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A Central de Risco de
Crédito do Banco Central do Brasil e o sigilo bancário
Priscila Cunha Lima
acadêmica de Direito na
UNIFACS, em Salvador (BA)
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Centrais de Informações de
Crédito (SPC, SERASA, etc.) e Sistema Central de Risco de Crédito (CRC –
BACEN):
As Instituições Financeiras como um todo, em virtude de
suas atividades que quase sempre envolvem grande responsabilidade patrimonial, necessitam
de informações acerca do mercado consumidor de capitais, com vistas a avaliar a
sua capacidade e vontade de pagar, ou seja, a solvência dos que lhe procuram
para contratar.
Não há dúvidas de que, neste competitivo mercado,
informação é sinônimo de segurança e rentabilidade. Assim, os integrantes de
todo o sistema financeiro nacional são vigilantes no que diz respeito de às
informações, procurando sempre atualizá-las e investindo consideravelmente para
mantê-las e obtê-las, visando sempre analisar o risco das suas atividades.
Certamente, a atividade das instituições financeiras é
empresarial e capitalista na mais pura forma e, por isto, há a busca incessante
pelo lucro, tendo sempre como inspiração de com o menor custo alcançar-se o
maior lucro. Pretende-se afastar o risco a todo custo reduzindo-o à menor
proporção sustentável.
A noção de risco de crédito liga-se à probabilidade de
recebimento do montante a ser emprestado ao consumidor bancário e,
conseqüentemente, daquela instituição financeira manter-se no mercado. É a
partir desta idéia, que haverá o estabelecimento do preço a ser cobrado
traduzido na taxa de juros aplicável àquela soma.
Tal valioso produto, qual seja, a informação,
entretanto, poderá ser obtido por apenas algumas formas. A instituição
financeira terá esta noção a partir de um relacionamento construído ao longo do
tempo, podendo levantar dados acerca daquele tomador de crédito junto ao seu
próprio conjunto de informações. Todavia, não sendo possível esta operação,
poderia esta instituição obter, junto a empresas ou instituições que realizaram
operações com este tomador, notícias acerca deste negócio. Entretanto, tais
possibilidades não se mostram eficientes no labor diário das empresas,
dificultando e muitas vezes dilatando o prazo para conclusão do negócio.
Para solucionar tal situação, foram criadas diversas
Centrais de Informações de Crédito, privadas ou públicas, funcionando para
eliminar a assimetria de informação entre o credor e o tomador de recursos,
reduzir os problemas ligados à seleção adversa, diminuindo tanto os efeitos do
risco, quanto os custos no fornecimento das informações. Surgiram então a
SERASA, o SPC e diversos outros bancos de dados que, na sua maioria, possuem
informações negativas, ou seja, são incluídas em sua base somente dados
relativos à inadimplências. Estas Centrais passaram a atuar como verdadeiros
instrumentos disciplinadores do mercado, sendo que, os nela incluídos passaram
a ter o estigma de maus pagadores publicizado a níveis nacionais.
Esta informação, ao revés, poderá ser positiva, ou
seja, poderá avaliar o perfil do bom pagador, revelando seu histórico de
adimplência, com disponibilização de dados acerca de todas as operações por ele
contratadas, com prazo e forma de pagamento. Esta forma acaba criando uma
consciência por parte de todos os bancos acerca daquele tomador, gerando uma
competição maior entre eles. Há também a prevenção de que os tomadores passem a
tornar-se inadimplentes, em vista de tomarem mais empréstimos do que
efetivamente possam adimplir, ficando excessivamente endividados, aumentando
assim o risco de emprestar-se dinheiro a esta pessoa.
Todavia, a experiência demonstra serem mais eficientes os
cadastros capazes de armazenarem os dois tipos de informações.
É com esta inspiração que surge a Central de Risco de
Crédito do Banco Central do Brasil (BACEN), visando primordialmente o aumento
da capacidade de monitoramento dos riscos de crédito dentro das carteiras das
instituições financeiras, prevenindo crises, detectando eventuais problemas,
fornecendo subsídios para a análise e pesquisa do mercado de crédito, tudo isto
por conta do fornecimento de informações mais precisas e de melhor qualidade
para os integrantes do Sistema Financeiro Nacional, auxiliando a tomada de
decisões para a concessão e gerenciamento do crédito.
Esta Central difere das demais centrais de Informações
de Crédito por amparar-se fortemente no uso de informações positivas. Ela
revela um sistema classificatório do risco de crédito para todos os devedores,
englobando não só financiamentos, mas também avais, fianças, coobrigações e
perfil de endividamento, consolidando as posições de risco de crédito entre
várias instituições financeiras e entre empresas do mesmo grupo empresarial.
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Surgimento e regulamentação da
Central de Risco de Crédito:
A Central de Risco de Crédito do Banco Central do
Brasil começou a ser implantada em 1997. Inicialmente este instrumento mostrou
ser muito útil na supervisão das atividades bancárias da própria autarquia e,
secundariamente atendendo, ainda que em uma pequena parte, ao Sistema
Financeiro Nacional.
No ano de 2000, foi efetuada uma avaliação global do
sistema, revelando-se a necessidade de ampliar-se o objetivo das informações
visando a atender à outras áreas do Banco Central do Brasil, não só, como vinha
ocorrendo, somente à área de supervisão bancária. O sistema expandiu-se além do
âmbito do BACEN, e estendeu-se também à esfera de todo o sistema financeiro,
através de suas instituições.
Desta forma, a partir desta reformulação, houve
significativas evoluções, entre as quais pode-se destacar o aumento da
capacidade de monitoramento de riscos de crédito, visando antever e prevenir
crises no Sistema Financeiro Nacional. Foram também desenvolvidas novas
ferramentas que possibilitaram detectar potenciais problemas nas carteiras de
créditos das instituições financeiras pela área de supervisão, por conta
principalmente da disponibilidade de informações mais detalhadas sobre crédito.
Todo este universo de informações foi disponibilizado ao Sistema Financeiro
Nacional com uma maior qualidade, permitindo com isto o aperfeiçoamento das
deliberações a respeito da concessão e gerenciamento dos créditos, dando ensejo
à diminuição da inadimplência do sistema e conseqüentemente do spread bancário.
A regulamentação deste sistema veio com a Resolução n.
2.390, de 22 de maio de 1997, substituída posteriormente pela Resolução 2.724
em 31 de maio de 2000, ambas emitidas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).
Esta última, ainda vigente, determinou que todas as instituições financeiras
ali especificadas passassem a prestar informações ao Banco Central, o qual, por
sua vez passou a editar regulamentos para esclarecimento dos procedimentos a
serem adotados.
A partir daí, as instituições financeiras passaram a
fornecer periodicamente informações acerca de todas as suas operações que se
enquadrassem nas exigências do BACEN, alimentando esta base de dados e tendo
acesso a ela, inclusive remotamente.
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As informações disponibilizadas e
o sigilo bancário:
A Constituição Federal assegura no seu art. 5º, inc. X,
a todos a inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e imagem, como
cláusula pétrea admitindo sua flexibilização somente quando presentes os
princípios garantidores da legalidade e do devido processo legal, em que se
insere o contraditório. Não há dúvidas de que o sigilo bancário possui esta
proteção da Carta Magna, sendo indiscutível que todas as pessoas serão
protegidas no que diz respeito às suas operações financeiras. Trata-se o sigilo
bancário, portanto, de direito fundamental o qual não pode ser abolido ou
limitado.
Entretanto, com esta Central de Risco de Crédito do
Banco Central do Brasil, poder-se-ia questionar acerca da sua criação ter ou
não violado este direito constitucional ao sigilo bancário.
De fato, a CRC, como receptáculo de informações, passa
a ter, conforme planejado para a sua nova reformulação já em andamento,
informações fornecidas por diversas instituições quais sejam: a Secretaria da
Receita Federal (SRF), as Câmaras de Compensação, Liquidação e Custódia, o
Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal (Cadin),
Departamento de Capitais Estrangeiros e Câmbio (Decec), Departamento de
Supervisão Direta (Desup), Departamento de Supervisão Indireta (Desin),
Balancetes Cosif, Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundo (CCF), Informações
sobre Entidades de Interesse do Banco Central (Unicad) e Instituições
Financeiras e Assemelhadas.
Como se vê, tal implantação criará um banco de dados
sem precedentes, com a capacidade de fornecer informações muito superior a
qualquer central já instalada, com o diferencial de ser um sistema mantido pelo
Poder Público, ao qual as empresas deverão necessariamente fornecer os dados.
Além de ser por ele mantido dará oportunidade de em qualquer local do país ser
acessado e, terá as mais diversas e heterogêneas informações acerca daquele
tomador, como um verdadeiro cérebro de todas as operações bancárias e
financeiras do país.
As informações poderão ser acessadas, como hoje ocorre,
pela supervisão bancária, no estrito cumprimento de suas atribuições, pelo
próprio cliente, após um cadastramento e obtenção de senha específica ou pela
instituição financeira quando devidamente autorizada pelo cliente.
Entretanto,
apesar desta restrição de possibilidades, o que se vê hoje são as instituições
financeiras, mais do que acostumadas a utilizarem contratos de adesão através
da impressão de diversos formulários padrões, obterem esta autorização do
consumidor sem que este saiba que está na realidade autorizando que o seu
sigilo bancário seja esmiuçado pelo concedente do empréstimo. Caberá ao Banco
Central orientar as instituições financeiras no sentido de coibir abusos desta
natureza e, ao Poder Judiciário sancionar caso haja sua materialização, em
vista inclusive do disposto no Código de Defesa do Consumidor.
A lei complementar 105, de 10 de janeiro de 2001, que
dispõe sobre o sigilo das operações de instituições financeiras e dá outras
providências, previu em seu artigo 1º, § 3º, inc. I, que não constituirá
violação do dever de sigilo das instituições financeiras a troca de informações
entre elas para fins cadastrais, incluindo as centrais de risco, observando-se
as normas baixadas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central do
Brasil. Entretanto, tal previsão legal não obsta seja esta CRC, na prática,
seja utilizada indevidamente, ensejando verdadeira violação à intimidade das
pessoas revelando todo o seu sigilo bancário.
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Conclusão:
De fato, não é necessária uma análise muito acurada
acerca do tema para visualizar-se o poder de fogo da Central de Risco de
Crédito do Banco Central do Brasil. Fica claro que por ter esta central uma
gama de informações muito grande, poderá ser considerada hoje, possivelmente, o
maior banco de dados já visto no país, reunindo em seu bojo todas as operações
financeiras relevantes.
Todavia, não se pode olvidar que tal banco de dados
conterá todos os elementos para um maior controle do sistema financeiro
nacional por parte do Banco Central do Brasil. É importante ter em mente que o
sentido da palavra risco empregado na denominação da CRC diz respeito não ao
risco do cliente vir a pagar, mas sim, numa perspectiva macroeconômica, à
capacidade da instituição financeira vir a causar imensos prejuízos à toda a
sociedade brasileira, como o passado se encarrega de demonstrar.
Certamente, será através deste controle maior por parte
do Banco Central do Brasil das instituições que será possível apurar-se
fraudes, má gestão dos recursos públicos e privados no momento da realização
dos empréstimos. De outra forma não poderia ser mais eficiente, tendo em vista
que, antes mesmo de realizar o empréstimo, o futuro credor terá a possibilidade
de estudar pormenorizadamente a vida financeira do seu tomador, justificando
assim a sua recusa, ou, comprovando o seu descompromisso ao efetuar o
empréstimo.
Trata-se, mais
uma vez, de aplicar-se o princípio da proporcionalidade perante o conflito de
interesses: de um lado o direito individual ao sigilo bancário e do outro o
interesse público, representado pela pretensão do Poder Público de averiguar a
solidez, a segurança e o grau de solvência e de risco das instituições
financeiras.
Deve-se, portanto, adequar este relevante interesse em
controlar a atividade das instituições financeiras à garantia de intimidade do
particular, tendo em vista a relevância econômica da questão. Aliás, questão
que, caso não observada, pode vir a gerar colapso em toda a economia e quiçá a
falência de um sistema financeiro que, apesar de suas mazelas, funciona
regularmente.
Retirado de: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=4336. Acesso em: 03 nov. 2004.