode ser uma
informação.
Isto significa que o ruído, através de determinado
foco de interpretação, pode servir para ilustrar um possível problema da
própria ciência da informação, no qual talvez figure a necessidade de esta
última utilizar a receita que ela mesma propôs à biblioteconomia, ou seja,
rever seus princípios e fundamentos de construção científica, principalmente os
relacionados ao mecanicismo, pois se entende que, teoricamente, os processos
que fazem parte e que envolvem a informação poderiam ser tratados não apenas
pela ótica lógica, mas também pela ótica ilógica, levando-se em consideração
fatores como o ruído, a desordem e a complexidade.
Talvez por ser outro momento, faz-se necessário
compreender que existem "novas" estruturas
(inter-trans-multi-pluri)disciplinares presentes no debate sobre a construção
científica, e entende-se que é a partir destas relações que se pode ingressar
na busca de "novos" paradigmas e proceder a um estudo epistemológico
em ciência da informação que não reprima o seu crescimento espiritual, mas que
possa dar condições sistêmicas para a construção científica em ciência da informação.
Seguindo Morin (2000), entende-se que a possível esterilidade de uma pesquisa
pode estar de acordo com o grau de isolamento que propõe ao objeto a ser
pesquisado.
REFERÊNCIA
MORIN, Edgar;
MOIGNE, Jean-Louis Le. A Inteligência da Complexidade. São Paulo: Editora Peirópolis, 2000. (Tradução
de Nurimar Maria Falci)
WIKIPEDIA.
Edgar Morin. http://en.wikipedia.org/wiki/Edgar_Morin
*Aluna de
graduação de Direito da UFSC.