Buscalegis.ccj.ufsc.br
Responsabilidade do fato do
produto e do serviço.
Responsabilidade por culpa presumida ou independentemente
de culpa?
Lúcio Delfino
advogado e consultor
jurídico na cidade de Uberaba (MG), pós-graduado em Direito Processual Civil e
Direito Civil pela Universidade de Franca, mestrando em Direito Empresarial
pela Universidade de Franca
--------------------------------------------------------------------------------
A idéia de escrever esse artigo surgiu do
descontentamento de um grande jurista, o estudioso juiz Dr. Jurandir
Sebastião,(1) quanto à grafia adotada pelo legislador pátrio na elaboração dos
artigos 12 e 14 (caput) do Código de Defesa do Consumidor. Especificamente,
discorda o ilustre magistrado da expressão "independentemente da
existência de culpa" contida nos mencionados comandos de Lei.
A questão deve ser colocada nos seguintes termos:
objetivou o legislador brasileiro, em face dos comandos retro aludidos, realmente
responsabilizar o fabricante, o produtor, o construtor, o importador e o
prestador de serviços, independentemente de culpa, ou, na verdade, adotou um
sistema de culpa presumida, em que os fornecedores podem e devem, para se
exonerar da responsabilidade civil, demonstrar que não agiram culposamente?
Os artigos em comento prescrevem:
"Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor,
nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da
existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos
decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas,
manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por
informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
(...)
Art. 14 O fornecedor de serviços responde, independentemente
da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por
defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações
insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos."
Percebe-se que o fato gerador da responsabilidade pelo
fato do produto e do serviço é uma imperfeição, intitulada pela Lei das
relações de consumo de defeito. Entretanto, o consumidor não possui o ônus de
demonstrá-la, cabendo ao fornecedor a incumbência de provar sua inexistência,
caso queira eximir-se da responsabilidade de indenizar. Essa imperfeição é,
portanto, presumida. A questão é saber se os defeitos manifestam-se em razão de
culpa do fornecedor, ou se eles podem, eventualmente, ocorrer independentemente
dela.
Não se trata de
discussão meramente acadêmica, porquanto é por intermédio da interpretação da
norma que efetivamente se aplicará a lei, definindo rumos, esclarecendo
situações e estabelecendo a certeza jurídica buscada pelos demandantes.
Situações estranhas podem nascer da exegese de um texto de lei imperfeito,
acarretando prejuízos inadmissíveis e incompreensíveis ao ordenamento jurídico
vigente no País.
Antes de concluir se existe ou não a possibilidade do
ato ou omissão violador do direito de outrem (ato causador do defeito), em se
tratando de relações de consumo, suceder independentemente de culpa do
fornecedor do produto ou do serviço, importante se faz conceituar o termo
culpa.
Conforme advertem os irmãos MAZEAUD, a fixação dos
critérios orientadores da noção de culpa apresenta-se como um dos pontos mais
delicados da responsabilidade civil.(2) Existem aqueles para os quais a culpa
reveste-se no próprio fato. Segundo essa corrente, a obrigação de indenizar
decorre do próprio fato humano constitutivo do dano; a culpa resulta do ato
voluntário, bastando uma relação de causalidade voluntária. No entanto, os que
negam a existência da culpa, para que surja a responsabilidade, julgando como
necessário apenas o nexo causal entre o fato e dano, não apresentam um conceito
de culpa, no sentido empregado pela teoria subjetiva da responsabilidade,
sustentando, apenas, a teoria da responsabilidade objetiva.(3)
ALVINO LIMA, mesclando o conceito formulado por CHIRONI
e ABELLO com a definição dos irmãos MAZEAUD, esclarece que a culpa "é um
erro de conduta, moralmente imputável ao agente e que não seria cometido por
uma pessoa avisada, em iguais circunstâncias de fato."(4) CAIO MÁRIO DA
SILVA PEREIRA, por sua vez, conceitua a culpa "como um erro de conduta,
cometido pelo agente que, procedendo contra direito, causa dano a outrem, sem a
intenção de prejudicar, e sem a consciência de que seu comportamento poderia
causá-lo."(5)
O ponto de partida para análise da culpa é a violação
de uma norma preexistente de conduta imposta pelo Direito, seja ela legal,
contratual ou socialmente desprezível.(6) A conduta contraveniente poderá ser
voluntária ou involuntária, não se inserindo no contexto de voluntariedade o
propósito ou a consciência do resultado danoso (dolo). A voluntariedade
pressuposta na culpa refere-se a da ação em si mesma; é a consciência do
procedimento que se alia à previsibilidade. A culpa, então, provém de um ato
voluntário, isto é, realizado com os necessários elementos internos:
discernimento, intenção e liberdade. Entretanto, a vontade do sujeito no ato
culposo vai endereçada à sua realização, mas não à conseqüência nociva.(7)
A culpa, pois, não corresponde à vontade de praticar
determinado ato ilícito. Ao contrário do dolo, equivale à vontade de praticar
ato lícito, mas o agente, por não adotar uma conduta adequada, acaba por
praticar um ato ilícito. Há na culpa uma conduta mal-dirigida a um fim lícito,
conduta essa inadequada aos padrões sociais; ato ou fato que uma pessoa
prudente e cautelosa não teria praticado. Trata-se da imprevisão do previsível
por falta de cautela do agente. Em resumo, na culpa, a conduta nasce lícita,
pois é dirigida a um fim legítimo, mas, por erro sobre o curso causal, desvia-se
da sua rota normal e acaba por produzir um resultado ilícito.(8)
A culpa possui três elementos: conduta voluntária com
resultado involuntário; previsão ou previsibilidade; e falta de cuidado,
cautela ou atenção. O primeiro elemento, conforme já esclarecido, ressalta a
inexistência de conduta intencional em causar o dano; a vontade (ação ou
omissão) se dirige à conduta em si, mas não ao ato ilícito. A previsibilidade,
como segundo elemento da culpa, evidencia que o resultado, embora involuntário,
poderia ser previsto pelo agente. Não havendo previsibilidade estar-se-á alheio
aos limites da culpa, já no terreno do caso fortuito e força maior. Finalmente,
o derradeiro elemento exterioriza-se pela imprudência, negligência e pela
imperícia. Imprudência significa falta de cautela ou cuidado por conduta
comissiva; negligência é a mesma ausência de cuidado, mas por conduta omissiva;
e a imperícia decorre de falta de habilidade no exercício de atividade
técnica.(9)
Interessa ao presente estudo, por motivos adiante
expostos, a chamada culpa contra a legalidade, ou como bem evidencia SÉRGIO
CAVALIERI FILHO, "quando o dever violado resulta de texto expresso de lei
ou regulamento, como ocorre, por exemplo, com o dever de obediência aos regulamentos
de trânsito de veículos motorizados, ou com o dever de obediência a certas
regras técnicas no desempenho de profissões ou atividades regulamentadas. A
mera infração da norma regulamentar é fator determinante da responsabilidade
civil; cria em desfavor do agente uma presunção de ter agido culpavelmente,
incumbindo-lhe o difícil ônus de prova em contrário."(10)
Posto o conceito de culpa, importante também definir os
termos vício e defeito adotados pelo Código de Defesa do Consumidor. Luiz
Antonio Rizzatto Nunes demonstra, por oportuno, serem considerados vícios
"as características de qualidade ou quantidade que tornem os produtos ou
serviços impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam e também que
lhes diminuam o valor. Da mesma forma são considerados vícios os decorrentes da
disparidade havida em relação às indicações constantes do recipiente,
embalagem, rotulagem, oferta ou mensagem publicitária".(11)
Ao definir o defeito, esclarece o respeitado jurista
que ele "pressupõe o vício. O vício é uma característica inerente,
intrínseca do produto ou serviço em si"(12). Os defeitos carregam consigo
uma bagagem extra, sendo "capazes de causar danos à saúde ou segurança do
consumidor"(13). Na verdade, o defeito corresponde à idéia de resultado ou
conseqüência, sempre proveniente de um vício. Equivale à idéia de acidente de
consumo; ocorre sempre que o consumidor for lesado em sua incolumidade física,
psíquica e/ou, conforme o caso, patrimonial.(14)
Assim, o vício "pertence ao próprio produto ou
serviço, jamais atingindo a pessoa do consumidor ou outros bens seus. O defeito
vai além do produto ou do serviço para atingir o consumidor em seu patrimônio
jurídico, seja moral e/ou material. Por isso, somente se fala propriamente em
acidente, e, no caso, acidente de consumo, na hipótese de defeito, pois é aí
que o consumidor é atingido."(15)
Mas o vício/defeito decorre ou não de um erro de
conduta (culpa)? Na chamada sociedade de massa, caracterizada pela produção em
série, sempre planejada unilateralmente pelo fornecedor, com custos minimizados
e maior oferta de produtos e serviços, a regra do artigo 159 do Código Civil,
apresentava-se, quase sempre, como um fardo insuportável ao consumidor que
buscava reparação de danos sofridos. Na grande maioria das vezes, não conseguia
demonstrar a culpa do fornecedor, restando-lhe, tão-somente, o conformismo.
O Código de Defesa do Consumidor, atendendo a um
comando constitucional, alicerçado no princípio geral de direito da dignidade
da pessoa humana,(16) e finalmente, abalizado no reconhecimento histórico de
que o fornecedor é o pólo mais forte da relação de consumo, e o consumidor, por
sua vez, a parte fraca e vulnerável,(17) veio, então, a facilitar a defesa dos
direitos do consumidor, instituindo a ele, dentre outros benefícios, a culpa
presumida do fornecedor de produtos e de serviços quando ingresso em juízo
pleiteando ressarcimento civil. Ou seja, inverteu o ônus da prova, situando o
consumidor a uma posição mais equilibrada com o fornecedor.
É censurável a expressão "independentemente de
culpa" contida no texto dos artigos 12 e 14 do Código de Defesa do
Consumidor, por enunciar a teoria do risco integral ou da responsabilidade
civil objetiva absoluta, o que não foi o fim colimado pelo legislador
brasileiro.
O fornecedor, ao integrar o mercado de consumo, está
obrigado ao fornecimento de produtos e serviços que não acarretem riscos à
saúde e a segurança dos consumidores, conforme dispõe o comando insculpido no
artigo 8º do Código de Defesa do Consumidor.(18) Assumem, desde o início do
negócio, uma obrigação legal de resultado, ou seja, não basta colocar no
mercado produtos e serviços; deverão obrigatoriamente fornecer apenas produtos
e serviços seguros, ou melhor, sem vícios/defeitos.(19) Colocando-se no mercado
de consumo produtos e serviços viciados/defeituosos, evidenciada estará a
conduta ilícita do fornecedor, por desrespeito ao seu dever de cautela imputado
pela Lei das relações de consumo.
O vício/defeito de produtos ou serviços resultará,
pois, sempre da culpa ou dolo de seus fornecedores, como conseqüência de
infração de norma legal preexistente. Conforme assevera MARTINHO GARCEZ NETO, "a
simples infração da norma regulamentar é fator determinante da
responsabilidade, isto é, desde que entre a sua transgressão e o evento danoso
se estabeleça indispensável nexo causal, pois, nessa hipótese, o ofensor que
executa um ato proibido, ou não cumpre com o que determina a lei ou o
regulamento, incorre, só por este fato, em culpa, sem que seja mister
ulteriores investigações."(20)
Provando inexistir defeito, o fornecedor demonstrará,
simplesmente, que não agiu com culpa, isto é, não desrespeitou a Lei. Mesmo na
sociedade de consumo, em que a produção em massa é regra geral, os vícios ou
defeitos surgirão em razão de uma conduta imperfeita (descumprimento do dever
legal de cautela) do fornecedor.
Nessa presunção de defeito (que decorre da culpa do
fornecedor), o fato lesivo traduz-se, em si mesmo, num fato culposo
determinando a responsabilidade do fornecedor, se este não demonstrar a
ausência de causa estranha causadora do dano (inexistência de defeito, culpa
exclusiva do consumidor ou de terceiro, caso fortuito ou força maior).
A interpretação errônea da expressão
"independentemente de culpa" levar-se-á a exageros, porquanto se
poderia acreditar tratar-se de presunção de culpa irrefragável ou da teoria do
risco integral, condenando-se o fornecedor tão só pelos danos sofridos pelo
consumidor, independentemente, até mesmo, da consubstanciação do nexo
causal.(21) Conforme leciona ALVINO LIMA, em se tratando de responsabilidade
sem culpa, esta residirá no próprio fato e dele se deduzirá como conseqüência
fatal.(22)
Não é esse, por óbvio, o objetivo colimado pela Lei
8.078/90. Trata-se, o Código de Defesa do Consumidor, de um microssistema
jurídico, composto de verdadeiros princípios que lhe são próprios, relacionando-se,
ainda, com vários ramos do Direito e dando nova roupagem a antigos institutos
jurídicos. O Código fez um corte horizontal em toda a extensão da ordem
jurídica existente, permeando a sua disciplina por todos os ramos do direito –
público e privado, contratual e extracontratual, material e processual.
Estabeleceu uma disciplina única e uniforme para todas as relações de consumo,
devendo ser aplicada em toda e qualquer área do Direito em que elas
ocorrem.(23)
Esse microssistema permite sua análise e interpretação
segundo padrões teleológicos perfeitamente definidos. Isto porque ele é
composto da denominada "norma-objetivo". Especificamente, o artigo 4º
da Lei 8.078/90 é uma norma-objetivo por definir os fins da política nacional
das relações de consumo, especificando os resultados a serem alcançados pela
legislação.(24) Um desses fins é justamente a harmonização dos interesses dos
participantes das relações de consumo e a compatibilização da proteção do
consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de
modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica, sempre
com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores
(art. 4º, III, da Lei 8.078/90). Ora, em se tratando de relação de consumo, um
sistema de responsabilidade de risco integral, em que a presunção de culpa é
irrefragável, a exemplo do que ocorre com o seguro obrigatório dos
proprietários de veículos automotores (DPVAT) e com o acidente de trabalho, só
iria desestruturar bases econômicas, contribuindo para o caos e não para com o
equilíbrio da relação.
Portanto, melhor seria que o legislador pátrio
utilizasse a expressão "por presunção de culpa" ao invés de
"independentemente de culpa", como forma de clarificar o texto da
lei, além de contribuir para a não ocorrência de erros interpretativos que,
ocasionalmente, podem levar a situações de extrema injustiça.
--------------------------------------------------------------------------------
Notas
1. O Dr. Jurandir Sebastião é Juiz de Direito na
comarca de Uberaba (MG) e autor do livro "Responsabilidade Médica civil,
criminal e ética", obra séria que representa uma grande contribuição para
a literatura jurídica do País.
2. SILVA PEREIRA, Caio Mário da. 9a ed.
Responsabilidade civil. Rio de Janeiro : Forense, 1999. p. 64.
3. LIMA, Alvino. Culpa e risco. 2a ed. São Paulo :
Revista dos Tribunais, 1999. p. 45.
4. Ibid. p. 69.
5. SILVA PEREIRA, Ob. cit. p. 69.
6. Conduta socialmente desprezível seria aquela que,
embora não defesa por lei ou contratualmente, apresenta-se contrária ao dever
de cuidado usualmente adotado pelo bonus pater familias. Seria um comportamento
inadequado socialmente, sempre determinado pela comparação do fato concreto com
o comportamento que teria adotado, no lugar do lesante, um homem comum, capaz e
prudente.
7. SILVA PEREIRA, Ob. cit. p. 70.
8. FILHO, Sérgio Cavalieri. 2a ed. Programa de
responsabilidade civil. São Paulo : Editora Malheiros, 2000. p. 38.
9.
Ibid. 40-41.
10. Ibid., p. 44.
11. NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao código de defesa
do consumidor. Direito Material. São Paulo : Saraiva, 2000. p. 157.
12. Ibid., 2000. p. 157.
13. MARINS, James. Responsabilidade da empresa pelo
fato do produto. São Paulo: Revista dos Tribunais, Biblioteca de Direito do
Consumidor, 1993. v. 5. p. 110.
14. Conforme leciona Silvio Luís Ferreira da Rocha:
proteção não é restrita apenas à integridade pessoal do consumidor. Abrange
também a proteção patrimonial, que poderá ser direta, quando não houver
violação à incolumidade físico-psíquica do consumidor, mas violação aos bens de
sua propriedade, ou reflexa, quando em decorrência da violação da incolumidade
físico-psíquica ocorrer danos patrimoniais. Entretanto, cumpre fazer uma
distinção. As lesões patrimoniais originárias do não funcionamento do bem ou de
sua inadequação com a finalidade legitimamente esperada estão protegidas pela
seção que cuida da responsabilidade por vícios de qualidade por inadequação.
Portanto, a responsabilidade do fornecedor pelo fato do
produto se caracteriza por ser uma responsabilidade por falta de segurança dos
produtos, enquanto a clássica garantia por vícios se traduz na responsabilidade
do vendedor por falta de conformidade ou qualidade da coisa, tendo, por isso,
objetivos diferentes: aquela visa proteger a integridade pessoal do consumidor
e dos seus bens; esta, o interesse (da equivalência entre a prestação e a
contraprestação) subjacente ao cumprimento perfeito. A primeira está
disciplinada nos arts. 12 a 17, enquanto a segunda está disciplinada nos arts.
18 a 21. (ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Responsabilidade civil do fornecedor
pelo fato do produto no direito brasileiro. 2. ed. São Paulo: RT, 2000. p. 66).
15.
NUNES, op. cit., 2000. p. 157.
16. Princípio esse positivado pela Constituição Federal de 1988.
17. Inclusive reconhecido por lei como tal.
18. "Art. 8º - Os produtos e serviços colocados no
mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde ou segurança dos
consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de
sua natureza e fruição, obrigando-se os fornecedores, em qualquer hipótese, a
dar as informações necessárias e adequadas a seu respeito."
19. Nesse sentido, leciona a insigne professora Cláudia
Lima Marques, em excelente trabalho, esclarecendo estar superada, em se
tratando de relações de consumo, a teoria do vício da vontade, uma vez que o
fornecedor já não pode alegar erro e menos ainda dolo bônus, uma vez que o
dever de informar, dever de segurança e dever de introdução no mercado apenas
de serviços sem defeito foi imputado ao fornecedor imperativamente ex vi lege.
(MARQUES, Cláudia Lima. Proposta de uma teoria geral dos serviços com base no
Código de Defesa do Consumidor. Revista de direito do consumidor, nº 33,
jan/mar., 2000, p. 98).
20. NETO, Martinho Garcez. Prática de responsabilidade
civil. 3a ed., p. 132.
21. Como, aliás, ocorreu na apelação cível nº
809.212-2, do Primeiro Tribunal de Alçada de São Paulo, em que foi dado
provimento ao recurso de uma médica que, ao realizar um exame denominado de
colonoscopia e posterior ressecção de pólipos, acabou por perfurar o intestino
de uma paciente. Entendeu o acórdão que a médica, ao realizar o exame, teve uma
conduta correta, utilizando-se dos meios adequados e indicados pela
experiência, não agindo, assim, de maneira negligente ou imperita. Por outro
lado, o hospital co-réu, onde o exame foi prestado, foi condenado sob o
fundamento de que a causa da perfuração intestinal produzida na vítima (evento
danoso) foi a prestação de serviços. Segundo referido acórdão demonstrou-se nos
autos a relação de causalidade entre o aludido exame e o dano para a vítima.
Ora, o acórdão na verdade desconsiderou a inexistência de nexo causal,
condenando-se o hospital simplesmente pelo fato da vítima ter sofrido danos;
tão-somente em razão do serviço lá ter sido prestado. Demonstrando-se a
inexistência da culpa da médica responsável pelo exame, por óbvio restou
provada a inocorrência de defeitos na prestação de serviços. Não houve nexo de
causalidade pelo fato de inexistir, no caso em tela, defeito na prestação de
serviços. Mas, mesmo assim, o hospital acabou condenado em razão da aplicação
da teoria do risco integral, sem comedimentos, sem possibilidade de prova em
contrário (O acórdão na íntegra foi publicado na Revista dos Tribunais, nº788,
p. 259).
22. LIMA, Ob. cit., 1999, p. 72.
23. FILHO, Ob. cit. p. 359.
24. GRAU, Eros Roberto. Interpretando o Código de
Defesa do Consumidor; algumas notas. Revista de Direito do Consumidor, nº 5,
1994. p. 183-189
--------------------------------------------------------------------------------
Bibliografia
FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de responsabilidade
civil. 2ª edição. São Paulo : Malheiros Editores, 2000.
GRAU, Eros Roberto. Interpretando o Código de Defesa do
Consumidor; algumas notas. Revista de Direito do Consumidor, nº 5, 1994. p.
183-189
LIMA, Alvino. Culpa e risco. 2a ed. São Paulo : Revista
dos Tribunais, 1999.
MARINS, James. Responsabilidade da empresa pelo fato do
produto. São Paulo: Revista dos Tribunais, Biblioteca de Direito do Consumidor,
1993. v. 5.
MARQUES, Cláudia
Lima. Proposta de uma teoria geral dos serviços com base no Código de Defesa do
Consumidor. Revista de direito do consumidor, nº 33, jan/mar., 2000.
NETO, Martinho Garcez. Prática de responsabilidade
civil. 3a ed.
NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários
ao código de defesa do consumidor. Direito Material. São Paulo : Saraiva, 2000.
ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Responsabilidade civil
do fornecedor pelo fato do produto no direito brasileiro. 2. ed. São Paulo: RT,
2000.
SEBASTIÃO, Jurandir. Responsabilidade médica civil
criminal e ética. Belo
Horizonte: Del Rey, 1998.
SILVA PEREIRA, Caio Mário da. 9a ed. Responsabilidade civil. Rio
de Janeiro : Forense, 1999.
Retirado de: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=2583. Acesso em: 05 nov. 2004.