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Nota crítica sobre a relação direito e moral.

(ESPACOS 4/2 (1996), p.119-143.)


P. Antonio Silva CSSR
Professor de Moral Social e Eclesiologia
Instituto Teológico São Paulo, São Paulo, SP


Conta o P. Antonio Maria Tannoia, companheiro de trabalho e biografo de Santo Afonso que ele costumava dizer: na moral, quando nos faltam os Cânones e o Evangelho não é claro, então a razão é quem deve ser a regra.1 Ele dá uma importância extraordinária aos cânones, às decisões escritas da autoridade, quase complementando-a com o Evangelho e com a razão. Era praticamente uma moral da lei. Hoje ninguém duvidaria de por a lei positiva em lugar bem menos saliente. Certamente daríamos precedência ao Evangelho e depois à razão. Como compreender então essa ligação entre a moral e a lei, mais concretamente expressa pelo direito?
 
 

1.A DIFERENÇA NA DEFINIÇÃO FENOMENOLÓGICA
 
 

Dentro de nossa cultura atual e quando se faz um exame fenomenológico, não há dúvida que existe uma distinção entre o direito e a moral. A moral define-se por uma situação de bondade e de maldade enquanto praticados por um ser humano como agente consciente: é uma situação do bem e do mal em sí e na sua qualidade de tornar responsável quem a escolhe e a realiza voluntariamente.2 O direito é uma situação social onde é essencial que haja uma permissão ou uma proibição legalmente estabelecidas como exigência, por uma autoridade competente e dentro dos limites de uma estrutura social. O bem e o mal entram apenas como uma das causas materiais, não como a causa final imediata..
 
 

1.1 A situação do direito
 
 

O direito é o regulador da vida social: não trata em si do bem e do mal mas proíbe como errado o que pode causar prejuízo à vida social e exige comportamentos bons enquanto são necessidades para convivência.3 Isso vale também para o direito canônico.4 Exatamente por isso, além do bom e do mau, compete ao direito estabelecer leis em coisas em si nem boas e nem más mas cuja regulamentação permite a vida social organizada, fazendo com que, a partir da legislação, essas coisas devam ser consideradas obrigatórias ou vetadas desde que assim foram regulamentadas pela sociedade. Os ingleses andam em suas estradas colocando-se à sua esquerda enquanto, no Brasil, os nacionais se devem por normalmente à direita para não cometerem um crime jurídico. O andar à direita ou à esquerda são em si indiferentes, mas desde que foram escolhidos por lei, o andar na contramão desorganiza o bom entrosamento social e portanto passa a ser uma desobediência juridicamente culpável e, enquanto perigosa, moralmente condenável. Fora da legislação, considerada somente por sí, qual das duas posições é boa ou e má?5

O direito não se contenta com estabelecer o que é crime mas também impõe condições para que uma coisa seja válida e possa dar direitos na convivência social: não enquanto essa realidade é boa ou má mas enquanto ela é constituída instrumento válido; este é o caso da assinatura utilizada para dar valor a um documento renunciando-se ao selo de cera como se fazia antigamente. Essa determinação puramente legal torna-se indispensável para a juridicidade sem nenhuma relação moral. No direito canônico a exigência de duas testemunhas para a validez do casamento eclesiástico (canon 1108 § 1) também se constitui numa exigência que torna impossível um casamento em circunstâncias normais, sem que por isso haja imoralidade num casamento natural onde a condição não é requerida e também não foi observada. O mesmo pode-se dizer do impedimento de idade (canon 1083) ou da exigência de que o contrato matrimonial se faça por uma declaração oral (canon 1104 § 2). É interessante que, em situações especiais, o próprio direito declara válidos esses atos sem as condições juridicamente impostas ou permite com facilidade dispensa das exigências, sem nenhuma conotação moral na ausência das condições por permissão ou dispensa (canon 35-93).6

O direito estabelece leis e regulamenta até em situações que são más em si, mas cuja presença na sociedade é constatada sobretudo quando os males que elas causam mudam as condições de vida social. Toda a legislação do direito penal, com imposição de castigos ou regulamentação de situações reprováveis, escapa a uma classificação moral estrita. Quando se cuida dos direitos dos concubinos ou se dá liberdade a erros culturalmente e historicamente constatáveis, como a escravidão, o aborto, o meretrício, a situação dos criminosos e semelhantes, não é dado socialmente um aval de valores positivos a essas situações anormais que moralmente são mas e indesejáveis. Entretanto sua presença na sociedade é tão forte e de tal influência que precisam de uma regulamentação que coíba seus prejuízos maiores ou piores.7
 
 

1.2. A situação da moral
 
 

A moral não depende de um legislador: ela é uma relação do ser humano agente com o bem e o mal que ele escolhe.8 A moral faz-nos bons ou maus dentro de nós mesmos ou perante a consciência dos outros. Podem os outros ver-nos como bons e maus conforme seus desejos; mas não podem em nós criar maldade ou bondade.

Individualmente ou em grupo, podemos tornar-nos mais sensíveis ou menos sensíveis pela condição moral de nossa ação, mas não podemos mudar-lhe a bel prazer a qualidade de serem boas ou más. Enredados em situações de análises culturais diferenciadas, podemos ter sínteses morais diferentes; podemos dar valores diferentes aos mesmos gestos ou dar a gestos diferentes um mesmo valor; mas as realidades produzidas não precisam de ninguém para aparecerem em sua especificidade determinante: são uma escolha entre o bem e mal.

A segunda caraterística da moral é sua condição de previsão. O que dá condição moral aos fatos acontece exatamente antes de eles terem existência, isto é, quando são planejados e podem ser escolhidos ou excluídos. Um bem ou um mal imprevisíveis podem ser medidos como fatos, mas não tem significação moral, nem condições de responsabilidade. Existem como realidades físicas mas não podem ter estrutura de culpa ou virtude para ninguém se não foram previstos. Quem nasce doente ou vive inteligente, existe com a doença e com a inteligência durante a vida, não é causa delas: vive com elas, não pode ser culpado ou elogiado como bom ou mau por te-las.

A moral caracteriza-se também em oposição à legislação porque ela sempre se constrói por uma escolha livre. Os efeitos da lei produzem-se desde que exista uma situação jurídica. Para a existência da moralidade, além do bem ou do mal e de sua previsão, para que os fatos sejam morais, é preciso que, quem os faz, aja com liberdade e por escolha. Ninguém pode ficar bom ou mau sem se determinar livremente: é sempre por meio de uma escolha que alguém se faz causa moral do ato responsável. Caso falte a liberdade, quem faz o mal agiu apenas dentro da realidade física, não é mau: produziu um fato, não foi responsável por um ato.

A moral, como reflexão científica, produz provas que permitem distinguir o bem do mal e pode aprofundar tecnicamente em que condições de escolha a consciência pode decidir-se: não é a ciência que faz a moralidade..
 
 
 
 

2. QUANDO A MORAL É LEI...
 
 

2.1 A lei natural
 
 

Partindo do pressuposto que o Criador é santo e que sua providência e onipotência não podiam escolher nenhum mal, a tradição teológica católica optou geralmente por uma reticência diante da naturalidade do mal, principalmente do mal moral.9 A criação e a criatura teriam de ser boas por duas condições dentro das quais elas se movem necessariamente: a lei divina e a lei natural. O mal é sobretudo um mistério, possível dentro dos limites da criatura e das responsabilidades da sua liberdade decaída.10

Acentuando a dependência direta da relação entre a criatura e o Criador na sabedoria e na providência divinas que nEle existem, certo jusnaturalismo faz da moral um direito legalmente estruturado e pré-estabelecido na organização física da criatura como se a declaração do Gênesis (Gn 1,4.10.12.18.21.25.31) sobre a bondade vista pelo Criador fosse uma consagração de perfeição não superável para tudo o que existe: todo o existente é uma projeção da vontade onipotente do Criador e, por isso, se constitui em direito "natural-divino" tornando-se uma explicitação e uma declaração da moral estabelecidas pelo Supremo Senhor (lei divina, lei natural).
 
 

2.2 O Deus legislador
 
 

A tradição bíblica onde Deus se dá um povo e lhe revela sua vontade a ser executada como lei social e como lei moral dentro de uma aliança feita explicitamente com um Israel da carne, escolhido por privilégio e separado por isso dos outros povos, vem acentuar ainda mais a mistura da moral com o direito dentro do projeto sagrado revelado: as diretivas jurídicas necessárias para a convivência humana e religiosa do povo escolhido e as tradições desenvolvidas humanamente pelos antepassados são assumidos sem crítica e até com certa malícia como expressões da vontade divina (Mc 7, 1-13)11

É verdade que o Novo Testamento, não estruturado sobre uma convivência social nacional, veio trazer uma Lei nova com outros paradigmas, mas o regime de cristandade, logo trouxe de volta a "lei" que absorveu com ela, através da metafísica essencialista escolhida como método de reflexão, a teoria grega da "lei natural".12

A compreensão da "lei moral divina ou natural" como lei "jurídica" leva a tal aproximação de semelhanças teóricas que se procuram encontrar na lei moral todas as fases e caraterísticas que acontecem com uma lei jurídica: descoberta de uma ordem racional, orientadora para o bem comum, por autoridade competente e com promulgação recebida.13 São Tomás assim prova a existência de uma lei divina: a lei nada mais é que uma expressão da razão prática no príncipe que governa uma comunidade perfeita. É evidente portanto, supondo-se que o mundo é regido pela providência divina, como foi definido no primeiro, que toda a comunidade do universo é governada pela razão divina. E, por isso, a lei recebe sua racionalidade de ordenação governadora das coisas do próprio Deus como príncipe de todo o universo. E porque a inteligência divina não concebe nada dentro do tempo mas tem conceitos sempre eternos, como se diz em Prov. 8, daí é necessário dizer que essa lei é eterna.14 E quando se objeta que essa lei divina não foi promulgada na eternidade pois não havia quem a recebesse, responde: a promulgação da lei faz-se por palavra e por escrito; em cada um desses modos a lei eterna recebeu uma promulgação da parte de Deus promulgador: porque o Verbo divino é eterno, e a escritura do livro da vida é eterna. Mas da parte da criatura que ouve ou que enxerga, não pode existir a promulgação eterna.15
 
 

2.3. A legalização do comportamento
 
 

Levando os princípios dessa visão até ao centro da moral, fez-se da moral uma obrigação legal e, então, pode-se dar por titulo a certos livros: tratado canônico moral. Desde os tempos primitivos da Igreja, o costume dos sínodos e concílios terem sido ocasião para orientação e reforma de costumes, publicando junto com decisões dogmáticas e administrativas, também cânones com orientação e reforma da vida cristã, ajudou a que as citações freqüentes desses cânones viesse a dar um cunho jurídico às orientações que relevam mais da moral.

A essa literatura vão acrescentar-se as decretais dos papas e dos bispos que se publicam como ordenações e que depois as coleções jurídicas juntam e condensam formando o centro das provas nos manuais de moral feitos para formação de confessores.16 A isso se acrescentam as opiniões dos probati autores cujas conclusões são mais citadas que suas razões, valendo seu nome como prova em forma de lei e jurisprudência nos tratados de moral da casuística.

Para exemplificar a estrutura jurídica dessa proposta de modelo moral, basta uma incursão breve nos tratados sobre os sacramentos: É pecado venial omitir bênçãos, inclinações, genuflexões, etc. quando são prescritas nas rubricas. Igualmente pode-se dizer que o são quando com advertência se faz genuflexão sem tocar a terra ou se fazem as bênçãos de maneira não definida. Além disso, essas omissões poderiam tornar-se mortais se alguém as omitisse em quantidade notável; e, por causa disso, não pode livrar-se de pecado mortal o sacerdote que celebrasse a missa com menos de um quarto de hora.17 Basta uma lei positiva para que a ação tenha uma "moralidade" extremamente desenvolvida, sem nenhuma relação para com o bem ou com o mal reais.

Pode-se talvez acrescentar que a teoria luterana da corrupção absoluta da natureza humana pelo pecado, veio acentuar ainda mais o valor da lei divina como centro da moral cristã. Tanto a filosofia moral de Descartes18 como talvez ainda mais a filosofia de Kant, consagram uma moral do dever pois não vêem como o humano possa responder positivamente quando tem tantas ocasiões de sentir-se livre diante do pecado, sem que se faça apelo a uma moral do dever universal e absoluto, como o é a lei jurídica.19

Podemos concluir com o P. Servais Pinckaers OP: Nessa apresentação da moral, a obrigação não constitui apenas uma questão entre as outras; ela é a questão moral por excelência; poder-se-ia mesmo dizer que ela é a única questão. A moral aparecerá como a ciência das obrigações ou dos deveres. O moralista é transformado em um guarda das leis, em um intérprete das ordens, um juiz das obrigações. Desenvolvida nos manuais destinados à formação dos clérigos, essa concepção da moral divulgou-se durante os últimos séculos pela pregação e pelos catecismos. Ela caracterizou a uma certa imagem do padre com quem ensina as obrigações e as proibições morais, com insistência nos pecados que se devem evitar. Certamente essa mentalidade era predominante e caraterística.20
 
 
 
 

3. CONFRONTO MORAL E DIREITO
 
 

A confusão entre a moral e o direito da qual a insolúvel querela do probabiliorismo contra o probabilismo foi um dos momentos mais veementes da história da moral católica21 não dominou a ética teológica cristã sem contradições e ambigüidades que a fizeram sempre ser discutida 22
 
 

3.1. Os confrontos indiretos
 
 

A análise dessa "lei" moral traz muitas dificuldades para os moralistas.23 Principalmente quando deve falar de "promulgação" da moral... Outro caso interessante sobre lei eclesiástica obrigatória mas de caráter diretivo, sem obrigação moral é a existência das constituições religiosas que não obrigam sob pecado: são normas de perfeição de vida mas elas mesmas não criam em si uma obrigatoriedade que vá além da orientação. Somente quando causam outro mal que a sua simples desobediência é que transgridem a bondade moral.24 Várias congregações possuíam uma indicação expressa centro de sua legislação. Logo são determinações jurídicas, sem conterem em si um estatuto ético.

Uma questão também muito marcante na história da consciência e da legislação tem sido a questão da liberdade da Igreja perante a sociedade civil e vice e versa. Há muitas diferenças entre as afirmativas de um Bonifácio VIII ou do Concílio Vaticano II sobre a independência dos Estados perante a Igreja e suas autoridades. Basta ler um pouco da história para vem como o iustum e o iussum se emaranham e se confundem freqüentemente nesses conflitos deixando lugar para muitas dúvidas quanto à moralidade de quem manda.25

O mundo atual acentua ainda mais a diferença consciente por causa de uma melhor compreensão do homem e de sua natureza. O Concílio Vaticano II não duvidou em dizer que se a Igreja colabora como a moral no mundo, iluminando-o na criação do pluralismo de suas culturas, mas também aprende com ele sendo ajudada a se purificar e desenvolver-se com a colaboração dele.26
 
 

3.2. O confronto direto
 
 

A teologia moral atual tem posto freqüentemente os diversos direitos diante de seus defeitos quando ela acusa a presença neles das estruturas de pecado.27 É a situação que se poderia classificar como o direito imoral: apoiados na força e na dominação, certos grupos e classes humanos estabelecem uma estrutura social legal injusta que sacrifica pobres e fracos. A constituição voluntária dessas situações de violência permanente mas juridicamente protegidas que obriga a uma submissão expoliadora sob formas freqüentemente paternalistas e culturalmente intransponíveis são um pecado social.

São moralmente piores porque foram conscientemente transformadas em direito. A lei do apartheid, a do liberalismo dos proprietários ou a das patentes dos capitalistas que privilegiam indivíduos ou grupos em prejuízo da ciência e da técnica produzida em comum e da verdade descoberta em todos, podem pedir uma submissão moral? Diante dos impostos injustos, de reservas absurdas de bens produzidos pela natureza e descobertas em comum, das estruturas de propriedade açambarcadoras, devem os necessitados, numa pedagogia de oprimidos, continuar alimentando sua pobreza e a sua fome ou promovendo a privação de uma tecnologia já dominada pela humanidade como grupo histórico e não distribuída aos indivíduos criando-se a classe majoritária dos excluidos.28

Moral e direito confrontam-se também na diferença das pessoas enquanto indivíduos e enquanto comunidade. O direito vai ser exercido sobretudo na condição de convivência social: busca uma média orientada por regras que excluam os extremos onde estariam as faltas ou onde ficariam a exigência só realizável pelos extraordinários. A moral busca o maior aproveitamento da inteligência e da vontade definidos através da liberdade e da responsabilidade. A ordem moral leva à plenitude da vida virtuosa que se expressa o mais plenamente pela consciência. A estrutura jurídica só pode tratar dos fins próximos e imediatos que estabelecem uma condição de liceidade e iliceidade. Se a moral e seus valores ficassem reduzidos ou fossem medidos por leis jurídicas, seu alcance seria drasticamente reduzido no desenvolvimento da bondade. Um exemplo de situação de violência do direito deve ser dado pelas leis "naturais" do mercado econômico onde o homem torna-se homini lupus com total ausência de moral.

Existe uma diferença na variedade das posições culturais do homem de hoje. Além de uma modernidade filosófica, existe uma modernidade histórica. No passado facilmente acreditou-se numa condição universal de realidade como "ordem natural" porque a humanidade vivia numa submissão estrita à natureza como conjunto. Hoje é mais difícil crer que existe uma só possibilidade de estruturação moral da vida humana e muito menos hoje se crê num direito "natural" que predetermine pela passiva observância das leis do cosmo uma ordem que serviria para todos os homens e para todos os tempos.29

Não se pode confundir natureza primitiva com natureza em si. Um prédio de cem apartamentos hoje é tão natural quanto uma caverna no ano 10.000 antes de Cristo; o fogo tirado da pedra pelo selvagem de antes da descoberta da América, o mesmo fogo produzido por um babilônio do ano 2.000 AC, seria mais natural que o fogo a esquentar uma comida em fogão de gaz natural ou gaz fabricado com petróleo? Como medir a família natural de hoje pelos mesmos critérios usados para a família de ontem onde os casamentos se faziam com baixa idade e tinham uma duração marcada por baixa sobrevivência das partes? Como exigir a mesma relação entre pais e filhos na situação camponesa e na situação urbana? Esse pluralismo cultural exige uma pluralidade jurídica e mesmo uma pluralidade moral para serem verdadeiros.

Um instrumento de crítica à moral compreendida como lei acontece com a mudança da posição do homem perante a natureza nos tempos do urbanismo e da técnica que fez surgirem novos paradigmas.30 Na condição de usuário submisso da natureza, o homem tornava-se pequeno ante as poderosas forças naturais. Precisando mudar as condições que ela lhe impunha, o ser humano procurava pedir ao Deus organizador dos fenômenos que mudasse a seu favor as situações adversas. Quando ocorriam as doenças, as secas ou outros fenômenos naturais poderosos, o homem procurava acalmar ou inclinar para si o Criador Todo-Poderoso e controlador. De posse das tecnologias que hoje domina, o homem torna-se maior que a natureza. Com muito maior poder sobre ela do que dispunha no passado, quer controlá-la cada vez mais em seu favor.

O próprio cristianismo o desafiou a apossar-se do mundo (Gn 1, 28-30). Em sua nova condição, sente-se com mais poder em suas mãos do que tinha no passado e procura soluções que lhe interessem não apenas utilizando a natureza mas reconstruindo-a profundamente. Ainda inexperiente, ensaia ir alem dos estreitos limites das condições primárias das leis naturais buscando novas combinações transformadoras de própria estrutura da realidade. O sucesso da biologia ou da engenharia genética em vencer dificuldades antes insuperáveis, para não trazermos mais que um exemplo, levam-nos a imaginar e talvez a poder criar condições de vida muito mais desenvolvidas e humanizantes! São novas situações morais antes impensáveis mas agora transformadas em situações concretas e possíveis que pedem uma legislação e um direito adequados e complexos. Quais bondades novas poderão ser colhidas na engenharia genética e quais leis se deverão fazer para que as experiências necessárias para chegar a esse estágio humano superior sejam controladas e não prejudiciais aos indivíduos e aos grupos?
 
 
 
 

4. ENCONTRO MORAL E DIREITO
 
 

Uma moral que queira desenvolver-se sem direito é uma utopia irresponsável. Ninguém consegue viver sem momentos de ambigüidade e sem precisar muitas vezes de corrigir a direção que pode tomar sua vida. A pessoa honesta, para ser coerente consigo mesma, deve assumir uma posição de moral de atitudes e até de opção fundamental. As escolhas do bem ou do mal que fossem apenas atuais e subjetivas, seriam uma moral primitiva e insuficiente para se constituírem em bondade humana.31

Uma liberdade imediatista que se reduzisse a atos bons intermitentes numa liberdade eternamente indeterminada seria uma escravidão ao acaso e ao passageiro que destruiriam as possibilidades do personalismo e da convivência social. São imorais as contradições do liberalismo econômico que proclama a lei do mercado, mas que se estrutura para ter uma proteção forte e universal em benefício dos seus possuidores através das violentas e fictícias leis de patentes e das brutais sanções comerciais e políticas. Além disso, qualquer pessoa ou grupo sabe que nem sempre a correção dos desvios se fará por forças interiores nas pessoas e sociedades. Quantas vezes uma correção do exterior é indispensável e salutar contanto que seja corretamente controlada pelo direito.

Um direito sem moral é uma contradição. Apoiado exclusivamente em fatores exteriores do relacionamento humano, o direito pode torna-se uma cobertura de todas as injustiças. E, quando o próprio direito torna-se a fonte da injustiça estabelecida, ele perde completamente o seu sentido.32 Fala-se em pirataria de programas de computadores e se põe a força da comunidade na perseguição dos que usam propriedade de indivíduos concentradores da ciência comum de maneira totalmente totalitária e injusta: Bill Gates, que nunca soube alemão ou espanhol é o proprietário intelectual legal dos frutos financeiros de um programa que tem partes escritas nessas línguas. Por que?33

Certamente a elevação do nível moral favorece um bom direito e um bom direito favorece um crescimento nas condições que facilitam o desenvolvimento moral.34 O direito é um instrumento de construção de ambiente moral. Se o direito torna-se não razoável, ele se transforma em concessão de privilégios, de dispensas e cria problemas de uma imoralidade revoltante: a questão dos sem terra, do policiamento violento, do político corrupto e impunível... Há uma equidade jurídica que o direito reconhece e exige na prática (canon 19).

O direito canônico do século XX procurou separar o núcleo do legislação eclesiástica das definições da moral cristã. A legislação de 1917 organiza o "novo direito" ao redor de leis precisas mas reduzidas.35 Isso nem sempre foi compreendido e portanto nem sempre foi aceito.36 Alguns amigos do direito e a maioria dos seus inimigos atribuem a ele um status moral e de espiritualidade que a legislação não possui. Não é por acaso que o último cânone do atual código de direito canônico termina com uma proclamação que supera o assunto no qual aparece: Nas causas de transferência (de párocos), apliquem-se as prescrições do canon 1747, respeitando-se a eqüidade canônica e tendo diante dos olhos a salvação das almas que, na Igreja, deve ser a lei suprema (canon 1752).37

Exemplo de tratamento diferente que dá a Igreja hoje à moral aparece na Doutrina Social da Igreja, sobretudo se vista nas grandes encíclicas pontifícias. Referimo-nos às encíclicas Rerum Novarum (1891), Quadragesimo Anno (1931), Mater et Magistra (1961), Octogesima adveniens (1971), Laborem exercens (1981) e Centesimus annus (1991) que formam um conjunto pelo assunto que nelas se trata: a relação trabalho e trabalhadores e a distribuição dos frutos dessa relação. Por serem comemoração umas das outras e também por se reformularem entre elas na medida em que o assunto abordado muda de forma ou de dados, não apresentam uniformidade de doutrina: é um aprofundamento das questões dentro de sua bondade e maldade à luz da revelação, reflexão e da história sem estabelecer nenhuma legislação ou estrutura que obrigasse a um comportamento padrão. É um mesmo assunto mas com reflexão onde se comparam realidades diferenciadas com abertura a princípios e decisões diferentes.

Se quisermos alongar a exemplificação deveríamos citar também as encíclicas Humanae vitae (1968), Familiaris consortium (1983) e Veritatis Splendor (1993) que aparecem menos ligadas a uma visão moral e mais envolvidas por determinações jurídicas, avançando conclusões onde existe menos espaço para a consciência auto-responsável e mais decisões legislativas. Essa situação complexa permite relação mais polêmica com o público e uma aceitação mais matizada dos documentos.

Moral e direito são ambos finitos: vivem no tempo e no espaço e dentro das condições de criatura humana que nunca chegará a uma definição de realização infinita. Onde há finito, há condições de mudança e de pluralismo. Isso exige uma moral das situações complexas onde ela será sempre parcial e conflitual.38 O mesmo acontece com o direito: não é possível conservar um direito só de legislação imutável quando não são imutáveis as realidades que ele quer ordenar.39 Há também direitos conflituais: nenhuma lei concreta pode chegar a tal desenvolvimento que abranja todas as soluções de maneira uniforme e sem contradições. A jurisprudência e o juiz fazem parte do direito tanto quanto a lei para que a justiça seja humanamente mais coerente. O mesmo sucede com a moral que deve respeitar a realidade dinâmica da consciência e da história.40

Uma das situações onde a moral tem de se encontrar mais freqüentemente com o direito é na análise das condições anormais: mesmo os piores elementos continuam em sua condição de homens a ter direitos que não são os normais mas devem ser respeitados pelos normais. Em muitos casos, as pessoas de pouca representação social ficam marginalizadas no direito que se constrói pelas forças sociais mais ativas. Prova isso o número pequeno dos colarinhos brancos que sofrem as pressões da justiça legal. A moral é instrumento precioso como crítica do mau direito e um direito legalmente desenvolvido por uma cultura formadora da justiça é eficiente corretor das más consciências morais.

Direito e moral tem um objetivo comum: ambos visam conseguir que o ser humano viva a justiça. Cada um deles tem sua especificidade que lhe da uma identidade e utilização diferenciada: a moral por meio da justiça moral (ser bom ou ser mau, santo ou pecador) e o direito pela justiça legal (valido ou errado perante o ritmo de vida da sociedade). O objetivo final dos dois é único: desenvolver a vida humana, dos indivíduos ou dos grupos, de maneira tal que cada pessoa chegue a realização responsável da maneira mais adequada possível. Na condição de ordo ordinans ambos diferem, mas na ordo ordinata os dois devem chegar a um mesmo objetivo.

Quando se examina a presença do direito canônico na Igreja, ele encontra ainda mais críticas que no direito em geral. Há quem chegue ao extremo de pensar que o direito na Igreja é uma contradição: a Igreja é comunhão de fé e caridade, não lugar de direito e poder.41 Há quem só aceite o que for direito positivo divino ou ao menos teológico. Entretanto uma comunhão vivida em comunidade exige um direito que regule as deficiências humanas e ordene a variedade de interesses e necessidades plurivalentes da vida eclesial divina encarnada. 42 Essa legislação não deve ser confundida com a pregação da moral evangélica, a "lei" de santidade que quer transformar o mundo em Reino de Deus através da conversão livre e exercida pelo sacerdócio comum dos fiéis.43 O direito tem seu próprio campo de ação: regula a ordem da comunidade eclesial: torna-se bem claro que o objetivo do Código não é, de forma alguma, substituir, na vida da Igreja ou dos fiéis, a ‘fé, a graça, os carismas, nem muito menos a caridade. Pelo contrário, sua finalidade é, antes , criar na sociedade eclesial uma ordem que, dando a primazia ao amor, à graça e aos carismas, facilite ao mesmo tempo seu desenvolvimento orgânico na vida, seja da sociedade eclesial, seja de cada um dos seus membros.44 Coerente com isso, ele não vai além da Igreja latina e não cria obrigação por si para aqueles que não estão identificados com ela, é obrigatório somente para os súditos dela (canon 1).
 
 

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NOTAS
 
 

1. Della vita ed Istituto del venerabile servo di Dio Alfonso Maria Liguori. Napoli, Vicenzo Orsini, 1798, vol. 1, p. 246.

2. JOÃO PAULO II, Splendor veritatis, n. 62-64 e 76-78.

3. Tercio Sampaio FERRAZ JUNIOR, Introdução ao estudo do direito. São Paulo, Atlas, 1994, p. 53-93; Soarez MARTÍNEZ, Filosofia do direito. Coimbra, Almedina, 1995, p. 240-273; Alasdair MACINTYERE, Justiça de quem? qual racionalidade?. São Paulo, Loyola, 1991, p. 375-396 (Filosofia 17).

4. Pedro J. VILADRICH, Il diritto canonico. Em Corso di Diritto Canonico. vol. 1, Cremona, Queriniana, 1975, p. 31-73 (Bibl.); Salvatore LENER, Sulla natura specifica del diritto canonico. Em LA CIVILTÀ CATTOLICA 133/3 (1982-3171-3172), p. 120-126; Dario COMPOSTA: La "Salus animarum", scopo del diritto della Chiesa. Em La nuova legislazione canonica. Roma, Urbaniana, 1983, p. 243-260

5. Cfr Soares MARTÍNEZ, o. cit., p. 413-473

6. Eduardo LABANDEIRA, Normas y actos juridicos. Em Manual de Derecho Canonico. Pamplona, EUNSA, 1988, p. 265-286.

7. Ibidem, p. 529-558. Todos nós sabemos que a Igreja e sua moral são contra o assassinado, mas ninguém, na Igreja, condena a justiça legal que controla a punição ou mesmo o julgamento dos casos de morte. Por que não se tem a mesma objetividade perante camisinhas, os vários comportamentos sexuais, etc...

8. VATICANO II, Gaudium et Spes, n. 74;P. Antonio SILVA CSSR, Moral, obrigação e mudança. Em ESPAÇOS 3 (1995-1), p. 15-21.

9. VATICANO II, Gaudium et Spes, n. 12-13; Catecismo da Igreja Católica, n. 309-314; SÃO TOMÁS, Summa contra gentiles, l. 1, c. 82-83; René LATOURELLE: Mal. Em René LATOURELLE e Rino FISICHELLA, Dicionário de Teologia Fundamental. Aparecida, Santuário, 1994, p. 562-568.

10. Catecismo, n. 1701-1709. O novo Catecismo, assumindo uma crítica que se faz à moral católica oficial, reduz a influência dessa "lei divina" e da "lei natural" preferindo falar de uma lei da graça, cfr n. 1954-1974, mas não deixa de usar a teoria: As expressões da lei moral variam muito, e todas se acham coordenadas entre si: a lei eterna, fonte em Deus de todas as leis; a lei natural; a lei revelada, compreendendo a lei antiga e a nova lei (ou evangélica); enfim, as leis civis e eclesiásticas. (n. 1952). Apesar de escrever depois do Catecismo da Igreja Católica, na Splendor Veritatis, João Paulo II usa muito a expressão "lei" para falar da verdade moral (n. 12-15 e 51-53).

11. John L MCKENZIE, Aspectos del pensamiento Veterotestamentario. Em Raymond BRAUN ET AL., Comentário bíblico "san Jeronimo" Madrid, Cristiandad, 1977, t. 5 p.644-646.658-672; Francisco LAGE, Ley y alianza. Em Perspectivas de moral biblica. Madrid, Perpetuo Socorro, 1984, p. 9-39 (Estudios de etica teológica 5).

12. Marciano VIDAL, Moral de atitudes: vol. I: Moral fundamental. 2 ed. Aparecida, Santuário, 1986, p. 188-197; E. CHIAVACCI: Lege naturale. Em Leandro ROSSI e Ambrogio VALSECHI, Dizíonario enciclopedico di teologia morale. Roma, Paoline, 1981, p. 524-534.

13. SÃO TOMÁS, Summa Theologica, 1ª-2ª, q. 90, § 1-4;

14. Ibidem, q. 91, a. 1

15. Ibidem, ad 1.

16. Jean GAUDEMET, Les sources du droit de l’Eglise en occident du II au VII siècle. Paris, Cerf, 1985.

17. I. AERTNYS e C. DAMEN, Theologia Moralis. vol. 1, 17 ed. Torino, Marietti, 1958, p. 250, n. 258.

18. Eduardo E. M. RIBEIRO, Individualismo e verdade em Descartes. Porto Alegre, EDIPUCRS, 1995, p. 71-79.

19. Jose GOMES CAFFARENA, El teismo moral de Kant. Madrid, Cristiandad, 1984, p. 113-159 (Senda abierta 2); E. CORECCO, Diritto canonico. Em L. ROSSI e A. VALSECCHI, o. cit., p. 233-236.

20. Les sources de la morale chrétienne. Paris, Cerf, 1985, p. 28

21. AFONSO DE LIGUORI, Theologia Moralis. t. 1, Ed. Leonard Gaudé. Roma, Vaticana, 1905, p. 21-70

22. Jean-Marie AUBERT, Loi de Dieu, lois des hommes. Tournai, Desclée, 1964, p. 98-116; Philippe DELHAYE, Permanence du droit naturel. Louvain, Nauwelaerts, 1960, p. 115-119.

23. Afonso de LIGUORI, o. cit., p. 71-145; J.M. AUBERT, o. cit. p. 37-54.

24. I. AERTNYS e C. DAMEN, p. 1006, n. 1228.

25. Soares MARTINEZ, o. cit., p. 344-348; Giuseppe DALLA TORRE, Orientações e problemas entre as relações entre Igreja e Estado depois do Vaticano II. Em Ernesto CAPPELLINI (org.), Problemas e perspectivas de direito canônico. São Paulo. Loyola, 1995, p. 288-317.

26. VATICANO II, Gaudium et Spes, n. 40-44.

27. JOÃO XXIII, Pacem in terris (1963), n. 80-85; VATICANO II, Gaudium et Spes, n. 4-10.

28. Hugo ASSMANN e Franz J. HINKELAMMAERT, A idolatria de mercado, ensaio de Economia e Teologia. Petropolis, Vozes, 1989; Jung MO SUNG, Deus numa economia sem coração. São Paulo, Paulinas, 1992 (Temas de atualidade).

29. VATICANO II, Gaudium et Spes, 33-39; JOÃO PAULO II, Familiaris consortium, n. ; Adela CORTINA, Ética civil e religião. São Paulo, Paulinas, 1996 (Atualidades em diálogo); Josef FUCHS, Etica cristiana in una società secularizzata. Roma, PIEMME, 1984, p. 159-172.

30. VATICANO II, Gaudium et Spes, n. 33-34.

31. JOÃO PAULO II, Veritatis splendor, n. 42-50.

32. José ALDUNATE (org.), Direitos humanos, direitos dos pobres. Petrópolis, Vozes, 1991 (Teologia e Libertação); Franz J. HINKELAMMERT, Sacrifícios humanos e sociedade ocidental: Lúcifer e a Besta. São Paulo, Paulus, 1995 (Temas da atualidade); Francisco MORENO REJON, Teologia moral a partir dos pobres. Aparecida, Santuário, 1987 (Teologia moral na América Latina 1).

33. Hugo ASSMANN, Critica à lógica da exclusão. São Paulo, Paulus, 1994 (Temas de Atualidade).

34. Salvatore LENER, Fondamento ontologico d’una civiltà dell’amore. Em CIVILTÀ CATTOLICA 131/1 (1980) p. 138ss.; Yves CONGAR, R. Sohm nous interroge encore. Em REVUE DES SCIENCES PHILOSOPHIQUES ET THEOLOGIQUES 57 (1973-2) p.281-287.

35. Cfr Giorgio FELICIANI: Il nuovo Codice tra fedeltà e novità. Em Ernesto CAPPELINI (ed.) , La normativa del nuovo Codice. Brescia, Queriniana, 1993, p. 9-26.

36. Veja-se a polêmica causada pela tentativa de estabelecer uma lei fundamental da Igreja: El proyecto de ley fundamental de la Iglesia. Pamplona, EUNSA, 1971; Luigi ROSA, A "Lex fundamentalis Ecclesiae". Em Ernesto CAPPELLINI, o. cit., p. 49-64. Veja-se também a polêmica sobre a natureza "teológica" do próprio direito, cfr as obras citadas na nota anterior.

37. Cfr Dario COMPOSTA, La "Salus animarum" scopo del diritto della Chiesa. Em La nuova legislazione canonica. Roma, Urbaniana, 1983, p. 243-260

38. Adela CORTINA, o. cit., p. 83-104.

39. JOÃO PAULO II, Sacrae disciplinae leges. Codigo de Direito Canônico,. São Paulo, Loyola, 1987, p. VIII.

40. VATICANO II, Dignitatis humanae, n. 9-12.

41. Yves CONGAR, o. cit.., p. 263-281.

42. P. J. VILADRICH, Hacia una teoria fundamental del derecho canónico. Em IUS CANONICUM 10 (1970), p. 5-66; J. HERVADA e P. LOMBARDIA, El derecho del Pueblo de Dios. p. 26-57

43. VATICANO II, Dignitatis humanae, 9-13; Gaudium et Spes, 15-16; JOÃO PAULO II, Veritatis Splendor, n. 16-18.

44. JOÃO PAULO II, Sacrae disciplinae leges, p. XV
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