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Colaboração do Jusnaturalismo para o Surgimento do Fenômeno da Codificação e dos Direitos Universais

 

 

Alceu José Cicco Filho*

 

 

Sumário:

1 Introdução – 2 O Jusnaturalismo – 3 Colaboração jusracionalista para o surgimento da Codificação – 4 Influência Jusnaturalista para o advento dos Direitos do Homem e do Cidadão - 5 Conclusão – 6 Referências Bibliográficas

1 Introdução

O Direito Natural é "uma questão permanente do homem teórico acerca de seu lugar na sociedade".(1) É a idéia abstrata do Direito, o ordenamento ideal, correspondente a uma justiça superior e anterior – trata-se de um sistema de leis que independe do direito positivo, ou seja, independe das variações do ordenamento da vida social que se original no Estado. O direito natural é aquele de deriva da natureza de algo, de sua essência; o conjunto de direitos humanos que são inegociáveis, mínimos para resolver os conflitos.

Thomas Hobbes procurar conceituar o direito natural concebendo-o como "a liberdade que cada homem tem de usar livremente o próprio poder para a conservação da vida e, portanto, para fazer tudo aquilo que o juízo e a razão considerem como os meios idôneos para a consecução desse fim"(2) Direito natural nasce a partir do momento que surge o Homem, aparece, portanto, naturalmente para regular a vida humana em sociedade.

Para Locke a lei natural é uma regra eterna para todos, sendo evidente e inteligível para todas as criaturas racionais. A lei natural, portanto, é igual à lei da razão. Para ele o homem deveria ser capaz de elaborar a partir dos princípios da razão um corpo de doutrina moral que seria seguramente a lei natural e ensinaria todos os deveres da vida, ou ainda formular o enunciado integral da lei da natureza. Para Rousseau, a aventura moderna era um erro radical e procura um remédio para isso no retorno ao pensamento antigo, ao seu estado natural.

A idéia da existência de um direito universalmente válido sempre povoou a mente humana, assim como há algo de comum em todos os homens, como a forma física, os componentes orgânicos e os sentidos dados pela natureza, e algo de diferente entre ele, que são as características determinadas pelos fenômenos ambientais e culturais, há também no Direito uma concepção dualista, composta por uma parte universal imutável e perpétua, outorgada pela razão, que seria o Direito Natural, e outra regionalizada, mutável e perecível, criada pelo homem, que seria o Direito Positivo.(3)

Esse pensamento é antiguíssimo, encontrou solo fértil da filosofia grega, Geráclito de Éfeso (540 a 480 a.C.), que integrou a fase dos filósofos da natureza, entendia que a natureza tudo fluía, mas algo permanecia imutável e a isso ele chamou de logos, que seria uma lei universal eterna, a razão, responsável pelo equilíbrio da natureza.

O presente trabalho faz uma análise da influência jusnaturalista -jusracionalista - para o surgimento do fenômeno da codificação bem como sua colaboração para a criação dos Direitos Universais. Tais colaborações foram de cunho científico bem como estruturador destas obras jurídicas, o que foi um avanço jamais visto antes no ramo Jurídico uma vez que proporcionou uma maior segurança jurídica como também uma maior organicidade – o que de certo modo se contrapunha aos arbitrários códigos antigos que englobavam em um único corpo diversos ramos do direito como Penal, Civil...

Contudo, antes é necessário um esclarecimento maior em relação ao que vem a ser Jusnaturalismo.

2 O Jusnaturalismo

O jusnaturalismo é uma corrente jusfilosófica que crê na existência de um conjunto de valores éticos universais inerentes ao homem, decorrendo, destarte, da própria natureza humana sendo superior bem como anterior ao direito positivo, o que se contrapõe aos ideais do juspositivismo.(4) O suntuoso pensador italiano Norberto Bobbio(5) observa no jusnaturalismo o início de uma fase da história mundial fundada sobre o ideal de liberdade e que advoga a junção entre liberalismo e democracia no Estado de direito, como um antídoto contra a febre neoliberal do Estado mínimo.

Um dos problemas de uma posição jusnaturalista, segundo o procurador Edil Batista Júnior,(6) é que esta corrente filosófica restringe o desenvolvimento do Direito ao aplicar princípios de imutabilidade, perpetuidade como também de universalidade no mundo jurídico. Tal corrente olvida que a sociedade está em um constante processo de desenvolvimento, mutação não podendo assim, aplicar um critério de imutabilidade nem tampouco aplicar o mesmo direito a todas as sociedades uma vez que este é um produto histórico o que o torna um fator singular. Inviabilizando, consequentemente, a construção de um Direito com pilares concentrados na universalidade.

A norma de Direito Natural "fornece os fundamentos sólidos sobre os quais pode o homem construir o edifício das regras morais que orientarão suas opções. Ela assenta igualmente a base moral indispensável para a construção da comunidade dos homens. Proporciona, enfim, a base necessária à lei civil que se relaciona com ela, seja por uma reflexão que tira as conclusões de seus princípios, seja por adições de natureza positiva e jurídica".(7)

O jusnaturalismo é apresentado pelos estudiosos como tendo passado por três momentos, com técnicas diferentes, a saber:

* Cosmológico – o Direito oriundo da "natureza das coisas". A concepção de um direito supra-real nasce com a visão geocêntrica da antiga filosofia grega quando então jusnaturalismo era, pois cosmológico, ou seja, direito oriundo da própria essência do universo. Temos nesta fase os romanos influenciados pela sabedoria grega, tais como Ulpiano e Justiniano.

Roma não foi pródiga na concepção do jusnaturalismo, não obstante a escola estóica tivesse influenciado decisivamente as idéias de Cícero, o maior expoente do Direito Natural em Roma. Ulpiano chegou a definir o Direito Natural como sendo aquele que a natureza ensinou aos homens e aos animais, cunhado na celebre frase: ius naturale est quod natura omnia animália docuit.

Foi Cícero, entretanto, quem humanizou o Direito Natural, referindo-se a ele como uma lei verdadeira, ditada pela natureza, aplicada a todos os homens, imutável e terna: Est quaedam vera lex, naturae congruens, diffusa in omnes, constans, sempiterna.

Para Cícero, o Estado não era superior ao homem e não poderia criar leis contra o Direito Natural, o qual deveria servir de fonte inspiradora do Direito Positivo.

* Teológico – o Direito divino como fonte do direito natural. Destaca-se aqui, a filosofia medieval onde encontramos seus principais autores em Santo Agostinho e São Tomas de Aquino. Já na passagem da história antiga para a média, nasce a segunda forma de jusnaturalismo, o teocêntrico; nesta fase são enormes as influências religiosas - fato este que encontra correspondência na filosofia geral -, a fonte reveladora agora, então, é Deus; e o direito que não fosse conforme jusnaturalismo, ou não seria direito ou seria nulo.

Com o surgimento da Igreja Católica, alguns de seus principais doutores cristianizaram o Direito Natural, que passou a ser visto como obra de Deus, inata ao homem, que deve pautar sua conduta pela preservação do justo, do amor ao próximo e a Deus.

A filosofia patrística, que dentre outros nomes da Igreja destaca Santo Agostinho como um dos expoentes, pregava a existência de uma lei natural fundada em Deus, universal e imutável: a supremacia da Igreja sobre o Estado, para quem a cidade terrena é do pecado, civitas impiorum, em contraposição a cidade de Deus, civita Dei.

Foi Santo Agostinho quem primeiro idealizou aquilo que ele chamou de lex aeterna, não como uma concepção da reta razão humana, mas sim como uma concepção divina, obra de Deus, e quem deveria reger o Direito Positivo, ivina, obra de Deus, e quem deveria reger o Direito Positivoamou de lex aeterna, nao um dos expoentes, pregava a existencia ebr lex temporalis.

Se Santo Agostinho era um admirador de Platão, outro doutor da Igreja cristianizou a filosofia aristotélica. Trata-se de São Tomás de Aquino, o "Doutor Angélico". Foi com a doutrina escolástica que São Tomás de Aquino conciliou a filosofia de Aristóteles com os dogmas da Igreja.

São Tomás de Aquino considerava a Igreja superior ao Estado, mas também relevava a importância da relação entre ambos, pois sendo o homem um ser social obrigado a viver no Estado, deveria este propiciar os meios de realização de uma convivência voltada para o bem-estar comunitário. Foi o grande conciliador da razão com a revelação, ou seja: da filosofia pagã, especialmente a aristotélica, com os dogmas da Igreja.

* Antropológico – os princípios supremos do Direito Natural seriam frutos da razão do homem. Numa terceira versão temos o jusnaturalismo antropocêntrico, com efeito, já é então o homem que vem de assumir o papel de criador de todo o direito, porém, ainda com respaldo em algo que não é tão-somente sua vontade livre (positivismo), a esta fase corresponde a tomada de consciência do homem naquele sentido que Virgílio Ferreira (1) divisou: o homem é no reino da criação, não apenas o rei, mas largamente o verdadeiro criador". Era o homem, sobretudo, se libertando das imposições místicas.

O renascimento. Iniciado em fins do século XIV, foi marcado pelo homocentrismo, em contraposição ao teocentrismo da Idade Média, inspirador das correntes filosóficas patrística e escolástica, que encontraram em Santo Agostinho e São Tomás de Aquino, respectivamente, os seus grandes nomes.

O homem voltou a ser, a exemplo do que pregavam os sofistas, a medida de todas as coisas. Em face dessa radical transformação, o Direito Natural sofreu um processo de acentuada laicização, desenvolvendo-se, a partir de então, uma corrente de pensamento jusnaturalista que enaltecia a supremacia da razão humana.

É curioso observar que, ainda que involuntariamente, a filosofia escolástica de Dão Tomás de Aquino contribuiu para ocorrência desse fenômeno, já que pela razão o homem poderia tomar conhecimento do Direito Natural, conforme a Lex Naturalis, concepção formulada por São Tomás de Aquino.

Essa nova tendência de laicização do Direito Natural, e até certo ponto de profanação, ganhou projeção no século XVIII, GROTIUS(8) (1583 - 1645) que por intermédio da Escola de Direito Natural,(9) rompe com o pensamento jusnaturalista escolástico e em decorrência dessa ruptura proporcionam o desenvolvimento da ciência jurídica, à medida que enxergam o Direito como fenômeno que se origina na razão humana, e não em forças de origem divina ou super-humana, trazendo, assim, o Direito para o mundo terreno, conferindo-lhe status de realidade criada pelo homem e para o homem.

O pensamento jusnaturalista de Grócio consistia em conceber o Direito Natural de forma independente da existência de Deus. Era a ruptura com os princípios teológicos da patrística e da escolástica, e também uma profanação, o que não teria agradado o pensamento da Igreja. Deus passou a ser visto como parte integrante da natureza de onde também o Direito Natural provém, não em razão de Deus, mas sim da natureza social do homem, sendo um ditame da razão reta e que indica o que convém e não convém, de acordo com a razão e a natureza de cada um.

Até o século XIX o Direito não tinha uma posição definida no mundo da cultura, sendo considerado por muitos como uma arte, tanto que Celso o definia como a arte do bom e do justo: just est ars boni et aequi. Consequentemente não havia também uma preocupação dos jurisconsultos em situar o Direito Natural.

A partir daquele século, entretanto, o positivismo jurídico se expandiu, fazendo surgir a Ciência do Direito, que, em principio, considerava tão somente a dogmática jurídica, para só depois admitir a Teoria Geral do Direito como integrante daquela ciência. Estava, portanto estabelecida a divisão do Direito em natural e positivo, e com ela outra questão importante, qual seja: indaga-se da cientificidade do Direito Natural.

Para muitos, o Direito Natural seria uma parte da filosofia do Direito, e que a Ciência do Direito englobaria apenas o Direito Positivo; outros vêem no Direito Natural a própria essência da razão no Direito, e nada mais científico do que demonstrar a razão do que se afirma.

O Direito Natural representa a expressão maior da dignidade do homem enquanto pessoa, e temos idéia de que o Direito Positivo nem sempre cumpriu a sua função de preservar a pessoa dos interesses sociais dominantes, e todas as vezes que os princípios basilares do jusnaturalismo foram postergados o resultado foi desastroso. Deve, pois, o Direito Natural servir de base civilizada ao Direito Positivo, até porque nenhum fato, seja ele qual for, pode existir sem uma base natural de sustentação.

Platão via na lei natural não só uma fonte inspiradora da lei positiva, com também um modelo para corrigir-lhe erros e insuficiências, daí a sua preocupação em traçar as metas do que entendia por Estado Perfeito.

3 Colaboração do Jusracionalismo para o Surgimento do Fenômeno da Codificação

A colaboração jusracionalista(10) para a codificação ocorreu basicamente em três diferentes estilos:

1- Permitiu a renovação metodológica do Direito, fornecendo um caráter racional, científico aos códigos modernos.

2- Os códigos deixaram de ficar sujeitos às mudanças da vontade humana e sim ao direito natural (jusracionalismo) e sendo deste sua fonte, apresentaram uma característica imutável, universal, capaz de instaurar uma "época de paz perpétua na convivência humana."

3- Os códigos foram providos com uma melhor estruturação, com um corpo de princípios dotados de unidade e deduzidos sistematicamente se contrastando com o plano arbitrário dos códigos antigos.

No que diz respeito à primeira hipótese – renovação metodológica do Direito com bases científicas – se faz necessária uma introdução sobre o Iluminismo uma vez que foi graças a este movimento filosófico que obtivemos esta perspectiva de um método científico a ser empregado.

Se processos ocorridos nos séculos XV e XVI, como as revoluções científicas, as grandes navegações a e Reforma Protestante, podem ser tomados como marcos iniciais da modernidade, é a partir do Iluminismo que o Direito começa a se transformar.

Segundo Reale e Antiseri, o Iluminismo foi:

Uma confiança decidida, mas não ingênua na razão humana, um despreconceituoso uso crítico da razão voltado para a libertação em relação aos dogmas metafísicos, aos preconceitos morais, às superstições religiosas, às relações desumanas entre os homens, às tiranias políticas: eis a característica fundamental do iluminismo.(11)

Isso apontava a busca por um ordenamento jurídico marcado pela sistematização, pela unicidade e coerência, que assegurasse acima de tudo o desenvolvimento racional da sociedade.

De acordo com Francisco Amaral:

Ao Iluminismo ligava-se diretamente ao Jusracionalismo, a doutrina segundo a qual a única fonte do conhecimento seria a razão. No campo jurídico, o racionalismo embasava a doutrina do direito natural, rectius, do jusracionalismo, que defendia a racionalização e a sistematização do direito, isto é, a reunião dos princípios e regras num corpo unitário e coerente, o sistema jurídico. A razão iluminista preconizava, assim, a idéia de sistema no direito, do que resultaram os códigos e as constituições do séc. XVIII e XIX. Diz-se, por isso, que a ligação do iluminismo com o jusracionalismo produziu a primeira onda de codificação moderna. Os códigos são representações sistemáticas do direito e levam ao desenvolvimento do pensamento sistemático na realização do direito.(12)

O Direito não poderia continuar dominado pela tradição e pela autoridade. A razão humana deveria tomar a seu cargo um projeto de renovação dos ordenamentos jurídicos. As regas deveriam ser claras e facilmente reconhecíveis. Não deveriam se contradizer. Antes deveriam participar de um sistema coerente.

Para atingir esse objetivo, duas condições deveriam ser preenchidas:

* A primeira condição era material e consistia na "criação de um novo sistema jurídico baseado num novo corpo de fontes". O Direito Natural ou, mais especificamente, o jusracionalismo se encarregou de preenchê-la.

* A segunda condição era formal e consistia na necessidade de se encontrar uma nova técnica que possibilitasse a aplicação pratica desse novo Direito. A codificação foi a resposta tendo como objetivo principal unificar o direito.

Em função dos ideais jusracionalistas e iluministas, o movimento da codificação acabou se tornando uma reforma científica na legislação. Além de tornarem-se mais claros e organizados, os códigos elaborados na época mudaram sua metodologia para uma análise baseada na razão, sendo necessárias diversas técnicas para fazê-los.

Em tempo anterior, não era cogente razão lógica para a criação de uma lei, devia exclusivamente ser tal lei aceita da maneira que fora feita: por exemplo, na lei das XII tábuas, colocava-se que não poderia matar outro, pois Deus não autoriza que se tirasse a vida de alguém. Diferentemente disso a metodologia, a cientificidade agregada aos códigos exigia uma justificativa lógica e racional para tudo que fosse ser estabelecido.

Sendo a lógica regente do pensamento científico e a ciência contemporânea baseada em uma metodologia, para que houvesse a concepção de um novo código eram imprescindíveis os seguintes procedimentos: distinguir sujeito de objeto; não deixar que valores pré-existentes no cientista influenciem no trabalho; seguir rigorosamente as regras estabelecidas pelo método durante a investigação; praticar as operações de análise e síntese; obedecer à idéia da regularidade universal necessária à formulação de "leis" gerais; valer-se de instrumentos tecnológicos adequados; utilizar-se uma linguagem específica e mais objetiva.

Foi Samuel Pufendorf quem inicia a elaboração das bases metodológicas de um sistema jusnaturalista autônomo. Em sua obra principal, De iure naturae et gentium libri VIII (1672), Pufendorf elabora um sistema racional e livre dos dogmas religiosos, baseando-se na dedução e na observação. Na verdade, suas reflexões tiveram a influência do pensamento científico da época, especialmente de Galileu e Descartes. É interessante mencionar que essa tentativa de construir um sistema influenciou diretamente no aparecimento das partes gerais dos códigos modernos.

Para este autor, os princípios do Direito deveriam ser estabelecidos pelo método científico e para que o conhecimento jurídico o fosse, dever-se-ia apresentar-se de forma neutra no sentido de não poder emitir qualquer juízo de valor acerca da opção adotada pelo órgão competente para a edição da norma jurídica.

No que concerne à segunda hipótese, não há que se olvidar que a codificação traz inúmeras vantagens, como a de facilitar a visualização dos institutos jurídicos. Traz também desvantagens, já que muitas vezes estático que é, o código não consegue acompanhar as alterações pelas quais passa a sociedade e nem prever a multiplicidade de relações que dela podem emergir. Por tal motivo, pensando que os códigos fossilizassem o direito, Savigni(13) questionava este movimento.

Os códigos eram considerados sem lacunas, não eram interpretados de outra forma que não literalmente, pois eram a expressão da vontade de seu criador, o legislador, portanto, não havia porque interpretá-lo de forma a modificá-lo. Pretendeu-se com a racionalização das leis em códigos a sistematização de todos os problemas jurídicos. Tais princípios eram seguidos rigidamente pela Escola da Exegese.(14)

Para a elaboração dos códigos, os Jusracionalistas desenvolveram os princípios de Direito Natural. Os princípios mais apontados referem-se ao direito a vida, a liberdade, a participação na vida social, à união entre os seres para a criação da prole e a igualdade de oportunidades. O Direito Natural do Jusracionalismo tem a pretensão de assumir-se como um sistema ideal, independente das circunstâncias. Segundo os Jusracionalistas, os códigos deveriam ser imutáveis, perpétuos, universais, indispensáveis e obrigatórios, ou seja, os jusracionalistas defendiam a unificação e a uniformização da legislação, a qual deveria ser compilada em um código absoluto, compacto e cerrado.

Suas normas valeriam para todos os tempos enquanto houvesse existência humana e jamais poderiam ser modificadas. Os Jusracionalistas queriam, com isso, dar uma estabilidade as leis e uma segurança jurídica à sociedade, que não mais ficariam expostas às mudanças das leis devido a vontade de um soberano.

A universalidade diz respeito às circunstâncias de que todas as normas do código devem ser cumpridas por todos os seres humanos e valem em qualquer lugar. Essa validade universal fundamenta-se, pois, na natureza essencial do homem, que traz em si exigências no que diz respeito ao seu comportamento e aos seus direitos e deveres fundamentais, relativos ao comportamento com seu semelhante.

Contudo, afirmar que características da filosofia jusnaturalista tais como imutabilidade e universalidade sejam aplicadas na codificação é uma atitude leviana ao passo que a sociedade está em constante modificação, transformação e para que o direito cumpra com sua função primordial, que é procurar ao máximo atingir o bem comum bem como a Justiça, é relevante também dizer que o direito terá sempre que tentar acompanhar este processo de desenvolvimento social.

Em se tratando da terceira hipótese - os códigos foram providos com uma melhor estruturação – é importante ressaltar antes de tudo o conceito atual de código. Para isto, far-se-á uma comparação com um dicionário da língua portuguesa enquanto que outra obra apresentará o mesmo conceito, contudo o fará por intermédio de uma linguagem jurídica.

Dicionário da Língua Portuguesa Aurélio:

"Código sm. 1.(15) Coleção de leis. 2. Conjunto metódico e sistemático de disposições legais relativas a um assunto ou a um ramo do direito."

Pequeno Dicionário Jurídico:

"Código. Lei que disciplina integral e isoladamente uma parte substanciosa do direito positivo; por exemplo: direito civil ou direito penal." (16)

De acordo com ambas as definições acima, concluímos que há uma linha de raciocínio única e solene na composição de um código. Este corpo de princípios, dotados de unidade e deduzidos sistematicamente, se contrasta com o plano "arbitrário" dos códigos antigos.

No latim primitivo CAUDEX ou CODEX queria dizer tábua, prancha de madeira. Existe um texto de Sêneca em que se explica que por esse motivo é que se chamava códice às tábuas da lei porque eram realmente escritas sobre tábuas de madeira.

O termo significava, portanto, o material em que se escrevia a lei, mas depois passou a designar a própria lei, independente do material em que estivesse escrita, chamamos código, por exemplo, à grande laje de pedra em que Hamurabi mandou gravar 400 anos as leis do seu império, e chamamos igualmente códigos as coleções de leis contemporâneas.

 Mas a semelhança é apenas de palavras, sob o ponto de vista cultural, as antigas coleções de leis e os modernos códigos são realidades completamente diferentes.

Importante é afirmar que esta metamorfose, este desenvolvimento em sua estrutura se deve ao advento do jusracionalismo na codificação.

Na acepção antiga, Código era um conjunto de normas jurídicas escritas. A sua organização não obedecia a uma seqüência lógica e normalmente não passava de condensação das diferentes regras vigentes. Eram mais compilações(17) do que propriamente códigos.

Da Antigüidade vêm os famosos códigos Manú(18) e Hamurabi.(19) Este último reunia seus 282 preceitos em um conjunto assistemático e que abrangia uma diversidade de assuntos: crimes, matérias patrimoniais, famílias, sucessões, obrigações, salários, normas especiais sobre os direitos e deveres de algumas classes profissionais, posse de escravos...

O Código de Hamurabi teria sido assim uma súmula jurídica global ao abranger, sobretudo, normas privadas e penais altamente elaboradas para o seu tempo, mas ainda muito distantes das estruturas modernas.

O jusracionalismo fez com que a feitura de um Código não fosse apenas a reunião de disposições legais, relativas a determinado assunto. Exigiu-se um trabalho mais amplo, subordinado a uma técnica mais apurada. Codificar o direito ficou sinônimo de coordenar as regras pertinentes às relações jurídicas de uma só natureza, criando um corpo de princípios dotados de unidade e deduzidos sistematicamente.

Pretende, por intermédio de tal filosofia, representar um sistema homogêneo, unitário, racional, aspirando a ser uma construção lógica completa, erigida sob o alicerce de princípios que se supõem aplicáveis a toda a realidade que o direito deve disciplinar.

O Código Civil Francês de 1804 - Código de Napoleão(20) - foi o primeiro grande triunfo do movimento de codificação. Antes do Código Civil, a França vivenciava um pluralismo político e um fracionamento do seu direito.

O mundo dos Códigos foi o mundo da segurança quando os valores do liberalismo podiam ser traduzidos numa seqüência ordenada de artigos. Desta necessidade de segurança, nasceu a idéia de imutabilidade da legislação e da perenidade dos institutos, principalmente a propriedade e o contrato. Durante certa época, o ideal e a suprema aspiração dos juristas foi a elaboração dos grandes Códigos. Chama-se este período "o Movimento da Codificação".(21)

Este movimento propriamente dito – fruto do Jusracionalismo - tem seu lugar a partir da Idade média, através da gradativa substituição da autoridade papal e do imperador pela soberania dos Estados Nacionais. Foi sustentado por correntes sociais e impulsionado por alguns fatores estratégicos, de cunho político, econômico e intelectual.

Conforme Francisco Amaral, a codificação pode ser resumida nas seguintes palavras:

Em senso estrito, significa o processo de elaboração legislativa que marcou os séculos XVIII e XIX, de acordo com critérios científicos decorrentes dos jusnaturalismo e o iluminismo e que produziu os códigos, leis gerais e sistemáticas.(22)

Sua causa imediata é a necessidade de unificar e uniformizar a legislação vigente em determinada matéria, simplificando o direito e facilitando o seu conhecimento, dando-lhe ainda mais certeza e estabilidade. Eventualmente, constitui-se em instrumento de reforma da sociedade como reflexo da evolução social. Seu fundamento filosófico ou ideológico é o jusracionalismo, que vê nos códigos o instrumento de planejamento global da sociedade pela reordenação sistemática e inovadora da matéria jurídica, pelo que se afirma que os "os códigos jusnaturalistas foram atos de transformações revolucionárias. (23)

Os códigos, consecutivamente, representariam uma ruptura da velha ordem, através do estabelecimento organizado, melhor estruturado de uma nova ordem. Seriam esperança de segurança jurídica, efetivada através de uma seqüência ordenada e sistematizada de artigos, que tratassem de forma igualitária todos os cidadãos. Além disso, pareciam revelar um sistema jurídico auto-suficiente, onde outros corpos normativos não seriam mais necessários.

Nas célebres palavras de Giselda Hironaka:

Desta era – da era da racionalização da vida jurídica – resultou, como conseqüência imediata, a concepção do direito como um sistema. E, como tal, o processo de codificação se tornou imperioso, visando unificar e uniformizar a legislação vigente, emprestando-lhe um sistema, uma ordem, uma carga didática, uma possibilidade melhor, ou maior, de compreensão destas próprias regras e de comparação destas com outros povos.(24)

Esta foi a importante fase de organização codicista, que atendeu às necessidades e reclamos de uma época que visava superar a insegurança. E apresentou suas vantagens, entre elas – uma que desejo citar – a de traduzir-se, o código, em instrumental de garantia das liberdades civis.(25)

Fundamental foi também a organicidade, que não pode deixar de existir. O Código transformou-se em um todo harmônico, em que as diferentes partes se entrelaçam e se complementam. As partes que compõem o Código desenvolvem uma atividade solidária, há uma interpenetração nos diversos segmentos que o integram, daí a dizer-se que os Códigos possuem organicidade.

A linguagem de um código torna-se clara, precisa e direta. Nada melhor para ilustrar essa característica que a atitude de Stendhal que dizia ler diariamente alguns artigos do Código para adquirir as qualidades de clareza, pureza e precisão.

Uma das grandes características do código passa a ser, com o advento racionalista, a praticidade do texto. É uma obra prática, feita por juristas práticos, que não tinham grandes preocupações filosóficas. Pelo contrário, jamais perderam de vista que este "produto jurídico" seria aplicado no cotidiano de todas as pessoas.

A codificação significou a tendência para enfeixar em lei toda a matéria jurídica, em regra, uma parte do direito, de modo a dar nessa parte, unidade de tratamento jurídico às relações jurídicas que dela brotam. Tal lei se denomina Código. Significa a adesão ao direito escrito, ao direito codificado ou legislado. Nesse caso, em códigos, estão os principais ramos do direito.

4 Influência Jusnaturalista para o advento dos Direitos do Homem e do Cidadão

Os direitos humanos são princípios internacionais que servem para proteger, garantir e respeitar o ser humano. Devem assegurar às pessoas o direito de levar uma vida digna com acesso à liberdade, ao trabalho, à terra, à saúde, à moradia, à educação, entre outras coisas.

Originalmente, era disseminada a designação direitos naturais, pois essa categoria de direitos era tida como universal e imutável, decorrente da própria natureza humana, enquanto criada à imagem e semelhança de Deus ou enquanto ser racional. Com a evolução histórica e a positivação desses direitos naturais, passou-se a preferir, nos países anglo-saxões e latinos, a expressão "direitos do homem", mas que foi, por ocasião da Segunda Guerra Mundial e da fundação da Organização das Nações Unidas (ONU), substituída por "direitos humanos" na medida em que aquela não necessariamente contemplava as mulheres.

Lafer localiza as origens dos Direitos Humanos nas tradições judaico-cristã e estóica da civilização ocidental. Tais tradições afirmam o valor, a dignidade de cada ser humano, o ser humano como valor-fonte, seja por ter sido criado à imagem e semelhança de Deus, seja por ser cidadão da cosmo-polis. Desenvolveu-se assim a mais que milenar crença ocidental no Direito Natural, um conjunto de normas jurídico-morais de natureza divina inerentes a cada ser humano, perante as quais poder-se-ia julgar o direito positivo como justo ou injusto.

Engrenando ao contexto da Europa pré Declaração Francesa, constataremos o Estado Absoluto, composto pela ação conjunta do Estado e do Clero com o Cristianismo na forma de religião oficial.

Foi a doutrina cristã que mais valorizou a pessoa humana. Concebeu-se vínculo entre indivíduo e a divindade, superando a concepção do Estado como única unidade perfeita. O homem cidadão foi substituído pelo homem pessoa e, na escola Patrística de Santo Agostinho o direito natural era manifestação pura da vontade de Deus, à qual os direitos terrenos deveriam submeter-se.

Todavia, a Igreja condicionava o cidadão a ser submisso ao Estado, considerando os hereges como inimigos deste e a autoridade do soberano era vista como emanada diretamente de Deus.

Nessa fase história, emerge Tomás de Aquino e suas teorias cristãs. Dele advém a noção de que os direitos humanos se propagam com maior intensidade, tendo em vista que o postulado cristão emerge como religião privilegiadora do aspecto humanitário, com caráter universal, não estando centrada em um único povo, pois preceitua atingir a todos indistintamente.

O sentido universalista cristão tomou vastas dimensões no período medieval abrindo caminho para um direito natural.

Surge a inquisição como sistema penal, com fins de subtrair confissões. A tortura, instrumento característico na Idade Média, continuava a ser utilizado no contexto dessa política governamental, principalmente contra os adversários de idéias e opiniões formulados pela Igreja juntamente com o Estado. As confissões obtidas eram forçadas e com tamanha produção de pavor e injustiças, surgem as críticas contra o Estado, baseadas na afirmação de uso do poder arbitrariamente por este.

Emerge, em meio a esse quadro, na Europa, uma tradição de garantias do indivíduo que propiciou o surgimento da doutrina contratualista, a qual inverteu a fonte e origem do poder de Deus para os próprios homens.

Movimentos com objetivo de promover mudanças (podemos citar o próprio Iluminismo) vem à tona. Aparece o conceito de Contrato Social que demarca uma primeira aproximação (moderna) sobre os direitos humanos, na qual os indivíduos passam a pactuar comportamentos e condutas individuais e coletivas, renunciando alguns direitos em prol da preservação de outros, como a vida, a propriedade, a liberdade, a igualdade como forma de saírem de um estado primitivo. Com isso, tais direitos preservados vincular-se-iam a todo sistema estatal e social, tornando-se eternos e inalienáveis, existindo, para o Direito Natural, independentemente de seu reconhecimento pelo Estado, já que diretamente relacionados com a natureza do homem.

A burguesia, como nova classe social, ascende. O homem passa a ser visto como centro do Universo, há forte apelo à razão natural, considerando como base, não mais Deus, mas o próprio indivíduo. Surge uma nova concepção jurídica baseada no jusnaturalismo, com princípios da igualdade formal e da universalidade do Direito.

O Jusnaturalismo espalhou-se por toda a Europa e América ( a partir do século XVII ), servindo como base doutrinária para as declarações de direito da centúria seguinte, aonde tais documentos passaram a enunciar formal e solenemente os direitos fundamenteis dos individuais ( esses documentos representavam verdadeiros manifestos políticos das novas forças sociais emergentes ). Ou seja, surge como um dos primeiros fundamentos filosóficos dos direitos humanos, enquanto "corrente ideológica defensora de um direito existente além do direito positivo.

Os direitos individuais não eram considerados advindos ou criados pelo Estado, mas somente declarados por ele, para existirem, já que eram deduzidos da natureza humana –advindos do Direito Natural. Visto isso, era vedado ao Estado intrometer-se na esfera dos direitos individuais, cabendo-lhe zelar por sua observância e conservação. Os principais direitos eram: a vida, liberdade, segurança, propriedade, resistência, opressão. A igualdade dos homens era reconhecida à medida que se conferia a titularidade de tais direitos a todos os indivíduos indistintamente.

A Idade Moderna caracteriza-se pela ruptura do direito natural e religião, posto que tal direito passa a figurar no plano da racionalidade, sendo considerando como migrado da razão humana e não mais de uma entidade divina. Assim, o direito passa a emanar da razão, tornando-se o homem objeto do pensamento jusnaturalista.

É nesse contexto que os direitos humanos surgiram a partir do pensamento racional do próprio homem acerca da sua dignidade enquanto ser humano.

Kant tem a justiça como princípio universal. Suas idéias permitiram o desenvolvimento posterior de legislações internacionais que culminaram na célebre Declaração Universal dos Direitos do Homem (...) que colocou suas bases para a transformação do indivíduo singular em sujeito de direito internacional. O desenvolvimento de um moderno direito internacional dos direitos humanos tem, saibam ou não os seus pregadores e defensores, uma forte influência do filósofo Konigsberg com a idéia de uma cidadania cosmopolita, abrangendo todos os seres humanos, potenciais cidadãos do mundo.

Os Direitos Individuais estão inseridos nos princípios gerais de dos:

Direitos civis - são o direito a igualdade perante a lei; o direito a um julgamento justo; o direito de ir e vir; o direito à liberdade de opinião; entre outros.

Direitos políticos - são o direito à liberdade de reunido; o direito de associação; o direito de votar e de ser votado; o direito de pertencer a um partido político: o direito de participar de um movimento social, entre outros.

Direitos sociais - são o direito à previdência social; o direito ao atendimento de saúde e tantos outros direitos neste sentido.

Direitos culturaissão o direito à educação; o direito de participar da vida cultural; o direito ao progresso científico e tecnológico; entre outros.

Direitos econômicos - são o direito à moradia; o direito ao trabalho; o direito à terra: o direito às leis trabalhistas e outros.

Direitos ambientais - são os direitos de proteção, preservação e recuperação do meio ambiente, utilizando recursos naturais sustentáveis.

5 Conclusão

O jusnaturalismo exerceu uma grande influência seja na codificação, seja no auxílio da construção deste patrimônio sólido que a humanidade deixa a seus sucessores que foi a concretização dos direitos do homem e do cidadão.

No que concerne ao fenômeno da codificação cabe afirmar:

O Iluminismo propôs uma nova visão de mundo; o jusnaturalismo traduziu essas idéias para o Direito, permitindo a renovação de seus métodos e fornecendo elementos para a construção de um novo sistema: o movimento da codificação completaria a transição, servindo de forma para os novos conteúdos. (26)

O código é a expressão de uma cultura evoluída e isto não apenas segundo o padrão dos critérios da época. Nesse ponto quase único na historia da legislação européia, ele apresenta um plano global da construção do Estado a partir dos fundamentos de base da sociedade humana. Essa organização só fora possível pela antropologia do jusracionalismo. Essa estrutura teórica foi por último completada pelo pragmatismo e pelo sentido histórico que impregnou o último jusracionalismo a partir de Thomasius e Montesquieu. Agora já não se tratava de conceitos gerais, mas da apreensão da realidade objetiva. O código deve à ética política e à capacidade de apreensão do seu autor, Svarez, a sua forma lingüística, já enobrecida pelos progressos da literatura clássica alemã; à paixão pedagógica do iluminismo, a sua clareza e caráter popular, que o tornou familiar à população dos campos e à burguesia da Prússia.

Faz-se necessário afirmar que os códigos com princípios jusracionalistas tiveram papel preponderante para a sistematização do Direito como nunca ocorrera em épocas passadas. Esta corrente filosófica foi responsável em trazer ao mundo jurídico uma visão racional assim como uma nova estrutura que seguia parâmetros de organização fundamentais para a melhor interpretação e entendimento desta obra jurídica.

O jusracionalismo não somente unificou o direito, dando em lei toda matéria jurídica, como também o impulsionou a uma apresentação de forma orgânica, sistemática. Isso se deve em virtude de suas regras passarem a observar princípios gerais informativos do todo, acabando, por conseguinte, a codificação com a legislação dispersa.

Por outro lado, seus idealizadores cometeram o deslize de buscar restringir o desenvolvimento do direito, uma vez que consideravam que os códigos eram perfeitos e imutáveis, o que é um equivoco, já que o Direito é vivo e dinâmico e deve ser apto a adequar-se a uma sociedade cada vez mais ávida por avanços científicos, econômicos como também sociais.

Em relação ao legado que nos foi conferido – Direitos do Homem e do Cidadão – é importante mencionar que foi a luta contra a opressão que ajudou o surgimento dos direitos humanos. A luta pela liberdade e pela vida, liberdade esta que proclamou a independência de regimes econômicos, sociais e políticos que oprimiam ou oprimem.

O conceito de direitos humanos é, pela tradição no Ocidente, tratado principalmente pelo marco do direito constitucional e do direito internacional, cujo propósito é construir instrumentos institucionais à defesa dos direitos dos seres humanos contra os abusos do poder cometidos pelos órgãos do Estado, ao mesmo tempo em que busca a promoção de condições dignas de vida humana e de seu desenvolvimento. Os princípios elencados nas características do Direito Natural serviram de base para a construção destes direitos que defendem acima de tudo a honra e a dignidade humana.

No ordenamento jurídico brasileiro, encontramos na Lei Maior tais princípios consagrados no artigo 5º da Constituição Federal onde acredito ser importante destacar:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;

III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;

IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;

VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença (...);

Foi por intermédio de tais vitórias em prol da própria humanidade que obtivemos reconhecidos solenemente a dignidade da pessoa humana, o ideal democrático, o direito de resistência a opressão bem como os direitos básicos e as liberdades fundamentais que pertencem a todos os seres humanos, sem distinção de raça, cor, sexo, idade, religião, opinião política, origem nacional ou social, ou qualquer outra. Em um mundo onde tudo que se adquire é com perseverança e determinação, a conquista dos Direitos Individuais pode ser certamente considerada um dos maiores triunfos do homem uma vez que modificou toda uma antiga tradição que via o cidadão plenamente subordinado aos interesses do Estado.

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(1) WIEACKER. História do direito privado moderno, p 280.

(2) HOBBES. Leviatã, parte 1ª, cap. XIV.

(3) Conjunto de regras de direito de caráter obrigatório, podendo, para seu cumprimento, o Estado utilizar-se da coação. O direito positivo se divide em dois grandes grupos: o direito público e privado. As normas de direito positivo são sempre abstratas, não se dirigem a ninguém em particular. É regionalizado, mutável e perecível criado pelo homem. Espelha a realidade jurídica de um povo em uma determinada época. Possui, portanto dimensão territorial e temporal fixada. Nada mais é que o ordenamento jurídico vigente em um Estado. Reflete, portanto a realidade política de um Estado.

(4) Chamamos juspositivismo o posicionamento dos que só admitem um Direito posto, ignorando o Direito Natural e, por vezes, negando sua existência. Noutros termos, os juspositivistas pensam e agem, ainda que nem sempre explicitamente, como se a lei dada pelo Estado criasse a verdade: está na lei, cumpra-se! Segundo João Baptista Herkenhoff, prócere das teses alternativistas, o juspositivismo "reduz o Direito a um papel mantenedor da ordem. Sacraliza a lei. Coloca o jurista a serviço da defesa da lei e dos valores e interesses que guarda e legitima, numa fortaleza inexpugnável." Para esse autor – que resume a teoria juspositivista com maestria – isso é o positivismo: se o Estado cria uma lei, cria uma verdade. E como tal, essa verdade deve ser defendida até que outra verdade – muitas vezes oposta! – tome seu lugar, em nova atividade legislativa estatal. Nisso reside a essência do contra-senso juspositivista, e os exageros kelsenianos, autêntico produto da filosofia liberal do século XVIII.

(5) MONDAINI. O Socialismo liberal de Norberto Bobbio, p. 2.

(6) BATISTA. O ilógico necessário: considerações acerca da crise da codificação jusracionalista, p.9.

(7) Catecismo da Igreja Católica, § 1959.

(8) Hugo Grócio, primeiro expoente da Escola Clássica, defendia a tese de que o direito natural seria imutável e universal. Para ele, a essência do homem nunca mudaria com o passar do tempo, logo, se o direito é obra da natureza humana e esta não muda com o tempo, o direito também seria imutável. Hugo Grócio é geralmente apontado como o fundador do moderno jusnaturalismo. Em suas obras mais famosas, Maré liberum (1609) e De iure belli ac pacis libri tres (1623), ele busca no Direito das Gentes que pudesse ser universalmente reconhecido.

(9) Para esta escola, o jusnaturalismo era um produto exclusivo da razão humana, igual para todos os povos e comum para todos os tempos. Ao assentar as bases do jusnaturalismo nos princípios da razão eterna e imutável, lançou as sementes do iluminismo.

(10) Na modernidade, surge um novo Direito Natural. Seu fundamento não é a natureza, como na antiguidade, nem o Direito divino, como no medievo. Seu fundamento é a razão humana a partir desses princípios axiomáticos outros mais específicos poderiam ser deduzidos, construindo-se assim, um completo sistema de normas.

(11) REALE; ANTISERI. A razão na cultura iluminista. In História da Filosofia, p. 669.

(12) AMARAL. A equidade no Código Civil Brasileiro, p 68.

(13) Fundador da Escola Histórica, acreditava que o Direito provem do povo e é um objeto da Historia, evoluindo e se transformando constantemente. As leis, uma vez em vigor, coordenam-se e subordinam-se umas as outras, integrando o ordenamento jurídico, e interpreta-las é esclarecer a ractio legis. Para tanto, numa só operação, deve o interprete considerar os métodos gramatical, histórico e sistemático.

(14) A Escola da Exegese, também conhecida como Escola dos Glosadores e Escola Filológica, compreende o direito a partir de esquemas lógico-formais criados para interpretar a lei literalmente, nada acrescentando ou retirando da regra interpretada, buscando atingir o seu espírito, guiando-se o intérprete pelas verdades legais estabelecidas, segundo as quais não há Direito fora dos códigos. As soluções legalmente propostas são justas para todos os conflitos e as palavras são tão claras que não comportam interpretação equívoca, por ser clara, dispensa interpretação contrária a intenção do legislador, devendo ser somente aplicada a interpretação do texto legal, sua exegese pura e simples, nisso fica reduzida a tarefa do cientista do direito. Com isso, a referida escola reduz o Direito ao formalismo extremo, na vã tentativa de imobilizá-lo, como se a realidade social, sempre dinâmica, pudesse permanecer engessada no tempo e no espaço, sem conexão com o mundo das normas, e nisso reside seu caráter peculiar, traduzido na expressão de NORBERTO BOBBIO como "... a admiração incondicional pela obra realizada pelo legislador através da codificação, uma confiança cega na suficiência das leis, a crença de que o código, uma vez promulgado, basta-se completamente a si próprio, isto é, não tem lacunas: numa palavra, o dogma da completude jurídica"(NORBERTO BOBBIO. Teoria do Ordenamento Jurídico, p. 121, Ed. UNB).

(15) AURÉLIO. Dicionário da língua portuguesa, p 242

(16) PAULO. Pequeno dicionário jurídico, p.83

(17) Compilações são repertórios de normas que, em geral, obedecem a critérios cronológicos, com divisões, às vezes, por matéria, e que conhecemos, sobretudo quanto às decisões jurisprudenciais. Junção, reunião de textos.

(18) Escrito em sânscrito e elaborado entre o século II a.C. e o século II d. C., o Código de Manú é a legislação mais antiga da Índia. Representa historicamente uma primeira organização geral da sociedade, sob forte motivação religiosa e política. exemplifica a situação do direito nos povos que não chegaram a distinguir a ordem jurídica dos demais planos da vida social.      
Da premissa de que a humanidade passa por quatro grandes fases, que marcam uma progressiva decadência moral dos homens, os idealizadores do código julgavam a coação e o castigo essenciais para se evitar o caos na sociedade.      
Encontramos neste código, ao lado de uma extensa e "sistematizada" determinação de preceitos jurídicos (com cominação de sanções seguindo uma escala coerente), uma série de idéias sobre valores como verdade, justiça e respeito. Os dados processuais que se baseiam sobre credibilidade dos testemunhos atribuem diferente validade à palavra dos homens conforme a casta a que pertencem. A mulher se acha sempre em extrema desvantagem e em condição totalmente passiva dentro da sociedade. A honra das pessoas e sua situação dentro da aplicação do direito, dependia da condição da casta.           
O código era bastante detalhado e meticuloso e previa vários tipos de problemas, nos campos penal, civil, comercial, laboral, etc., trazendo ao início uma extensa série de artigos sobre administração da justiça, modos de julgamento e meios de prova.

(19) O "Código" de Hamurábi revela um esforço de unificar a aplicação do direito, sistematizando a administração da justiça e a estimação das condutas. Há quem ache que ele foi um reformador avançado para seu tempo uma vez que apresentava claramente um prólogo de um epílogo.
O texto consta de 282 dispositivos legais, antecedidos pelas invocações do prólogo e sucedidas pelas apóstrofes do epílogo.           
Consagrando a pena de Talião, (olho por olho, dente por dente), o código reunia os seus 282 preceitos em um conjunto assistemático e que abrangia uma diversidade de assuntos: crimes, matéria patrimonial, família, sucessões, obrigações, salários, normas especiais sobre os direitos e deveres de algumas classes profissionais, posse de escravos,... Podemos, então, observar que o código quase não foge aos problemas jurídicos, aos quais regulamenta com estritos detalhes. Ao corpo de leis de Hamurábi faltam traços de técnica que só com os romanos se tornaram definitivas.   
O Código de Hamurábi teria sido assim uma súmula jurídica global, abrangendo sobretudo normas privadas e penais, altamente elaboradas para o seu tempo, mas ainda muito distantes das estruturas modernas.  
Mencionado e encarado durante muito tempo como o código mais antigo do mundo, o monumento legislativo de Hamurábi não o foi, entretanto.

(20) Codificação inspirada por Napoleão Bonaparte (1769 – 1821), que começou a vigorar em 1804, ainda vigente. Sua orientação individualista fê-lo importante veículo de desenvolvimento do capitalismo. O Código Francês procurou harmonizar o Direito Romano com o direito público costumeiro, em essência rendia homenagem à doutrina dos direitos do homem, colocava o indivíduo frente ao Estado em posição superior e sancionava a autonomia do direito privado em relação com o direito público. Seu espírito reflete a mentalidade individualista da época. Foi considerado o Código da Burguesia, por ter atendido aos interesses e aspirações desta classe, não se redigiu no propósito de ser lei de privilégios, ao contrário, a intenção foi elaborar um código impessoal, expressão eterna das coisas, para ser aplicado sem distinção de classe, e sem limite de tempo.          
Funda-se nos princípios individualistas da liberdade contratual, na propriedade como direito absoluto, e na responsabilidade civil fundada na culpa provada pelo lesado. Inspirou o antigo Código Civil Italiano, bem como o Espanhol, o Português, o Belga, o Holandês, o Romeno, o antigo Código Civil Egípcio e os de Quebec e de Louisiana.

(21) A codificação é um movimento jurídico aparecido no Ocidente no século XIX, em função do qual os direitos ocidentais, quanto à forma, se dividem em: direito continental, ou direito codificado, que compreende o grupo francês, tendo por ponto de partida o Código de Napoleão ( Code Civil des Français), e o grupo alemão; e sistema do Common Law ou do grupo Anglo- Americano. Pode-se dizer que, na civilização européia, ressurge, no século XVIII, o movimento codificador. Não se manifestou, a princípio, em códigos, mas em compilações, isto é, em reunião de leis esparsas ou de costumes, só em 1804 surge o primeiro código moderno: o de Napoleão (Code Civil des Français ou Code Napoléon).           
Esse movimento significa a tendência para enfeixar em lei toda a matéria jurídica, em regra, uma parte do direito, de modo a dar, nessa parte, unidade de tratamento jurídico às relações jurídicas que dela brotam. Tal lei se denomina Código. Mas, codificação, como movimento jurídico, não é a feitura de um código. Muitos países que pertencem ao sistema da Common Law têm alguns códigos. Significa sim a adesão ao direito escrito, ao direito codificado ou legislado. Nesse caso, em códigos, estão os principais ramos do direito. 
Acaba a codificação com a legislação dispersa. Apresentando, quase sempre, tratamento jurídico novo.

(22) AMARAL. A equidade no Código Civil Brasileiro, p 122.

(23) AMARAL. A equidade do Código Civil Brasileiro, p 123.

(24) HIRONAKA. Direito civil: estudos, p.96.

(25) HIRONAKA. Direito civil: estudos, p.97.

(26) GIORDANO. Introdução à história do direito privado e da codificação, p.27.

*Graduando de Direito do Centro Universitário de Brasília - UNICEUB

 

Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_75/index.htm > / Acesso em : 18 out. 2006