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SOBRE O FUNDAMENTO DOS DIREITOS HUMANOS

SERGIO GARDENGHI SUIAMA

Procurador do Estado de São Paulo e Professor de Direito Constitucional

 

 

I. INTRODUÇÃO.

 

O debate sobre o fundamento dos direitos humanos tem por objetivo oferecer uma resposta válida a um problema filosófico e político essencial: por que devem esses direitos ser respeitados?

De modo bastante simplificado, podemos dizer que, ao longo da história, três respostas foram oferecidas à questão: a) a religiosa (respeito aos direitos do homem é um mandamento divino); b) a jusnaturalista (respeito aos direitos humanos é um imperativo da razão); c) a positivista (fundamento do direito encontra-se na vontade do legislador).

A primeira partia da idéia de que a lei moral era dada aos homens por Deus, através da revelação aos profetas e dos ensinamentos de Jesus Cristo. Com a crise de hegemonia da Igreja católica, iniciada no século XVII, a resposta religiosa perdeu grande parte de seu sentido na medida em que não era ela mais universalmente aceita. Iniciou-se, assim, a pesquisa de um fundamento exclusivamente terreno para a validade do direito e da moral. Daí a afirmação de Kant, no prólogo à primeira edição de seu escrito sobre a religião, de que "a moral, enquanto fundada no conceito de homem como um ser livre (...) não precisa nem da idéia de outro ser acima do homem para conhecer o seu dever, nem de outro móbil diferente da própria lei para o observar".

Trataremos, neste pequeno artigo, das duas outras respostas oferecidas, buscando, ao final, discutir as condições para a reconstrução crítica do fundamento dos direitos do homem, a partir da superação do antagonismo entre jusnaturalismo e positivismo jurídico.

 

II. JUSNATURALISMO E FUNDAMENTO DOS DIREITOS HUMANOS.

 

Como bem observou Bobbio, o que reunia autores tão díspares como Hobbes, Leibniz, Locke, Kant e Pufendorf sob a denominação "escola do direito natural", não era exatamente o conteúdo de suas idéias, mas sim a crença comum de que era possível reduzir o direito e a moral a uma ciência demonstrativa. Para tanto, nas significativas palavras de Espinosa, bastava ao ser racional analisar "as ações e os apetites humanos como se tratasse de linhas, de superfícies ou de volumes".

Em simetria com a frase do filósofo holandês, sustentava Hobbes que "se a natureza das ações humanas fosse tão bem conhecida como, na geometria, a natureza da quantidade, então a força da avareza e da ambição, que é sustentada pelas errôneas opiniões do vulgo quanto à natureza do que é certo ou errado, prontamente se enlanguesceria e se esvaneceria; e o gênero humano gozaria de paz sem fim (...)".

Também Locke compartilhava desse entendimento: "o conhecimento moral é tão capaz de certeza real como o matemático. Com efeito, a certeza é apenas a percepção de acordo ou desacordo de nossas idéias, e a demonstração nada mais que a percepção de tal acordo, pela intervenção de outras idéias ou meios. Por conseguinte, nossas idéias morais, como as matemáticas, sendo elas mesmas arquétipos, e idéias tão adequadas e completas, todo o acordo ou desacordo que descobrirmos nelas produzirá conhecimento do real, do mesmo modo que nas figuras matemáticas".

Nessa concepção, o termo "fundamento" assume um sentido filosófico muito preciso: o de axioma, de verdade primeira, de "alicerce" - para usar da metáfora cartesiana - a partir do qual todo o conhecimento moral é construído. Para Hobbes, Locke, Rousseau e os demais filósofos do jusnaturalismo, esse fundamento deveria ser encontrado na natureza das coisas, sendo este, pois, o motivo pelo qual todos iniciam suas teorias morais tecendo considerações acerca do homem e de sua condição de ser racional. Na síntese de Locke, "a idéia de um Ser supremo, de infinito poder, bondade e sabedoria, cuja obra nós somos, e do qual dependemos, como ainda a idéia de nós mesmos, como criaturas racionais e inteligentes, por serem tão claras em nós, ofereceriam, suponho, se bem consideradas e pesquisadas, tais fundamentos para nosso dever e regras para a ação que poderiam situar a moral entre as ciências capazes de demonstração".

A tarefa empreendida pelos jusnaturalistas representava, a um só tempo, a negação da tradição moralista herdada acriticamente da Idade Média e a tentativa de combater o niilismo de valores que ameaçava ocupar o vácuo produzido pela crise religiosa. Para tanto, o pressuposto básico assumido pela escola do direito natural era o de que "(...) se um método correto fosse empregado, grande parte da moral seria estabelecida com clareza, e não deixaria, para um homem ponderado, razão para duvidar, do mesmo modo que não poderia duvidar da verdade das proposições matemáticas, que lhe foram demonstradas".

Dessa afirmação de Locke depreende-se a confiança absoluta na razão, compartilhada por todos os iluministas. Somente ela poderia tirar o homem da menoridade, isto é, da "incapacidade de servir-se do próprio entendimento sem a direção de um outro", e conduzi-lo à autonomia, único princípio legítimo da moralidade, segundo Kant. Para os filósofos do Iluminismo, identificados os fundamentos e deduzidas destes as regras morais e jurídicas, nenhum ser no uso de sua faculdades racionais poderia deixar de negá-las vigência e de observá-las nas suas ações.

 

III. POSITIVISMO JURÍDICO E CRISE DA IDÉIA DE FUNDAMENTO.

 

No século XIX, como resultado dos processos de sistematização, positivação e historicização do Direito, ocorreu a erosão do paradigma do direito natural. Com efeito, como aponta Celso Lafer, "transposta e positivada pelos códigos e pelas constituições a visão jusnaturalista de um Direito racional e sistemático, foi perdendo o significado a idéia de outro Direito que não o Direito do Código e da Constituição. Por isso, o fundamento do Direito deixou de ser buscado nos ditames da razão e passou a afirmar-se como vontade do legislador, independentemente de qualquer juízo sobre a conformidade desta vontade com a razão". Além disso, a crença em um direito natural fundado na razão, imutável e universal, e que tinha por escopo precípuo qualificar as ações em boas ou más tornou-se incompatível com a crescente complexidade do fenômeno jurídico do mundo contemporâneo. Como é sabido, a partir do século XIX verifica-se a separação entre moral e direito e a crescente identificação deste com o direito positivo, em um processo que acentuou seu papel instrumental de gestão da sociedade mediante a premiação/penalização de condutas.

É certo que esse processo de historicização e positivação do direito garantiu maior segurança às relações sociais, na medida em que a lei constitui um referencial mais objetivo do que a "natureza" ou a "razão" tal como imaginadas pelo Iluminismo. Por outro lado, a ausência de um fundamento para o direito que não a própria vontade do legislador produziu indivíduos incapazes de pensar eticamente, incapacidade esta explicitada pelo fenômeno totalitário.

Não se pode dizer, assim, que o positivismo jurídico nega a razão, mas sim que, ao historicizá-la e secularizá-la, a reduz a uma razão instrumental ou "subjetiva", para usarmos da dicotomia proposta por Max Horkheimer. A conseqüência desse processo é que conceitos como o de justiça, igualdade e felicidade perdem suas raízes intelectuais, inexistindo força racional autorizada para avaliá-los e ligá-los a uma realidade objetiva. "Endossados por veneráveis documentos históricos, podem ainda gozar de certo prestígio, e alguns estão presentes nas leis supremas dos maiores países. Contudo falta-lhes a confirmação da razão em seu sentido moderno. Quem pode dizer que qualquer um desses ideais é mais estritamente relacionado com a verdade do que o seu oposto? Segundo a filosofia do intelectual médio moderno, só existe uma autoridade, a saber, a ciência, concebida como classificação de fatos e cálculo de probabilidades. A afirmação de que a justiça e a liberdade são em si mesmas melhores do que a injustiça e a opressão é, cientificamente, inverificável e inútil".

É nesse contexto que o conhecido ensaio de Norberto Bobbio sobre o fundamento dos direitos humanos deve ser entendido. Segundo Bobbio, a questão do fundamento dos direitos humanos perdeu seu interesse no mundo contemporâneo, na medida em que a maior parte dos Estados aderiu às grandes declarações internacionais de direitos do homem (Declaração Universal dos Direitos do Homem e os Pactos Internacionais de Direitos Civis e Políticos e de Direitos Econômicos e Sociais) e, com isso, reconheceu sua importância. Para o grande filósofo italiano, portanto, o problema atual dos direitos humanos não seria o de justificá-los, mas sim de protegê-los, garantindo sua eficácia.

Em outras palavras, somente ante à incapacidade do pensamento filosófico contemporâneo de conceber conceitos universalmente válidos é que a noção de fundamento - tal como concebida pelos jusnaturalistas - perde seu sentido e se torna jurídica e eticamente inútil.

Será, então, que devemos renunciar à qualquer discussão sobre o fundamento dos direitos humanos no mundo contemporâneo, ante à sua esterilidade? Teria, de fato, o consensus omnium gentium atestado pela adesão à Declaração Universal dos Direitos do Homem resolvido o problema filosófico dessa categoria de direitos, restando, como pensa Bobbio, apenas a questão de como protegê-los politicamente? Parece-nos que não.

 

IV. PARA UMA RECONSTRUÇÃO CRÍTICA DO FUNDAMENTO DOS DIREITOS HUMANOS.

 

Fundamentar uma proposição ou uma norma, observa Perelman, significa dissipar, ao menos provisoriamente, uma dúvida ou controvérsia sobre o alcance e o sentido dessa proposição ou dessa norma. Ora, por certo que o simples fato de os Estados terem aderido às Declarações Internacionais de Direitos não afastou todas as controvérsias em relação aos direitos humanos. Durante a Conferência de Viena, por exemplo, houve acesa disputa sobre a natureza universal ou relativa dos direitos do homem. A obrigação de matricular os filhos no ensino fundamental (CF, art. 208, inciso I, e § 1o), por exemplo, deve ser estendida a culturas que adotam formas alternativas de educação, tais como os ciganos? A ablação do clitóris, prática comum em países muçulmanos, afronta o direito humano fundamental à integridade física e moral?

Além disso, como bem ressalta José Eduardo Faria, o positivismo jurídico, ao institucionalizar e vincular os direitos do homem ao Estado, terminou por empobrecer e olvidar o conteúdo ético e a promessa emancipatória contida nesses direitos. Para além da relação jurídica obrigacional pública instituída por eles, são os direitos do homem portadores de valores éticos e sociais. Declarados ou não, reconhecidos pelos Estados ou não, com maior ou menor grau de eficácia, a força dos direitos humanos de primeira, segunda e terceira geração reside precisamente no fato deles expressarem os valores-símbolo da liberdade, da igualdade e da solidariedade.

É certo que, em muitos casos, estes valores entram em conflito. Nestas situações, o que garante coesão e unidade ao sistema, permitindo mesmo que um valor prevaleça sobre outro, é precisamente a noção de um fundamento comum. Daí, pois, a relevância do debate sobre o sentido contemporâneo do fundamento. O termo, contudo, não pode mais ser entendido em seu sentido iluminista de verdade primeira. A idéia de que a ética poderia ser demonstrada "à maneira dos geômetras", além de absurda para a consciência contemporânea, contém em si o germe do hiper-racionalismo, da razão autoritária e narcísica, responsável por, dentre outros episódios, o Terror pós-revolucionário francês. A filosofia contemporânea deve, assim, buscar um outro significado para o termo fundamento e, nesta busca, como bem observou Perelman, o estudo do direito pode oferecer uma contribuição importante. Com efeito, ante a imperfeição das leis humanas e sendo próprio do direito a decisão, o jurista não opera, em seu cotidiano, com a lógica racional própria das ciências exatas, mas sim com a lógica do razoável, de natureza argumentativa, "que utiliza não provas analíticas, que são coercivas, mas provas dialéticas - no sentido aristotélico dessa distinção - que visam a convencer ou, pelo menos, a persuadir o auditório (...), de modo que o leve a dirimir com sua decisão uma controvérsia jurídica".

Dito de outro modo, o direito emprega o termo "fundamento" de forma diversa das ciências demonstrativas. "Fundamento", para a ciência jurídica, exprime a idéia de justificativa legítima, de motivação. Daí o artigo 458 do Código de Processo Civil determinar, como um dos requisitos essenciais da sentença, "os fundamentos, em que juiz analisará as questões de fato e de direito", e no artigo 131 estabelecer que o juiz "deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento."

Deve, assim, o termo "fundamento" ser compreendido não mais em seu sentido iluminista de verdade primeira a partir da qual toda a moral é construída, mas sim como uma justificativa, como um referencial ético para a formação de laços de solidariedade intersubjetiva, sem os quais não há possibilidade de afirmação dos direitos do homem.

E qual seria esse referencial ético? A Declaração Universal dos Direitos do Homem, em seu parágrafo inicial, nos indica a resposta: "(...) o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo". Em igual direção, declara a Constituição de 1988: "Art. 1º. A República Federativa do Brasil (...) constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) III - a dignidade da pessoa humana." A dignidade humana, portanto, é, reconhecidamente, o fundamento de todos os direitos do homem. Na lição de José Afonso da Silva, é ela "um valor supremo, que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida". "Respeitá-la e protegê-la - assevera por sua vez a Constituição alemã - é dever de todos os Poderes Públicos".

Cumpre-nos, contudo, verificar se a dignidade humana possui, de fato, um conteúdo, ou, ao contrário, se apresenta como um conceito vazio, destinado a assegurar a adesão acrítica do público ao discurso. Neste ponto, cremos ser de extrema relevância lembrar a lição de Kant, na Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Para o filósofo de Königsberg, "tudo tem um preço ou uma dignidade. Aquilo que tem um preço pode ser muito bem substituído por qualquer outra coisa, a título de equivalente; ao contrário, aquilo que é superior a todo preço, aquilo que por consegüinte não admite equivalente, é isto que possui uma dignidade".

A dignidade, fundamento de todos os direitos do homem, reside, portanto, nesta característica própria dos seres humanos que é a de não serem substituíveis. A dignidade é o conceito que unifica toda a raça humana: independentemente de sua origem, cor, etnia, sexo, idade, condição social, religião, crença política, situação penal e outras características individuais e sociais, todos os seres humanos possuem a mesma dignidade e, por isso, devem ser igualmente respeitados. É isto o que declara expressamente o artigo 1º da Declaração Universal dos Direitos do Homem: "Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos."

A dignidade humana, na medida em que não se constitui em "verdade primeira", é um conceito historicamente mutável. A exploração do trabalho infantil, p.ex., que hoje constitui uma afronta à dignidade do homem, era visto como algo natural há dois séculos atrás. É também uma noção variável de lugar para lugar. Como bem lembra Boaventura Souza Santos, cada cultura possui sua própria concepção de dignidade humana, apesar de nem todas elas a conceberem em termos de direitos humanos. Na síntese de José Joaquim Gomes Canotilho e Vital Moreira, "concebida como referência constitucional unificadora de todos os direitos fundamentais, o conceito de dignidade da pessoa humana obriga a uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional e não uma qualquer idéia apriorística do homem".

Para ilustrar o que foi dito, encerro este ensaio trazendo à colação alguns julgados que evidenciam que a dignidade humana é empregada pelos juízes como um importantíssimo referencial ético e jurídico para as suas decisões.

 

"INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE - EXAME DNA - CONDUÇÃO DO RÉU "DEBAIXO DE VARA". Discrepa, a mais não poder, de garantias constitucionais implícitas e explícitas - preservação da dignidade humana, da intimidade, da intangibilidade do corpo humano, do império da lei e da inexecução específica e direta de obrigação de fazer - provimento judicial que, em ação civil de investigação de paternidade, implique determinação no sentido de o réu ser conduzido ao laboratório, "debaixo de vara", para coleta do material indispensável à feitura do exame DNA. A recusa resolve-se no plano jurídico-instrumental, consideradas a dogmática, a doutrina e a jurisprudência, no que voltadas ao deslinde das questões ligadas à prova dos fatos" (STF - HC-71373/RS - Rel. Min. Francisco Rezek - Rel. Acórdão Min. Marco Aurélio - DJU 22/11/96 - Tribunal Pleno - v.u.).

 

"CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. Ativos financeiros. Cruzados Novos. Retenção no Banco Central do Brasil. Desbloqueio. Lei 8.024/90. Ação Cautelar. Liminar concessiva. Agravo de Instrumento. Efeitos. Mandado de Segurança. Dever de assistência aos pais enfermos. CF, artigo 229. Objetivos da Republica. CF, artigo 3º. Lesão à economia nacional. Segurança denegada. 1. Este Tribunal já considerou inconstitucional a retenção de ativos financeiros, inconvertidos em cruzeiros, pela lei 8.024/90. 2. A Constituição impõe aos filhos o dever de assistência aos pais enfermos, na velhice, como concretização da justiça social e dignidade humana almejadas pela República. 3. Escorreita, pois, a concessão de liminar em cautelar visando utilização de ativos retidos, diante de grave situação da mãe da requerente, bem como a não suspensividade de agravo contra tal medida. 4. Ordem denegada" (TRF - 4ª Região - Mandado de Segurança n.º 424.633/90 - 2ª Turma - Relator Juiz Osvaldo Alvarez - DJU 23/09/92 - p. 29.643 - v.u.).

 

"CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL. Habeas Corpus. Tráfico de Drogas. Prisão preventiva que invoca abstratamente motivos como ‘ordem pública’, ‘credibilidade da justiça’, ‘aplicação da lei penal’ e ‘lei de crimes hediondos’ fica no plano puramente teorético e não desce ao concreto. A Constituição Federal de 1988, por ter consagrado expressamente os princípios da dignidade humana, da presunção de inocência e da fundamentação dos atos judiciais, pede fique demonstrada concretamente que a prisão processual é imprescindível, necessária. Recurso ordinário conhecido e provido" (STJ – RHC 3888/RJ – Rel. Min. Anselmo Santiago – Rel. Acórdão Min. Adhemar Maciel – j. 21.08.1995 – maioria de votos – DJU 05.02.1996 – p. 1.442).

 

"PROCESSUAL. LEI 8.009/90. ALCANCE. TELEVISORES E APARELHO DE SOM. PENHORABILIDADE. APLICAÇÃO NO TEMPO. 1. A proteção da Lei 8.009 /90 é apenas para os bens que guarnecem a residência do devedor indispensáveis à habitabilidade mínima de sua família, bem como os necessários para a manutenção da dignidade humana. 2. Televisores e aparelho de som escapam da protetora inspiração social da impenhorabilidade. 3. A impenhorabilidade da Lei 8.009 /90 alcança o bem que, anteriormente ao seu advento, tenha sido objeto de constrição judicial (Sum.10/TRF 4ª Região). 4. Apelação e remessa oficial parcialmente providas" (TRF - 4ª Região - Ap. Cível n.º 407.575/96 - 1ª Turma - Relator Juiz Edgard Antonio Lippmann Júnior - DJU 30/10/96 - p. 83042 - maioria de votos).

 

"INDENIZAÇÃO - Responsabilidade Civil - Dano Moral - Utilização indevida de imagens por emissora de TV - Aplicação da Lei n.º 5.250/67 - voto vencido - Emissora de televisão que realiza cobertura jornalística levando ao ar cenas de suicídio, mostradas ao vivo, e, logo após, seus repórteres conduzem os pais da vítima a um distrito policial para, assim, registrar, também, imagens com reações e impressões dos mesmos naquele momento de desespero, e ainda, no dia seguinte, contra a vontade dos familiares da vítima, filma, à distância, cenas do sepultamento, acompanhadas de comentários de que a menor era viciada em drogas, tudo levado ao ar em busca de alguns pontos a mais nos índices de audiência, o que sem dúvida provocou um agravamento na dor espiritual dos pais da vítima. Inegável, assim, que a emissora de TV abusou da liberdade de imprensa, princípio constitucional que deve ser exercitado com consciência e responsabilidade, em respeito a outros valores igualmente importantes e protegidos pelo mesmo texto constitucional, quais sejam, a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, em suma, a dignidade da pessoa humana, que, uma vez violada, reclama a devida reparação. Assim, para cada transgressão isoladamente considerada, deve ser fixado valor em salários mínimos na forma do artigo 51 da Lei de Imprensa (Lei n.º 5.250/67), a ser aumentado em 10 vezes, máximo previsto no artigo 52 do mesmo diploma legal" (TJSP - 9ª Câm.; Ap. Cível n.º 252.801-1/3-SP; Rel. Des. Ricardo Feitosa; j. 20.08.1996; maioria de votos. Pub. BAASP 1998/29-e, de 09.04.1997).

 

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Texto retirado de http://www.pge.sp.gov.br/tesesdh/Tese 10.htm