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O Leasing e a revisão judicial dos
contratos. Aplicação do CDC
Werson
Franco Pereira Rêgo
Juiz de Direito no Rio
de Janeiro (RJ)
Professor Titular de
Consumidor da Faculdade de Direito da UNESA
Conferencista da Escola
da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro
Doutorando em Ciências
Jurídicas e Sociais ¿ UMSA, Buenos Aires
Uma questão que tem suscitado
acesa controvérsia nos meios jurídicos é a da incidência ou não do Código de
Proteção e Defesa do Consumidor aos contratos ditos de Direito Econômico,
nomeadamente aos contratos de leasing, cujos critérios de reajuste das
prestações assumidas pelos arrendatários estão vinculados à variação cambial do
dólar americano, em razão da modificação operada na política econômica do
Governo Federal que, em janeiro de 1999, adotou o sistema de livre flutuação do
câmbio.
Não temos nenhum receio de
afirmar que, sem dúvida alguma, o Código de Proteção e Defesa do Consumidor se
estende aos ditos contratos de Direito Econômico, sobretudo aos prefalados contratos de leasing.
Todavia, para chegar-se a tal
conclusão impõe-se, em primeiro lugar, conhecer-se adequadamente o Código de
Proteção e Defesa do Consumidor, a sua origem e as suas finalidades.
IEDO BATISTA NEVES, em seu
Vocabulário Enciclopédico de Terminologia Jurídica e de Brocardos Latinos, vol.
I, Ed. Forense, 1ª ed. , 1997, p. 811, define Direito
Econômico como o conjunto de regras que protegem as relações de ordem jurídica
que resultam da produção, circulação, distribuição e consumo das riquezas.
Pois bem. O Código de Proteção e
Defesa do Consumidor, inegavelmente, apresenta estrutura e conteúdo modernos,
sintonizados à realidade brasileira e, entre as principais inovações, a
formulação de um conceito amplo de fornecedor que inclui todos os agentes econômicos
que atuam, direta ou indiretamente, no mercado de
consumo, produzindo, distribuindo, comercializando produtos e serviços
abrangendo, de maneira expressa, as operações de crédito, de financiamento,
bancárias e securitárias ¿ artigo 3o, caput e seu §2º.
Ademais disso, não é o Código de
Proteção e Defesa do Consumidor uma simples lei específica das relações de
consumo vez que, por força de disposições legais expressas, se estende a proteção consumeira ainda
àqueles que não fazem parte de qualquer relação de consumo como, por exemplo,
os artigos 17 e 29, que equiparam a consumidores (logo, não o são), as pessoas
ali mencionadas.
Sobreleva notar o que dispõe o
mencionado artigo 29 que equipara a consumidores, para efeitos de incidência do
Codecon, todas as pessoas expostas a relações contratualizadas e que necessitem de proteção contratual.
Trata-se, portanto, de verdadeira norma de extensão, cuja aplicação não pode
ser recusada pelo Magistrado. Ao contrário.
Tratando-se de norma de ordem
pública e de interesse social ¿ artigo 1º -, deve ser conhecida de ofício pelo
Magistrado.
Note-se que o Codecon,
ao dispor sobre a proteção contratual, o fez sem aludir a qualquer contrato,
especificamente. Refere-se, pois, a todos, indistintamente.
Nesse sentido, a posição de
notáveis especialistas da matéria, entre eles, ADA GRINOVER, NELSON NERY
JUNIOR, ARRUDA ALVIM, CLÁUDIA LIMA MARQUES, JAMES MARINS, CARLOS ROBERTO
BARBOSA MOREIRA.
Destarte, sempre que uma das
partes contratantes se encontrar em posição de vulnerabilidade em relação à
outra, àquela relação incidirá, para efeitos de proteção contratual, o CODECON,
ainda quando não se trate de relação jurídica de consumo, impondo-se a
observância das regras e princípios consagrados pela legislação consumeira e que regem o tema, notadamente, os da
transparência, da eqüidade contratual e da boa-fé.
Estabelecida a incidência do
Código de Proteção e Defesa do Consumidor a todos os contratos, para os fins
acima especificados, não há como negar-se vigência aos
seus dispositivos eis que, assim agindo, estaria o intérprete e aplicador da
lei obrando contra legem.
Dispõe o artigo 6o., V, do CODECON, que é direito básico do consumidor a
revisão de cláusulas contratuais que, em razão de fatos supervenientes à sua
elaboração, tornaram-nas excessivamente onerosas para a parte vulnerável
naquela relação jurídica, à semelhança do que ocorre com as mais de um milhão e quinhentas mil pessoas físicas que celebraram
contratos de leasing, com cláusula de reajuste das prestações vinculando-as à
variação cambial.
O critério para a revisão legal é
objetivo, fundado na teoria da quebra da base do negócio jurídico, não havendo
que se falar em culpa ou imprevisibilidade e, sendo fato incontroverso que a
mudança na política adotada pelo Governo Federal em relação ao câmbio tornou
excessivamente onerosos os contratos em debate, dúvidas não há que os
arrendatários têm incontestável direito à revisão da cláusula que prevê o
reajuste das parcelas financiadas. Assim vem decidindo, reiteradamente, a
Egrégia 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (v.g. REsp
135151/RJ ; REsp 73370/AM ).
A Magistratura nacional precisa
abandonar as grandes acomodações e enfrentar as pequenas mudanças que se fazem
necessárias, adequando-se o ordenamento vigente à realidade social brasileira.
O Código de Proteção e Defesa do Consumidor é um diploma legal com vocação
constitucional, vez que materializa princípios contidos dentre os direitos e
garantias fundamentais do cidadão (art. 5º, XXXII, CR/88)
e da ordem econômica e social (art. 170, V, CR/88).
Suas normas são de ordem pública versando, assim, sobre direitos indisponíveis,
a ensejar a sua observância de ofício. Felizmente, não só a
Magistratura de primeiro grau, como a das mais altas cortes do país, vêm
assimilando bem esta nova concepção.
Fonte: http://www.mp.sc.gov.br