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Técnica e Direito enquanto técnica: a administração do Oásis

Eury Pereira Luna Filho

Técnica é um conjunto ordenado de conhecimentos que possibilita
atuar sobre a realidade, com vistas à transformação material dessa
realidade-objeto . Por exemplo, a engenharia é uma técnica que se
volta para a produção de artefatos, que por sua vez são meios para
obtenção de resultados concretos e práticos. Nesse sentido a
engenharia civil, que realiza edificações (artefatos) , possibilita a
criação de abrigos, anteparos, recintos, vias de circulação. A
medicina, por sua vez, possibilita a intervenção sobre o corpo humano,
buscando a manutenção ou a recuperação das condições de equilíbrio
orgânico desse corpo ou matéria viva.

O conhecimento dito técnico obtém seus princípios operacionais, por
um lado, do conhecimento empírico, da experimentação e do registro
tradicional das causas e efeitos, e , por outro, quando a compreensão
se aprofunda em causa e efeito e princípios aí representados, já não
pertence mais, esse conhecimento, ao campo da mera técnica -
regras identificadas e ordenadas para obtenção de determinados
resultados ou reações - , mas passa a refletir-se em corpo de
conhecimento científico. Uma vez que se aprofunda a indagação e
o questionamento a respeito de causas e efeitos dos fenômenos
observados, verifica-se mudança qualitativa na postura indagativa.
Não se quer mais conhecer para agir imediatamente ou para
reproduzir algo que antes foi obtido, mas se quer conhecer porque
uma dada ação resulta em uma dada reação e em nenhuma outra
além dessa; ou , ao contrário, se uma dada ação, dadas tais e quais
condições e ocorrências identificadas , poderá produzir uma ou outra
ações identificadas, e se sempre serão ou quando serão estas as
mesmas, ou não, e porquê seria assim.

Ingressa-se, então , no campo do conhecimento científico, que se
caracteriza, conceitualmente, pela busca , identificação e interpretação
de leis naturais, i.e., condições verificáveis e previsíveis, leis essas a
reger fenômenos percebidos e que, uma vez compreendidas,
permitem a reprodução controlada e em escala desses mesmos
fenômenos.

Não é casual que se faça uso do conceito “ leis “ , para expressar tais
relações naturais, fixas e necessárias, que explicam ou identificam
fenômenos materiais e informam , a posteriori, operações intencionais
humanas. A propósito, por “ operações intencionais humanas “
poderia ser também definido o que se convencionou , aqui,
denominar “ técnica “; esse conjunto ordenado de conhecimento são
operações possíveis de conhecer, de serem repetidas, assimiladas
pela memória, inclusive corporal ou mecânica por parte de um sujeito
humano, e são transmissíveis pela experiência ou comunicação
entre sujeitos. Entretanto, “ leis ” são gerais; de certo modo , uma
vez conhecidas são inalteráveis. Enquanto “ operações intencionais
humanas “ (ou “ técnica “) admitem ou não uma invariabilidade, às
vezes comportando alterações , ou aperfeiçoamentos sutis que
decorrem, digamos , do estilo da execução ou da maestria do
executor. Portanto, “ lei “ , no sentido de relação natural , fixa e
necessária, regendo fenômenos percebidos, não pode ser confundida
como “ técnica “ , esta última no sentido de “ operações intencionais
humanas “ .

O Direito, assim entendido, enquanto um conjunto ordenado de regras
(“ conhecimentos “), admite, portanto, ser estudado, conhecido,
reconhecido, transmitido , experimentado, comunicado, como técnica.
Mas, técnica, para quê ? Qual a interação do sujeito com a realidade
exterior , ou qual transformação do real a realizar mediante essa
técnica específica ? e que técnica seria esta que tem por objeto
“ Leis “ ?

Cabe, então, definir Direito enquanto técnica (leia-se: “ conjunto
ordenado de regras “, ou “ operações intencionais humanas “ ) ,
como - o conhecimento dirigido para obtenção de condutas, condutas
essas , em princípio , visando ampliar o espectro de liberdade de ação
ou de opções para conduta do sujeito ativo, ou seja, daquele que
detém o uso dessa técnica.

Entretanto, ao escolher essa definição , surge uma dificuldade
decorrente de, embora existindo na teoria uma ilimitada gama de
opções, estas na sua maioria não são exercitadas pelo sujeito, na
prática; assim, as opções que este sujeito identifica, reconhece e
almeja , são muito reduzidas e somente se tornam possíveis, a partir
da participação desse sujeito em interação com um universo
indeterminado de outros sujeitos, o que comporia – esse universo de
sujeitos indeterminados e concorrentes – a sociedade dos homens.

Segundo essa definição, Direito seria , então, a técnica de conduzir-se
de forma a ampliar e manter à disposição de um agente consciente
condutas que fossem escolhidas pelo sujeito, para usufruir de mais e
mais liberdade; mas seria também a técnica de reduzir ao mínimo o
atrito entre as condutas propostas ou ambicionadas pelo sujeito, face
aos demais sujeitos com que o primeiro interagisse.

Direito é técnica, portanto. Mas toda técnica prescreve ações, que
decorrem então, de princípios empíricos conhecidos ou, em um
estágio superior de conhecimento, a partir de leis naturais, universais,
gerais, reconhecidas, provadas e demonstradas, controladas e
controláveis . Leis universais , gerais, controladas e controláveis
que atuam sobre o Direito, considerado enquanto técnica, então,
seriam leis deduzidas dos fenômenos que se produzem em sociedade,
fenômenos que interessa ao sujeito passem a integrar objetos de sua
ação . O Direito, assim, exigiria, a exemplo das demais técnicas,
observar , em primeiro lugar , fatos , externos ao sujeito , em relação
aos quais o mesmo se interessa, ou que lhe afetam de algum modo;
e a compreensão desses fatos e da lógica em sua gênese, ocorrência
e manifestação; e , em segundo lugar, processar , ordenar e aquilatar
outros fatores ou agentes correlacionados, que não seriam
assimiláveis ou se confundiriam com os fatos observados, mas
possibilitariam a atitude de liberdade almejada pelo sujeito diante do
fato observado.

23 de setembro de 1998
Eury Pereira Luna Filho . Advogado inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional do Rio de Janeiro e Seccional do Distrito Federal. Pertence ao Instituto dos Advogados Brasileiros - IAB. Tem cursos de especialização em Instituições da Comunidade   Européia, Planejamento Ambiental, Políticas Públicas e Gestão Governamental, e em Direito Tributário.

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Discorrer sobre a evolução da Medicina, enquanto técnica para conservação e recuperação da saúde. Os
conhecimentos científicos básicos, no século XVIII, eram obtidos pela pesquisa anatômica, descritiva, referir
The Way We Die . Abordar a transformação técnica , decorrente dos procedimentos diagnósticos não
invasivos e a revolução médica que poderá resultar da bio-engenharia e da nanotecnologia.
Página: 3
Buscar referência acerca de norma técnica e norma ética
Eury Pereira Luna Filho, 1998, Brasília, Distrito Federal