É sabido que o tributo possui outras funções que não a de mero instrumento de arrecadação. Os impostos também podem ser utilizados pelo Poder Público para promover intervenção na economia. É a denominada função extrafiscal do tributo.
Os impostos de importação e de exportação, embora propiciem receita significativa para o Tesouro, são utilizados predominantemente com essa função. O IPI, outro clássico exemplo de extrafiscalidade, incide com variadas alíquotas, dependendo da natureza e da essencialidade do produto. Sobre produtos considerados essenciais, a alíquota é menor, chegando a zero. Para produtos considerados supérfluos, ou de utilização inconveniente, como é o caso do cigarro, e da água ardente ou cachaça, por exemplo, incide a alíquota mais elevada.
Isto mostra que o tributo pode dificultar ou até mesmo impedir totalmente a atividade tributada. O poder de tributar, como já afirmou a Corte Suprema dos Estados Unidos, envolve o poder de destruir. Nas palavras de PINTO FERREIRA, "O poder ilimitado de tributar significa o poder de destruir a liberdade, uma vez que quem controla a segurança econômica do homem também lhe controla a liberdade."13 É fácil, assim, compreender a finalidade das imunidades, que constituem limitação do poder de tributar.
Quando se cogita de imunidade, não se há de pensar em termos dos impostos hoje existentes. A imunidade foi imaginada para proteger o objeto imune contra toda e qualquer forma de imposto. Para excluir o imposto como instrumento de dominação estatal.
Se fosse instituído imposto altíssimo sobre templos de qualquer culto, sem efeito estaria o direito ao livre exercício dos cultos religiosos, assegurado pelo art. 5.º, VI, CF/88. Caso não fosse vedado à União, aos Estados e aos Municípios a instituição de impostos sobre o patrimônio, a renda ou os serviços dos partidos políticos, restariam seriamente avariadas as bases da democracia no País. Vedando a tributação recíproca entre União, Estados, Municípios, a Constituição preserva o princípio federativo, evitando sofra este restrições decorrentes de tributação, com a qual uma entidade politicamente forte poderia destruir aquelas dotadas de menor poder político.
É fácil de se ver que a imunidade tem por fim impedir que, através do imposto, o Estado tolha a liberdade, a democracia e a forma federativa, transformando em letra morta os valores democráticos consagrados pela Constituição.
Tais imunidades, por isto mesmo, nem por emenda constitucional podem ser revogadas, vez que o art. 60, §4.º, IV determina que não será sequer objeto de deliberação emenda constitucional tendente a abolir a forma federativa de Estado e Direitos individuais.
Assim, tais imunidades somente diante de uma nova Constituição podem ser revogadas. É a proteção máxima que o Direito pode oferecer, pois somente através de uma reconstrução dele podem ser removidas.
Finalidade da imunização do livro.
Analisando especificamente a imunidade garantida pelo artigo 150, VI, "d", da Constituição de 1988, verificamos ser ela garantia à liberdade de expressão, por ser o livro um veículo de divulgação de idéias, da livre manifestação do pensamento.
Com efeito, se fosse possível a tributação do livro, poderia o Estado instituir imposto esmagador sobre o mesmo, tornando-o inacessível. Esvaziado estaria o princípio constitucional da liberdade de manifestação do pensamento.
Barato o livro, mais viável fica a educação, a manifestação de idéias. A democracia como um todo, pois, como ressaltou PONTES DE MIRANDA:
"Se falta liberdade de pensamento, todas as outras liberdades humanas estão sacrificadas, desde os fundamentos. Foram os alicerces mesmos que cederam. Todo o edifício tem de ruir." 14
Desse modo, o livro eletrônico, além de ocupar espaço físico cada vez menor, ainda é de pesquisa rápida e precisa, devido ao auxilio prestado pelo microcomputador na localização do texto desejado, por exemplo.
Seu conteúdo é o mesmo dos velhos pergaminhos. A diferença está no modo como tal conteúdo é organizado e apresentado. O velho pergaminho, que não possuía índice ou números de páginas cedeu lugar ao livro de papel. Este último, nos dias que ora correm, cede lugar ao livro eletrônico, que possibilita maior armazenamento, maior rapidez nas pesquisas, etc.
São conhecidas de todos os que já se utilizaram de um livro eletrônico suas vantagens sobre os tradicionais livros de papel. Não fosse assim, não haveria porque adotá-los.
Uma das inúmeras vantagens do livro eletrônico é o fato de este conter o texto como hipertexto. Um clique de mouse em determinadas palavras leva o leitor a outras áreas do texto, ou a ilustrações que demonstram o está escrito.
Graças ao hipertexto, caso o autor do livro faça uma referência, um simples clique de mouse sobre tal palavra ou frase marcada é suficiente para que se abra uma outra janela contendo o texto referido.
Se o texto trata de medidas provisórias, e o autor faz referência ao artigo 62 da Constituição Federal, um simples clique sobre a palavra destacada faz com que o artigo da constituição apareça na tela, para eventual verificação. Pode-se dizer que é uma evolução da nota de rodapé.
Caso o livro verse sobre música, e em determinado trecho refira-se à 5.ª sinfonia de Beethoven, um simples clique nessa citação é suficiente para que o computador toque um trecho da música, tornando o estudo prático e proveitoso.
Note-se que o conteúdo permanece o mesmo. O hipertexto não passa de uma evolução significativa da antiga nota de rodapé. O livro eletrônico é o livro de papel evoluído, evidentemente, mas isso não altera em nada sua essência.
Assim, se os livros eletrônicos são a mais nova forma de livro, não configura integração por analogia nem interpretação extensiva a tese que defende sua imunidade. A constituição refere-se a livros, e livros eletrônicos são livros.
Restringir a imunidade constitucional aos livros de papel somente, por outro lado, é fazer distinção onde o legislador não fez, prática condenada até pelos mais formalistas dos hermenêutas.
Grande confusão é feita pelos juristas entre a informática e que através dela se veicula. Desfeita essa confusão, a questão da tributação dos produtos de informática torna-se simples.
A informática é apenas instrumento. É meio. Não se pode questionar se disquetes e similares são abrangidos pela norma imunizante do artigo 150, VI, "d", da CF/88. O que neles está contido é que pode merecer referida imunidade, ou não.
Evidentemente um CD-ROM contendo um videojogo (v.g FIFA SOCCER 98) é diferente de um outro contendo o Repertório IOB de Jurisprudência. O produto de informática, no caso, é somente o meio através do qual se materializa um brinquedo ou um periódico. Em ambos os casos, o meio físico não passa de um CD.
Não se pode discutir, portanto, a tributação de produtos de informática genericamente. O que através do produto de informática é feito ou vendido é que deve ser objeto de análise detalhada.
Se um grande jurista resolve responder consultas através da INTERNET, incidirá sobre tal serviço o mesmo ISS que incidiria sobre a consulta oral ou escrita em papel. Não é pelo fato de ser veiculado pela Internet que tal serviço torna-se imune, pois, na caso, o papel, o disquete ou a Internet são meios através dos quais se veicula o produto da prestação de um serviço.
Admitamos, ainda como exemplo, que uma gravadora decida, além de vender discos convencionais nas lojas, vender as músicas pela Internet. No caso, o usuário faria a cópia do arquivo contendo a música a partir do site da gravadora na Internet mediante o pagamento de um preço. Este arquivo ficaria gravado no disco rígido de seu computador, e poderia ser ouvido quantas vezes desejado. Sobre essa venda incidiria o mesmo imposto da venda realizada no balcão da loja. Isso porque quando compramos um CD em um loja estamos comprando o direito de ouvir as músicas nele contidas. O CD e a Internet, em ambos os casos, apenas "conduzem" o real objeto da compra.
Da mesma forma, o livro pode ser disponibilizado em papel, em disquetes, em CD-ROM ou através da Internet, sendo, independentemente do meio, imune.
Assim, constatamos não ser possível entender a imunidade como abrangente de todos os produtos de informática. Pelo mesmo motivo que o papel abrangido pela imunidade é somente aquele destinado à impressão do livro, o produto de informática imune é somente aquele que constitui meio de materialização de livros, jornais e periódicos.
Não se deve, portanto, confundir software, de uma maneira geral, com livros eletrônicos, ou seja, software cuja essência é um livro; sob pena de se tributar um livro ou de se imunizar o que livro não é.
Portanto, os meios de gravação e disponibilização (disquetes, CD-ROM e similares) não podem, de forma alguma, receber tratamento tributário indiscriminado. O tributo deve ser aquele devido pelo conteúdo e não pela forma.
Pensamos, por isso, que a imunidade alcança também as operações com disquetes e similares virgens destinados à gravação de livros eletrônicos. Os disquetes virgens equivalem, para todos os efeitos, ao papel destinado à impressão dos livros, jornais e periódicos. São instrumentos de transmissão do pensamento, de disseminação cultural, cujo desenvolvimento não pode ficar vulnerável ao poder de tributar.
Com base no que foi exposto neste estudo, chegamos às seguintes conclusões:
a) O disposto no artigo 150, VI, "d", aplica-se também aos livros contidos em CD-ROM, disquetes, na internet, ou em qualquer outro suporte físico, pois:
a.1) A constituição deve ser interpretada a fim de se conceder máxima efetividade às suas normas;
a.2) A constituição deve ser interpretada com o intuito de se adequar suas normas à nova realidade, a fim de garantir sua rigidez e sua supremacia, sob pena de suas regras restarem estioladas com o decorrer do tempo;
a.3) Mesmo que sejam utilizados os métodos tradicionais de hermenêutica, todos levam à conclusão de que o livro eletrônico também é imune, com exceção da interpretação literal, causadora de verdadeiros absurdos quando utilizada de forma isolada;
a.4) Sendo coisas distintas o livro e seu suporte físico, e sendo os Cds, disquetes e similares apenas o mais novo suporte físico dos livros, mesmo utilizando a interpretação literal concluímos ser o livro eletrônico imune, pois, literalmente, é um livro, houve uma evolução no conceito de livro, e onde o legislador não distinguiu (livros...) não cabe ao intérprete distinguir;
b) Da mesma forma como o papel destinado a impressão de livros, jornais e periódicos é imune, também estão albergados pela imunidade os suportes físicos dos livros, jornais e periódicos eletrônicos: (CDs, DVDs, disquetes, ou similares que sejam destinados em sua gravação.)
Processo Digital: a recepção da lei 9800/99 pelo Judiciário Informatizado
LEI Nº 9.800, DE 26 DE MAIO DE 1999.
Oriunda do PLS 43/95
(Publicado no DOU de 27.5.99, Seção 1 )
Permite às partes a utilização de sistema de transmissão de dados para a prática de atos processuais.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o É permitida às partes a utilização de sistema de transmissão de dados e imagens tipo fac-símile ou outro similar, para a prática de atos processuais que dependam de petição escrita.
Art. 2o A utilização de sistema de transmissão de dados e imagens não prejudica o cumprimento dos prazos, devendo os originais ser entregues em juízo, necessariamente, até cinco dias da data de seu término.
Parágrafo único. Nos atos não sujeitos a prazo, os originais deverão ser entregues, necessariamente, até cinco dias da data da recepção do material.
Art. 3o Os juízes poderão praticar atos de sua competência à vista de transmissões efetuadas na forma desta Lei, sem prejuízo do disposto no artigo anterior.
Art. 4o Quem fizer uso de sistema de transmissão torna-se responsável pela qualidade e fidelidade do material transmitido, e por sua entrega ao órgão judiciário.
Parágrafo único. Sem prejuízo de outras sanções, o usuário do sistema será considerado litigante de má-fé se não houver perfeita concordância entre o original remetido pelo fac-símile e o original entregue em juízo.
Art. 5o O disposto nesta Lei não obriga a que os órgãos judiciários disponham de equipamentos para recepção.
Art. 6o Esta Lei entra em vigor trinta dias após a data de sua publicação.
Brasília, 26 de maio de 1999;
178o da Independência e 111o da República. |
A produção desta lei possibilitou a utilização de sistema de transmissão de dados de imagens, do fac-símile ou outro similar, para a prática de atos processuais. Esta lei marca um divisor de águas no que concerne os atos processuais realizados por meio eletrônico, pois dará mais celeridade ao processo e o acesso à justiça ficará mais eficaz, segundo a visão do autor. Em minha opinião foi um avanço, mas a lei possui as suas limitações, não somente formais, mas em decorrência da própria tradição do direito escrito por meio não eletrônico.