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A abusividade na prestação
de serviços de telefonia
Hugo Barbosa Torquato Ferreira
acadêmico de Direito na
Faculdade Milton Campos, estagiário do Juizado Especial das Relações de Consumo
de Belo Horizonte
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"Impulso é um sistema criado para calcular o tempo
que você conversa ao telefone nas chamadas locais. Por exemplo: quando você
efetua uma ligação, registra-se um impulso no momento em que o telefone chamado
é atendido. A partir daí, é registrado um impulso para cada 4 minutos,
ocorrendo o primeiro impulso adicional ao acaso com relação ao início da
chamada. Para calcular o tempo de conversa, existe um contador de chamadas,
aparelho de precisão instalado na companhia telefônica e ligado ao terminal do
cliente". (grifo nosso)
Esta informação é fornecida na lista telefônica,
visando a prestar ao consumidor esclarecimentos acerca da forma como o serviço
é cobrado. Este método é conhecido como Karlsson Acrescido. As cobranças são
feitas com fulcro na Lei Geral de Telecomunicações, no contrato de Concessão
que atribui à ANATEL competência para regular o setor, no decreto n.º 2338 de
1997 e na Resolução 85, de 30/12/98, da Anatel, publicada no D.O.U. de
31/12/98.
A partir destes dados é possível formular pelo menos
duas questões juridicamente relevantes, como passamos a analisar.
A primeira delas tem nascedouro no conflito entre a
forma de cobrança e o disposto no art. 39, I, parte final, da lei 8.078 de 11
de Setembro de 1990.
Art.39 É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços,
dentre outras práticas abusivas::
I- Condicionar o fornecimento de produto ou de serviço
ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites
quantitativos.
A aquisição do referido serviço se dá em grupos de 4
unidades, considerando-se como unidade cada minuto ou mesmo em grupos de 240
unidades, tomando-se por base os segundos. É estabelecido, portanto, limite
quantitativo para a prestação do serviço. O consumidor não tem a prerrogativa
de contratar o serviço de forma diversa, como, por exemplo, pagar pelo uso de
15 segundos. Ocorre a chamada venda casada, prática bastante comum nos
contratos bancários (abertura de conta corrente vinculada à de conta poupança,
concessão de crédito pessoal vinculada à celebração de contrato de seguro etc.)
e na venda de pequenas mercadorias (4 pilhas, 3 sabonetes...). As companhias
telefônicas usufruem de um mercado em permanente expansão e com pouca
concorrência, pelo que não há, aparentemente, justa causa para a prática desta
modalidade de venda. Destarte, é inaceitável a alegação de falta de condições
financeiras para modernização do contador de chamadas, sendo estas questões que
devem ser resolvidas interna corporis, não servindo para eximi-las da adequação
de sua atividade às normas esposadas no Código Brasileiro de Defesa do
Consumidor. Caracterizada estaria, portanto, a abusividade da forma de medição
de impulsos. É evidente que a existência da resolução da Anatel, bem como a
mera alegação do uso de tecnologia de alta precisão e segurança, por si só, não
isentam as companhias telefônicas da obrigação que lhe é imposta por lei, nos
termos do art. 39, I, da Lei 8.078/90. Nasce para o consumidor o direito de
pleitear o pagamento apenas do serviço efetivamente utilizado, furtando-se ao
custeamento injustificado de valor excedente. Caberia ainda, nos termos do art.
56 e seguintes da lei 8.078/90, aplicação, pela autoridade administrativa, das
sanções legais, fundada em infração de norma de defesa do consumidor.
A segunda questão que pretendemos analisar é
concernente à expressão "ao acaso" utilizada na definição de impulso.
No momento em que o telefone chamado é atendido registra-se o primeiro impulso.
Pelo sistema de cobrança adotado, um impulso a cada quatro minutos, que,
insistimos, consideramos abusivo, o próximo impulso só poderia ser registrado
quatro minutos após, o que não ocorre. A leitura do contador é feita sempre nos
mesmos horários, como, por exemplo:
* = impulso
14:00__14:04__14:08__14:12__14:16__14:20__14:24__14:28
*
* * * *
* * *
Desta forma, a cobrança de impulsos é variável, podendo
ser feita mais de uma vez no período de quatro minutos. Se o telefonema for
atendido às 14:03 e desligado às 14:05 o consumidor terá utilizado o serviço
por apenas dois minutos, mas pagará 2 impulsos, um relativo ao atendimento da
ligação (14:03) e outro no momento em que o contador fizer a leitura (14:04).
14:00__14:04__14:08__14:12__14:14__14:16__14:18__14:20
*
* * * *
* * * ( 14:03 )
Ainda há o plus da não informação ao consumidor sobre a
hora exata da leitura, privando-o da oportunidade de utilizar o serviço de
forma mais econômica. A variação do preço da chamada ocorre à revelia do
consumidor, caracterizando abusividade e conseqüente nulidade da cláusula
contratual que a prevê, nos termos do Art. 51, X, do já citado diploma legal.
Art.51 - São nulas de pleno direito as cláusulas
contratuais relativas ao fornecimento de produtos ou serviços que:
X - permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente,
variação do preço de forma unilateral.
O preço de uma ligação telefônica de 5 segundos pode
ser equivalente a um impulso ou a dois, sem que o consumidor tenha a
prerrogativa de intervir nesta variação. O aumento do preço a ser pago
obedecerá a critérios quase que subjetivos, o que é inadmissível em nossos
tempos e sob a ótica do atual ordenamento jurídico.
Impressiona-nos constatar que, ao décimo primeiro ano
do Código de Defesa do Consumidor, ainda ocorram práticas desta natureza sem
que a sociedade, visivelmente insatisfeita com os serviços prestados, consiga
exigir do Estado a revisão destes contratos.
Retirado de: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=2194. Acesso em: 04 nov. 2004.