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O medo do Código de Defesa do Consumidor

 

 

 

Alberto Rollo*

 

Arthur Rollo**

 

 

*Advogado especialista em Direito Eleitoral, presidente do IDIPE (Instituto de Direito Político Eleitoral e Administrativo) e escritor de mais de 14 livros, entre eles: “Propaganda Eleitoral – teoria e prática” e “O advogado e a administração pública”.

 


**Advogado, mestre e doutorando em direito pela PUC de São Paulo, na área de direito das relações sociais, sub-área de direitos difusos e coletivos.

 

 

 

 

Os bancos têm medo do Código de Defesa do Consumidor. A prova disso está na propositura da ação direta de inconstitucionalidade 2.591 que, recentemente julgada, ratificou a aplicabilidade dessa lei às instituições financeiras.          

As operadoras de planos e seguros de saúde também têm medo do Código, porque, com base nele, têm sido contidos inúmeros abusos, como a negativa do pagamento de “stent”, considerado prótese cardíaca, aumento de faixa etária para idosos, contrariando o estatuto do idoso, etc..    

São tantas as decisões judiciais contrárias às operadoras que estas, valendo-se de uma brecha da lei, estão se recusando a firmar contratos individuais e passando a celebrar, exclusivamente, contratos coletivos.      

Nesses contratos coletivos os segurados firmam a minuta através de uma empresa, que pode ser a sua empregadora, uma entidade de classe, uma associação civil, etc..           

Muito embora a divergência pareça sutil, essa estratégia dificulta sobraneira a proteção do segurado e, por vezes, até a inviabiliza.       

A primeira dificuldade consiste na propositura da ação. A relação entre o segurado e a sua entidade pode ser trabalhista, caso o seguro coletivo seja contratado através da empregadora, ou de direito civil, na hipótese do contrato ser firmado através de entidade de classe ou de associação civil. Traduzindo: não pode o segurado invocar o Código de Defesa do Consumidor contra essas empresas com as quais contrata diretamente, porque a relação que mantém com elas não é de consumo.           

De outra parte, em princípio, também não pode o segurado promover a ação diretamente contra a seguradora, porque com ela não mantém relação direta. Sem falar que a relação jurídica mantida entre a seguradora e a empresa é de direito comercial, o que também afasta a possibilidade de se invocar a condição de consumidor.         

Essas peculiaridades das relações jurídicas fazem toda a diferença, uma vez que a própria lei que regula os planos e seguros de saúde, 9656/98, protege menos aquele que possui seguro saúde coletivo, impondo ressalvas no seu art. 31.

O segurado que contrata individualmente seguro saúde ostenta a condição de consumidor, o que lhe traz uma série de vantagens em relação àqueles que contratam de forma coletiva. A seguradora, consoante inúmeras decisões judiciais nesse sentido, não pode expulsar o segurado, notadamente quando ele está mais necessitado, por razão da idade ou por motivo de doença.     

Já aquele que contrata o seguro de forma coletiva pode perder o seu contrato a qualquer momento. Para tanto, basta que a seguradora rescinda o contrato que mantém com a empresa, o que pode acontecer sem maiores obstáculos.       

O contrato individual só pode ser reajustado de acordo com o que está previsto na minuta, ou seja, de acordo com as faixas etárias estabelecidas e, anualmente, conforme a inflação. Já no contrato coletivo, anualmente, podem ser embutidas outras perdas o que, na prática, significa a possibilidade de um aumento maior.           

Ainda que, num primeiro momento, a opção por um contrato coletivo pareça mais vantajosa, tanto em relação ao preço quanto a coberturas, porque as seguradoras estão buscando atrair os consumidores para “arapucas”, não devem aqueles que possuem contratos individuais optar por contratos coletivos.      

Pode-se dizer que hoje quem tem contrato coletivo está desprotegido pelo Código de Defesa do Consumidor, o que significa que as seguradoras de saúde foram mais hábeis que os bancos, porque conseguiram uma forma de evitar a aplicação da relação de consumo.

O Judiciário, no entanto, está aí para corrigir as injustiças. E essa, sem dúvida, é uma injustiça realizada pelo nosso legislador. Tendo em conta o crescente número de planos coletivos, entendemos que o Judiciário terá que encontrar uma forma de aplicar o Código de Defesa do Consumidor a esses contratos, continuando a resguardar especialmente os mais necessitados, idosos e doentes que, em caso de rescisão contratual, dificilmente conseguirão novos contratos, em condições aceitáveis. É o que esperamos.    

Entendemos que mesmo aquele que contrata coletivamente seguro de saúde deve receber a proteção integral do Código de Defesa do Consumidor, o que implica na impossibilidade de expulsão, de aumentos extorsivos, etc.. Até porque o entendimento diverso prestigiaria a má-fé das seguradoras, que estão evitando os contratos individuais porque têm medo do Código de Defesa do Consumidor.

 

 

 

 

 

 

ROLLO, Alberto; ROLLO, Arthur. O medo do Código de Defesa do Consumidor. Disponível em: http://jusvi.com/doutrinas_e_pecas/ver/22313. Acesso em: 10 out. 2006.