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Daniela Moura Ferreira
Advogada
especialista em Defesa do Consumidor pela Universidade de Coimbra
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Acompanhamos nos últimos dias a ação que a
Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif) apresentou ao Superior
Tribunal de Justiça (STJ) para que as instituições que prestam serviços
financeiros em geral não sejam obrigadas a obedecer ao Código de Defesa do
Consumidor. Trata-se de um retrocesso
às conquistas sociais o afastamento da aplicação do Código de Defesa do
Consumidor nas relações entre estas instituições e clientes. O Código de Defesa do Consumidor nasceu
baseado nas bem sucedidas experiências de leis internacionais, assim, nossos
legisladores deixaram-se influenciar, por exemplo, pelo Projet de code de la
consommation francês; pela Ley General para la Defensa de los Conumidores y
Usuarios, Espanhola; pelo Decreto Lei 466/85, Português, bem como e
principalmente, pelo AGB-Gesetz Alemão de 09 de dezembro de 1976, que funcionam
perfeitamente nestes países, mesmo com relação a serviços financeiros em geral.
Todavia, o que realmente pode enfraquecer o
espírito do Código de Defesa do Consumidor (se a Consif obter vitória com a
ação que interpôs) é o afastamento da denominada boa fé objetiva que é o
principal enfoque da lei que defende os consumidores.
Na boa fé objetiva presente no Código, cria-se
obstáculo a qualquer deslealdade para com o usuário do serviços financeiros,
tanto na fase de conclusão, como na fase de execução dos contratos; regras
justas e claras tornam-se imperativas às relações entre fornecedores e
consumidores, regras que tratam inclusive de obrigatoriedade em conceder
informações claras sobre os serviços prestados.
Se o STJ julgar que as instituições financeiras
estão desobrigadas de respeitar o Código, a boa fé objetiva não mais será o elo
de segurança daqueles que necessitam negociar com estes fornecedores de
serviços.
Note-se que de nos últimos anos, a publicidade
dos bancos, por exemplo, perdeu seu caráter institucional de divulgação dos
produtos. O que se vê é um caráter mercantilista nas propagandas dos bancos,
tanto é verdade que hoje alguns fazem, inclusive, propagandas em telenovelas. Assim,
vende-se um produto, e quem o adquire está influenciado pelo marketing que na
maioria das vezes o persuade, não agindo livremente, logo, torna-se foco
primário de atenção do Código de Defesa do Consumidor. A liberdade de contratar
fica enfraquecida para que abusos nos contratos sejam censurados pelo Poder
Judiciário.
O consumidor tem tratamento especial na
Constituição Federal justamente porque é a pessoa mais fraca nesta relação
jurídica.
Nossa Constituição prevê, ao contrário do que
muitos pensam, tratamento desigual aos desiguais para que se estabeleça uma
sociedade mais justa onde uns não possam tirar vantagens excessivas de outros e
o Código de Defesa do Consumidor veio justamente para cumprir o que determina a
Constituição.
Os bancos sempre lutaram contra o Código de
Defesa do Consumidor, desta forma, surgiu o Código de Defesa do Consumidor
Bancário, que nada mais é do que uma extensão daquele código, especificamente
tratando das relações entre bancos e consumidores, entretanto, em nossa visão
tratou-se de um erro, afinal o Código abrange claramente os bancos como
prestadores de serviços.
Novamente, insatisfeitos, os bancos buscam
eximir-se. Afastar a proteção dos consumidores de serviços financeiros é uma
afronta aos cidadãos em nome do lucro das instituições bancárias.
Retirado de: http://www.ocaixa.com.br/artigos/ferreira2.htm.
Acesso em: 24 nov. 2004.