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Taxa e tarifa nos serviços públicos
essenciais e conseqüências jurídicas face ao Código de Defesa do Consumidor
Michelle
Dibo Nacer Hindo
acadêmica de Direito na Universidade Federal do
Mato Grosso do Sul, estagiária do escritório Marco Túlio Garcia & Advogados
Associados
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Sumário: I – Introdução; II - Da classificação
dos serviços públicos e sua remuneração; III – da definição de taxa e tarifa ;
IV - Das Delegações de Serviço Público; V-Das conseqüências jurídicas da
cobrança de Tarifas em face do Código de Defesa do Consumidor; VI – Conclusão e
VII – Bibliografia.
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I – Introdução
Com a privatização dos serviços públicos essenciais (água, coleta de
esgotos, energia elétrica, telefonia e outros), abriu-se a discussão a respeito
da cobrança por estes serviços, sob égide do Código de Defesa do Consumidor,
que está completando onze anos de vigência.
Iniciou-se, assim, a discussão sobre a legalidade da cobrança de taxas e
tarifas, consumação mínima, manutenção, disponibilidade, e outros institutos
controvertidos. Antes de entrar no mérito da diferença entre taxas e tarifas, é
preciso definir o que é serviço público, o que é serviço público essencial,
como se classificam e a que título serão remunerados. Serviço Público, nas
palavras do professor Celso Antônio Bandeira de Mello 1 é toda atividade de
oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da
coletividade em geral, mas fruível singularmente pelos administrados, prestado
pelo Estado ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito Público.
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II - Da classificação dos serviços públicos
Os serviços públicos, não somente os essenciais, se subdividem em dois
grandes grupos, segundo o administrativista Helly Lopes Meirelles. No primeiro
grupo temos os serviços públicos prestados de forma abstrata, difusa, à toda
coletividade, sem particularização ou individualização da prestação, são
chamados "uti universi", de utilização ou utilidade universal. São
eles, a educação, a saúde pública, a iluminação pública, a segurança pública, a
limpeza pública, coleta de lixo, calçamento e outros. Estes serviços são
indelegáveis, constituindo assim um monopólio do Estado, afinal serão
remunerados por via necessariamente tributária. O tributo em questão será o
imposto, que é genérico , sem qualquer vinculação à prestação de qualquer
serviço público.
Em contrapartida, existem serviços cuja prestação é especifica,
mensurável, individual, ou seja, se apresenta de forma concreta ao usuário, o
que gerará um direito subjetivo de prestação. A fruição destes serviços não
será homogênea para todos os usuários, que poderão utiliza-los em intensidades
diversas, de acordo com a necessidade de cada um. São serviços como energia
elétrica, telefonia, gás, água encanada e transporte coletivo. Eles são
específicos, que significa dizer que são prestados de uma forma autônoma,
destacada e são também divisíveis , em que o uso efetivo ou potencial pode ser
aferido individualmente. Estes serviços serão remunerados por Taxas de serviços
(que diferem das taxas de polícia) ou por também por tarifas (também chamadas de
preços), já que este tipo de serviço público pode ser objeto de delegação.
A definição e o rol de serviços públicos essenciais não se encontram no
Código do Consumidor, nem na Constituição Federal. Esta última, por sua vez
institui em seu art. 9°, o direito de greve e disciplinou em seu parágrafo
único que a lei definirá os serviços essenciais. Consideram-se serviços
públicos essenciais aqueles definidos no art. 10 da Lei nº 7.783/89, a Lei de
greve.
São serviços cujo princípio da continuidade é mais ainda mais evidente,
ou seja, não podem ser interrompidos, devido ao grande prejuízo, quiçá
irreparável, pela não prestação, ainda que em caso de greve, que é o objeto da
referida lei. São serviços cuja interrupção pode comprometer a sobrevivência, a
saúde e a segurança (art. 11 da Lei 7.783/89), inclusive essa interrupção
configura o delito de "paralisação de trabalho de interesse coletivo"
3 (art. 201 do Código Penal). São eles os serviços de água, energia elétrica,
gás, combustíveis, saúde, distribuição de medicamentos e alimentos, funerário,
transporte coletivo, captação e tratamento de esgoto, tráfego aéreo,
compensação bancária, telecomunicações, guarda de materiais radioativos e
nucleares e processamento de dados referentes a esses serviços.
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III – Da definição de Taxa e Tarifa
a) da Taxa
Taxa é um tributo, previsto no art. 145, II da CF, portanto, instituída
unilateralmente pelo Estado, compelindo o particular a efetuar seu pagamento,
quando há uma atuação específica do Estado, seja na restrição (poder de
polícia) ou no acréscimo de um direito (serviço público).
Serão objeto de taxas de acordo com o art. 77 do Código Tributário
Nacional, os serviços:
a) Quando utilizados de forma efetiva ou potencial (art. 79, I,
"a" e "b") e
b) Quando forem específicos e divisíveis.
O festejado professor ALIOMAR BALEEIRO 2 , esclareceu a respeito das
taxas que
"Taxa é o tributo cobrado de alguém que se utiliza de serviço
público especial e divisível, de caráter administrativo ou jurisdicional, ou o
tem à sua disposição, e ainda quando provoca em seu benefício, ou por ato seu, despesa
especial dos cofres públicos" (negritei), afirmando que
"a taxa é a contraprestação de serviço público, ou de benefício
feito, posto à disposição, ou custeado pelo Estado em favor de quem a paga, ou
por este provocado."
Passemos à definição de serviço público de utilização efetiva,
potencial, específico e divisível.
Utilização efetiva é quando o usuário realmente frui o serviço. Neste
caso, a taxa só poderá incidir se houver fruição efetiva e comprovada. A taxa
de serviço fruído decorre da facultatividade da utilização do serviço pelo o
contribuinte, ou seja, ele não será compelido a utiliza-lo. São serviços como o
de telefonia, transporte coletivo e gás, por exemplo. Ao Estado não interessa
obrigar o contribuinte a ter telefone em casa ou a utilizar o ônibus para ir ao
trabalho, logo a incidência do tributo taxa só ocorrerá mediante a utilização
real do serviço.
Utilização potencial é quando a simples disponibilidade do serviço ao
contribuinte autorizará a tributação, ou seja, será a Taxa por serviço fruível.
São os serviços, que por força legal, serão de utilização compulsória, ou seja,
os quais o Estado compele os administrados a utilizar, através do pagamento. A
Lei irá impor a compulsoriedade sempre que o interesse público,
constitucionalmente, o exigir, ou seja, quando a utilização for imprescindível.
A saúde pública, por exemplo, é um valor relevante, que torna
obrigatório o uso do serviço de água encanada e coleta de lixo. Isso significa
que ainda que o contribuinte terá que pagar por eles ainda que não use de fato,
já que o tributo incide ainda mesmo sem utilização efetiva, como forma de
compelir sua fruição .
Significa dizer que se trata de um serviço obrigatório por imposição
legal, que só admitirá a cobrança por taxa, não por tarifa. A esse respeito
Leciona Roque Antonio Carrazza 3 :
"a taxa, que, nascida da lei sobre ser compulsória, resulta de uma
atividade estatal desenvolvida debaixo de um regime de direito público, e
relacionada, "direta e imediatamente", ao contribuinte. Sendo tal
atividade realizada por imperativo de lei , não pode fazer nascer um simples
preço (uma contraprestação). Sem dúvida, eis aí duas colocações antitéticas,
pois, se a atividade vem a lume por determinação legal, não se opera em
conseqüência de uma contraprestação."
Outra diferenciação a ser feita
quanto aos serviços públicos, para o estudo da taxa, é quanto ao caráter de
especificidade e divisibilidade. Serviço Público Específico é aquele prestado a
uma categoria delimitada de usuários. Está previsto no art 79, inciso II do
CTN, que define "Consideram-se específicos os serviços públicos quando
passam a ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade ou
de necessidade públicas",isso quer dizer que serviço específico é aquele
que é prestado de forma própria, não genérica.
Serviço divisível é aquele que pode ser mensurado, medido, ter sua
quantidade aferida por algum instrumento, ser prestado de forma individualizada
ao usuário. Está capitulado no art. 79, III do CTN. Entendem-se divisíveis, os
serviços quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um
dos usuários.
Dessa constatação, deriva o unânime reconhecimento da
inconstitucionalidade da Taxa de Iluminação Pública, também denominada, no
município de Campo Grande, como tarifa de conservação e manutenção da rede de
iluminação pública. O serviço de iluminação pública, quando cobrado através de
Taxa ou Tarifa, constitui uma legítima excrescência jurídica.
Isto porque esse serviço não apresenta os requisitos legais de
especificidade e divisibilidade. A carência destes requisitos já foi
reconhecida inúmeras vezes pelo Supremo Tribunal Federal, além do Tribunal de
Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, que a seu turno, entendeu que:
A taxa de iluminação pública, por ser
embasada em um critério de generalidade, não pode subsistir como taxa, visto
colidir com o art. 145, II, da Constituição Federal, devendo ser tais encargos
suportados por toda a comunidade por meio de impostos." (Reexame n.
55.4670/97 - Ponta Porã -Rel. Des. Nelson Mendes Fontoura).
A taxa ou tarifa de iluminação pública comportava-se como se fosse um
"quase- imposto", afinal era cobrada pela prestação de um serviço,
que não era nem específico, nem divisível e pior, era cobrado dos
usuários-consumidores de energia elétrica no município de Campo Grande-MS, ou
seja, bastava receber energia elétrica para ter que pagar a taxa, ainda que na
rua não houvesse iluminação pública, da mesma forma que o proprietário de um
imóvel urbano paga o Imposto Predial Territorial Urbano mesmo que não tenha
asfalto no seu bairro.
Ocorre que essa cobrança acabou se incorporando novamente ao ordenamento
jurídico, mas sob a forma de contribuição, denominada “contribuição para
custeio do serviço de iluminação pública”, através da emenda constitucional n.
39/2002, que acrescentou ao texto constitucional o art. 149-A, autorizando os
municípios e o distrito federal a instituírem a cobrança, por meio de lei
própria, facultando inclusive, que seja cobrado em conjunto com o consumo de
energia elétrica, embutida no valor total da fatura.
A presente inclusão já era praticada quando se tratava de taxa,
perpetuando os prejuízos ao consumidor, visto que não se poderá separar o
débito proveniente da relação de consumo do débito fiscal, já que a não
satisfação deste último só pode ser penalizada através de ação de execução
fiscal, e o que certamente ocorrerá será a nefasta e ilegal prática da
suspensão do fornecimento do serviço, como forma de pressionar o usuário a
pagar a contribuição, que a seu turno não tem o condão de gerar inadimplência
em relação ao serviço de energia elétrica.
b) da Tarifa
Tarifa, também conhecida como preço público, é o valor cobrado pela
prestação de serviços públicos por empresas públicas, sociedades de economia
mista , empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos (art.
2° e 3° do Código de Defesa do Consumidor). Aqui, o Estado também presta
serviço público, mas por meio dos órgãos da administração indireta, ao
contrário do tributo taxa, cobrado pelos órgãos da Administração Direta, que
podem, inclusive, celebrar contratos administrativos para a prestação de
serviços taxados. Tarifa é um instituto típico de direito privado, existente em
uma relação de consumo, em que há a autonomia da vontade, a liberdade de
contratar e de discutir cláusulas e condições de contrato, ou seja, do pacta
sunt servanda.
A relação entre o Estado e o contribuinte é de império. Ele pode
constituir o particular de forma unilateral na relação jurídica tributária, sem
a aquiescência daquele. O Estado irá impor a cobrança de taxas de serviço (de
fruição compulsória) ainda que o particular não o deseje receber. Já na relação
de consumo, que é obrigatoriamente relação contratual, ambas as partes estarão,
em tese, no mesmo patamar, sem a prevalência de uma sobre a outra. O que
significa a possibilidade de o particular recusar o recebimento do serviço, e
assim, não terá que pagar, pois não recebeu, não contratou.
A doutrina de Helly Lopes Meirelles é clara "Dentre os preços, os
mais importantes são os públicos ou tarifas, cobrados pela utilização de bens
ou serviços públicos. As tarifas remuneratórias distinguem-se das taxas porque
não são compulsórias, mas cobradas somente dos usuários que os utilizem
efetivamente, se e quando entenderem fazê-lo, ao passo que as taxas são devidas
pelo contribuinte desde que o serviço, de utilização obrigatória, esteja à sua
disposição."
As tarifas são preços praticados pelo Estado através de empresas
públicas ou sociedades de economia mista ou empresas particulares, que
receberam delegação do Estado, através de contrato de concessão ou permissão,
para executar um serviço público. Este último tipo ganha maior destaque no
estudo das tarifas, visto que a maioria dos serviços públicos essenciais é
prestada por empresas privadas. As delegações de serviço público poderão feitas
em duas modalidades: a concessão e a permissão, que são regidas pelas Leis n.°.
8.897/95 e n.° 9.074/95 e pelos arts. 22, XXVII e 175 da CF, que prescrevem:
"Art. 22. Compete privativamente à união legislar sobre (...)
XXXVII – normas gerais de licitação e
contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas,
autárquicas e funcionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios,
obedecendo ao disposto no art. 37,XXI, e para as empresas públicas e sociedades
de economia mista, nos termos do art. 173, §1°, III."
"Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente
ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a
prestação de serviços públicos. Parágrafo único. A lei disporá sobre: I – o
regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o
caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de
caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão; II – os direitos
dos usuários; III – política tarifária; IV - a obrigação de manter serviço
adequado."
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IV - Das Delegações de Serviço Público
Vejamos seus conceitos. Concessão é o instituto mediante o qual o Estado
atribui a terceiro o exercício de um serviço público (nunca sua titularidade,
que é intransferível), que será prestado em nome próprio, por conta e risco do
concessionário, nas condições fixadas e alteráveis unilateralmente pelo Poder
Público, mas sob a garantia contratual de um equilíbrio econômico e financeiro,
cobrado geralmente por meio de tarifas e com prazo determinado de duração .
As tarifas cobradas dos usuários por essas empresas serão definidas no
processo de licitação. O valor das mesmas não pode ser alterado
unilateralmente, mas sim mediante autorização do poder público, que irá
analisar suas planilhas de custos, de forma a não comprometer a saúde
financeira da concessionária.
Esse equilíbrio econômico e financeiro significa um equilíbrio entre os
deveres e os encargos da empresa concessionária. Em relação às tarifas,
significa dizer que a concessionária irá fixar seus preços de forma a atingir o
fim de lucro, mas que não será seu fim principal. Embora legítima a pretensão
do lucro, não deverá se sobrepor ao dever de prestação do serviço público com
eficiência e continuidade, afinal a empresa não poderá deixar de investir na
melhoria do serviço, para diminuir seus custos. Significa dizer, em caso
extremo, que deverá a concessionária cumprir seus deveres contratuais, ainda
que experimentando a ruína financeira.
Neste caso, caberá ao Estado amortizar eventuais prejuízos que a empresa
vier a sofrer, subsidiá-la (o que colabora também para garantir tarifas
módicas) ou intervir na mesma.
Outro instituto importante é o da permissão, que pode ser definida como
a delegação de um serviço público, a título precário, mediante licitação e
através do chamado contrato de adesão, conforme exigência da Lei n.° 8.987/95,
feita pelo poder público à pessoa física ou jurídica que demonstre capacidade
para seu desempenho, por sua conta e seu risco. O prazo aqui não é determinado,
e embora a permissão seja a titulo precário, poderá o permissionário pleitear
indenização da administração quando a mesma promover a rescisão unilateral do
contrato.
Essas empresas ao receberem a delegação do Poder Público sofrerão a
fiscalização de suas atividades, principalmente, através de uma espécie de
autarquia, as chamadas "Agências de Regulação". Essas agências foram
criadas por lei com o fim de normatizar a prestação dos serviços públicos
delegados e harmonizar os interesses do Estado, das empresas delegatárias e dos
usuários dos serviços. As principais agências são: a ANP – Agência Nacional do
Petróleo (lei de criação 9.478/97), a ANATEL – Agência Nacional de
Telecomunicações (lei 9.472/97) e a ANEEL - Agência Nacional de Energia
Elétrica (lei 9.427/96)
A existência de agências representa que a quebra do monopólio estatal
não significou, em absoluto, a liberação total do mercado de serviços públicos,
pois serão elas as responsáveis pela fiscalização do setor, impondo normas para
a prestação, além de interferir na fixação dos preços.
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V – Das conseqüências jurídicas da cobrança de
Tarifas em face do Código de Defesa do Consumidor
Ficou esclarecido no item II que os serviços públicos remunerados por
taxas encerram uma relação tributária, em que o contribuinte é submetido ao
poder de império do Estado, que terá o condão de determinar a conduta do
particular. Os serviços remunerados por tarifas se referem a relações
consumeristas, baseadas na liberdade e na vontade de contratar. A legislação
aplicada neste caso será o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90).
A esse respeito, o Ministério Público do Estado de São Paulo, através do
Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Defesa do Consumidor, editou a
Súmula de Estudos n.º. 6, para dirimir a dúvida que havia sobre os casos de incidência
do código na prestação de serviços públicos. A referida súmula assinalou que:
"São objeto de tutela pelo Código do Consumidor, e de atribuição
das Promotorias de Justiça do Consumidor, os serviços públicos prestados
"UTI SINGULI" e mediante retribuição por tarifa ou preço público,
quer pelo Poder Público diretamente, quer por empresas concessionárias ou
permissionárias, sobretudo para os efeitos do seu art. 22. Não o são, porém, os
serviços públicos prestados "UTI UNIVERSI" como decorrência da
atividade precípua do Poder Público e retribuído por taxa ou pela contribuição
a título de tributos em geral. Nesse caso, tais serviços poderão ser objeto de
inquérito civil e ação civil pública pelo Ministério Público, mas por
intermédio do setor de defesa dos direitos do cidadão" (Junho/92 -
atualizada em maio/96)
A defesa do consumidor é prestigiada pela constituição, principalmente
através dos art. 5°, XXXII (dos direitos e garantias individuais) e art. 170, V
(relativo à ordem econômica) revela a importância da tutela das relações de
consumo para a consecução dos objetivos constitucionais elencados no art. 3º da
CF, que são, em síntese, construir uma sociedade mais justa, propícia ao
desenvolvimento individual e coletivo. O consumidor, em especial o de serviços
públicos essenciais, é naturalmente vulnerável face ao fornecedor, que não
raro, lhe impõe ônus abusivos e ilegais para fornecer o serviço de que tanto o
usuário necessita.
O código de Defesa do Consumidor (Lei federal n. 8.072/90) é uma norma
cogente, de ordem pública e interesse social, portanto os Direitos tutelados e
nele contidos são indisponíveis, prevalecendo mesmo em vista da vontade das
partes. É também uma legislação especial, ou seja, prevalece sobre normas
gerais outras para disciplinar as relações de consumo, quando houver, como por
exemplo as normas civilistas de direito das
obrigações, em nome do principio "lex specialis revogat legi
generali".
Assim, pode-se concluir que a Ação Direta de Inconstitucionalidade
2591/2001, proposta pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro propor uma
Ação Direta de Inconstitucionalidade, produzida pelo eminente jurista Ives
Gandra Martins, tem, "em tese", poucas chances de ser julgada procedente.
A finalidade da referida ADIN é demonstrar que o serviço bancário não pode
considerado como relação de consumo por vício de inconstitucionalidade formal,
pelo simples fato de o art. 192 da CF prescrever que matérias bancárias devem
ser disciplinadas por lei complementar e não ordinária como é o CDC. Ocorre
que, conforme o parágrafo acima, o código consumerista prevalece sobre as
demais legislações sempre que presente a relação de consumo, ainda mais, porque
o serviço bancário, é expressamente previsto no código, em seu art. 3º, §2º, in
verbis:
"Art. 3º...;
§ 1º...;
§ 2º - Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo,
mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de
crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter
trabalhista."
(negritei)
Após esta pequena intervenção, é momento de adentrar no tema.
As empresas estatais são submetidos ao regime de Direito Privado em
relação à sua atividade fim, com a conseqüente cobrança de tarifas como
contraprestação. Esse fato não se alterou com as privatizações ocorridas, assim
como o usuário permaneceu em seu papel de consumidor.
As empresas estatais sempre praticaram muitos abusos, acobertados pela
inexistência de um ordenamento jurídico capaz de defender o usuário de suas
iniqüidades. A maioria das estatais, prestadora de serviços públicos essenciais
conviveram por pouco tempo com o CDC. Com o surgimento do código, o consumidor
passou a contar com um instrumento poderoso para sua defesa em face aos abusos
praticados e para garantir a prestação eficiente dos serviços públicos essenciais.
Infelizmente, a privatização não trouxe a revolução nos serviços
públicos que era esperada. As práticas comerciais abusivas não cessaram por
parte das empresas concessionárias e permissionárias, que prevalecem da
necessidade do serviço e, em geral, do monopólio para enriquecer-se as custas
do consumidor, sem prestar um serviço adequado e muitas vezes com amparado das
Agências de Regulação, que deveriam fiscaliza-las e puni-las nestes casos. Para
o Código, os serviços públicos essenciais terão que ser adequados, eficientes,
seguros e contínuos, nos termos do art. 22, art 6°, X, do CDC e art. 6°,
parágrafo único da Lei 8.987/95. O que se constata é que o código trata com
maior rigor o fornecedor de serviços públicos, o que é uma verdade. Esse rigor
deriva da prevalência do interesse público, da população, sobre o interesse do
fornecedor. O desrespeito às características exigidas do serviço público e de
outros deveres para com o consumidor gerarão um série de conseqüências, em
especial, e é o que interessa a este trabalho, para a cobrança de tarifas. Serão
abordadas as principais e mais relevantes.
A instituição de tarifa mínima, por exemplo, é uma gravíssima
conseqüência do desrespeito ao principio da boa-fé nas relações de consumo
(art. 6°, IV do CDC), pois impõe ao usuário uma contraprestação
desproporcional. Algumas empresas fornecedoras impõem ao usuário o pagamento de
um valor mínimo em sua fatura, caso nada consuma, ou ainda se o consumo ficar
abaixo do valor fixado, unilateralmente, como mínimo. Seria razoável essa
imposição diante de uma justa causa, devidamente comprovada. Ocorre que nada
justifica, por exemplo, o pagamento de uma franquia mensal de pulsos para a
empresa de telefonia, ainda que não consumidos, assim como a imposição de um
consumo de 10 m³ de água se o consumidor estiver viajando.
Mais grave ainda é o fato de isso ser permitido pelas agências
reguladoras ou órgãos congêneres, como por exemplo, o DNAEE (Departamento
Nacional de Águas e Energia Elétrica), órgão autor da Portaria 222/87, que em
seu art. 42, dispõe sobre os valores mínimos de cada grupo de consumidores,
sendo monofásicos (30 kWh), bifásico (50 kWh) e trifásico (100 kWh). Na
verdade, deveriam estes organismos velar pela devida, adequada, continua,
eficiente prestação do serviço e também não permitir abusos nas cobranças aos
usuários.
Esse abuso tem nome. Chama-se "venda casada" em limite
quantitativo (art. 39, I do CDC), ou seja para receber o serviço, o consumidor
é obrigado a receber, pelo menos, a quantidade mínima. A justificativa
apresentada pelas empresas concessionárias é que precisam prover à manutenção
do sistema de fornecimento, ou seja, precisam mantê-lo disponível ao usuário,
já que isto representa a própria prestação do serviço, o que é falso, pois tal
fato é decorrência lógica da própria atividade desenvolvida pela companhia,
além de ser corolário da concessão do serviço público.
O fornecedor que adota essa prática está se comportando como se fosse o
próprio Estado, agindo com base em seu poder de império, obrigando ao pagamento
de taxas por serviço fruível. Que fique bem claro. O serviço que é cobrado pela
sua mera disponibilidade, ou seja, por potencialidade de uso, só pode ser
remunerado por TAXAS, jamais por tarifas. A tarifa decorre de preço, é
disciplinada pelo regime de Direito Privado, não pelo Direito Público, onde se
encontra o Direito Tributário, que instituiu a cobrança de taxas.
O dever de eficiência e adequação do serviço público nos revela que
disponibilidade é obrigação do fornecedor e, obviamente, é condição de
prestação, afinal, serviços como telefonia fixa, água encanada e energia
elétrica precisam vir até o consumidor. A empresa precisa trazer suas
instalações até o usuário para que possa recebe-lo. Diferentemente dos serviços
bancários que podem ser prestados sem que a instituição financeira precise ir
até o consumidor.
Não se pode admitir uma cobrança pelo simples fato de as instalações
terem sido implantadas na residência do consumidor, afinal elas podem ser
desligadas, desativadas quando o consumidor se tornar inadimplente. O terminal
telefônico de um assinante pode ser repassado a outro usuário. O que nos revela
que as instalações pertencem à empresa e não ao consumidor, sem as quais ela
não poderia prestar seu próprio serviço, da mesma forma que não poderia faze-lo
sem a devida manutenção.
Outro mito é que a disponibilidade seja efetiva prestação de serviço. Não
é. O fato de a empresa de águas instalar cavalete, tubulação e hidrômetro em
uma residência e, é claro, manter água da rede e o hidrômetro não girar não se
pode falar em prestação efetiva, mas sim potencial, pois a água
"poderia" ser utilizada. Ocorre que este verbo "poderia"
está conjugado no futuro do pretérito, o que significa possibilidade, não
efetividade. Prestação efetiva será o uso e o gozo de fato do serviço. Não é
segredo que tais serviços são de relevante valor social e de grande interesse
público, o que poderia ensejar a imposição de uma fruição obrigatória, só que
isso deve ser previsto em Lei, jamais presumido.
A disponibilidade do serviço não é luxo, mas sim condição de prestação,
pois não há como, por exemplo, comprar energia elétrica em um supermercado, é
preciso que a fornecedora promova a instalação do serviço, e que o mesmo possa
ser utilizado a qualquer momento e em qualquer quantidade. Não se pode
confundir. O fornecedor tem o dever de prestação e o usuário tem a faculdade de
o utilizar. Ocorre que ainda não fosse público, o dever de prestação do serviço
subsiste, nos termos do art. 39, IX do CDC, que proíbe a recusa de fornecimento
de serviço a quem se disponha a pagar por ele.
A cobrança de valores mínimos constitui verdadeira cláusula abusiva,
pois impõe ao usuário uma obrigação desproporcional, ferindo os princípio da
boa-fé e do equilíbrio (não igualdade) das partes nas relações de consumo. Esclarece
o art. 51, IV e §1º, III:
"Art. 51 - São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas
contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
(...)
IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem
o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a
equidade;
(...)
§ 1º - Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:
(...)
III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor,
considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e
outras circunstâncias peculiares ao caso." (negritei)
Num raciocínio inverso, isto é, admitindo-se a cobrança de tarifa
mínima, ou de manutenção como forma de custear a disponibilidade do serviço, se
verifica que a concessionária (ou permissionária) jamais poderia suspender o
fornecimento do serviço, sua única alternativa para receber sua contraprestação
pecuniária será através de ação de cobrança e, no caso de pessoas carentes, o
fornecedor deveria cobrar do Estado, que é o titular do serviço que ele
presta..
Cumpre informar que prestação contínua é um dever para as empresas
delegatárias, está nas normas legais e nos contratos de concessão. Significa
dizer que a prestação deve ser adequada e eficaz, nos termos dos arts. 6º, X e
22 do CDC. É comum, por exemplo, a existência de ar nas tubulações, visto que a
água é bombeada dos reservatórios, o que gera um refluxo natural, no entanto
esse ar é contabilizado pelo hidrômetro e o ar, que sempre foi de graça, passa
a ser cobrado como se fosse a água não consumida pelo usuário e, é claro, caso
o consumidor instale algum equipamento para eliminar o ar acaba sendo multado
pela concessionária. Além deste fato, ainda tem o usuário de conviver com a
falta de água em certos bairros e horários, e mesmo assim tendo que pagar a
mesma e absurda taxa mínima, só lhe restando contestar em juízo.
A suspensão do fornecimento do serviço público, o chamado
"corte", viola flagrantemente o princípio da continuidade do serviço
público. Há que se ponderar que o corte é praticado pelo fornecedor como forma
de proteção de sua propriedade privada, que é garantida pelo art. 170 da
Constituição, que também prevê a proteção do consumidor, o que mostra que ambas
as proteções não são, em absoluto, conflitantes, ou seja, são harmônicas, desde
que o
fornecedor não prevaleça de seu poder econômico para praticar abusos
contra a o consumidor.
O corte é previsto no art. 6º da Lei n.º
8.987, § 3º, inciso II, verbis :
"Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço
adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei,
nas normas pertinentes e no respectivo contrato. (...)
§ 3º Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua
interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso, quando:
(...)
II - por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da
coletividade."
(negritei)
A empresa não pode efetuar cortes, pois não se pode confundir o dever de
prestação da empresa (principio da universalização) como a compulsoriedade da
fruição. Esta última não existe quando o serviço é tarifado, o primeiro sim,
logo, o fornecedor deve prestar obrigatoriamente o serviço, sendo facultado seu
uso pelo consumidor e corte inadmitido.
O consumidor pode utilizar o serviço quando e quanto quiser, podendo
ainda escolher de quem receber o serviço, se houver pluralidade de
fornecedores, sendo vedado qualquer tipo de imposição de pagamento ou
interrupção por inadimplemento
O corte, se fosse permitido, não poderia ser feito sem prévia
comunicação ao consumidor, inclusive oportunizando novamente a ele a quitação
do débito como forma de escapar à sanção. O dever de notificar o consumidor é
previsto nos regulamentos expedidos pelas agencias de regulação, cuja ausência
constitui cláusula abusiva, por permitir o cancelamento unilateral do contrato
(art. 51, XI do CDC).
No entanto, há empresas que para cumprir seu dever de notificação
prévia, aproveitam para embutir tarifas abusivas. É o caso da tarifa de
reaviso, que é a "cobrança da cobrança", ou seja, caso o consumidor
não pague na data do vencimento, é reavisado alguns dias depois, daí se não
quitar dentro de um outro prazo sofrerá o corte e ainda terá que pagar a tarifa
de reaviso na conta do mês seguinte. Essa conduta é vedada pelo art. 51, XII do
CDC, que proíbe que a fornecedor transfira ao consumidor os custos da cobrança
de sua obrigação, sem que igual direito lhe seja assegurado contra aquele. Não
menos surpreendente é a previsão do DNAEE, através do o art. 85, da Portaria
nº. 466/97.
O referido artigo diz, em seu parágrafo quinto, que "A cobrança do
serviço previsto no inciso VIII deste artigo, só poderá ser feita se o reaviso
contiver, no mínimo, o nome do consumidor, a data de vencimento, o número da
conta e o valor total a pagar e for apresentado no endereço da unidade
consumidora, após o decurso de 5 (cinco) dias do vencimento da conta."
Outro inaceitável e ilegal abuso do direito de corte é a imposição de
tarifa de religamento, pois ela representa a criação de um obstáculo para o uso
de um serviço considerado de utilidade pública, essencial, o que significa que
deve ser universal, ou seja fornecido obrigatoriamente a todos que queiram
utiliza-lo. O consumidor ao quitar o débito que originou seu corte não deveria
pagar mais nada, não pode ser cobrado para a religação das instalações, que
aliás sequer lhe pertencem. A religação não constitui efetiva prestação de
serviço público, não há consumação alguma, mas sim o restabelecimento da
disponibilidade, que como já exposto, jamais pode ser cobrada, por ser um dever
e ser condição de prestação.
O contrato de prestação de serviço público é bilateral, sinalagmático,
com deveres para ambas as partes. Exigir a manutenção da prestação de um
serviço, cujo contrato é de trato sucessivo, para um inadimplente contumaz é
ferir o princípio da razoabilidade, da mesma forma que o seria se o corte
ocorresse sem aviso prévio.
O corte fere vários princípios constitucionais. Fere o principio da
solidariedade (art. 3°, I, da Constituição Federal), fere o dever de inclusão
social dos desfavorecidos (art. 3°, III), pois ao negar a prestação de um
serviço essencial, como a água, está sendo promovida a exclusão, a discriminação
e marginalização, o que ataca, por conseqüência, a garantia de dignidade humana
(art. 1°, III, da CF)e a função social da propriedade (art. 5°, XXIII, da CF).
Outra legislação importante que reforça a proibição do corte é o Código
de Processo Civil, através de seu art. 620, prescreve "quando por vários
meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que o faça pelo modo
menos gravoso para o devedor". E não se conhece nada mais gravoso que o
corte.
O corte é sempre vedado, o que significa dizer que quando não houver
pagamento o serviço deverá ser prestado, pois viola o fornecedor ao cortar o
serviço tornará ainda mais inviável a possibilidade de pagamento, especialmente
se for o usuário um estabelecimento comercial. O que se espera na relação entre
consumidor e fornecedor é uma parceria, não um confronto, deve haver
colaboração mútua para a consecução dos fins do contrato. Esse dever de boa-fé
da mesma forma que veda o corte, também veda o direito de a escola não renovar
a matricula do aluno inadimplente no semestre seguinte (art. 5° da Lei
9.870/99).
Em suma, são estas as nefastas conseqüências da imposição de tarifa
mínima, mas felizmente, os tribunais já vêm consagrando o entendimento de que a
cobrança de tarifa mínima, além de absurda é ilegal. O desembargador do
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, Paulo César Salomão asseverou que
"acabou o abuso das concessionárias que insistiam na cobrança de consumos
fictícios, baseados em vetustos e inconstitucionais decretos" e quanto ao
dever de obrar apenas o consumo efetivo afirmou "é tão obvio que não se
entende como ainda possa ser discutido" (apelação cível 20.063/99).
A "venda casada" também se manifesta na cobrança dos serviços
ao usuário, que é feita de uma forma global, ou seja, todos os serviços e
cobranças são incluídos na mesma fatura, ou seja, a empresa impede o consumidor
de destacar do pagamento as cobranças ilegais, só restando ao consumidor
consignar o que entende justo e discutir o restante. Isso fere o princípio da
informação, da boa-fé (ao dificultar a defesa do consumidor), obrigando-lhe a
se submeter, sob pena de sofrer cortes (que neste caso serão ilegais, pois a
inadimplência é justificável) e o consumidor pode ainda ter seu nome lançado
nos bancos de dados do SERASA, sofrendo assim inúmeros outros contratempos. Esses
expedientes desonestos utilizados para cobrar tarifas ilegais constituem o delito
de cobrança abusiva 4 (artigo 71 e 42 do CDC), cabendo ao consumidor lesado a
repetição do indébito em dobro (art. 42, parágrafo único), sem prejuízo das
sanções penais cabíveis ao representante legal da empresa.
Outra questão relevante é quanto ao reajuste das tarifas. Já foi visto
no item II que as Tarifas não podem ser reajustadas unilateralmente pela
empresa concessionária ou permissionária, mas sim de acordo com as
determinações expostas no contrato de concessão (art. 9°, §2° da Lei 8.987). Em
geral, a revisão é feita através de proposta, que poderá ou não ser aprovada
pelo Poder Público responsável pela delegação, como por exemplo a recente
solicitação de reajuste das tarifas de transporte coletivo, no município de
Campo Grande . Caso tenha algum prejuízo, a fornecedora deverá socorrer-se de
outros meios administrativos ou judiciais em face do Estado, diretamente.
O reajuste unilateral, ou seja, em desacordo com as normas da concessão
ou permissão, será nulo, e o a reajuste desarrazoado será ilegal, podendo ser
objeto de Ação Civil Pública (art. 1, II da lei 7.345/85 – "danos
materiais e morais causados ao consumidor") para impedir a cobrança
majorada e obter a repetição do indébito para os consumidores que já foram
lesados com o pagamento indevido, por infringência do art. 39, X do Código
consumerista, que assevera:
"Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos e serviços:
(...)
X – elevar sem justa causa o preço de produtos e serviços;"
A Constituição federal também veda o aumento arbitrário do lucro, que é
a motivação e o reflexo do aumento injustificado no preço das tarifas, por
disposição expressa inserida no art. 173, § 4°, in verbis:
"A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação
dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros’.
O consumidor deve ser perfeitamente esclarecido a respeito das tarifas
que está pagando, e previamente. O Código de Defesa do Consumidor impõe aos
fornecedores de serviços, dentre outros, o dever de informação prévia e
suficiente da prestação, para que possa exigir do consumidor o pagamento do
serviço. Este dever deve ser aliado à obrigação de provar a prestação do serviço.
É direito básico do consumidor obter "informação adequada e clara sobre os
diferentes produtos e serviços, com especificação correta da quantidade,
características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que
apresentem"5
O dever de informação se reflete, por exemplo, na cobrança de pulsos
excedentes, que nunca são discriminados perfeitamente pela empresa, que tem o
dever legal de demonstrar o consumo do usuário e não ele, através do instituto
da inversão do ônus da prova (art. 6, VIII). As tarifas bancárias, em alguns
casos, também não são perfeitamente esclarecidas, ou melhor, só são quando já
lançadas na conta do consumidor, bem ao estilo "pague primeiro,
discuta depois".
A ofensa ao principio da informação e também ao da livre escolha do
consumidor ocorre quando há a prestação de serviço não solicitado (art. 39, III
do CDC), como por exemplo, a insistência das empresas de telefonia em fornecer
serviços adicionais sem previa aquiescência do consumidor, como o caso dos 0900
(disque-amizade e congêneres), que é disponibilizado sem o menor controle, sem
que tenha sido solicitado. Neste caso, a tarifa não pode ser cobrada, será o
serviço considerado "amostra grátis", nos termos do art. 39,
parágrafo único do referido diploma legal. Retomando o item anterior, a
distinção entre taxa e tarifa, há que mencionar o abuso cometido nas cobranças
pelo serviço de água encanada, que inclui a cobrança de tarifa de esgoto, que é
um serviço não divisível, portanto impossível de ser cobrado por tarifas. Além
da venda e da cobrança casada, que é o ato de condicionar o recebimento de um
serviço ao recebimento (e pagamento) de outro, está havendo a cobrança feita de
forma uma por dois serviços submetidos a regimes jurídicos diversos. A cobrança
de esgoto não pode ser feita sequer por taxas, dado o caráter universal de sua
prestação e, ainda que o fosse (ou até por tarifas) só seria possível se houver
tratamento para o esgoto, visto que sua simples coleta não importa uma prestação
efetiva por parte da empresa fornecedora.
Essas são as principais conseqüências da cobrança das tarifas em face do
Código de Defesa do Consumidor. As tarifas são questões não apenas
administrativas, mas principalmente consumeristas, pois derivam de relação de
consumo. O desrespeito aos direitos desses usuários em relação ao pagamento de
tarifas se apresenta sob a forma de clausulas abusivas. Essas cláusulas são
chamadas abusivas por imporem ônus desproporcionais ao consumidor.
Os contratos de adesão (art.
54, caput do CDC) constituem terreno fértil para a criação dessas clausulas,
também chamadas leoninas, quando muito abusivas, visto que eles são
apresentados pelo fornecedor ao consumidor, sem que este tenha o poder de discutir
e alterar seus termos. É o chamado contrato-padrão, modalidade preferida das
grandes empresas, que lidam com consumo de massa, sem condição ou intenção,
principalmente, de particularizar ou diferenciar os termos contratuais para
cada um dos inúmeros usuários.
O Professor Caio Mário da Silva Pereira 6 , a respeito da onerosidade
excessiva dos contratos, lecionou:
"Todo contrato é previsão, e em todo contrato há margem de
oscilação do ganho e da perda, em termos que permitem o lucro ou prejuízo. Ao
direito não podem afetar estas vicissitudes, desde que constritas nas margens
do lícito. Mas, quando é ultrapassado um grau de razoabilidade que o jogo da
concorrência livre tolera, e é atingido o plano de desequilíbrio não pode
omitir-se o homem do direito, e deixar que em nome da ordem jurídica, e por
amor ao princípio da obrigatoriedade do contrato um dos contratantes leve o
outro à ruína completa, e extraia para si o máximo benefício". (negritei).
A dimensão das cobranças indevidas ou ilegais de tarifas assume dimensão
maior quando ultrapassa a esfera da lesão individual. É o mais comum, afinal o
fornecedor que lesa um consumidor, lesa milhares de outros. Daí decorre a
importância da tutela dos direitos desses consumidores, em especial, a tutela
coletiva, que é disciplinada nos art. 81 e 82 do CDC, que prevê a defesa dos
direitos difusos (cujos titulares são indeterminados), os coletivos (cujo
titular é um grupo ou categoria) e os individuais homogêneos (os de origem
comum).
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VI – Conclusão
Este trabalho tem como missão conceituar os serviços públicos
essenciais, suas subdivisões em serviços de fruição universal e individual,
sendo estes últimos subdivididos em de fruição efetiva e fruição potencial e a
forma como serão remunerados.
Os serviços universais serão remunerados por impostos gerais, dado a
impossibilidade de mensuração e aferição do aproveitamento individual, o que
não ocorre, por sua vez com os serviços específicos e divisíveis, que podem ser
remunerados pelo Estado, diretamente, ou por meio de entes que dele receberam
delegação, através de contratos de concessão ou de permissão.
Os serviços tarifados encerram relação de consumo, sendo regidos pelo
Código de Defesa do Consumidor, que coíbe uma série de práticas abusivas
perpetradas pelas empresas fornecedoras, que prevalecem de seu poderio
econômico e da necessidade dos serviços prestados para obrigar o pagamento de
consumo mínimo, tarifas de reaviso, religação e outras tão ilegais e
inaceitáveis quanto essas.
O código exige (art. 22) que s serviços
públicos essenciais devem ser prestados de forma eficiente, adequada, segura,
universal, continua e segura. Assim, episódios como o do racionamento de
energia, o "apagão" revelam o descaso das empresas fornecedoras e do
Estado, que pouco ou nada investem na prestação de serviços públicos de
qualidade e acessíveis à toda a população.
Essa exigência de prestação não rima, em absoluto com imposição ao
consumidor, ou seja, os serviços públicos submetidos ao regime de tarifas não
podem ser obrigatórios, ou seja, tem o consumidor plena liberdade de escolha de
fornecedores (se houver mais de um) ou ainda a de não receber o serviço, quando
por exemplo, prefere perfurar um poço artesiano a solicitar o abastecimento de
água encanada. As empresas é que nunca reconheceram essa liberdade.
Compreender bem estes controvertidos institutos é peça fundamental na
formação da consciência do consumidor, do usuário de serviços públicos, ou
seja, do cidadão, que merece ser respeitado, e jamais agredido da forma como
vem sendo quando o que quer é apenas usufruir o seu direito.
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VII – Bibliografia
BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro, Forense, 10ª ed.,
1983.
BANDEIRA DE MELLO, Celso Natônio. Curso de Direito Administrativo, 14
ed. São Paulo: Malheiros, 2002.
BRITO FILOMENO, José Geraldo. Manual de Direitos do Consumidor, 5ª ed. São
Paulo: Atlas, 2001.
CARRAZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário, 3ª
ed. Revistas dos Tribunais, 1.991.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil, vol. III,
10ª ed., Forense.
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Notas
1 Curso de Direito Administrativo, 14 ed. Malheiros, p. 600.
2 Direito Tributário Brasileiro, Forense, 10ª ed., 1983, pags. 324 e
325.
3 Curso de Direito Constitucional Tributário, 3ª ed. Revistas dos
Tribunais 1.991.
4 Art. 42 - Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será
exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou
ameaça.
Parágrafo único - O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à
repetição do indébito, por valor igual ao dobro ao que pagou em excesso,
acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.
5 redação do art. 6º, III da Lei 8.072/90.
6 Pereira, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil, vol. III,
10ª edição, Forense, pág. 98.
Retirado
de: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=2966&p=2.
Acesso em: 06 abr. 05.