ESTRUTURA LÓGICA DA PROPOSIÇÃO JURÍDICA
(artigo publicado na Revista VOX LEGIS, Vol. 151, julho 1981)
Paulo Lopo Saraiva *
Sumário: 1. Prólogo. 1.1. Aspectos históricos. 1.2. Aspectos teóricos. 2. Estrutura lógica da proposição jurídica e um caso concreto. 2.1. A posição de Hans Kelsen. 2.2. A posição de Carlos Cóssio. 2.3. A posição de Jorge Millas. 2.4. A posição de Avelino Quintas. 2.5. A posição de André Franco Montoro. 3. A probabilidade - um elemento na formação jurídica. 4. Conclusões.
1. Prólogo
O assunto que vamos examinar é um dos pontos essenciais da Ciência
Jurídica.
A função do cientista do Direito é descrever as
normas jurídicas, para sua melhor compreensão e mais justa
aplicação.
Não deve preocupar a este cientista o caráter mandamental
da norma, sua função regulamentadora da conduta humana.
A norma é, ao fim e ao cabo, um previsto de três situações:
permissão, proibição e obrigação.
Na estrutura lógica da proposição jurídica,
vamos encontrar as várias alternativas epistemológicas, que
se diversificam na visão conceitual dos jusfilósofos.
As teorias estrangeiras acerca da estrutura lógica da proposição
jurídica são conhecidas. Somente repeti-las, "hic et nunc",
seria "um bis in idem". Mas haverá possibilidade de modificá-las?
Haverá modo de substitui-las? Cremos que isto não. É
possível, no entanto, apresentá-las sob uma nova metodologia,
sem o exercício repetitivo que, ao longo dos anos, torna cansativa
a atividade avaliadora.
Nesta trilha de entendimento é que, para exame do assunto proposto,
tormar-se-á como base um caso concreto e, a partir dele, serão
efetuadas as operações necessárias à apresentação
e análise do tema.
Como texto usar-se-á o acordão prolatado pelo TFR (1ª
T., Ap. Civ n. 37.391-RS, rel. Min. Márcio Ribeiro, J. em 3-6-77;
maioria de votos).
1.1. Aspectos históricos
Em 1827, Jonh Austin assumiu a cadeira de jurisprudência ou Teoria
do Direito, na Universidade de Londres. Austin é o fundador da Escola
Analítica Britânica, defensora do imperativo jurídico.
Desde 1872, Karl Binding já criticara o caráter imperativo
das normas penais. Em verdade, na opinião deste mestre, os deliquentes
não violam tais normas, ao contrário, eles é que as
observam.
A crítica de Binding, todavia, cindiu-se à argumentação
verbal, pois ele imaginava que as normas deveriam ser escritas conforme
sua natureza ontológica, isto é, em sendo imperativas, teriam
obrigatoriamente de ter essa forma gramatical.
Korkounov oferece uma valiosa contribuição ao estudo
da proposição jurídica, quando ressalva o caráter
condicional da norma.
Hans Kelsen, na segunda fase do seu pensamento, de modo definitivo,
estabelece a diferença clara entre a norma jurídica, que
tem caráter imperativo e a proposição jurídica,
que descreve as normas jurídicas.
1.2. Aspectos teóricos
De modo estrutural, a proposição é uma soma de
conceitos, com afirmação ou negação de algo.
Ex.: A União não pode negar-se a responder pelos danos causados
a terceiros por seus funcionários.
De modo amplo, a preposição é um juízo,
sentença, frase.
De modo componencial, as proposições podem ser simples
(sujeito e predicado, unidos por uma negação ou afirmação)
e compostas, complexas ou hipotéticas (quando reúnem duas
ou mais proposições simples).
De modo lógico, todas as leis, sentenças, contratos,
portarias, decretos e normas jurídicas em geral são proposições.
Daí a necessidade de se estudar sua estrutura lógica, no
campo jurídico, para entender seu caráter descritivo, normativo,
categórico, condicional, disjuntivo, conjuntivo e adversativo.
2. Estrutura lógica da proposição jurídica
e um caso concreto
A proposição jurídica é bimembre. Compõe-se
de dois elementos: a) pressuposto (prófase ou hipótese) e
b) conseqüência (apódose ou tese). O primeiro membro
descreve uma possível situação fática. É
o descriptor. O segundo membro prescreve a relação constituída
entre o sujeito de direito e o fato descrito na hipótese. Estabelece,
assim, uma relação deôntica. É o praescritor.
A decisão constante do Acórdão, que servirá
de base para este trabalho, condenou a União a indenizar o casal
J. C. G. e sua mulher, em face do princípio da responsabilidade
objetiva, estatuído pelo art. 107 da Constituição
Federal, "verbis":
"Art. 107. As pessoas jurídicas de direito público responderão
pelos danos que seus funcionários, nessa qualidade, causarem a terceiros.
Parágrafo único. Caberá ação regressiva
contra o funcionário responsável, nos casos de culpa ou dolo".
A formulação lógica dessa proposição
apresenta a seguinte estrutura:
Hipótese - Ocorridos os danos causados a terceiros por funcionários
da União;
Conseqüência - Esta pessoa de direito público deve
responder pelos danos.
Como bem se infere do exposto, o primeiro membro apenas descreve o
acontecimento possível (ocorridos os danos causados a terceiros
por funcionários da União), enquanto que o segundo determina
a conduta prescrita para o sujeito de direito (esta pessoa de direito deve
ser responsável pelos danos causados).
Na hipótese, há o elemento apofântico; na conseqüência,
há o elemento deôntico (deve ser).
2.1. A posição de Hans Kelsen
A Teoria Pura do Direito, desenvolvida pelo consagrado jusfilósofo
Hans Kelsen, procura examinar, de maneira pura, isto é, sem o uso
de elementos que lhe sejam estranhos, o fenômeno jurídico,
o Direito. É bem de ver que pura é a Teoria e não
o Direito.
Para Kelsen, a norma jurídica não é mero esquema
lógico-formal(1), mas um mandamento, cujo o objeto é a regulamentação
da conduta humana.
Ao contrário, a proposição jurídica ou
normativa é um juízo que enuncia a norma jurídica.
A proposição é um instrumento de trabalho do cientista
do Direito. Em sendo assim, pode-se afirmar que a Ciência do Direito
ou Teoria Pura do Direito é constituída por uma reunião
de proposições jurídicas que são utilizadas
pelos juristas.
Para Teoria Pura do Direito, enquanto a norma é prescritiva,
um imperativo, a proposição jurídica é descritiva.
Uma se origina, como ato de vontade, dos órgãos competentes;
outra promana do intelecto dos cientistas jurídicos. Uma tem conteúdo
imperativista; outra tem caráter epistemológico.
Em síntese, na concepção kelseniana, o dever ser
da norma jurídica(2) funciona como prescrição, ao
passo que o dever ser da proposição funciona como indicação.
Com este breves delineadores acerca da teoria de Kelsen, que permitem
situar-nos, de início, no seu pensamento, examinaremos a proposição
susomencionada.
A formulação da proposição jurídica,
na ótica kelseniana, é um duplo juízo hipotético
condicional, formado pelos seguintes elementos:
H (hipótese), S (sanção), Ft (Fato temporal),
P (prestação).
Em outros termos,
Dada certa conduta de alguém, deve ser um ato coativo.
Dada a não prestação, deve ser sanção.
Dado um fato temporal, deve haver prestação.
Adaptando-se a estrutura à proposição contida
no acórdão, teremos:
Hipótese - Se o funcionário da União causar dano
a terceiro, a União deve reparar.
Não-prestação - Se a União não o
dano,
Sanção - Deve ser condenada.
Fato temporal - Se ocorrer o dano contra terceiro a que seu funcionário
der causa,
Prestação - A União deve reparar (responsabilizar-se)
Para exame lógico da estrutura normativa, Kelsen usava duas
formulações hierarquizadas: a norma primária e a norma
secundária.
Na norma primária está a sanção, isto é,
o verdadeiro caráter jurídico.
Por esta razão, Kelsen só reconhecia a norma primária.
A norma secundária era inexpressiva. Era usada como mero instrumento
técnico para explicação da norma primária.
Na 2a. edição da Teoria Pura do Direito, Kelsen desprezou
tal distinção e passou a referir-se às normas autônomas
e não-autônomas.
Formalizando a proposição contida no Acórdão,
com base na visão kelseniana, podemos apresentar o seguinte:
NP - Se a União não reparar o dano
Norma Primária
S - Deve ser condenada
Ft - Se o funcionário da União der causa a dano contra
terceiro
Norma Secundária
P - A União deve reparar
2.2. A posição de Carlos Cóssio
Carlos Cóssio foi discípulo de Kelsen. Discordou do enfoque
do mestre vienense, em face da sua concepção puramente sancionadora.
Cóssio defende que o Direito tem como missão básica
não o punir, mas o orientar. Na estrutura normativa, segundo a Teoria
Egológica, o importante não é a regra sancionadora,
mas a regra orientadora, aquela que deve coincidir com a conduta humana.
O professor portenho ressalta o papel da liberdade como fundamento maior
do Direito.
Na concepção de Cóssio, a proposição
que estamos a examinar, passa a ter esta estrutura:
Ft - Se o funcionário da União der causa a dano contra
terceiro
Endonorma
P - A União deve reparar
ou
NP - Se a União não reparar o dano causado a terceiro
que o funcionário praticou
Perinorma
S - Deve ser condenada.
Onde: Ft = fato temporal, P = prestação, NP = não-prestação
e S = sanção
O elemento disjuntivo ou modifica, sem dúvida, a formulação
lógico-jurídica.
"In causa", a funcionalidade inverte as posições de Kelsen.
Ao invés de supervalorizar-se a norma sancionadora, eleva-se a norma
em que se insere a conduta humana.
Tal inversão modifica, também, a classificação
dos juízos hipotéticos.
A norma primária de Kelsen passa a ser a perinorma (peri=periferia)
de Cóssio (Se a União não reparar o dano causado a
terceiro que o funcionário praticou, deve ser condenada) e a norma
secundária de Kelsen passa a ser a endonorma (endo=cerne, núcleo)
de Cóssio (Se o funcionário da União der causa a dano
contra terceiro, a União deve reparar).
Enquanto Kelsen valoriza o ilícito e sua conseqüência
jurídica - a sanção -, Cóssio, sem excluí-la,
inclui, também, o lícito, na estrutura normativa, o que propicia
apresentar as duas situações do comportamento humano frente
à regra: o comportamento aceito, contido na endonorma e o não
aceito, existente na perinorma.
A teoria cossiana demonstra que a função do Direito não
se resume, apenas, no punir a violação de suas normas, mas
no estímulo e garantia de sua observância voluntária.
2.3. A posição de Jorge Millas
Como crítica à concepção cossiana, que
ele considera falsa estrutura disjuntiva, o professor chileno Jorge Millas
propõe uma nova formulação para a norma jurídica:
a formulação conjuntiva.
Para o mestre andino, a fórmula de Cóssio é limitada,
porque define somente duas hipóteses possíveis: a observância
da prestação, como se esses elementos não fossem partícipes
da mesma realidade comportamental.
A explicação de Millas consiste em afirmar que, se o
juiz deve punir o homicida, fica determinado o dever de respeitar a vida
alheia.
Usando-se a fórmula de Millas ao caso "sub examine", teremos:
Se o funcionário da União causar dano a terceiro,
A União deve reparar
e
Se a União não reparar o dano ocorrido,
Deve ser condenada.
Em outras palavras,
Dado um fato temporal ou deve haver, "ao mesmo tempo", a prestação
ou deve haver a sanção.
Ou ainda,
Se A é, B deve ser e Se B não é, deve ser S.
2.4. A posição de Avelino Quintas
Por fim, entre os autores alienígenas, encontramos a persectiva
do professor italiano Avelino Quintas, da Universidade de Ciências
Sociais de Roma.
Quintas é outro crítico da posição cossiana.
Ele afirma que a fórmula disjuntiva, somente, descreve as hipóteses
possíveis, ou seja, o atendimento ou não da prestação.
Preleciona o mestre romano que, para a estrutura da norma, é
melhor posicionar o segundo membro da fórmula lógica, não
como alternativa (como faz Cóssio), mas como conseqüência
do não cumprimento do enunciado do primeiro membro.
No caso em tela, ficaria assim a proposição:
Se o funcionário da União causar dano a terceiro,
A União deve reparar,
Mas
Se a União não reparar o dano ocorrido,
Deve ser condenada.
2.5. A posição de André Franco Montoro
De interesse para o nosso estudo é, sem dúvida, a apreciação
crítica do Prof. Franco Montoro.
Sugerindo nova fórmula para estruturação da norma
jurídica, o mestre paulista defende a idéia de que se deve
apresentar as conseqüências positivas, oriundas da hipótese
de haver a prestação.
Para melhor elucidar seu pensamento, o conceituado professor indica
esta fórmula:
H (hipótese) .................................................................
P (prestação)
NP (não-prestação) ......................................................
conseqüências negativas
P (prestação) ...............................................................
conseqüências positivas
ou seja:
Se Pedro é eleitor, Pedro deve votar,
Se não votar, será multado;
Se votar, será premiado (poderá tirar passaporte etc.)
Inobstante a valiosa colaboração oferecida à interpretação
lógica da norma, venia concessa, apresentaremos algumas ponderações.
Como ficou exposto, no início do trabalho, a proposição
jurídica é bimembre, isto é, compõe-se invariavelmente
de uma hipótese e uma conseqüência.
Portanto, no plano lógico-formal, dada hipótese, deve
haver a conseqüência.
Renomados juristas brasileiros, entre eles, Lourival Vilanova e Paulo
de Barros Carvalho doutrinam que a sanção não está
presente na estrutura bipolar da proposição normativa.
A sanção é conseqüência de outra hipótese,
ou seja, o não cumprimento do dever jurídico estatuído,
como o prêmio - se assim o fora - seria conseqüência da
hipótese do cumprimento do mesmo dever.
Demais disso, o Direito é uma ordem de coerção,
no dizer de Kelsen, isto é, "uma ordem estatuidora de atos de coerção,
então a proposição jurídica que descreve o
Direito toma forma da afirmação segundo a qual, sob certas
condições e pressupostos pela ordem jurídica determinados,
deve executar-se um ato de coação pela mesma ordem jurídica
especificado. Atos de coerção são atos a executar
mesmo contra a vontade de quem por eles é atingido e, em caso de
resistência, com o emprego da força física"(3)
Não interessa ao Direito - e nisto estamos com Kelsen - a conduta
lícita do indivíduo. As normas só brilham, quando
são violadas, porque o ilícito é condição
do Direito.
Retomando o exemplo visto anteriormente ( Se Pedro é eleitor,
deve votar, se não votar, será multado, se votar, será
premiado, poderá tirar passaporte etc.), constata-se que, para sua
análise, neste aspecto, há uma interpretação
errônea entre o devido e o merecido.
O cidadão que vota, cumpre seu dever cívico, exigindo
- "ipso facto" - que o Estado, também, cumpra o seu.
O fornecimento de passaporte ou outro qualquer documento ao cidadão
quite não é um prêmio, mas um deve do Estado.
Tanto isto é verdade que, em caso de procastinação
ou negação do pleiteado, o indivíduo dispõe
de um "remedium juris" constitucional - o mandado de segurança,
para obrigar o Estado a agir corretamente.
Expendidas estas idéias, com o devido respeito, entendemos que
não há no Direito nenhum sentido premial.
3. A probabilidade: um novo elemento na formulação jurídica
Após o aparecimento da Física Quântica, imensas
modificações ocorreram no campo da Ciência Natural.
A nova ciência, embora não negue o valor das teorias anteriores,
adita-lhes um novo e inevitável fenômeno: a probabilidade.
A Física Moderna já não mais afirma, por exemplo,
que um elétron incidirá num determinado ponto, mas dirá,
apenas, que é possível sua incidência em determinado
ponto. Isto quer significar uma nova realidade natural que, embora não
desacredite as concepções precedentes, posiciona-se, no entanto,
numa condição menos causal.
Esta proposital referência ao mundo físico relaciona-se
com o nosso tema. Afinal, somos participantes de uma sociedade cósmica.
O mundo jurídico não é especial, senão
parte importante do mundo da natureza unitária.
O Direito está inserido no contexto universal. "É a ordenação
quântica das sociedades humanas"(4).
Por este prisma, nunca é possível garantir a reação
do ser humano.
Estas reações encontram-se, também, no campo do
provável e podem ser classificadas como: muito prováveis,
apenas prováveis e algumas improváveis(5).
Com base nesta concepção, não se admite, hodiernamente,
que a ciência jurídica afirme como um homem ou grupo de homens
deve comportar-se, mas ela deve afirmar que, um determinado sistema de
referência, o homem ou grupo de homens provavelmente se comportará
desta ou daquela maneira, pois isto é mais consentâneo com
sua maneira de proceder.
Feita esta introdução, passemos ao campo prático.
Analisemos, sob a égide desse novo pensar, dois exemplos de
proposição jurídica:
1. Se Pedro é eleitor, Pedro deve votar;
Se Pedro não votar, Pedro será multado.
Aplicando-se a probabilidade, teremos:
Se Pedro é eleitor, "provavelmente" Pedro votará;
Se Pedro não votar, "provavelmente" será multado, pois
pode justificar legalmente a impossibilidade de votar e, "ipso facto",
não ser multado.
2. Se Pedro matou, Pedro deve ser punido.
Com a probalidade, teremos:
Se Pedro matou, "provavelmente" Pedro será punido, pois Pedro
poderá nunca ser preso ou justificar o homicídio, sua ação
negativa, através da legítima defesa etc.
4. Conclusões
1. Não se deve confundir a norma em si com sua formulação
lógica: a proposição jurídica.
2. A proposição jurídica é sempre composta
de dois membros: hipótese (descritivo) e conseqüência
(prescritivo).
3. A norma jurídica promana do órgão competente;
a proposição jurídica procede do intelecto dos cientistas
jurídicos e é por eles utilizada para tradução
e enunciação da norma.
4. Kelsen, inicialmente, usou as expressões norma primária
(sanção) e norma secundária (prestação).
Depois, abandonou essa terminologia e passou a referir-se às normas
autônomas e não-autônomas.
5. A norma primária de Kelsen é a perinorma de Cóssio
e a norma secundária de Kelsen é a endonorma de Cóssio.
6. Enquanto Kelsen valoriza o ilícito e sua conseqüência
jurídica a sanção , Cóssio, sem excluí-la,
inclui, também, na estrutura normativa, o lícito (faculdade),
o que permite apresentar as duas situações do comportamento
humano frente à regra: o comportamento aceito, previsto pela endonorma
e o não aceito, indicado pela perinorma.
7. A posição de Quintas (adversativa) defende o posicionamento
do segundo membro da formulação lógica como uma conseqüência
e não alternativa do enunciado do primeiro membro.
8. Millas prefere a formulação conjuntiva, pois entende
que tanto a observância como a inobservância são elementos
partícipes da mesma realidade comportamental.
9. Para Kelsen, o Direito é uma ordem coercitiva, ou seja, uma
ordem estatuidora de atos de coerção, que emprega atos de
coação, sob certas condições e pressupostos
pela ordem jurídica especificados. Nunca uma ordem premial. Enquanto
que, para o Prof. Franco Montoro, as conseqüências positivas
devem ser ressaltadas.
10. A probabilidade é um novo elemento que não pode estar
ausente do exame da formulação lógica da norma jurídica.
Notas:
1. Maria Helena Diniz, Conceito de Norma Jurídica como Problema
de Essência, p. 68. Assim para ele, as normas jurídicas formuladas
pelas autoridades têm caráter imperativo, pois prescrevem,
permitem, conferem poder, sendo, portanto, fontes do direito, uma vez que
impõem obrigações e conferem direitos. Por conseguinte,
o objeto da norma jurídica é regulamentar a conduta dos indivíduos.
As proposições jurídicas, são no dizer de Kelsen,
a função da Ciência Jurídica, representando
atos de conhecimento, tendo por missão conhecer as normas jurídicas
e descrevê-las como base no seu conhecimento, não podendo
prescrever nada. Seu objeto é, portanto, descrever a norma jurídica
e não regulamentar a conduta humana. Logo, não são
fontes de Direito, por serem uma descrição de uma fonte.
A proposição jurídica não é, pois, expressão
independente e plena de uma norma jurídica, mas um juízo
que contém uma enunciação sobre a norma jurídica.
Afirma Kelsen que pela proposição sabe-se o que se deve ou
se pode, juridicamente, fazer sem incorrer numa conseqüência
jurídica desfavorável, isto porque, nela estão, perfeitamente,
definidos os tipos de fato condicionantes, aos quais se vinculam as conseqüências
prescritas na norma.
Daí a sua afirmação de que a Ciência do
Direito é conhecimento do direito. Sob o enfoque kelseniano a Ciência
Jurídica está integrada por um conjunto de proposições
normativas e não por normas jurídicas.
2. Daí se infere que: a) o dever ser da norma jurídica
tem o sentido prescritivo (imperativo), o dever ser da proposição
um sentido descritivo (indicativo); b) a norma decorre de um ato de vontade,
trata-se de uma criação real e a proposição
de um ato de conhecimento, sendo assim uma criação espistemológica,
como diz Kelsen. A norma jurídica, portanto, não é
um juízo, mas um imperativo, é uma manifestação
de um ato de vontade e não de conhecimento. A função
significativa de uma norma não é enunciar, mas prescrever
um determinado comportamento humano, ou seja, impor um dever (cf. Maria
Helena Diniz, ob. cit., págs. 69/70).
3. Hans Kelsen, Teoria Pura do Direito, 4a. edição, Armênio
Amado, Coimbra, pág. 163.
4. Gofredo Telles Júnior, Direito Quântico, Max Limonad,
2a. edição, São Paulo, pág. 285.
5. Cf. Gofredo Telles Júnior, ob. cit., pág. 160.
* O autor é Mestre em Direito Constitucional - professor da
UFRN - Conselheiro Federal da OAB.