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A ilegalidade dos serviços
telefônicos de valor adicionado (0900)
Duciran Van Marsen Farena
procurador da República
em São Paulo (SP)
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Os serviços conhecidos genericamente pelos códigos 0900
ou 900 (há ainda outros códigos, como o 145, etc.) são tecnicamente denominados
de "serviços de valor adicionado", e têm como característica um
sobrepreço, de natureza privada, que se acrescenta à tarifa.
Os principais vícios do sistema são bem conhecidos,
depois de sete anos de abusos e descontrole: não existe o bloqueio gratuito;
nenhuma divulgação é feita da possibilidade de bloqueio (levando o consumidor a
só pedi-lo quando já sofreu o prejuízo); exige-se que o usuário pague para
poder contestar cobrança indevida; nenhum limite é fixado para o valor máximo
de cobrança (quanto mais o assinante ligar, melhor), etc. Para não falar na
propaganda abusiva e enganosa, explorando a credulidade de menores e pessoas
fragilizadas econômica ou sentimentalmente.
De há muito, entidades de defesa do consumidor vêm
reclamando garantias como a exclusão da conta de telefone de todos os valores
do 0900 quando há contestação (passaria ao provedor interessado o encargo da
cobrança), de modo a não ficar o usuário injustamente privado do serviço.
Isso porque hoje, por norma administrativa, a conta
telefônica é indivisível, ou seja, não se pode desdobrá-la para pagar só a
tarifa. Constatada tecnicamente a "origem" das ligações, tem o
usuário duas alternativas: ou paga tudo, ou tem a linha cortada.
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Não é difícil, assim, perceber os principais problemas
que envolvem o 0900:
a) ausência de autorização expressa - o consumidor,
quando adquiriu o telefone, obrigou-se pela tarifa, pura e simples, assumindo,
nesse caso, o risco de pagar por ligações não autorizadas. Mas não autorizou
nem assumiu o risco de pagar por serviços privados como o tele-sexo ou o
disque-amizade, acessados por menores ou terceiros, oferecidos com a mais
apelativa propaganda de TV.
Ausente a solicitação prévia do titular da linha (que não
se confunde com o ato de discar) o serviço fornecido só pode ser considerado
gratuito (Art. 39, III, e parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor).
Não é possível comparar o uso indevido do 0900 com outros
casos (p. ex., uma criança que deixa uma torneira aberta) que se encontram
dentro da órbita normal de responsabilidade inerente ao serviço público. A
solução é o bloqueio prévio, com o desbloqueio por iniciativa do titular da
linha - que aí sim, estará se responsabilizando pelo uso indevido.
b) Cobrança na conta de telefone. Sendo o telefone um
serviço público, somente pela ausência de pagamento da contraprestação – a
tarifa - é que o consumidor pode ser dele privado. É o que se extrai do no
artigo 3º, inciso VII, da Lei nº 9.472/97 (Lei Geral das Telecomunicações),
verbis:
" Art. 3º. O usuário de serviços de telecomunicações
tem direito:
(...)
VII - à não suspensão de serviço prestado em regime
público, salvo por débito diretamente decorrente de sua utilização ou por
descumprimento de condições contratuais."(grifamos)
Ou seja, débito decorrente da utilização do serviço
público ou descumprimento de condições inerentes a este. E, para não deixar
dúvidas, dispõe o art. 61 da citada Lei que "serviço de valor adicionado é
a atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte
e com o qual não se confunde..."(grifamos).
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Como se vê, o 0900 não se confunde com o serviço público
de telefonia, mas compartilha indevidamente do mesmo modo coativo de cobrança -
ou o usuário paga, ou tem sua linha cortada. A lógica dessa cobrança é a mesma
de embutir na conta de luz as prestações do aparelho de televisão. Não pagou,
fica sem TV e sem luz...
Tais serviços, na verdade, deveriam ser cobrados pelo
próprio fornecedor, através de boleto, cartão de crédito, etc., sem a
intermediação do poder administrativo de cortar a linha. O serviço público de
telefonia não pode ser o penhor de contratos privados.
Do contrário, valha o conhecido refrão do
"locupletemo-nos todos". Ponha-se igualmente todo tipo de cobrança na
conta de luz e água. Estará eliminada a inadimplência no Brasil...
Sempre houve a possibilidade de cancelar o valor do 0900
na primeira reclamação. No entanto, tal providência era até pouco tempo o
segredo mais bem guardado do Brasil. Como confessou um operador do sistema:
"não podemos divulgar isso senão todo mundo vai reclamar".
Por tais razões, foram bloqueados, por decisão da 4ª
Vara, os serviços de valor adicionado da TELEFONICA e EMBRATEL, até que sejam
adotados os condicionamentos determinados na liminar. Como se verifica, não se
trata de proibir o 0900, nem sequer o tele-sexo, mas de eliminar, com medidas
simples, as atuais práticas lesivas ao usuário. A resistência das rés e
provedores, inclusive em cumprir a ordem judicial, deixa a impressão que a
verdadeira lucratividade do sistema deriva não de seu conteúdo de facilidade ou
entretenimento, mas da coação que proporciona contra o titular da linha, que
jamais aceitou tais "serviços" nem assumiu o risco de perder seu
telefone por causa deles.
Retirado de: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=740. Acesso em: 04 nov. 2004.